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  • Ferreira Gullar e Paulo Leminski, dois rivais em exílio | Ensaio

    Ferreira Gullar e Paulo Leminski, dois rivais em exílio | Ensaio

    poema-sujo-ferreira-gullar-livro-capaCatarse (do grego: kathar­sis) é o proces­so de depu­ração dos sen­ti­men­tos, purifi­cação ou pur­gação do espíri­to sen­sív­el. No teatro grego, o herói dramáti­co pre­cisa sofr­er para purificar o espíri­to. Em psi­canálise, é a lib­er­tação de um trau­ma. A gênese da mais famosa obra dos últi­mos 40 anos da poe­sia brasileira, o Poe­ma sujo, é catár­ti­ca, segun­do seu autor, Fer­reira Gullar.

    Gullar esta­va no exílio, em Buenos Aires, em 1975, quan­do escreveu o poe­ma. Depois de pas­sar anos moran­do em diver­sas cidades do mun­do (Moscou, San­ti­a­go do Chile e Lima), viu ditaduras mil­itares se insta­larem nos país­es sul-amer­i­canos. Com o fra­cas­so da utopia comu­nista no Brasil, depois de um tem­po na Rús­sia, emi­grou para o Chile e assis­tiu à que­da de Allende. Mudou para a Argenti­na em 1974 e reviveu o pesade­lo de ver os ami­gos ao redor serem pre­sos ou fugir. Saben­do que os agentes da repressão brasileiros fechavam o cer­co no país viz­in­ho, decid­iu escr­ev­er um poe­ma que fos­se um teste­munho final.

    O Poe­ma sujo, escrito em cin­co meses, em esta­do de transe ver­tig­i­noso, foi aca­len­ta­do por anos. Tem como fio con­du­tor a ideia de res­gatar memórias de sua cidade natal, São Luís do Maran­hão. As condições de penúria no exílio e a eminên­cia de calar-se para sem­pre o forçaram a ultra­pas­sar o tom memo­ri­alís­ti­co. O Poe­ma sujo dá voz ao deses­pero do poeta. Deses­pero que, para­doxal­mente, englo­ba grande esper­ança, por situ­ar-se na infân­cia, como demon­stra seu tre­cho mais con­heci­do, trans­for­ma­do na letra da canção O tren­z­in­ho caipi­ra, a toca­ta da Bachi­ana no. 2, de Vil­la-Lobos:

    Lá vai o trem com o menino
    Lá vai a vida a rodar
    Lá vai ciran­da e destino
    Cidade e noite a girar
    Lá vai o trem sem destino
    Pro dia novo encontrar
    Cor­ren­do vai pela terra
    Vai pela serra
    Vai pelo mar
    Can­tan­do pela ser­ra o luar
    Cor­ren­do entre as estre­las a voar
    No ar, no ar…

    A evo­cação da memória da infân­cia em rede­moin­ho é o pon­to de par­ti­da para com­por um poe­ma em vários tons, com momen­tos de inten­si­dade e de banal­i­dade, como cita o poeta, con­struí­dos por frag­men­tos de lem­branças “das pes­soas às coisas, das plan­tas aos bichos, tudo, água, lama, noite estre­la­da, fome, esper­ma, son­ho, humil­hações, tudo era gora matéria poéti­ca”. Antítese entre o claro do pre­sente e o tur­vo da infân­cia, mais que res­gate, é a recom­posição do pas­sa­do no presente.

    A memória da infân­cia é um reg­istro infiel, sujo, recom­pos­ta por destroços: tel­has encar­di­das, gar­fos e facas que se que­braram, e se perder­am nas fal­has do assoal­ho para con­viv­er com baratas e ratos no quin­tal esque­ci­dos entre os pés de erva cidreira. Des­or­dem que é ordem “per­feita­mente fora do rig­or cronológi­co”, do labir­in­to do tem­po inte­ri­or. A casa per­di­da no tem­po, com tal­heres enfer­ru­ja­dos, facas cegas, cadeiras furadas, mesas gas­tas, armários obso­le­tos raste­jam “pelos túneis das noites clan­des­ti­nas” esperan­do “que o dia ven­ha”. A infân­cia é o úni­co refú­gio para quem perdeu tudo. O cor­po, a úni­ca casa, o úni­co ter­ritório, a pos­si­bil­i­dade de êxtase quan­do já não se per­tence a lugar nenhum.

    A iden­ti­dade são-luisense se con­cretiza no cor­po do poeta, o pas­sa­do se esmiúça, como cita Alcides Vil­laça: o “sujo do poe­ma ref­ere-se tan­to ao impuro quan­to pela com­posição das difer­enças, pelas águas revolvi­das, pelo esti­lo que vai da mão sol­ta no papel à cadên­cia rig­orosa de uma avali­ação […] Mas sujo tam­bém porque par­tic­i­pa de uma história não ofi­cial, sec­re­ta, que soma a con­sciên­cia abafa­da e o cor­po pri­sioneiro de von­tades cal­adas.” Sujo porque a vida é suja: toda matéria se perde, apo­drece lentamente.

    A canção de exílio dos anos de chum­bo é Sabiá, de Chico Buar­que e Tom Jobim, com­pos­ta em 1968 para um fes­ti­val. A canção traz refer­ên­cias claras ao “dia que virá”, dia em que os exi­la­dos retornar­i­am à pátria. Gullar ante­ci­pa a pátria destruí­da, memória dev­as­ta­da e ilu­mi­na­da ape­nas pelo facho das lem­branças da cidade de infân­cia. Os obje­tos da casa pri­mor­dial gas­taram-se no tem­po e por isso sua lem­brança é de sujeira, ou algo que foi sujo.

    https://www.youtube.com/watch?v=lhsXWXzh4ow

    O teste­munho do poeta é mais uma canção do exílio, que se desvia do nacional­is­mo insu­fla­do por Gonçalves Dias. A canção de Gullar é tan­to mais comovente quan­to bus­ca negar qual­quer resquí­cio român­ti­co ou pan­fletário. Em nem um momen­to rev­ela tex­tual­mente a dor pela per­da dos ami­gos, o esface­la­men­to famil­iar e a melan­co­l­ia da desterritorialização.

    Depois de con­cluir o poe­ma, Gullar o leu a Viní­cius de Morais, que lev­ou uma gravação da leitu­ra para o Brasil. Gru­pos se for­mavam para ouvir a voz do poeta exi­la­do. O edi­tor Ênio Sil­veira pediu cópia para pub­licá-lo. Com a pub­li­cação, ami­gos, jor­nal­is­tas e escritores cla­ma­ram ao gov­er­no mil­i­tar o fim do exílio de Gullar. O gov­er­no não aten­deu. O poeta, porém cansa­do, resolveu voltar por con­ta própria. Quan­do chegou, foi lev­a­do ao DOI-Codi e inter­ro­ga­do, acarea­do e ameaça­do. Mas graças ao poe­ma, pôde ficar no Brasil.

    A catarse do ago­ra con­tra o futuro marginal

    A repub­li­cação do Poe­ma sujo, em 2013, pela José Olym­pio, o cel­e­bra como mar­co na luta con­tra a repressão mil­i­tar. Mas antes de se tor­na per­sona non gra­ta no país, Gullar já guer­rea­va, e muito, mas por razões estéti­cas, con­tra out­ros adver­sários. Con­trapôs-se ao movi­men­to de van­guar­da da poe­sia conc­re­ta, com­pos­ta pelos irmãos Augus­to e Harol­do de Cam­pos e Décio Pig­natari, defend­en­do o nacional­is­mo da arte brasileira e crian­do a poe­sia neo­conc­re­ta. A prin­ci­pal críti­ca de Gullar aos con­cre­tos era de que com­par­a­vam a poe­sia à matemáti­ca e pre­tendi­am atu­ar em todos os cam­pos, jor­nais, pub­li­ci­dade, da músi­ca (canção pop­u­lar), tevê, rádio, cinema.

    Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos, a Tríade Concretista.
    Augus­to de Cam­pos, Décio Pig­natari e Harol­do de Cam­pos, a Tríade Concretista.

    Provo­cador, polêmi­co, jamais pací­fi­co, o poeta Paulo Lemins­ki é herdeiro de uma tradição poéti­ca de van­guar­da (ou tradição de rup­tura, como quer Octávio Paz) que no Brasil ren­deu movi­men­tos como o Mod­ernismo, a Poe­sia Conc­re­ta e o Trop­i­cal­is­mo. Por causa do tem­po históri­co de sua eclosão (anos 70 e 80), por vezes é erronea­mente situ­a­do den­tro da Poe­sia Mar­gin­al, movi­men­to ao qual nun­ca se fil­iou (não gos­to da poe­sia de Caca­so, um dos líderes da poe­sia mar­gin­al car­i­o­ca dos 70/80, afir­mou, em entre­vista ao jor­nal­ista Aramis Mil­larch, em 1986) e con­tra o qual escreveu uma série de ensaios no livro “Anseios Críp­ti­cos” (1986).

    Lemins­ki her­dou a briga com os neo­con­cre­tos. Ape­sar de propa­gar a teo­ria da arte como  inuten­sílio, nun­ca fez ape­nas arte pela arte. É o que se com­pro­va na canção Ver­du­ra, veta­da pela cen­sura em 1978.

    De repente
    me lem­bro do verde
    da cor verde
    a mais verde que existe
    a cor mais alegre
    a cor mais triste
    o verde que vestes
    o verde que vestiste
    o dia em que te vi
    o dia em que me viste
    De repente
    ven­di meus filhos
    a uma família americana
    eles têm carro
    eles têm grana
    eles têm casa
    a gra­ma é bacana
    só assim eles podem voltar
    e pegar um sol em Copacabana

    O poeta Fab­rí­cio Mar­ques asso­cia o ver­so de repente me lem­bro do verde ao Trop­i­cal­is­mo, conectan­do o verde cita­do com uma das cores-sím­bo­lo do Brasil:

    todas as suas nuances e con­tradições (a cor mais alegre/ a cor mais triste). Desse modo, o poe­ma atinge um tom quase lisér­gi­co, no qual ressaltam ecos do trop­i­cal­is­mo: super­ba­cana, de Cae­tano Veloso, e ai de ti, Copaca­bana, de Torqua­to. Ocorre então uma inver­são paródi­ca do nacional­is­mo, prin­ci­pal­mente na segun­da estrofe, que fun­ciona como uma espé­cie de críti­ca políti­ca avant la let­tre à emi­gração de brasileiros em bus­ca de mel­hores condições de vida, numa pro­gressão desen­f­rea­da, prin­ci­pal­mente para os Esta­dos Unidos, nos anos que se seguiram à primeira pub­li­cação do tex­to em livro (1981).

    A asso­ci­ação com o verde trop­i­cal­ista não é a úni­ca pos­sív­el. A cor verde e triste é a ”grana” que seduz a família a vender o fil­ho para os amer­i­canos. O verde triste trans­for­ma tudo em mer­cado­ria, até as relações afe­ti­vas. Triste ain­da o verde do uni­forme dos mil­itares, cujos cen­sores enten­der­am a iro­nia. A canção só pas­sou pelo cri­vo em 1981, quan­do foi grava­da por Cae­tano Veloso. Mas a refer­ên­cia aos poe­mas trop­i­cal­is­tas é inex­a­ta. Em vez de Super­ba­cana e Ai de mim, Copaca­bana, a asso­ci­ação mais ine­bri­ante pode­ria ser Quan­do o san­to guer­reiro entre­ga as pon­tas, de Torqua­to Neto:

    nada de mais:
    o muro pin­ta­do de verde
    e ninguém que pre­cise dizer-me
    que esse verde que não quero verde
    lírico
    mais planos e mais planos
    se desfaz:
    nada demais
    aqui de den­tro eu pego e furo a fogo
    e luz
    (é movimento)
    vos­so sis­tema pro­te­tor de incêndios
    e pin­to a tela o muro diferente
    porque uso como quero min­ha lentes
    e fil­mo o verde,
    que eu não temo o verde,
    de out­ra cor:
    diari­a­mente encaro bem de perto
    e escar­ro sobre o muro:
    nada demais

    Lemins­ki deg­lute antropofagi­ca­mente o Bis­po Sardinha, como que­ria Oswald, can­tan­do, com dó de peito o momen­to históri­co do iní­cio da diás­po­ra glob­al. O sen­ti­men­to de dor (por ver seu igual par­tir e se par­tir) não fratu­ra o poeta, que final­iza: só assim eles podem voltar e pegar um sol em Copaca­bana, com a con­sciên­cia de que a Ale­gria é a Pro­va dos Nove, como can­ta­va Oswald, ou seja, a úni­ca for­ma de resistên­cia a um regime desigual que estim­ula­va o despa­tri­a­men­to só pode­ria ser a iro­nia, trazen­do a capa de um fal­so con­formis­mo. Desse modo, mes­mo nun­ca ten­do se desli­ga­do de sua ter­ra natal, Lemisn­ki par­tic­i­pa dass ago­nias da vida nacional em seu insilio1.

    O críti­co Sil­viano San­ti­a­go esclarece que o bor­dão antropofági­co vin­cu­la-se com a catarse do ago­ra: “o ressurg­i­men­to de um cor­po que não estaria mais com­pro­meti­do com a éti­ca protes­tante do tra­bal­ho, um cor­po que recusa, inclu­sive, […] a col­o­niza­ção do futuro. Esse cor­po, então, estaria fin­can­do mais e mais o pé no ago­ra: nesse sen­ti­do, um cor­po que é fruição.” Esta ideia estaria lig­a­da à emergên­cia das mino­rias sex­u­ais nos anos 70: “De cer­ta for­ma, na nos­sa sociedade oci­den­tal, em par­tic­u­lar, o praz­er esteve muito vin­cu­la­do a uma cer­ta nor­mal­iza­ção de con­du­ta sex­u­al, e quan­do essa con­du­ta não era nor­mal­iza­da as pes­soas se sen­ti­am enorme­mente infelizes.”

    Paulo Leminski
    Paulo Lemins­ki

    O críti­co fala de um cor­po não reprim­i­do, de pura ale­gria, em con­trapon­to com a tradição críti­ca que colo­ca o pre­sente como esta­do de martírio. O sofri­men­to cul­tua­do pelos gru­pos políti­cos de esquer­da no Brasil tin­ha como pro­je­to de redenção a pos­si­bil­i­dade de uma utopia social. San­ti­a­go se posi­ciona con­tra este esta­do de pobreza: “Inver­tendo os ter­mos, dizen­do que o pre­sente pode ser vivi­do, pode ser vivi­do ale­gre­mente, sem as amar­ras da repressão, estaríamos descondi­cio­nan­do a pos­si­bil­i­dade de um pen­sa­men­to dito utópi­co.” Nos ver­sos de Leminski:

    praz­er
    da pura percepção
    os sentidos
    sejam a crítica
    da razão
    (Dis­traí­dos Vencer­e­mos, 1987)

    Esta ide­olo­gia está em coal­izão com a microp­olíti­ca do dese­jo de Felix Guat­tari e o com­por­ta­men­to aqui-ago­ra do movi­men­to hip­pie dos anos 70, que vul­gar­iza con­ceitos de filosofias ori­en­tais, como o hin­duís­mo e o zen-bud­is­mo. Os hip­pies trazem a ideia do praz­er na real­i­dade do pre­sente, em que a utopia não se adia, em que o esta­do par­adis­ía­co é vivi­do todos os dias. A poe­sia de Lemins­ki con­strói a catarse do ago­ra con­tra a repressão do pre­sente – no con­tex­to históri­co, a saí­da da ditadu­ra mil­i­tar para a ditadu­ra da econo­mia glob­al. Con­tra um sis­tema no qual a poe­sia é ape­nas o dese­jo, os artefatos de Lemins­ki tor­nam-se instru­men­to críti­co que cor­roem con­ceitos e faz­eres mumi­fi­ca­dos, como na genial inver­são dis­traí­dos vencer­e­mos do títu­lo de livro pub­li­ca­do em 1987, que car­naval­iza o bor­dão Unidos, vencer­e­mos.

    Um dos recur­sos usa­dos pelos poet­as para com­bat­er o regime repres­sor foi o humor. San­ti­a­go difer­en­cia dois proces­sos usa­dos nos movi­men­tos de poe­sia de protesto. O primeiro, a paró­dia, é um recur­so val­oriza­do como instru­men­to poten­cial de irrisão con­tra o poder insti­tuí­do, uma rup­tura. O segun­do, o pas­tiche, é uma der­risão que enfraque­ce o poder da críti­ca: A paró­dia sig­nifi­ca uma rup­tura, um escárnio com relação àquela estéti­ca que é dada como neg­a­ti­va. O pas­tiche não rechaça o pas­sa­do, num gesto de escárnio, de despre­zo, de iro­nia, escreve Santiago.

    A paró­dia tem o mes­mo grau de irrisão do insti­tuí­do pelo mote Tupy or Not Tupy, inscrito no Man­i­festo Antropofági­co de Oswald, em 1922. A lição mod­ernista foi incor­po­ra­da por Lemins­ki, que des­de sua aparição públi­ca nos jor­nais em Curiti­ba, achin­cal­ha o cul­to ao con­to e a figu­ra mon­u­men­tal­iza­da de Dal­ton Tre­visan, nos anos 70 e 80. Neste momen­to, seu embate não é con­tra as ino­vações de Dal­ton (a lin­guagem sin­téti­ca, a opção pela “cor local”, ado­tadas por Lemins­ki) e sim con­tra a insti­tu­cional­iza­ção de Dalton.

    Ferreira Gullar.
    Fer­reira Gullar

    A dor tão ele­va­da que é capaz de faz­er rir, evo­ca­da por Alice Ruiz no pre­fá­cio do livro La Vie en Close foi a táti­ca de uma guer­ril­ha que tem no riso, no chiste, no witz, na descon­strução de clichês e no aproveita­men­to de palavras de ordem seu núcleo. Este tipo de guer­ril­ha cul­tur­al seria her­ança do Trop­i­cal­is­mo. Para Ana Cristi­na César, a Trop­icália é a expressão de uma crise, uma opção estéti­ca que inclui um pro­je­to de vida, em que o com­por­ta­men­to pas­sa a ser ele­men­to críti­co, sub­ver­tendo a ordem mes­ma do cotid­i­ano. A ideia de enfrentar o sufo­co políti­co com as armas do cotid­i­ano foi legit­i­ma­da em Leminski.

    Dois adver­sários no cam­po da estéti­ca da poe­sia lutam con­tra um inimi­go comum. E fil­iam-se à tradição literária brasileira inserindo mais uma paró­dia da Canção do Exílio, descon­stru­in­do o nacional­is­mo orig­i­nal. Enquan­to a nação desa­parece, a infân­cia tor­na-se ter­ritório míti­co e o cor­po, o úni­co sacra­men­to, para Gullar. Já Lemins­ki percebe que até a infân­cia será ven­di­da, restando, para a poe­sia, sua úni­ca arma de luta: o praz­er de provo­car sentidos.

    Insílio: De acor­do com Paul Ilie, inner exilie são os que vivem o exílio em seu próprio país. O con­ceito nasce basea­do em sociedades autoritárias. Os insi­la­dos ficam pre­sos no país sofren­do os des­man­dos do regime. Ilie dis­cute o inner exilie da sociedade espan­ho­la sob o regime fran­quista, não exi­ladas de acor­do com o mod­e­lo clás­si­co, mas tiver­am a liber­dade restri­ta, sofren­do com a negação, dom­i­nação, anu­lação, intolerância.

    BIBLIOGRAFIA

    Livros

    • GULLAR, Fer­reira
      • Inda­gações de hoje. Rio de Janeiro: José Olym­pio Edi­to­ra, 1989.
      • Poe­ma sujo. Rio de Janeiro: José Olym­pio Edi­to­ra, 2013.
    • LEMINSKI, Paulo
      •  Capri­chos e Relax­os. São Paulo: Brasiliense, 1983.
      • Dis­traí­dos Vencer­e­mos. São Paulo: Brasiliense, 1987. (5ª edição 1995).
      • Anseios Críp­ti­cos, Curiti­ba: Cri­ar Edições, 1985.
      • Um Escritor na Bib­liote­ca, Curiti­ba: Bib­liote­ca Públi­ca do Paraná, 1985.
      • La vie en close. São Paulo: Brasiliense, 1991.
      • Poe­sia, paixão da lin­guagem. In: Novaes, Adau­to (Org.) Os sen­ti­dos da paixão. São Paulo: Cia das Letras, 1986.
      • Uma car­ta uma brasa através – car­tas a Régis Bon­vi­ci­no. 1976–1981 São Paulo: Ilu­min­uras, 1992.
    • SANTIAGO, Sil­viano
      • Nas Mal­has da Letra. São Paulo: Com­pan­hia das Letras, 1989.

    Doc­u­men­tos eletrônicos

  • O valor da humanidade em Antonio Skármeta

    O valor da humanidade em Antonio Skármeta

    Cena do filme 'O Carteiro e o poeta'
    Cena do filme ‘O Carteiro e o poeta’

    Em relação aos que viram o filme ‘O carteiro e o poeta’, poucos terão lido ‘Ardi­ente pacien­cia’ escrito pelo chileno Anto­nio Skármeta em 1985, e adap­ta­do para o cin­e­ma em 1994. Mas muitos lem­brarão o per­son­agem Mario Rup­po­lo, o carteiro que que­ria apren­der a escr­ev­er poe­mas com Pablo Neru­da, a quem entre­ga­va car­tas em Isla Negra, onde o poeta se exilou por razões políti­cas. Quan­do Neru­da vai emb­o­ra, Mario se casa e pas­sa a ter uma pro­fun­da con­sciên­cia social. Com saudades do poeta, gra­va os sons do mar e a bati­da do coração do fil­ho no ven­tre da esposa grávi­da e os envia ao céle­bre interlocutor.

    Em várias entre­vis­tas, Skármeta con­ta um episó­dio saboroso sobre o per­son­agem. Logo depois de rece­ber indi­cações ao Oscar, frus­trou uma jor­nal­ista de uma grande rede de tevê amer­i­cana, que o procurou para que a lev­asse até o ami­go de Neru­da. O escritor rev­el­ou que o carteiro era fru­to de sua imaginação.

    Pablo Neruda, Antonio Skármeta e Juan Rulfo (Foto: Sara Facio)
    Pablo Neru­da, Anto­nio Skármeta e Juan Rul­fo (Foto: Sara Facio)

    O chileno foi grande ami­go de Pablo Neru­da. Mas a faís­ca para a cri­ação de Mario pode ter sido dis­para­da num encon­tro com o escritor argenti­no Julio Cortázar, em Manágua. Ambos estavam lá para cel­e­brar a vitória dos san­din­istas, con­vo­ca­dos por Ernesto Car­de­nal. Apare­ceu  um carteiro, com um telegra­ma para Cortázar. Skármeta indi­cou o escritor, ao lado de um poste. O escritor mex­i­cano Augus­to Mon­ter­roso per­gun­tou: “Quem é o poste e quem é Julio?

    A poe­sia tem sido a peça de resistên­cia, ao lon­go da obra de Skármeta. O liris­mo é um recur­so literário estratégi­co, usa­do para tratar questões espin­hosas, como a repressão políti­ca e o exílio. Assim é de ‘Ardente Paciên­cia’, ‘Não foi nada’ (No pasó nada, 1980) e ‘A insur­reição’ (La insur­ren­ción, 1985), os três pub­li­ca­dos no Brasil, a ‘Los dias de arco Iris’, (2011). As nov­e­las relatam parte da história recente do Chile, des­de o golpe de Augus­to Pinochet, que der­rubou o social­ista Sal­vador Allende, em 1973, ao proces­so de rede­moc­ra­ti­za­ção, em 1990. O escritor se vale de per­son­agens secundários, em ger­al jovens ou nasci­dos nas camadas pop­u­lares, para relatar dra­mas vivi­dos por pro­tag­o­nistas em protestos con­tra regimes de exceção.

    A obra de Skármeta cruza-se com a sua biografia. O escritor estu­dou Filosofia na Uni­ver­si­dade do Chile, ori­en­ta­do pelo filó­so­fo alemão Fran­cis­co Sol­er Gri­ma, dis­cípu­lo de Julián Marías e José Orte­ga y Gas­set. Ain­da na uni­ver­si­dade, atu­ou como dire­tor de teatro e mon­tou obras de Calderón de la Bar­ca, Gar­cía Lor­ca, William Saroy­an e Edward Albee. Gan­hou con­cur­sos literários nos jor­nais La Nación e El Sur. Traduz­iu Her­mann Melville, Jack Ker­ouac, Scott Fitzger­ald e Nor­man Mail­er.

    Antonio Skármeta
    Anto­nio Skármeta

    Em 1969, rece­beu o Prêmio ‘Casa de las Améri­c­as’ por ‘Desnudo en el teja­do’. Já havia pro­duzi­do um filme sobre o Movi­men­to de ação pop­u­lar e Unitária (MAPU), do qual era mem­bro. Incor­porou, mais tarde, a história à nov­ela ‘La insur­rec­ción’. Com o golpe mil­i­tar no Chile, exilou-se em Berlim, onde se dedi­cou ao cin­e­ma. Aí escreveu ‘O carteiro e o poeta’, primeiro para a rádio alemã e depois para o mun­do. Em 1989, voltou ao Chile, depois de 16 anos. Criou um pro­gra­ma de tele­visão chama­do ‘O show dos livros’.

    valor-humanidade-antonio-skarmeta-5Em 1994, estre­ou no cin­e­ma a segun­da ver­são de ‘O Carteiro e O Poeta’, com o títu­lo ‘El cartero de Neru­da’. O filme, dirigi­do por Michael Rad­ford e estre­la­do por Mas­si­mo Troisi, teve cin­co indi­cações ao Oscar. A par­tir daí, Skármeta pas­sou a ser recon­heci­do mundial­mente e rece­beu vários prêmios literários por suas obras: ‘Prêmio Inter­na­cional de Lit­er­atu­ra Bocac­cio’ (1996), por ‘No pasó nada’, ‘Pre­mio Alta­zor’ (1999), por ‘La boda del poeta’, e o ‘Grin­zane Cavour’, em 2003. Em 2006, rece­beu o ‘Pre­mio Inter­nazionale Ennio Fla­iano’ pelo “val­or cul­tur­al e artís­ti­co de sua obra”, em par­tic­u­lar pelo romance ‘El baile de la Vic­to­ria’.

    Se a maior parte dos escritores con­tem­porâ­neos se ren­dem à sedução neolib­er­al, pul­ver­izan­do sua obra no entreten­i­men­to para camadas médias, Skármeta resiste, fundin­do ficção e memória históri­ca. Utópi­co, o escritor crê na função social da arte: ’em momen­tos árdu­os da vida de um país, cel­e­brar a imag­i­nação do artista, que com­bi­na­da com a força da gente ati­va, pode pro­duzir mudanças lib­ertárias na sociedade’, afir­ma em entre­vista em 2011, pub­li­ca­da em seu site oficial.

    Além de ‘O carteiro e o poeta’, muitas nov­e­las suas foram adap­tadas para out­ras lin­gua­gens artís­ti­cas. ‘Ardi­ente Pacien­cia’ virou filme e ópera, can­ta­da por Plá­ci­do Domin­go, em Los Ange­les e um musi­cal inter­pre­ta­do pela Orques­tra Sin­fôni­ca de Lon­dres. ‘El plebisc­i­to’, orig­i­nal­mente tex­to para o teatro, com mon­tagem frustra­da em 2008, foi remon­ta­do na nov­ela ‘Los dias del arco iris’. A nar­ra­ti­va ‘Un padre de pelic­u­la’, que tem à frente um jovem que sente a fal­ta de seu pai, um francês que voltou a seu país, começa a ser fil­ma­do em 2015, pelo dire­tor e ator brasileiro Sel­ton Mel­lo.

    Sipho Sepamla e Antonio Skarmeta (1981)
    Sipho Sep­am­la e Anto­nio Skarmeta (1981)

    Uma car­ac­terís­ti­ca de suas obras são os per­son­agens de ape­lo pop­u­lar: pes­soas humildes, jovens tími­dos e tristes, pros­ti­tu­tas. Ess­es per­son­agens sofrem uma bru­tal trans­for­mação em suas vidas ao entrar em con­ta­to com o mun­do da alta cul­tura. A fricção entre a espon­tanei­dade da cul­tura pop­u­lar e as pro­fun­di­dade do con­hec­i­men­to eru­di­to aca­ba crian­do fig­uras trans­bor­dantes de humanidade, palpáveis como as que encon­tramos no cotidiano.

    Cri­ar ess­es tipos parece ter sido uma lição que Skármeta apren­deu do teatro e do cin­e­ma, para atrair o leitor médio. Graças à for­mação int­elec­tu­al e políti­ca, o escritor agra­da tam­bém o leitor exi­gente, ambi­en­tan­do sua ficção em con­tex­to históri­co. O encon­tro entre per­son­agens da baixa e da alta cul­tura põe em movi­men­to a ideia de que a lit­er­atu­ra pode trans­for­mar a real­i­dade através da edu­cação. Edu­car, nesse caso, é levar o leitor à con­sciên­cia social e à descober­ta da poe­sia, através da iden­ti­fi­cação com os per­son­agens mais ingênuos.

  • Eu confesso, sou poeta | Crônica

    Eu confesso, sou poeta | Crônica

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    Cerâmi­ca de Marce­lo Tokai

    Chegar em qual­quer lugar, mes­mo um ambi­ente prepara­do para rece­ber poe­sia é um desafio. Ten­ho que des­faz­er expec­ta­ti­vas. A primeira, em relação à etnia japone­sa. Vou logo dizen­do: não escre­vo haicai. Depois, explicar que sou poeta, não poet­i­sa. “Poeta, porque em poet­i­sa todo mun­do pisa”, como diz Leila Mic­co­l­is.

    Óbvio: “japone­sa” escreve haicai. Aí é que está: não sou japone­sa. Nasci no Brasil, nun­ca fui ao Japão. Meus qua­tro avós nasce­r­am no Japão. Por isso, sou san­sei: a ter­ceira ger­ação de imi­grantes japone­ses no Brasil. Até há um tem­po atrás teria paciên­cia para explicar o que é um nikkei. Palavra japone­sa que des­igna o descen­dente de japone­ses nasci­do fora do Japão. No Brasil, nipo-brasileiros. Nos EUA, nipo-amer­i­canos. No Peru, nipo-peru­anos. Netos de imi­grantes japone­ses são nativos do país que rece­beu seus avós.

    Mas ascendên­cia japone­sa “forçou a bar­ra” para que eu ori­en­tasse ofic­i­nas sobre haicai. Aí, pas­sei a estu­dar o tema e a escr­ev­er mais haicai. Não sou hai­jin — haicaís­ta prat­i­cante. Meus poe­mas ain­da não tem hai­mi — o sabor, aqui­lo que os mestres — Mat­suo Bashô, Kobayashi Issa, Yosa Buson e out­ros — diziam ser a essên­cia do poema.

    Teruko Oda, Masuda Goga e Nempuku Sato
    Teruko Oda, Masu­da Goga e Nem­puku Sato

    Nun­ca fiz parte de grêmios literários que prati­cam haicai. Con­heço Teruko Oda, sobrin­ha de Masu­da Goga, fun­dador do primeiro grêmio de haicai do Brasil, o Ipê. Goga apren­deu com Nem­puku Sato, o maior propa­gador do haiku o haicai tradi­cional japonês. Em 2008, para divul­gar o haiku no Brasil, pro­movi, pelo Nikkei Curiti­ba, o Con­cur­so Nacional de Haicai Nem­puku Sato, em parce­ria com a Sec­re­taria da Cul­tura do Paraná.

    Admiro poet­as que, com liber­dade de espíri­to trans­puser­am o haicai para o Brasil: Hele­na Kolody, Mil­lôr Fer­nan­des, Paulo Lemins­ki e Alice Ruiz. Admiro menos Guil­herme de Almei­da e descon­heço Afrânio Peixo­to e Fan­ny Dupré, cita­dos em estu­dos sobre a história do haicai no Brasil.

    A jor­nal­ista e poeta Karen Debertólis, em entre­vista para o pro­gra­ma de rádio “Con­tra­ca­pa”, disse que meus poe­mas pare­cem encadea­men­tos de haicais. Espé­cie de ren­ga, que é mes­mo um encadea­men­to de poe­mas. Mes­mo com essa pista, me sen­tia aliení­ge­na na poe­sia japonesa.

    eu-confesso-sou-poeta-cronica-livro-bichoNos anos 90, fiz cur­so de vídeo e a pro­fes­so­ra, doc­u­men­tarista de São Paulo, disse algo curioso: que eu, ten­do raízes japone­sas não pre­cisa­va escr­ev­er haicai ou can­tar em karaokê. Podia escr­ev­er letras de bal­adas e ser fã de jazz. Gostei do que ela disse. Me enco­ra­jou a escr­ev­er poe­sia em com­posições ready-made, como diz o críti­co Mar­tin Palá­cio Gam­boa, na antolo­gia argenti­na “Bicho de Siete Cabezas”, para a qual tive a hon­ra de ser sele­ciona­da e foi lança­da no começo desse ano, em Buenos Aires.

    O que não sabia e fui apren­der estu­dan­do, é que na poe­sia japone­sa é comum a com­posição de tex­tos em frag­men­tos, seja em diários (nik­ki), “ensaios” (zui­hit­su) ou poe­sia (haiku, tan­ka e out­ras for­mas). Um ami­go, de tan­to de ler meus poe­mas no Face­book, pôs na cabeça que ia pesquis­ar poe­sia con­tem­porânea de Curiti­ba. E disse que encon­trou a palavra sol em muitos de meus poemas.

    Perce­bi que, de modo trôpego e sem forçar a bar­ra do enraiza­men­to, estou voltan­do para um lugar que nun­ca pareço ter saí­do. E assim retorno, caiçara japone­sa, a uma onda fei­ta de lágri­mas. No Brasil a expressão é pie­gas, mas em japonês já foi usa­da em poe­ma, só por causa do tro­cadil­ho: onda é nami, e lágri­mas, nami­da. Não existe nada mais con­fortáv­el do que voltar pra casa, mes­mo que a casa seja a toda hora sacu­d­i­da por tsunamis e ressacas.

  • Um homem que escreve jamais está só

    Um homem que escreve jamais está só

    Valêncio Xavier, Manoel Carlos Karam e Jamil Snege
    Valên­cio Xavier, Manoel Car­los Karam e Jamil Snege

    Quem escreve con­to ou poe­sia pre­de­ter­mi­na que não terá públi­co em mas­sa. Con­to e poe­sia são gêneros des­ti­na­dos a um públi­co fora do alvo do mer­ca­do edi­to­r­i­al. Uma ex-jor­nal­ista que tra­bal­ha no mer­ca­do adverte: se quis­er entrar, o can­dida­to a escritor tem que escr­ev­er romance. Autores pub­li­ca­dos por grandes edi­toras são romancis­tas. Exceção, os con­sagra­dos ao lon­go do tem­po. E aí se tem uma vida inteira — e uma morte — de trabalho.

    Valên­cio Xavier, Jamil Snege, Manoel Car­los Karam, Wil­son Bueno talvez sejam daque­le tipo de autores que jamais atin­jam o grande públi­co. O “grande públi­co”, essa enti­dade fan­tás­ti­ca que lê “50 tons de cin­za”, “O diário de um mago”, “Har­ry Pot­ter” e é visa­do pelo mer­ca­do, nem sem­pre se inter­es­sa por boa lit­er­atu­ra. Assim, se pri­va de ler, além dos já cita­dos, Nel­son de Oliveira, Luiz Ruffa­to, Ricar­do Lísias e J.M. Coet­zee. E, claro, nem quer saber de poe­sia. A não ser que o poeta se torne um fenô­meno com­er­cial, como Paulo Lemins­ki. O grande públi­co seguirá igno­ran­do as obras de Alice Ruiz, Paulo Hen­riques Brit­to, Adília Lopes, Miche­liny Verun­schk. Lerá, quan­do muito, Manoel de Bar­ros.

    Wilson Bueno, Nelson de Oliveira e Luiz Ruffato
    Wil­son Bueno, Nel­son de Oliveira e Luiz Ruffato

    Recon­heci­do pela críti­ca, Valên­cio mor­reu “esque­ci­do” . Tão esque­ci­do que nem sabia mais diz­er seu nome. Em vida, Valên­cio era esque­ci­do. Pela man­hã tele­fon­a­va aos ami­gos para con­tar casos que repe­tiria à noite, quan­do os encon­trasse. Era o iní­cio do “Alemão”. A doença não cor­tou a verve cria­ti­va e per­maneceu lúci­do. A frase der­radeira do últi­mo livro, “Rre­men­branças da meni­na de rua mor­ta nua e out­ros livros”, pub­li­ca­do em 2006 é: “Estou mor­to.” Valên­cio, ele mes­mo, era seu per­son­agem. Seguiu estri­ta­mente o con­sel­ho de Roland Barthes que dizia: “tra­bal­he enquan­to hou­ver sol.” A luz da razão per­maneceu até o lim­ite da lucidez.

    Há alguns anos, Daniel Fil­ho lançou uma biografia inti­t­u­la­da “Antes que me esqueçam”. Atores globais e out­ras cele­bri­dades lançam biografias e livros para não serem esque­ci­dos. O livro, obje­to mis­te­rioso numa cul­tura midiáti­ca audio­vi­su­al, é um amule­to que asse­gu­rará a imor­tal­i­dade dos tementes do Juí­zo da Eternidade. É fácil pre­v­er que, à parte sua neces­si­dade de ser irra­di­a­da pelo públi­co, em pouco tem­po essas cele­bri­dades serão esquecidas.

    Ricardo Lísias, Alice Ruiz e J.M. Coetzee
    Ricar­do Lísias, Alice Ruiz e J.M. Coetzee

    Na Antigu­idade, os reis não podi­am ser vis­tos pelo povo, nas tri­bos prim­i­ti­vas. Como eram con­sid­er­a­dos deuses, não podi­am tocar o solo impuro, toca­do por todos. Eram lhes atribuí­dos poderes de con­tro­lar as forças da natureza e pro­por­cionar boas col­heitas na agri­cul­tura. Mas seus poderes só se man­tinham intac­tos longe do povo. Assim, criou-se o vín­cu­lo entre objetos/entidades sagra­dos e sua ocul­tação ou vela­men­to públi­co. Aparente­mente, a era da repro­dução instan­tânea inver­teu o par­a­dig­ma. Ago­ra, o que deve ser cul­tua­do têm que ser superexposto.

    Michelliny Verunschk, Paulo Henriques Brito e Adília Lopes
    Michelliny Verun­schk, Paulo Hen­riques Brito e Adília Lopes

    Um pas­so para além da neces­si­dade de pub­li­ci­dade, o val­or do obje­to artís­ti­co per­manece igual ao de ger­ações pas­sadas. A memória humana não é preser­va­da nos obje­tos que seduzem instan­ta­nea­mente. Mas naque­les em que se percebe o val­or do tra­bal­ho e da luta pela preser­vação da humanidade. No caso da lit­er­atu­ra, o tra­bal­ho com a lin­guagem e a lín­gua: novas per­cepções, conexões, saltos cria­tivos. Por isso, escritores como Valên­cio Xavier não são esque­ci­dos. O sol bril­hou em seu sig­no astral, até sua luz sumir no hor­i­zonte. Esse tími­do raio de sol será vis­to por anos.

  • Livro: Poesia é Não — Estrela Leminski

    Livro: Poesia é Não — Estrela Leminski

    Ler poe­sia é como ler prosa? Ler poe­sia como se lê prosa é desler? Para ler poe­sia ler e rel­er ao relen­to, desli­gan­do o relé do pen­sa­men­to. Desli­gar a face, reli­gar o ver­so. No epi­cen­tro da poe­sia a palavra, a músi­ca, a imagem movem ter­re­mo­tos de imag­i­nação. Para uma sociedade cen­tra­da na fun­cional­i­dade da palavra, que não admite ambigu­idade sub­je­ti­va, ou a comu­ni­cação por exces­so, poe­sia é um desvio que excede a palavra em rit­mo e imagem.

    Fiquei pen­san­do isto quan­do li o Poe­sia é Não (Ilu­min­uras, 2011), de Estrela Lemins­ki. Primeiro li os poe­mas. Depois, a auto­bi­ografia da poeta, nas orel­has do livro. E fol­he­an­do, vi aqui e ali pági­nas com­postas em nuances de cores e tipos difer­entes. Depois li a resen­ha de Mar­cos Pasche no Jor­nal Ras­cun­ho. “Fal­tou Poe­sia”, avi­sou o críti­co, logo no títu­lo. E escreveu um arti­go ante­ci­pan­do sua defe­sa por não criticar a poe­sia e sim a per­son­al­i­dade de Estrela, fil­ha de um casal de poet­as céle­bres. O modo que o críti­co escol­heu é um modo de desler poe­sia, con­cen­tran­do-se na per­son­al­i­dade do poeta e não em sua poe­sia, nem sem­pre con­ti­da ape­nas nos versos.

    Estrela joga com o títu­lo Poe­sia é Não, indi­can­do o que a poe­sia não é. Catarse, obje­to útil, notí­cia, mer­cado­ria, ras­cun­ho de gave­ta, protesto, influên­cia. A neg­a­tivi­dade se lê nos escritos, nas pági­nas grá­fi­cas. Ao deixar de lado o que está escrito e pas­sar a ler o códi­go visu­al, a leitu­ra é outra.Papel de embrul­ho, doc­u­men­to ofi­cial, jor­nal, livro, operária, con­ta e pagado­ra de con­ta, gave­ta, pan­fle­to, ver­bete de dicionário, lit­er­atu­ra, sig­no, as pági­nas grá­fi­cas apon­tam para o que a poe­sia não é. O que ela é , então ?

    Poe­sia é ver o ver­so, o aves­so do que a diz palavra. Se a palavra diz “blogue ado­les­cente”, pode ser que a poe­sia diga, como Estrela, a ale­gria pelo Não, ale­gria de quem cresce e con­hece os praz­eres de viv­er, praz­er da comunhão pela palavra. Ser poeta é não parar de ado­lescer, é amadure­cer ado­lescen­do, envel­he­cer ado­lescen­do, mor­rer ado­lescen­do. Ser poeta é não desi­s­tir da infân­cia para se pre­ocu­par em como escr­ev­er, escr­ev­er bem, escr­ev­er para um públi­co, escr­ev­er sagran­do o já sagra­do. Escr­ev­er poe­sia é desescr­ev­er, é não saber, não acer­tar o rit­mo, ler livros de poe­sia e esque­cer, saber lín­guas e con­fun­di-las com a lín­gua da boca. Sem esquec­i­men­to, ignorân­cia, erro, a poe­sia é pobre, por que uma vida per­fei­ta é pobre, ou impos­sív­el. Quer­er que uma poeta jovem não cresça é ideia de quem acha que todo mun­do deve nascer velho.

    Juven­tude nem sem­pre é vital­i­dade. Vel­hice não é sinôn­i­mo de decrepi­tude. O domínio sobre a lin­guagem, que os críti­cos esper­am dos bons (?) escritores não é sinal de maturi­dade. É sinal de quem tem medo de cri­ar, de quem se pro­tege por trás da ter­mi­nolo­gia letra­da. O jargão int­elec­tu­al não inter­es­sa para a maio­r­ia dos mor­tais. A maio­r­ia silen­ciosa, ao con­trário do que pen­sam os críti­cos, ama a poe­sia — ama ouvir canções pop­u­lares, por exem­p­lo. A maio­r­ia silen­ciosa ama escr­ev­er ver­sos, na ado­lescên­cia cronológ­i­ca ou tar­dia. E a maio­r­ia silen­ciosa se enver­gonha de amar a poe­sia, quan­do o críti­co se lev­an­ta em nome do cânone literário e pre­ga que é pre­ciso ter ver­gonha por amar poe­sia e escr­ev­er bobagens que qual­quer um escreve quan­do o coração dispara.

    Atirem o poeta ao mar”, diz um dos ver­sos de Estrela, evo­can­do o pai, que escreveu um livro juve­nil (Guer­ra den­tro da gente, Sci­p­i­one) no qual um poeta, con­sid­er­a­do o pal­haço da trip­u­lação de uma embar­cação é ati­ra­do ao mar. A úni­ca solução para o poeta é atirá-lo ao mar, já que o poeta é inútil em qual­quer sociedade. Que faz­er com os que amam seus encan­ta­men­tos? Não se pode ati­rar os amadores de poe­sia ao mar, não sobraria mar para todos. Prefer­ív­el diz­er ao críti­co não leia seus poe­mas e con­dene a per­son­al­i­dade do poeta. Assim ape­nas um será afo­ga­do por suas más palavras.

    Mas o poeta é trezen­tos ou trezen­tos mil, e seus ver­sos se des­do­bram entre as palavras de ordem. Ape­sar das advertên­cias do críti­co, os leitores atrav­es­sam o tex­to e seus pre­tex­tos e saem atrás de mira­gens. Para os que amam se diver­tir, a poe­sia de Estrela é, sim. 

    *Marília Kub­o­ta, além de colab­o­rado­ra do inter­ro­gAção, escreve no seu blog Micrópo­lis.

  • Entrevista Lau Siqueira: Poesia a vida inteira

    Entrevista Lau Siqueira: Poesia a vida inteira

    O poeta Lau Siqueira nasceu em Jaguarão (RS), em 21 de março de 1957. Começou a pub­licar poe­mas no Jor­nal Cor­reio do Povo, de Por­to Ale­gre, nos anos 70. Seu primeiro livro foi O Comí­cio das Veias, pub­li­ca­do em 1993. Seguem O Guardador de Sor­risos (1998), Sem Meias Palavras (2000). Par­ticipou das antolo­gias Mário Quin­tana – 1985, Na Vira­da do Sécu­lo — Poe­sia de Invenção no Brasil (Landy, 2002) e Agen­das da Tri­bo. Há 20 anos mora em João Pes­soa (PB), e há out­ro par de anos man­tém o blogue Poe­sia Sim

    Lau Siqueira tam­bém esteve em Curiti­ba lançan­do o livro Poe­sia Sem Pele.

    Teu nome é Lau­re­ci Siqueira . De onde vem o “ Lau”?

    O que é o nos­so nome? É o que está na cédu­la de iden­ti­dade ou é o nome no qual as pes­soas nos recon­hecem? Nem sem­pre essas coisas coin­ci­dem. Acho que este é o meu caso. Na min­ha iden­ti­dade está escrito Lau­recí Siqueira dos San­tos. Foi assim que meu pai me bati­zou. No entan­to, nem ele me chama­va pelo nome de batismo. Meu apeli­do de infân­cia era Dido. Até hoje alguns ami­gos de infân­cia lá de Jaguarão, me chamam assim. O “codi­nome” Lau foi se empoderan­do nat­u­ral­mente da min­ha existên­cia e da min­ha inex­istên­cia. Tudo porque quan­do apre­sen­ta­do às pes­soas a con­fusão apare­cia logo: Laude­cir, Lau­re­mi, Laude­ci?… As pes­soas sim­pli­fi­cavam nat­u­ral­mente, rap­i­da­mente, reduzin­do para Lau. Isso acon­te­ceu muito com cole­gas de tra­bal­ho e na esco­la, prin­ci­pal­mente, mas em out­ros espaços tam­bém . Depois veio o primeiro livro e eu pen­sei que era mais coer­ente assi­nar o nome pelo qual eu já esta­va con­heci­do entre os ami­gos. Enfim, se tudo tem uma história, esta min­ha história é assim. O nome tam­bém expli­ca uma poe­sia que bus­ca se despir das sonori­dades desnecessárias. Assim, o meu nome literário é tam­bém mín­i­mo e ao mes­mo tem­po de den­sa sonoridade.

    Você nasceu em Jaguarão , pas­sou a infân­cia, lá, depois morou em Por­to Ale­gre ? Con­ta um pouco sobre a tua juventude.

    É ver­dade, nasci em Jaguarão, cidade históri­ca e muito boni­ta, às mar­gens de um rio (Rio Jaguarão) que cor­ta a fron­teira com o Rio Uruguay. A cidade tem uma vida cul­tur­al inten­sa, pro­duzin­do uma Feira Bina­cional do Livro onde farei uma sessão de autó­grafos no mês de novem­bro. Mor­ei lá até os 15 anos e fui para Por­to Ale­gre, de onde voltei no final do serviço mil­i­tar para aju­dar a cuidar do meu pai que esta­va muito doente. Assim, fiquei nova­mente em Jaguarão no ano de 1977, até que meu pai mor­reu no dia 3 de dezem­bro e em janeiro de 78 voltei para Por­to Ale­gre onde mor­ei nova­mente até me mudar para a Paraí­ba, “de mala e cuia”, em 1985. Este é o resumo da ópera.

    Por que mudou do Rio Grande para a Paraíba?

    Por motivos muito par­tic­u­lares. Eu casei na Paraí­ba, vivi casa­do 13 anos e depois divor­ciei. Mas aí já tin­ha duas fil­has para dar con­ta dos meus afe­tos e das min­has respon­s­abil­i­dades de pai apaixon­a­do e fui fican­do. Hoje ten­ho uma neta, tam­bém por aqui. Além dis­so, o povo paraibano é muito espe­cial, muito acol­he­dor e sem­pre me sen­ti queri­do por aqui. Hoje me sin­to um ser­tane­jo do pam­pa ou um pam­peano do sertão que mora num dos litorais mais belos do País. Não é difí­cil largar tudo e vir pra cá. Os encan­tos são muitos. A cap­i­tal da Paraí­ba é a ter­ceira mais anti­ga do país. É uma das cidades mais verdes do país e ain­da não está assim tão caóti­ca. Aqui se con­vive com pas­sa­do e futuro numa mes­ma avenida. 

    Em Por­to Ale­gre você con­heceu Mário Quin­tana ? Que lem­brança tem dele ? Que out­ros poet­as foram impor­tantes para sua for­mação e informação ?

    Mário era uma per­son­al­i­dade das ruas de Por­to Ale­gre. Quem andou pelo cen­tro da cap­i­tal gaúcha até os anos 80, pelo menos algu­ma deve ter vis­to o poeta cam­in­han­do pela Rua da Pra­ia, pelas ruas do cen­tro. Ele tin­ha hábitos reg­u­lares. Mora­va no Hotel Majes­tic, onde hoje é a Casa de Cul­tura Mário Quin­tana. Toma­va café sem­pre no anti­go Ryan, gosta­va de uma sal­a­da de fru­tas no Mer­ca­do Cen­tral. Eu vi Mário muitas vezes, na Feira do Livro, na anti­ga Livraria do Globo, na Bib­liote­ca Públi­ca onde até assisti um recital com ele, nos anos 80. Tam­bém tive o priv­ilé­gio de entre­vistá-lo, jun­ta­mente com a jor­nal­ista Joana Belarmi­no, em janeiro de 1987. Enfim, além dis­so, podia encon­trá-lo nos livros que escreveu e traduz­iu. A primeira tradução de Proust que li, foi sua. Ele tra­bal­ha­va no jor­nal Cor­reio do Povo e quan­do o jor­nal fechou, pude vê-lo em uma passea­ta de jor­nal­is­tas pelas ruas de Por­to Ale­gre. Acho que foi sim um poeta impor­tante para a min­ha for­mação, mas eu admiro muitos poet­as. Inclu­sive me sin­to a von­tade para diz­er que não gos­to de tudo que leio nos poet­as que admiro. Sin­to da mes­ma for­ma quan­to aos meus con­tem­porâ­neos. Sou um escritor abso­lu­ta­mente aber­to às influên­cias e não me pre­ocupo em ser engoli­do por algum esti­lo. Acho que quan­to maiores e mais diver­si­fi­cadas as leituras, mais pos­si­bil­i­dades temos de con­stru­ir uma lin­guagem sin­gu­lar, que não seja a mais pura e bela diluição, a imi­tação de algum poeta ama­do. Enfim, os poet­as que mais me fasci­nam são os que cam­in­ham no fio da naval­ha, os que bus­cam o extremo, a margem do erro… o risco permanente.

    E a poe­sia, quan­do se tornou impor­tante? Ao con­trário de tan­tos, você não começou escreven­do poesia…

    A poe­sia foi se tor­nan­do grada­ti­va­mente impor­tante pra mim. Na ado­lescên­cia eu detes­ta­va poe­sia. Apren­di a gostar com os român­ti­cos Cas­tro Alves e Fagun­des Varela por motivos abso­lu­ta­mente extra-literários. Um pelo dis­cur­so agu­do con­tra o sitema de escrav­is­mo da monar­quia brasileira, out­ro pela dor de ter per­di­do um fil­ho. Dig­amos que não come­cei a escr­ev­er poe­sia, mas tam­bém não come­cei escreven­do gênero algum. Escr­ev­er era ape­nas uma for­ma de res­pi­rar mel­hor num mun­do em que o silên­cio ger­a­va o medo e tudo era de uma vio­lên­cia assus­ta­do­ra. Cresci numa área de segu­rança nacional, em ple­na ditadu­ra. Acho que isso tudo me ensi­nou uma for­ma de ver as coisas. Escr­ev­er é um ato úni­co e con­tín­uo. Sin­to que des­de sem­pre estive escreven­do o mes­mo livro, mes­mo já ten­do pub­li­ca­do cin­co inédi­tos e um pela Coleção Dul­cinéia Cata­do­ra que con­sidero, talvez, o mais impor­tante de todos. Procuro sem­pre fugir dos rótu­los e, pra diz­er a ver­dade, algu­mas vezes ques­tiono até mes­mo o fato de ser chama­do de poeta. O que é ser poeta? Eu acho que ser poeta é exata­mente não ser.

    Par­ticipou do movi­men­to Arte Postal ? O que era este movimento ?

    Como se diz aqui no Nordeste, fui me metendo meio que de “enx­eri­do” e acabei tro­can­do toques com nomes impor­tantes do movi­men­to arte-postal e com artis­tas da van­guar­da visu­al, como Paulo Brusky, Sama­r­al, Hugo Pontes, Moa­cy Cirne e Con­stança Lucas. Pes­soas que depois acabei con­hecen­do pes­soal­mente (menos Sama­r­al que fale­ceu pre­mat­u­ra­mente) e hoje são meus ami­gos. Con­heci mui­ta gente bacana, mui­ta cri­ação na área da Poe­sia Visu­al que cir­cula­va como se estivesse ante­ci­pan­do o que hoje temos na inter­net. Eu envi­a­va fanzines que pro­duzia para divul­gar min­ha pro­dução poéti­ca, min­has exper­iên­cias, mes­mo antes de sequer pen­sar em pub­licar livros. Fazia um orig­i­nal numa fol­ha de ofí­cio e imprim­ia em aero­gra­mas, encam­in­han­do não ape­nas para out­ros mil­i­tantes da arte postal, mas sele­cio­nan­do aleato­ri­a­mente endereços nas vel­has lis­tas tele­fôni­cas e encam­in­han­do cor­re­spondên­cias poéti­cas, geral­mente anôn­i­mas. Enfim, no meu caso foi da for­ma como hoje se envia spam pela internet.

    Você tra­bal­hou na sec­re­taria de cul­tura de João Pes­soa ? Que car­go exerceu ? Quais os feitos mem­o­ráveis de sua pas­sagem por lá ?

    Na ver­dade, fui o dire­tor exec­u­ti­vo da Fun­dação Cul­tur­al de João Pes­soa – FUNJOPE, entre 2007 e 2008. É a Fun­dação que dirige as políti­cas de cul­tura na cidade. Não temos Sec­re­taria Munic­i­pal de Cul­tura aqui. De 2005 a 2006, eu era o dire­tor adjun­to na gestão do ator Luiz Car­los Vas­con­ce­los que fez o médi­co em Carandiru, Baile Per­fuma­do e out­ros filmes. Ele se afas­tou para fil­mar Pedra do Reino, na Rede Globo e eu assu­mi. Depois veio o Chico Cesar e ago­ra a Fun­dação é dirigi­da por Mil­ton Dor­nel­las, um ami­go músi­co dos bons que foi meu adjun­to. Por­tan­to, tive­mos teatro, lit­er­atu­ra e músi­ca na direção da Fun­dação nos últi­mos anos. Olha, para falar dos feitos mem­o­ráveis, não sei se ten­ho jeito. Até porque ess­es feitos não são meus. Vou falar de algu­mas coisas que con­sidero rel­e­vantes, como ter cri­a­do o depar­ta­men­to de Lit­er­atu­ra na Fun­dação, coisa que antes não exis­tia; tam­bém assinei jun­ta­mente com o secretário da Edu­cação da época, Wal­ter Galvão, a cri­ação da primeira bib­liote­ca públi­ca do municí­pio de João Pes­soa. Na ver­dade, lev­a­mos arte e cul­tura para prati­ca­mente todos os bair­ros da cidade e desta­co aí o pro­je­to Cir­cuito Cul­tur­al das Praças que até hoje visa aproveitar os anfiteatros que foram cri­a­dos pela Prefeitu­ra nas praças públi­cas para apre­sen­tação sem­anal de gru­pos da cidade, em todas as áreas, em todas as estéti­cas. Tra­bal­hamos muito pela preser­vação da diver­si­dade cul­tur­al, pela preser­vação das tradições da cul­tura pop­u­lar, dos bens ima­te­ri­ais, trazen­do para a cena expressões que se encon­travam mar­gin­al­izadas, como as Cam­bindas, o Cav­a­lo Mar­in­ho, o Boi de Reis, o Coco de Roda, o Babau, o Coco de Embo­la­da, o tradi­cional for­ró pé-de-ser­ra que hoje Chico Cesar bus­ca preser­var no Esta­do, enquan­to Secretário de Cul­tura da Paraí­ba. Até mes­mo o Cordel anda­va deix­a­do de lado porque a gestão ante­ri­or bus­ca­va preser­var as ações de pão e cir­co, deixan­do a cul­tura na mín­gua. Nós afir­mamos as políti­cas de cul­tura den­tro da gestão. Pau­ta­mos politi­ca­mente a cul­tura na cidade. Dialog­amos com a cena con­tem­porânea, apoian­do a cri­ação de even­tos under­grounds ou pop­u­lares, aju­damos a con­sol­i­dar aqui o Fes­ti­val de Cin­e­ma de Lín­gua Por­tugue­sa, o CINEPORT, imple­men­ta­mos ofic­i­nas de arte pela cidade inteira, bus­camos a qual­i­dade musi­cal para os nos­sos even­tos de verão que hoje ref­er­en­ci­am João Pes­soa nacional­mente. A cidade tem hoje um dos mais impor­tantes fes­ti­vais de verão do país, o Estação Nordeste. Na ver­dade tudo isso foi fru­to de um debate cole­ti­vo que vin­ha se for­man­do através dos anos, nos instru­men­tos da luta dos artis­tas, como o Musi­clube da Paraí­ba, nas idéias do gru­pos como Jaguaribe Carne, com Pedro Osmar, Chico Cesar e Paulo Ró, de pen­sadores e gestores da cul­tura paraibana como Car­los Aran­ha e Fer­nan­do Abath… Enfim, bus­camos preser­var a iden­ti­dade cul­tur­al nordes­ti­na e dialog­ar com a con­tem­po­ranei­dade. São essas as idéias que ain­da prevale­cem por lá. Não são coisas min­has, relevân­cias min­has, mas questões cole­ti­vas, debati­das e imple­men­tadas cole­ti­va­mente. Por­tan­to, estive den­tro de um proces­so e não fiz nada soz­in­ho. E esse é o que foi o difer­en­cial e que ain­da está sendo. Foi uma gestão de com­pan­heiros e con­tin­ua sendo uma gestão de com­pan­heiros e com­pan­heiras. Como diz Chico Cesar, no meu tem­po, eu fui “ape­nas o orde­nador de despe­sas”. (risos)

    Para que ou para quem serve a poesia ?

    A poe­sia não serve para abso­lu­ta­mente nada, ain­da bem. Não existe nada mais inútil que a dana­da da poe­sia. Para quem serve? Sei lá… acho que serve de pano de fun­do aos que curtem jog­ar amare­lin­ha com psiquia­tras que inves­tigam as pro­fun­dezas do espíri­to humano.

    Um poeta pre­cisa ter grupo, site, blogue, livro , ser dinâmi­co, ati­vo, empreende­dor ? Pre­cisa gan­har prêmios, rece­ber bol­sas de cri­ação literária e coisas tais ?

    Um poeta pre­cisa ter con­sciên­cia do seu ofí­cio que é: tra­bal­har, tra­bal­har, tra­bal­har… Tra­bal­har para sus­ten­tar o cadáver desajeita­do que é e tra­bal­har exaus­ti­va­mente a palavra, escreven­do ou não. Então ele pode ter grupo, pode ter blog, ser dinâmi­co, ati­vo, pas­si­vo, malu­co, empreende­dor, bundão… Ele só não pode achar que já está pron­to, que já é uma cele­bri­dade por ser razoavel­mente con­heci­do ou elo­gia­do pelos ami­gos. Um poeta nun­ca é uma cele­bri­dade. Pelo menos, não deve pen­sar que é. Porque aí ele terá mor­ri­do e será ape­nas uma camisa e uma calça flu­tuan­do pelas ruas em bus­ca de algum tipo de imor­tal­i­dade. O poeta não pode ter medo de arriscar-se. Ser poeta é não ter medo do abis­mo, ser poeta é cor­rer riscos per­ma­nen­te­mente. É não ter medo do ridícu­lo. Ele pode até rece­ber prêmios, bol­sas de cri­ação literária, mas acho com­pli­ca­do alguém achar que pode escr­ev­er um grande livro ape­nas porque rece­beu uma bol­sa de cri­ação literária. Poe­sia é como diz meu queri­do poeta Ronald Augus­to, “coisa nen­hu­ma” e por­tan­do o poeta tem que estar pre­ocu­pa­do é com coisa nen­hu­ma mes­mo. O poeta pre­cisa viv­er inten­sa­mente a vida (como qual­quer pes­soa), viv­er pro­fun­da­mente a palavra e bus­car exper­i­men­tar esse mis­tério que é a pul­sação dos seus movi­men­tos, dos seus sig­nifi­ca­dos den­tro da invenção poéti­ca, den­tro das pos­si­bil­i­dades de trans­gressão dos próprios processos.

    Você lançou teu livro Poe­sia sem Pele na Sem­ana Anti­man­i­co­mi­al, na Paraí­ba. Como a lou­cu­ra pode ser arte na cidade ?

    Sim, acho que a poe­sia não pode ser enga­ja­da — emb­o­ra pos­sa ser temáti­ca. No entan­to, o poeta pode escol­her entre ser um cidadão enga­ja­do ou não. Eu estou enga­ja­do na Luta Anti­man­i­co­mi­al, con­tra o anti­go e crim­i­noso mod­e­lo dos choques, das lobot­o­mias… ações que viti­maram pes­soas do meu mais pro­fun­do afe­to. Des­de muito novo estou enga­ja­do nas questões humanas. Na ver­dade eu sabia e sei que cuidar do out­ro é cuidar de si mes­mo. E acho que a arte é uma das curas da humanidade. Por isso, a lou­cu­ra pode ser arte na cidade.

    quar­ta capa

    o poeta

    é o que bus­ca na palavra

    a dimen­são do átomo

    o silên­cio extremo

    por detrás de cada fato

    o poeta é o etéreo e o ácido

    na pele dos val­ores estáticos

    estéti­cos são seus baralhos

    o poeta é o vapor bara­to e o

    lance de dados

    o aca­so e o atalho

    macalé e mallarmé

    no mes­mo saco

    o poeta é um guapo

    (de: POESIA SEM PELE , Casa Verde, 2011. Pedi­dos pelo email: poesiasempele@gmail.com)

  • Livro: 20 poemas para o seu Walkman

    Livro: 20 poemas para o seu Walkman

    20 poemas para seu walkman

    Você gos­ta de poe­sia? E de músi­ca? Já pen­sou em jun­tar os dois? Poe­mas para ouvir. Via­jar e poder levar poe­mas no seu iPod. Um poe­ma como tril­ha sono­ra de sua vida. Parece uma ideia um tan­to quan­to esquisi­ta. Não para Marília Gar­cia. Ela nasceu no Rio de Janeiro em 29 de novem­bro de 1979, é escrito­ra, tradu­to­ra e edi­to­ra brasileira. Já pub­li­cou os livros Encon­tro às cegas (Edi­to­ra Moby Dick, 2001) e 20 poe­mas para o seu walk­man (Cosac Naify & 7Letras, 2007).

    Em seu livro — 20 poe­mas para o seu walk­man- Marília Gar­cia apre­sen­ta uma poe­sia reple­ta de car­ac­terís­ti­cas mar­cantes, per­cep­tíveis através da leitu­ra dos poe­mas, sendo a prin­ci­pal o não uso das rimas, por se tratar de poe­sia do pre­sente. Essas car­ac­terís­ti­cas instigam a curiosi­dade no leitor e des­per­tam as mais vari­adas sen­sações e emoções, o que se tor­na pos­sív­el com a uti­liza­ção das fig­uras de lin­guagem, prin­ci­pal­mente a sinestesia. 

    Há tam­bém a forte pre­sença da relação entre tem­po e espaço; a pre­sença de per­son­agens, fic­tí­cios ou não; o pouco uso da pon­tu­ação, a pro­dução de ima­gens; uso de cores e tam­bém, o grande uso de estrangeiris­mos, pre­sentes na maio­r­ia dos poe­mas da escrito­ra. Então, surge a grande per­gun­ta: por que o títu­lo do livro é 20 poe­mas para o seu walk­man?

    O ter­mo Walk­man, do inglês, rep­re­sen­ta a ideia de “cam­in­har”. Seria essa a intenção dos cri­adores do apar­el­ho que foi uti­liza­do para se referir a apar­el­hos portáteis sim­i­lares de repro­dução de áudio. Com sua chega­da, cos­tu­ma-se diz­er que mudaram os hábitos musi­cais, uma vez que cada pes­soa podia car­regar e ouvir seus sons preferi­dos e, prin­ci­pal­mente, sem inco­modar out­ras pes­soas. O walk­man, evoluiu para mp3, mp4, iPod etc. 

    Mas por que um “walk­man”?

    Talvez, porque, como a própria auto­ra, Marília Gar­cia, afir­mou em entre­vista — em 2007 — que “a poe­sia escapa à músi­ca”, poden­do ser enten­di­da de várias formas:

    Ela (a poe­sia) pode ser enten­di­da de diver­sas for­mas, como um som para tocar em seu walk­man ou como uma cena cin­e­matográ­fi­ca nar­ra­da. Acho que o poe­ma é aqui­lo que escapa à lit­er­atu­ra, escapa à músi­ca, escapa ao cin­e­ma, escapa às coisas definíveis, mas que se rela­ciona o tem­po todo com elas, bus­can­do exper­i­men­tar e cri­ar novas formas.” 

    20 poe­mas para o seu walk­man divide-se em qua­tro partes: Per­gun­tas sobre a difer­ença entre, Le pays n’est pás La carte, Encon­tro às cegas (escala indus­tri­al) e Algo que se esqui­va. Curiosa­mente, o livro não apre­sen­ta 20 poe­mas e sim 45. 20 poe­mas para o seu walk­man é o títu­lo de um deles. 

    Poe­sia do Presente 

    Marília Gar­cia, jun­ta­mente com alguns out­ros escritores, como Angéli­ca Fre­itas e Ricar­do Dome­neck, é con­sid­er­a­da escrito­ra do pre­sente. Mas o que sig­nifi­ca isso? Escritores do presente?

    Segun­do a pro­fes­so­ra e pesquisado­ra Susana Scramim, os “escritores do pre­sente” não são nec­es­sari­a­mente con­tem­porâ­neos. Mas estes pos­suem um pen­sa­men­to comum acer­ca do literário. A auto­ra desta­ca que:

    A lit­er­atu­ra do pre­sente que envolve uma noção muito maior do que a noção de con­tem­porâ­neo é aque­la que assume o risco inclu­sive de deixar de ser lit­er­atu­ra, ou ain­da, de faz­er com que a lit­er­atu­ra se coloque num lugar de pas­sagem entre os dis­cur­sos, entre os lugares orig­inários da poe­sia, e que não devem ser con­fun­di­dos com o espaço, com a cir­cun­scrição de um ter­ritório para a lit­er­atu­ra. Escr­ev­er lit­er­atu­ra do pre­sente hoje tem função de faz­er coin­cidi­rem duas coisas que a mod­ernidade esgo­tou há muito: a pos­si­bil­i­dade do con­hec­i­men­to e da experiência. 

    A Poe­sia do Pre­sente, então, “brin­ca” com o leitor, pois o induz a pro­duzir ima­gens, decifrar códi­gos e bus­car respostas para seus ques­tion­a­men­tos. A par­tir da leitu­ra dos poe­mas de Marília Gar­cia ima­gens tam­bém são pro­duzi­das. Desta­ca-se os lugares, lín­guas e pessoas. 

    20 poe­mas para o seu walkman

    I.
    um dos primeiros dias
    do ano, francesc subia a notre – dame
    ‑de-lorette atrás de jacques roubaud
    e sen­ta­va no café gio­con­da de frente
    para uma saco­la com um
    gato dentro.
    um dos primeiros
    dias de outono,não pare­cia seguro
    ficar ali – como a beira do barco
    escor­re­ga­dia e do out­ro lado
    tudo era um quar­to com terraço
    as ruas crescen­do ao redor a estação
    de trem com mato cobrindo as
    lin­has e ás vezes um mergulho
    na água salgada:
    ficar boiando
    com um walk­man e depois olhar para
    os pés: — um pouco insu­lano isso de as
    lín­guas iso­ladas se misturarem
    pouco a pouco e dirigir
    na estra­da à noite. 

    II.
    depois descia as ruas
    e que­ria ficar no car­ro trancado
    segu­ran­do um livro.o penhasco
    apa­ga­va qual­quer definição
    de coisas, mas quando
    se virava
    ela já não estava
    tomara o bar­co para casa e dizia
    que talvez no verão seguinte mas
    só lig­a­va para con­tar do emprego
    de matemáti­ca – “quase um objeto
    poroso” – sair para um con­cer­to de rock
    e preparar vari­ações para uma
    veg­e­tar­i­ana amáv­el que pinta
    de bran­co o apartamento
    antes de ir.

    III.
    um dos primeiros dias
    e chega­va o cartão da
    catalun­ha, dizia que ficava
    mudo em seu metro e noventa
    esbar­ran­do nas pes­soas e olhava
    pra os pés: um tênis azul. se não tivesse
    tan­ta hier­ar­quia ou o que pensaria
    (estaria de verde? traria uma pilha
    de obje­tos nas mãos ? teria um
    fone de ouvi­do? e ain­da cantaria
    em voz alta) 

  • FestivalVerãoRS 2011: Dicas de Filmes

    FestivalVerãoRS 2011: Dicas de Filmes

    O 7º Fes­ti­val de Verão do RS de Cin­e­ma Inter­na­cional, em Por­to Ale­gre começou na quin­ta, dia 24 de março, com a pré-estreia do lon­ga-metragem Lope, de Andrucha Wadding­ton. Obvi­a­mente que mui­ta gente já fez a sua lista de filmes, mas quem não fez, ain­da dá tem­po. Pen­san­do nis­so, o inter­ro­gAção sele­cio­nou os prováveis filmes mais inter­es­santes — e esper­a­dos por nós — do Fes­ti­val. Se você assis­tiu algum deles, gos­tou ou não, deixe sua opinião nos comentários!


    Nati­mor­to (Brasil, 2010) - A adap­tação homôn­i­ma do livro do quadrin­ista e escritor Lourenço Mutarel­li pre­tende dar o que falar. O livro, antes adap­ta­do pelo teatro, traz a história de um homem com­pul­si­vo — o próprio Mutarel­li — e um caça-tal­en­tos que traz uma jovem can­to­ra para São Paulo para uma audição, enquan­to esper­am o dia mar­ca­do ele vai se apre­sen­ta­do mais e mais estran­ho, toman­do café, fuman­do com­pul­si­va­mente e lendo as car­tas de tarô para ela.

    Talvez o pon­to mais alto da espera pelo lon­ga é que o próprio Mutarel­li é uma figu­ra incóg­ni­ta, com uma lista de quadrin­hos e livros com um humor áci­do e um tan­to obscuro. Além, claro, que O Cheiro do Ralo, escrito por ele, foi uma das mel­hores adap­tações do cin­e­ma nacional até hoje.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=Opls68GIyT8

    Amor? (Brasil, 2010) É Mais um lon­ga nacional que prom­ete. João Jardim é um cineas­ta que tra­bal­ha com doc­u­men­tários de uma for­ma extrema­mente artís­ti­ca, bas­ta ver o incrív­el Janela da Alma para enten­der um pouco o esti­lo autor.

    Em Amor? o enre­do se foca em histórias reais de vio­lên­cia pas­sion­al inter­pre­tadas por atores, ou seja, o dire­tor criou uma ficção poéti­ca em cima da real­i­dade. O filme estre­ou ano pas­sa­do no Fes­ti­val de Brasília e con­ta com uma sessão comen­ta­da no 7º Fes­ti­val de Verão do RS de Cin­e­ma Inter­na­cional (Con­fi­ra a pro­gra­mação)

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=hDckZziiWS0


    A min­ha ver­são do Amor (Canadá/Itália, 2010) Nor­mal­mente filmes que envolvam Paul Gia­mat­ti sem­pre são inter­es­santes, vis­to por exem­p­lo o exce­lente Almas à Ven­da e a cinebi­ografia do quadrin­ista Har­vey Pekar em Anti-herói Amer­i­cano.

    Em A min­ha ver­são do Amor, Giammati inter­pre­ta Bar­ney Panof­sky, o per­son­agem-nar­rador de A Ver­são de Bar­ney, livro de Morde­cai Rich­ler. Panof­sky é car­i­ca­to e está pos­ses­so — e bêba­do, como sem­pre —, porque seu vel­ho desafe­to e ex-ami­go, Ter­ry McIv­er, está para lançar um livro auto­bi­ográ­fi­co em que lhe faz pesadas acusações. Então que Panof­sky resolve rev­er sua vida através de sua própria visão e lembranças.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=VMWf3UpmuvM

    Poe­sia (Coréia do Sul, 2010) Cin­e­ma core­ano sem­pre é uma bela indi­cação, vis­to que na últi­ma déca­da dire­tores como Kim Ki-Duk e Chan-wook Park, alcançaram boas tem­po­radas no cin­e­ma ocidental.

    Poe­sia é um dess­es filmes ori­en­tais que você dese­ja ver somente pela beleza que o filme evo­ca logo no trail­er. Dirigi­do por Chang-dong Lee o lon­ga con­ta a história de Mija, uma sen­ho­ra curiosa e ques­tion­ado­ra que ao rece­ber uma notí­cia que muda a sua vida decide ver mais poe­sia e beleza no cotid­i­ano, se inscreve numa aula do gênero e pas­sa a ten­tar com­preen­der a vida através das palavras.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=VM27hunyDTA

    Zona de Risco (Córeia do Sul, 2001) Reforço que cin­e­ma core­ano é sem­pre sen­sa­cional. Este lon­ga do Chan-wook Park, faz parte de uma mostra espe­cial para o cin­e­ma core­ano (veja a pro­gra­mação no site), por­tan­to já recomen­damos logo de cara todos os filmes.

    Por vários ângu­los Zona de Risco é um filme políti­co, mas como todo filme do dire­tor pode-se esper­ar ação e sangue à von­tade. Alguns sol­da­dos core­anos são mor­tos após um dire­tor, uma equipe espe­cial da Suíça vem para inves­ti­gar o caso pois acred­i­ta-se que haja um deser­tor entre os soldados.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=B3zOZL5nl2w

    Em um Mun­do Mel­hor (Dinamarca/Suécia, 2010) Talvez o sim­ples fato do filme ter gan­ho o Oscar de mel­hor filme estrangeiro seja um belo moti­vo para ver esse lon­ga. Mas ain­da há o fato do lon­ga ser dina­mar­quês e o cin­e­ma do norte-europeu cos­tu­ma apre­sen­tar belas sur­pre­sas. A dire­to­ra Susane Bier já dirigiu lon­gas inter­es­santes como Coisas que perdemos pelo cam­in­ho.

    Em um Mun­do Mel­hor um médi­co dina­mar­quês tra­bal­ha em um cam­po de refu­gia­dos na África enquan­to sua família está na Dina­mar­ca, a história de ambos se entre­laça com a de um garo­to orfão de mãe que migra para o país.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=diJ3IRIyqfo

    Para quem você lig­aria? Os nos­sos her­manos têm um cin­e­ma sen­sa­cional, isso é indis­cutív­el! O cin­e­ma exis­ten­cial dos argenti­nos sem­pre resul­ta em belas pelícu­las, tan­to com enre­dos encan­ta­dores como em fotografia.

    Em Para quem você lig­aria? um homem se vê numa ver­dadeira crise que ao encar­ar sua difi­cul­dade de lidar com as pes­soas se per­gun­ta, que em um momen­to com esse, para quem lig­ar, afinal?

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=yNqfM0Ef2Cw

  • Estreias 25/02

    Estreias 25/02

    Estas são as estreias da sem­ana de cin­e­ma:

    Desconhecido

    (Unknown, 2011)
    Ação, Suspense,Drama, Suspense/12 anos/113 min.

    Direção: Jaume Col­let-Ser­ra
    Elen­co: Liam Nee­son, Diane Kruger, Jan­u­ary Jones, Aidan Quinn, Bruno Ganz, Frank Lan­gel­la, Sebas­t­ian Koch

    Sinopse: O Dr. Mar­tin Har­ris acor­da após um aci­dente de car­ro em Berlim e desco­bre que sua esposa não o recon­hece. Um out­ro homem assum­iu sua iden­ti­dade. Igno­ra­do por autori­dades incré­du­las e caça­do por assas­si­nos mis­te­riosos, ele se vê soz­in­ho, cansa­do e sem­pre em fuga. Aux­il­i­a­do por uma ali­a­da improváv­el, a motorista de táxi Gina, Mar­tin mer­gul­ha de cabeça em um mis­tério mor­tal que vai obrigá-lo a ques­tionar sua sanidade, sua iden­ti­dade e até onde ele está dis­pos­to a ir para desco­brir a verdade.

    Site ofi­cial | IMDB | Críti­ca | Con­cor­ra a ingressos

    httpv://www.youtube.com/watch?v=GQIUe5tMuMk


    Bruna Surfistinha

    (Bruna Sur­fistin­ha, 2011)
    Drama/16 anos/109 min.

    Direção: Mar­cus Baldini
    Elen­co: Deb­o­rah Sec­co, Cás­sio Gabus Mendes, Cristi­na Lago, Dri­ca Moraes, Fabi­u­la Nasci­men­to, Guta Ruiz

    Sinopse: Raquel é uma jovem de classe média paulis­tana que um dia sai de casa e toma uma decisão sur­preen­dente: virar garo­ta de pro­gra­ma. Em pouco tem­po, Raquel se trans­for­ma em Bruna Sur­fistin­ha e pas­sa a ser uma cele­bri­dade nacional, con­tan­do sua roti­na em um blog na internet.

    Site ofi­cial | IMDB

    httpv://www.youtube.com/watch?v=8FKuCSA2c0U


    Justin Bieber: Never Say Never

    (Justin Bieber: Nev­er Say Nev­er, 2011)
    Documentário/Livre/105 min.

    Direção: Jon Chu
    Elen­co: Justin Bieber, Miley Cyrus, Sean Kingston, Ludacris, Jaden Smith, Ush­er Raymond

    Sinopse: Doc­u­men­tário que segue apre­sen­tações do can­tor canadense no ano de 2010. Ima­gens de arqui­vo mostram a infân­cia do astro..

    Site | IMDB| Con­cor­ra a ingressos

    httpv://www.youtube.com/watch?v=IwJ5Jz8wrEs


    Poesia

    (Shi, 2010)
    Drama/16 anos/139 min.

    Direção: Chang-dong Lee
    Elen­co: Jeong-hie Yun, Da-wit Lee, Nae-sang Ahn, Hira Kim
    Sinopse: Mija vive com seu neto em uma cidade local­iza­da nas encostas do rio Han. É uma velin­ha excên­tri­ca, que adoro se vestir com chapéus de flor, e roupas da moda, mas tam­bém é uma mente inqui­eta e ques­tion­ado­ra. Por aca­so, ela aca­ba entran­do em uma “aula de poe­sia” que acon­tece em um cen­tro cul­tur­al na viz­in­hança e é desafi­a­da pela primeira vez em sua vida a escr­ev­er um poema.

    Site |IMDB

    httpv://www.youtube.com/watch?v=a1gfDDmOeuw

  • Café Literário: Fabrício Carpinejar e Alberto Martins

    Café Literário: Fabrício Carpinejar e Alberto Martins

    Poe­sia é núcleo, é matriz. Quan­do eu faço poe­sia, fico cha­pa­do.Carpine­jar

    Escr­ev­er é poe­sia, é dar cor­da para a inqui­etação.Mar­tins

    Um bate-papo sobre poe­sia talvez não seja um even­to que chame muito a atenção das pes­soas, prin­ci­pal­mente porque a dis­cussão em torno dela seja ain­da muito acadêmi­ca e reple­ta de refer­ên­cias canônes da lit­er­atu­ra, geran­do uma con­ver­sa monó­tona, com lin­guagem muito especí­fi­ca, e assun­tos muito dis­tantes do cotid­i­ano. Não foi o caso do Café Literário, na Bien­al do Livro Paraná 2010, com Fab­rí­cio Carpine­jar e Alber­to Mar­tins, medi­a­do por Luiz Rebin­s­ki Junior, em cima do tema “Poe­sia, quem é você?”.

    De uma for­ma bem descon­traí­da e acalo­ra­da, os dois poet­as lit­eral­mente dis­cu­ti­am as suas opiniões sobre o que é ser poeta e a poe­sia na atu­al­i­dade. Uma dis­cussão muito per­ti­nente no cam­po literário hoje, já que o faz­er poéti­co vem se meta­mor­fos­e­an­do des­de do Mod­ernismo e os Con­cretis­tas a par­tir da déca­da de 70.

    A iden­ti­dade do poeta foi o pon­to cen­tral em que a dis­cussão girou. Para Carpine­jar, os poet­as vivem uma crise de iden­ti­dade e têm muito prob­le­ma em se assumir, não só per­ante as edi­toras e o mer­ca­do, mas na sua própria vida pes­soal tam­bém. Diz que se essa difi­cul­dade fos­se ultra­pas­sa­da, isto iria ajudá-los na cri­ação do seu próprio tra­bal­ho, tor­nan­do-se mais autên­ti­cos. Já Mar­tins acred­i­ta que não é o escritor que tem o dire­ito de se inti­t­u­lar poeta, até que porque ele não con­sid­era isso como um ofí­cio e sim um momen­to que acon­tece durante o tra­bal­ho, mas cabe ao leitor da obra decidir isto. Este momen­to da dis­cussão deixou claro a dual­i­dade (necessária) das pon­tos de vista dos dois poet­as, Mar­tins optan­do pelas visões do ¨out­ro¨ que o escritor vive e Carpine­jar visan­do o cotid­i­ano na auto­ria da poe­sia, insistin­do em um autor mais próx­i­mo de quem o lê. Este debate foi o que mais se desta­cou, prin­ci­pal­mente pela indig­nação de Carpine­jar com o fato que Mar­tins não con­seguia respon­der a per­gun­ta “Tu é poeta ou não é?” de maneira binária (sim ou não).

    A difer­ença de ger­ações entre os dois é muito clara, prin­ci­pal­mente pela difer­ença das visões sobre as novas tec­nolo­gias. Carpine­jar pub­li­ca tam­bém seus poe­mas em blog e pos­sui uma visão total­mente adep­ta ao mun­do vir­tu­al. Como seria se Drum­mond usasse o twit­ter e fos­se tão expos­to como são as pes­soas hoje? Porque é que um poeta pre­cisa ter um livro pub­li­ca­do para ser con­sid­er­a­do poeta? Não pode ape­nas fazê-lo no mun­do vir­tu­al? Por que uma bib­liote­ca pre­cisa ser silen­ciosa, sem músi­ca e sem poder levar comi­da? Ess­es foram alguns ques­tion­a­men­tos lev­an­ta­dos por ele. Alías, a sua visão de bib­liote­ca mod­er­na é bem difer­ente do que ouvi­mos nor­mal­mente falar por aí. Mar­tins tem uma visão clara­mente mais lit­er­a­ta e volta­da ao ato da leitu­ra como exper­iên­cia e não somente práti­ca social. Ele ques­tiona a efe­meri­dade dos poet­as vir­tu­ais e ao se con­tra­por às opiniões do gaú­cho, diz que a poe­sia não pode ser gen­er­al­iza­da, pois é um ato singular.

    O bate-papo se desen­volveu de uma for­ma exce­lente, pois mes­mo que os dois autores sejam con­tem­porâ­neos entre si, o con­traste de opiniões é necessário para que uma lacu­na per­maneça aber­ta quan­to a car­ac­ter­i­za­ção do que é poe­sia, hoje. A dis­cussão não girou em torno somente desse assun­to, pois quan­do se tra­ta de lit­er­atu­ra out­ros dois com­po­nentes sem­pre andam jun­tos: leitor e autor, e nesse que­si­to ambos abrem novas dis­cussões muito pertinentes.

    No final do bate-papo, Fab­rí­cio Carpine­jar e Alber­to Mar­tins rece­ber­am várias per­gun­tas vin­das dos par­tic­i­pantes, que levaram á des­do­bra­men­tos bem inter­es­santes, tor­nan­do o encon­tro bem dinâmi­co, descon­traí­do e infor­mal, sat­is­fazen­do a pro­pos­ta prin­ci­pal do Café Literário, na Bien­al do Livro Paraná 2010.

    O inter­ro­gAção gravou em áudio todo esse bate-papo e se você quis­er pode escu­tar aqui pelo site, logo abaixo, ou baixar para o sue com­puta­dor e ouvir onde preferir.

    Ouça a palestra com­ple­ta: (clique no link abaixo para ouvir ou faça o down­load)

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