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  • Dossiê Darren Aronofsky: O Lutador — Entrevista Traduzida

    Dossiê Darren Aronofsky: O Lutador — Entrevista Traduzida

    por Kei­th Phipps, 18/12/2008, traduzi­do exclu­si­va­mente com per­mis­são do The Onion.

    O filme de estréia de Dar­ren Aronof­sky, Pi (1998) , provou seu poder de cri­ar ima­gens cati­vantes e uma história atra­ti­va com pouco din­heiro. A par­tir daí, seus orça­men­tos aumen­taram, mas o foco con­tin­u­ou firme, e ele real­i­zou mais dois filmes provo­cadores – a bem rece­bi­da adap­tação do livro de Hubert Sel­by sobre as pro­fun­dezas do vício, Réquiem para um Son­ho (2000), e o menos bem rece­bido Fonte da Vida (2006), uma história entre­laça­da de amor e morte rejeita­da pelo públi­co e por vários críti­cos, mas ado­ra­da por um cres­cente públi­co cult. Tra­bal­han­do a par­tir de um roteiro de Rob Siegel (um anti­go edi­tor do Onion e – con­fis­são – ami­go do autor des­ta entre­vista), O Luta­dor (2008) mostra Aronof­sky voltan­do a um esti­lo ain­da mais rig­oroso do que o de sua estréia para explo­rar o mun­do de um luta­dor profis­sion­al (um rev­e­lador Mick­ey Rourke) lidan­do com a pos­si­bil­i­dade latente de que seus mel­hores dias já pas­saram. Logo depois de gan­har o Leão de Ouro no Fes­ti­val de Veneza, Aronof­sky con­ver­sou com o The A.V. Club sobre a lin­guagem sec­re­ta dos luta­dores, como faz­er o públi­co levar o wrestling a sério e sobre diri­gir seus próprios pais.

    Onde fica o mun­do real – den­tro do ringue ou fora do ringue?

    Da últi­ma vez que con­ver­samos, você esta­va pron­to para diri­gir cer­ca de oito filmes difer­entes. Por que este?
    Eu pas­sei quase um ano e meio fazen­do pós-pro­dução téc­ni­ca em Fonte da Vida. Ape­sar de eu gostar do proces­so, acho que min­ha parte predile­ta de faz­er filmes são os atores. Eu que­ria faz­er algo que só tivesse a ver com as atu­ações, com bem poucos efeitos espe­ci­ais. Eu dei uma olha­da em todos os pro­je­tos que está­va­mos desen­vol­ven­do e O Luta­dor com Rob [Siegel] esta­va bem adi­anta­do, então nós começamos a con­cen­trar todas as nos­sas atenções naque­la direção.

    Sendo o wrestling profis­sion­al um fenô­meno tão grande, deve ter –
    Bom, nun­ca hou­ve um filme sério, eu diria, não que eu sai­ba. Anos atrás, quan­do eu me formei em cin­e­ma, eu escrevi uma lista de filmes pos­síveis, e um deles era chama­do O Luta­dor. Exis­tem tan­tos filmes de boxe que já chega a ser um gênero, mas ninguém tin­ha feito um filme de ver­dade sobre o wrestling. À medi­da que come­cei a acom­pan­har aque­le uni­ver­so, pude perce­ber quão úni­co ele era.

    Parte do prob­le­ma é que, com o boxe, há uma dúvi­da sobre qual vai ser o resul­ta­do, quem vai gan­har. Mas é difer­ente no wrestling. Que tipo de difi­cul­dades isso trouxe?
    Foi um desafio, no sen­ti­do de faz­er uma luta no fim do filme que não dissesse respeito ao resul­ta­do como com­petição atléti­ca, mas sim como con­se­quên­cia de uma decisão pes­soal. Então esse foi um desafio com­pli­ca­do – e, tam­bém, como retratar algo que as pes­soas percebem como fal­so e, basi­ca­mente, rejeitam. Como faz­er uma inves­ti­gação sin­cera desse mundo?

    Então, como você fez? 
    Eu acho que o lim­ite do que é ver­dadeiro e fal­so tornou-se um grande tema quan­do Rob e eu falá­va­mos a respeito do filme logo no iní­cio, porque há esta ideia de “Onde fica o mun­do real – den­tro do ringue ou fora do ringue?” Essa foi a prin­ci­pal razão do Rob ter luta­do para man­ter a strip­per no filme. Eu esta­va dis­pos­to a mudar, porque, um filme inde­pen­dente com uma strip­per… me deix­a­va ner­voso. Mas quan­to mais a gente pen­sa­va a respeito, mais a gente perce­bia que as lig­ações entre a strip­per e o luta­dor eram real­mente sig­ni­fica­ti­vas. Ambos usam nomes fal­sos, ambos vestem fan­tasias, ambos encan­tam um públi­co e cri­am uma fan­ta­sia para esse públi­co, e ambos usam seus cor­pos como sua arte, então o tem­po é o seu maior inimigo.

    Você pesquisou sobre o des­ti­no de luta­dores e strip­pers depois que a idade acabou com suas carreiras?
    Bom, strip­pers de idade… a gente não fez essa pesquisa. [Risos.] Mas era claro o que acon­tece com elas. Luta­dores mais vel­hos, por muitos deles terem tido grande fama em algum pon­to, con­tin­u­am suas car­reiras. Nós nos reuni­mos com vários dos grandes caras mais vel­hos, des­de Greg “The Ham­mer” Valen­tine a Niko­lai Volkoff, Super­fly Snu­ka a Tony Atlas. Nós falam­os com vários dess­es caras, tive­mos lon­gas con­ver­sas a respeito disso.

    O filme todo acon­tece prati­ca­mente neste mun­do onde as pes­soas ou estão em ascen­são ou em declínio. É um mun­do que muitas pes­soas nem sabem exi­s­tir. Qual foi a coisa mais sur­preen­dente que você desco­briu ao observá-lo?
    Há várias coisas sin­gu­lares e inter­es­santes – a frater­nidade entre os luta­dores, a rede de suporte. O fato de que eles falam seu próprio idioma, que é cheio de expressões “circens­es”, o que me faz pen­sar que o wrestling provavel­mente veio do negó­cio do “cir­co”, algo no esti­lo “Assista dois fortões lutan­do”. Eles chamam a audiên­cia de “os alvos”, chamam a luta de “o espetácu­lo”. Eles têm tan­tas expressões que só fazem parte do seu próprio diale­to secre­to. Até o jeito que lutam quan­do estão no ringue – fazen­do sinais com as mãos uns pros out­ros ou dan­do tap­in­has pra avis­ar o out­ro quan­do está na hora de entre­gar a luta. É um mun­do muito com­pli­ca­do que vem de anos e anos de home­ns entre­tendo as massas.

    Os anos 90 foram do ecsta­sy, os 80 dos yup­pies. Havia toda aque­la cul­tura do ecsta­sy. As pes­soas se diver­ti­am bas­tante nos anos 90.

    E ele cos­tu­ma ser retrata­do como um mun­do basi­ca­mente sem rival­i­dade fora do pal­co. Isso é sim­pli­ficar demais?
    Ten­ho certeza que sim. Defin­i­ti­va­mente exis­tem caras que não são pop­u­lares porque batem um tan­to forte demais quan­do estão no ringue, eles chamam esse esti­lo de “stiff” (durão). Tam­bém há vários brin­cal­hões no negó­cio, há sem­pre vários trotes sendo apli­ca­dos, e havia algu­mas cenas dis­so tudo que acabaram sendo cor­tadas do filme. Mas eu não acho que qual­quer tipo de rival­i­dade seria pro­por­cional às rival­i­dades den­tro do ringue, se é isso que você está per­gun­tan­do. Eles têm suas próprias políti­cas, com certeza.

    Necro Butch­er

    Há uma cena mem­o­ráv­el com uma luta abso­lu­ta­mente bru­tal. O que você acha que atrai a audiên­cia ao se ter algo tão vio­len­to num even­to de wrestling?
    É um fenô­meno inter­es­sante. Quero diz­er, é ina­cred­itáv­el. O nív­el de bru­tal­i­dade do filme não é nada per­to do tipo de coisa que real­mente acon­tece. O cara com quem Mick­ey Rourke luta naque­la cena se chama Necro Butch­er, que inter­pre­ta ele mes­mo. So você for até o YouTube e procu­rar por “Necro Butch­er”, você vai ver coisas mais hard­core do que qual­quer coisa que a gente apre­sen­ta. Eu ten­ho teo­rias sobre a psi­colo­gia de porque essas pes­soas têm praz­er com isso, mas eu acho que enten­do como tudo evoluiu.

    Quan­do o WWF se tornou o WWE e basi­ca­mente admi­tiu que o wrestling era entreten­i­men­to e não esporte, prati­ca­mente todo mun­do desis­tiu da ilusão de que aqui­lo era real, que não era ence­na­do. O públi­co que assiste ao wrestling sabe que ele é ence­na­do, mas ain­da meio que se deixa levar pela sua dra­mati­ci­dade. A coisa que os emo­ciona é quan­do ess­es caras arriscam sua saúde e suas vidas. Mes­mo em even­tos menos hard­core, eles ficam impres­sion­a­dos quan­do os caras dão aque­les saltos e giros malu­cos. No mun­do hard­core, a coisa vai mais além, e as pes­soas esper­am que ess­es caras se machuquem para o seu entreten­i­men­to. Eu não acho que eles queiram que alguém mor­ra, mas de algu­ma for­ma eles sen­tem praz­er em saber que os caras estão se machu­can­do de ver­dade. Eu acho que é uma com­petição dire­ta com o que o MMA vem fazen­do. É um jeito de man­ter o wrestling como um esporte san­gren­to, basi­ca­mente. Que tal a min­ha psi­colo­gia pop? [Risos.] Eu acho que é daí que tudo se orig­i­na, mas não ten­ho certeza.

    Você mudou rad­i­cal­mente seu esti­lo a cada filme. Por que tan­tas mudanças radicais?
    Bem, eu ten­ho brin­ca­do que, se a Madon­na nos ensi­nou algu­ma coisa, é que você pre­cisa se rein­ven­tar. Eu acho que é impor­tante, como dire­tor, ou qual­quer pes­soa tra­bal­han­do com arte, que você tente coisas novas, desafie-se e se arrisque. Eu ten­tei me arriscar em cada filme que fiz – nun­ca fiz do jeito fácil, e acho que é porque o que me ani­ma é pôr uma mon­tan­ha tão grande quan­to eu pud­er na min­ha frente e faz­er o pos­sív­el para escalá-la.

    Obvi­a­mente hou­ve algu­mas desvan­ta­gens ao tra­bal­har com um orça­men­to tão pequeno e com uma pro­pos­ta de câmera na mão, mas quais foram algu­mas das van­ta­gens que você teve?
    Eu achei todo o proces­so de faz­er esse filme bas­tante empol­gante e diver­tido porque ele foi incriv­el­mente nat­u­ral­ista. O filme inteiro é muito nat­u­ral­ista, mas, espe­cial­mente na exe­cução, nós ten­ta­mos man­tê-lo tão nat­u­ral­ista quan­to pos­sív­el. Então, ao invés de mon­tar a ilu­mi­nação por horas, nós mon­tá­va­mos tudo em cin­co min­u­tos, mudan­do algu­mas lâm­padas, colo­can­do algu­mas corti­nas nas janelas, e seguíamos em frente. Geral­mente eu falo sobre como min­ha lin­guagem visu­al vem da história – a história lhe diz como fotogra­far um filme. Para este filme, ela veio do meu ator, e eu sabia que Mick­ey gosta­va de liber­dade. Então eu ten­tei cri­ar um play­ground com­ple­ta­mente sem lim­ites pra ele, pra que ele pudesse basi­ca­mente sair do trail­er e andar 20 quadras se fos­se isso o que ele quisesse faz­er. É pra isso que nós está­va­mos pron­tos. Eu con­tratei uma cine­grafista que fez vários filmes nar­ra­tivos, mas tam­bém muitos doc­u­men­tários nat­u­rais, Maryse Alber­ti. Eu con­tratei um design­er de pro­dução [Tim Grimes] que me con­seguiu óti­mas locações pra tra­bal­har. A gente fez coisas como gravar em even­tos de ver­dade com fãs de wrestling de ver­dade e com luta­dores de ver­dade. Todo mun­do com quem Mick­ey lutou era profis­sion­al. A gente fre­quen­ta­va as arquiban­cadas. Aque­la cena onde Mick­ey está assistin­do a uma luta, ela ter­mi­na e todo mun­do está no camarim, e eu disse, “Mick­ey, vai pro camarim”, e a gente só pôs a câmera nas costas e foi atrás dele, impro­visamos com­ple­ta­mente aque­la cena. Na cena da mer­cearia, metade daque­les clientes eram pes­soas reais, não atores. Na ver­dade, uma hora o ger­ente veio me pedir, “Ei, você pode pedir pro Mick­ey escr­ev­er um pouco mel­hor?” Eu fiquei, tipo, “Do que você tá falan­do?” E ele disse, “Bom, ele tá dan­do coisas pras pes­soas, e os preços que ele escreve – quan­do elas olham, elas não con­seguem enten­der a letra dele”. Mick­ey não sabia quan­to cus­ta­va o qui­lo de nada! Ele só escrevia, e eles saíam com aqui­lo! Então era uma lou­cu­ra. Foi muito diver­tido poder tra­bal­har nes­sa veloci­dade de pega-a-câmera-e-grava.

    Ele treinou muito para as cenas da mercearia?
    Ele odi­ou as cenas da mer­cearia. Ele não que­ria estar lá de jeito nen­hum, então ele meio que se virou.

    Eu sin­ce­ra­mente sen­ti como se pudesse assi­s­tir a uma hora daquilo.
    [Risos.] Ain­da temos mais material.

    Os clientes de sobrenome “Aronof­sky” eram os seus pais?
    Sim, eles estavam lá.

    Como foi diri­gir seus pais?
    Mãe, gri­ta mais alto! Não, gri­ta de ver­dade! Não, gri­ta, mãe!” É diver­tido e eles gostaram pra caram­ba, então eu fico feliz de ter eles por perto.

    Deixar Rourke ter liber­dade chegou a atra­pal­har o filme?
    Se atra­pal­hou, foi cor­ta­do. [Risos.] Eu sou bas­tante bru­tal na sala de edição. Geral­mente, se algu­ma coisa não está fun­cio­nan­do, cai fora. Mas, ao mes­mo tem­po, às vezes ele faz algu­ma coisa incrív­el, mas vai ficar um pouquin­ho fora de tom porque é demais, de um jeito ou de out­ro. Então é só o tra­bal­ho de edi­tar, uma vez que você tem todo o mate­r­i­al, de cor­tar tudo isso fora.

    O públi­co que assiste ao wrestling sabe que ele é ence­na­do, mas ain­da meio que se deixa levar pela sua dra­mati­ci­dade. A coisa que os emo­ciona é quan­do ess­es caras arriscam sua saúde e suas vidas.

    Mick­ey Rourke

    Você acom­pan­hou a car­reira de Mick­ey Rourke antes? Como foi a sua exper­iên­cia em crescer nos anos 80 e 90 assistin­do Rourke?
    Eu era um tremen­do fã no fim dos anos 80, começo dos 90. E provavel­mente foi por isso que o escalei, porque eu era um grande fã imag­i­nan­do o que teria acon­te­ci­do com ele.

    Quais atu­ações em particular?
    Coração Satâni­co era um dos meus filmes favoritos. E, é claro, Barfly – Con­de­na­dos pelo Vício. Eu sem­prei achei que ele esta­va espetac­u­lar ness­es filmes. Eu lem­bro de assi­s­tir a Barfly, e então vê-lo ser indi­ca­do naque­le ano [ao Oscar de] Mel­hor Ator, porque ele nun­ca tin­ha sido indi­ca­do. Eu fiquei ator­doa­do. Aque­la atu­ação é tão marcante.

    Quem gan­hou naque­le ano?
    Eu não sei. Infe­liz­mente, foi um ano forte. As out­ras cin­co atu­ações… Bull Durham ou alguém assim, eu não sei. Foi um bom ano, aque­le. [Foi 1987. Michael Dou­glas gan­hou Mel­hor Ator por Wall Street – Poder e Cobiça, des­ban­can­do William Hurt, Mar­cel­lo Mas­troian­ni, Jack Nichol­son e Robin Williams.]

    Falan­do de Bull Durham, essas lig­as de wrestling são pare­ci­das com as segun­das divisões de out­ros esportes.
    Sim, defin­i­ti­va­mente. É exata­mente isso. São caras que não são bons o sufi­ciente para estarem no WWE. Hoje em dia, é o WWE e o resto. E o resto é um pun­hado de even­tos pequenos, o maior deles o Ring of Hon­or, que é a nos­sa últi­ma luta no ROH. Esse é o maior even­to fora do WWE. E nós pudemos tra­bal­har com eles, porque eles pre­cisam de toda exposição que con­seguirem, e são vis­tos como mais fiéis ao wrestling. Nós tra­bal­hamos com três even­tos. O out­ro foi o even­to mais hard­core do mundo.

    Há uma cena onde Rourke e Marisa Tomei falam sobre Kurt Cobain e como os anos 90 foram hor­ríveis, e os anos 90 como a morte da diver­são. Tem algo a ver com a idade deles ou eles tem algu­ma out­ra razão?
    [Risos.] Bom, Rob escreveu ess­es diál­o­gos. Havia muito mais diál­o­gos que eram ain­da mais engraça­dos, mas eles não fun­cionaram – os atores sofr­eram com eles. Mas, de qual­quer for­ma, Rob escreveu isso. Vou te diz­er, fica muito engraça­do no filme. Nas pou­cas vezes em que ele foi exibido, as pes­soas ama­ram. Acho que cutu­cou algo. Eu não acho que é só a inver­são de papéis ao colo­car Kurt como o vilão da história, que é uma visão pouco comum da coisa toda. Os anos 90 foram uma fes­ta, quero diz­er, talvez defin­i­ti­va­mente não para aque­le movi­men­to grunge, mas as pes­soas estavam fazen­do muito mais fes­ta nos anos 90 do que nos anos 80. Você não acha? Os anos 90 foram do ecsta­sy, os 80 dos yup­pies. Havia toda aque­la cul­tura do ecsta­sy. As pes­soas se diver­ti­am bas­tante nos anos 90.

    Sen­tir dor é o que nos faz sen­tir mais vivos!

    Todas as deixas musi­cais estão lig­adas ao glam met­al dos anos 80. O que faz wrestling e glam met­al com­bina­rem tanto?
    [Risos.] Tudo isso veio do Rob. Você pre­cisa saber que ele é um grande fã de glam met­al. A gente sen­ta­va lá e ele me con­ta­va dessas ban­das. Eu dizia, “Rob, eu pre­ciso colo­car essa músi­ca ago­ra – pre­ciso escol­her entre Scor­pi­ons, blábláblá e Accept, qual eu escol­ho?” E ele, “Scor­pi­ons!” Então eu acho que ele fez essa lig­ação muito bem, essas épocas se sobre­pun­ham. À medi­da que o filme começou a tomar for­ma, percebe­mos quão diver­tido e empol­gante ele seria. Era uma delí­cia ten­tar per­cor­rer toda aque­la músi­ca e escol­her aque­la cer­ta para cada momen­to, da músi­ca do Cin­derel­la no iní­cio a “Balls to the Wall” no final.

    Como os fãs e os luta­dores rece­ber­am o filme?
    Eu vou mostrá-lo logo para Vince [McMa­hon, pres­i­dente do WWE], então estou muito ani­ma­do com isso; provavel­mente irei até lá em algu­mas sem­anas. Mas, por enquan­to – basi­ca­mente ele só esteve em fes­ti­vais, e os úni­cos luta­dores que o assi­s­ti­ram foram os que nos aju­daram no filme – eles acham que mostramos bas­tante respeito pelo ofí­cio. Quan­to a Mick­ey, eles dizem que não há um só luta­dor no mun­do todo que pen­saria que ele não sabe lutar, e que ele é mel­hor que provavel­mente 80% dos caras por aí. Mick­ey ficou feliz em ouvir isso.

    Mas eu ando muito curioso para saber o que os vet­er­a­nos vão achar. Quan­do eu gan­hei o Leão de Ouro, eu dediquei o filme a todos os luta­dores, já que eu meio que com­par­til­hei suas histórias. Eles são uma classe úni­ca. Eles não são orga­ni­za­dos, não têm aposen­ta­do­ria, não tem plano de saúde, vários deles estão tragi­ca­mente mor­ren­do muito jovens. Eu fala­va com Mick­ey, “Por que não há luta­dores no SAG?” Se você pen­sar a respeito, o Screen Actor Guild [espé­cie de sindi­ca­to de atores estadunidense] dev­e­ria orga­nizá-los. Eu não dev­e­ria deixar Vince ouvir isso. Mas eles estão rep­re­sen­tan­do diante de câmeras, e até dublês fazem parte do SAG.

    A primeira vez que lhe entre­vis­ta­mos, depois de Pi, você ime­di­ata­mente expres­sou inter­esse em tra­bal­har num grande filme de Hol­ly­wood. Robo­cop será esse filme?
    Espero que sim. Eu fico chegan­do per­to, mas aí surge a opor­tu­nidade de faz­er algo sobre o qual eu prati­ca­mente vou ter con­t­role com­ple­to. Então é uma opor­tu­nidade difí­cil de deixar pas­sar, e aque­le filme grande ain­da não apare­ceu na hora cer­ta. Eu gostei da min­ha colab­o­ração com Hol­ly­wood em Fonte da Vida. Você encon­tra mui­ta gente esper­ta com mui­ta exper­iên­cia em filmes, e você pode con­seguir muito a par­tir daí, então eu estou esperan­do a chance pra que acon­teça. Robo­cop ain­da não tem um roteiro. Espero que acabe sendo um grande roteiro e que nós pos­samos fazê-lo.

    Você acha que Fonte da Vida encon­trou uma segun­da audiên­cia neste ponto?
    Ah, cer­ta­mente existe uma audiên­cia para Fonte da Vida. Eu diria que fica numa pro­porção de 30/70, só 30% das pes­soas real­mente enten­dem, e esse tipo de gente já viu ele algu­mas vezes. A real­i­dade é que é com­pli­ca­do faz­er um filme com­er­cial sobre aceitar a morte. Mui­ta gente quer ver pes­soas sendo mor­tas, não uma visão metafísi­ca da morte, então ele vai levar tem­po até encon­trar pes­soas que este­jam aber­tas a ele, e sem­pre vai haver gente que não está dis­pos­ta sob nen­hu­ma cir­cun­stân­cia a exper­i­men­tar aqui­lo. É o meu mel­hor tra­bal­ho, e o resul­ta­do final é o filme que eu que­ria faz­er, e sin­to muito orgul­ho dele. Min­ha intenção está toda lá.

    Então, mais psi­colo­gia pop para você: Por que as pes­soas querem assi­s­tir wrestling e vio­lên­cia, mas não lidar com um filme que tem a ver com a morte?
    Bom, é estran­ho, porque há um tema em O Luta­dor que é muito sim­i­lar ao tema de Fonte da Vida. [O per­son­agem de Rourke] acei­ta quem ele é e tem um tipo de mer­gul­ho no final pare­ci­do com [o de] Fonte da Vida. Eu acho que, no fim das con­tas, o wrestling não pas­sa de uma exten­são da luta glad­i­atória, porém mais cívi­ca no sen­ti­do de que as pes­soas não estão sendo mor­tas. É tirar toda a dinâmi­ca do bem con­tra o mal, mas, além dis­so, há todo o ele­men­to maso­quista do wrestling. Por que as pes­soas gostam de assi­s­tir alguém encar­an­do a morte e a dor, é, eu acho… Caram­ba, eu não sei, provavel­mente há mais um bil­hão de razões, mas eu acho que uma parte dis­so tudo é teste­munhar out­ras pes­soas pas­san­do por aqui­lo. Você pode sen­tir empa­tia, e isso faz você se sen­tir mais vivo, porque sen­tir dor é uma das coisas que nos faz sen­tir mais vivos. Aqui está a sua citação, “Sen­tir dor é o que nos faz sen­tir mais vivos!” [Risos.]

  • Dossiê Darren Aronofsky: Pi — Entrevista Traduzida

    Dossiê Darren Aronofsky: Pi — Entrevista Traduzida

    Quan­do assis­ti­mos algum filme de Dar­ren Aronof­sky é inevitáv­el o tur­bil­hão de sen­sações, ideias e ques­tion­a­men­tos que surgem em torno do enre­do. Os lon­gas do dire­tor são reple­tos de refer­ên­cias e sem­pre deix­am pon­tas para que o espec­ta­dor con­strua sua própria rede de deduções, o que por si só é fan­tás­ti­co. 3.141592.. — Pi (leia nos­so primeiro tex­to do Dos­siê Dar­ren Aronof­sky) é primeira entre­vista que vamos pub­licar, traduzi­da com exclu­sivi­dade pelo inter­ro­gAção, pub­li­ca­da orig­i­nal­mente no site do óti­mo A.V. Club (do grupo The Onion) e con­duzi­da por Joshua Klein. O dire­tor, lá em 1998, fala da exper­iên­cia de faz­er um filme de baixo orça­men­to total­mente foca­do em ideias, já con­sid­er­a­do cult na época, além de prom­e­ter con­tin­uar fazen­do filmes do mes­mo nív­el e con­ven­hamos, Dar­ren Aronof­sky con­seguiu man­ter o foco.

    Dar­ren Aronof­sky — 3.141592…

    Traduzi­do por Natália Bel­los

    Pro­du­to de Har­vard e do Amer­i­can Film Insti­tute, o cineas­ta Dar­ren Aronof­sky, nasci­do no Brook­lyn, parece ter sido des­ti­na­do a faz­er o extremo e int­elec­tu­al filme de ficção cien­tí­fi­ca, que gan­hou o prêmio de Mel­hor Dire­tor, na com­petição de dra­ma, em 1998, no Fes­ti­val de Cin­e­ma de Sun­dance.

    A tra­ma de Pi – um gênio da matemáti­ca desco­bre um elab­o­ra­do códi­go numéri­co e pre­cisa se pro­te­ger daque­les que querem sua descober­ta — resul­ta tan­to do perío­do de tem­po que ele pas­sou em um kibutz em Israel quan­to do “des­ti­no Wall Street” que muitos de seus ami­gos de infân­cia seguiram. 

    Des­de que o filme ger­ou o bur­bur­in­ho após sua exibição em Utah, Aronof­sky assi­nou um con­tra­to para pro­dução de vários filmes com a Mira­max. O The Onion con­ver­sou com Aronof­sky sobre o hype, fazen­do um filme de baixo orça­men­to pare­cer caro e a real­i­dade de comprometer-se. 

    Toda a atenção em torno do pré-lança­men­to que Pi rece­beu criou mui­ta pressão?

    Pressão para transar, talvez. 

    Bem, Pi não é um filme muito comercial… 

    Ah, você está erra­do quan­to a isso, amigo!

    Você acha que Pi é um filme comercial?

    É um filme pura­mente com­er­cial. É o filme mais com­er­cial desse verão. Você quer saber por quê? Porque a estrela do filme são as ideias.

    São as mes­mas ideias que deix­am as pes­soas curiosas há muito tem­po. Assista A pro­fe­cia celesti­na, leia The Bible Code, são best-sell­ers no mun­do todo. As pes­soas querem saber por que esta­mos aqui, o sen­ti­do da vida, quem é Deus, onde Ele está, o que Ele é. 

    São questões como essas que Pi brin­ca. Eu acred­i­to que se os donos de cin­e­ma não fos­sem uns bananas e as pes­soas percebessem os temas inter­es­santes trata­dos no filme, nós faríamos eles irem ao cinema. 

    O proces­so de fil­magem é uma espé­cie de retorno aos dias mais visuais dos indies, de dire­tores como David Lynch. A maio­r­ia dos filmes inde­pen­dentes atual­mente, se são de con­fron­to, quase nun­ca são estilis­ti­ca­mente con­frontantes. O foco é sem­pre o tema, como sexo, vio­lên­cia ou a lin­guagem. Pi é um ataque sen­so­r­i­al completo.

    Des­de o começo, nós sabíamos que queríamos faz­er um filme que fos­se com­ple­ta­mente orig­i­nal, úni­co e difer­ente, porque eu acred­i­to que o públi­co tem uma cer­ta fome após verem o mes­mo pastelão hol­ly­wood­i­ano sem val­or repeti­das vezes.

    Há sem­pre o inter­esse em ver algo novo. Filmes inde­pen­dentes rara­mente dão isso ao públi­co atual­mente. Quan­do eu era mais novo, os filmes que eu gosta­va, como Laran­ja Mecâni­ca – eu cos­tu­ma­va ir a sessões à meia-noite em Man­hat­tan e fica­va deslum­bra­do. Eu sem­pre quis faz­er um filme que fos­se exci­tante e desafi­ador como esse para o público. 

    A parte mais impor­tante do filme, e uma das razões pelas quais eu o acho com­er­cial, é que Pi é ape­nas um thriller. É um filme de perseguição, guia­do pela adren­a­li­na. Nós queríamos faz­er um pas­seio de mon­tan­ha-rus­sa por 90 min­u­tos, em que o públi­co ficas­se pre­so e se man­tivesse cola­do nos seus assen­tos. Com essa meta… Se nós cumprísse­mos o obje­ti­vo do thriller, eu sabia que nós podíamos forçar os temas um pouco e forçar o esti­lo. Se eu tivesse o públi­co sen­ta­do por todo o tem­po pen­san­do para onde o filme esta­va indo, eu sabia que podia brin­car com as out­ras coisas.

    É um filme pura­mente com­er­cial. É o filme mais com­er­cial desse verão. Você quer saber por quê? Porque a estrela do filme são as ideias.

    A ideia era, des­de o começo, faz­er algo que fos­se ao mes­mo tem­po visual­mente inter­es­sante e int­elec­tual­mente estimulante?

    Sim, nós con­stan­te­mente queríamos que fos­se difer­ente. Queríamos que fos­se visual­mente difer­ente de qual­quer coisa que qual­quer um já ten­ha vis­to. É por isso que nós fil­mamos em pre­to ou bran­co em oposição ao pre­to e bran­co; é por isso que nós mis­tu­ramos todos ess­es tipos novos e estran­hos de fil­magem (como o Heat-Cam e a Vibra­tor-Cam). Nós queríamos mudar as regras bási­cas da fil­magem e faz­er escol­has que eram novas na tela. 

    Isso foi difí­cil com um orça­men­to baixo?

    Ah, sim. É um desafio enorme. É muito mais fácil ape­nas ajus­tar a câmera no can­to e deixar a cena rolar, mas isso não seria grat­i­f­i­cante. Meus tipos favoritos de filmes me fazem sen­tir coisas como “Uau, isso é incrív­el”.

    Nós queríamos que nos­sa câmera fizesse isso pelas pes­soas. Nós sim­ples­mente a colo­camos em todos os lugares que podíamos. Nós fomos muito inspi­ra­dos pelos quadrin­hos. A mel­hor coisa dos quadrin­hos é que eles podem colo­car a “câmera” em qual­quer lugar. Não há prob­le­mas de orça­men­to quan­do se quer colo­car a câmera a 90 met­ros do chão. Então ten­ta­mos faz­er isso o máx­i­mo possível. 

    Afi­nal, quan­to o filme custou?

    Cus­tou U$60.000,00 para faz­er até o corte final. Toda a fil­magem e todos os cortes para video­tape. Cus­tou mais din­heiro para ser con­ver­tido para 35 mm* e deixá-lo com um som profis­sion­al. O filme que você vê na tela é defin­i­ti­va­mente de muito baixo orça­men­to, mas ele não parece. 

    *Blown up é o nome que se dá ao proces­so no qual o filme é grava­do em for­ma­to dig­i­tal e depois con­ver­tido para 35 mm, para que se ten­ha uma cópia em película. 

    É total­mente pau­ta­do em seu próprio esti­lo visu­al, então ele fun­ciona nesse nív­el [de baixo orça­men­to]. Com apoios, porém, você pode faz­er um filme por nada. Você sabe, empres­ta uma câmera , pega o filme de graça. Com Pi, o cus­to real incluin­do todos os favores que tive­mos seria astronômi­co. É facil­mente um filme de U$2 mil­hões com todos o apoio que tive­mos e com a equipe que tra­bal­hou receben­do o paga­men­to atrasado.

    É um monte de din­heiro. É por isso que ele parece um filme de U$2 mil­hões: na ver­dade é um filme de U$2 mil­hões. Mas em ter­mos de din­heiro real­mente gas­to, foram U$60.000,00.

    Eu acred­i­to que se os donos de cin­e­ma não fos­sem uns “bananas” e as pes­soas percebessem os temas inter­es­santes trata­dos no filme, nós faríamos eles irem ao cinema

    Você acha que a difí­cil situ­ação “din­heiro-primeiro, filme-depois” que muitos jovens cineas­tas enfrentam atra­pal­ha a cria­tivi­dade deles?

    Não, eu acho que expande total­mente a cria­tivi­dade. O prob­le­ma com muitos filmes de grande orça­men­to é que eles têm muito din­heiro, e então eles agem de maneira rotineira e mecâni­ca. Eu acho que quan­do você é lim­i­ta­do pelos seus recur­sos você tem que ser mais criativo. 

    Seus lim­ites cri­am sua real­i­dade, e den­tro dessa real­i­dade, você ten­ta trans­for­mar essas lim­i­tações em seus pon­tos fortes. No fim das con­tas, se algo não fun­ciona, você tem que cor­tar. Você não pode sim­ples­mente diz­er “Bem, eram três da man­hã e meu ator esta­va vom­i­tan­do, esta­va frio e é por isso que o filme ficou assim”. Você não pode faz­er isso. 

    Ou fun­ciona ou não fun­ciona. Pon­to. Fim. Então nós nem queríamos chegar nes­sa situ­ação. Nós basi­ca­mente per­gun­ta­mos “O que podemos faz­er?” E uma vez que nós sabi­amos, nós falam­os “Vamos levá-lo o mais longe que con­seguirmos e torná-lo o mais excep­cional que pud­er­mos nes­sa direção”.

    Já é desafi­ador faz­er out­ros filmes como este da sua estreia?

    Não, eu vou sim­ples­mente desafi­ar con­stan­te­mente os lim­ites o máx­i­mo que pud­er. Eu ten­ho um grande inter­esse em faz­er grandes filmes hol­ly­wood­i­anos, mas eu quero ter certeza de que eles sejam difer­entes e úni­cos. Eu acho que qual­quer empre­sa que fiz­er negó­cios comi­go vai esper­ar isso de mim. 

  • FestivalVerãoRS 2011: Entrevista Andrucha Waddington

    FestivalVerãoRS 2011: Entrevista Andrucha Waddington

    entrevista Andrucha Waddington

    Pro­duções cin­e­matográ­fi­cas asso­ci­adas entre país­es não são nen­hu­ma novi­dade, são inclu­sive estim­u­lantes para resul­ta­dos mais elab­o­ra­dos. Lope, de Andrucha Wadding­ton é um tra­bal­ho que surgiu com a parce­ria de Brasil e Espan­ha sobre um perío­do da juven­tude de Lope de Vega, um grande poeta espan­hol que é prati­ca­mente descon­heci­do aqui no país.

    O dire­tor Andrucha Wadding­ton é con­heci­do por seus tra­bal­hos como Casa de Areia (2005), o pre­mi­a­do Eu, tu, eles (2000) ou ain­da por diri­gir artis­tas como Arnal­do Antunes e Os Par­ala­mas do Suces­so. Com o lon­ga-metragem Lope, o dire­tor diz que hou­ve um cer­to receio, pois a direção de um lon­ga assim era real­mente desafi­ado­ra, além de envolver dois país­es com cul­turas um tan­to diferentes.

    Ele con­ta que hou­ve um proces­so de em média qua­tro anos para estu­dar a vida de Lope, uma espé­cie de Don Juan da poe­sia espan­ho­la, e con­seguir com­preende-lo a pon­to de apre­sen­tá-lo ao grande públi­co. Ressalta que o lon­ga cria uma espé­cie de fun­dação do per­son­agem, con­tan­do a sua vida pré-fama e de que for­ma a poe­sia pas­sou a ser o esti­lo de vida do escritor. Ain­da, diz que o maior desafio foi recu­per­ar os cenários da Idade Média, mes­mo que a Espan­ha ain­da pre­serve muito o patrimônio, a recon­sti­tu­ição de época foi um tra­bal­ho árduo mas que foi bem resolvi­do graças a preparação tan­to dos cenários, como dos atores.

    O inter­ro­gAção con­ver­sou com Wadding­ton no lança­men­to de Lope, na séti­ma edição do Fes­ti­val de Verão do RS de Cin­e­ma Inter­na­cional, em Por­to Ale­gre. Além de con­tar como foi fil­mar fora do país, o dire­tor rela­ta seus anseios sobre a fal­ta de inter­esse dos exibidores em torno de filmes menos com­er­ci­ais, mais volta­dos para cin­e­ma de arte. Inclu­sive, sug­ere algu­mas for­mas para que as dis­tribuido­ras e os artis­tas parem de perder incen­tivos e retorno finan­ceiro com suas obras, prin­ci­pal­mente com a pirataria via inter­net. Con­fi­ra abaixo!

    Como foi o lança­men­to do filme?
    Lope é um filme que para a Espan­ha é extrema­mente com­er­cial, porque é um per­son­agem que é um mito den­tro da cul­tura espan­ho­la. Lá ele saiu com 340 copias e aqui ele é um per­son­agem abso­lu­ta­mente descon­heci­do do públi­co. Lançamos ele com 25 cópias, primeiro no cir­cuito Rio, São Paulo, Belo Hor­i­zonte e Brasília e ago­ra Por­to Ale­gre, Curiti­ba e Flo­ri­anópo­lis, no dia primeiro de abril.

    Nor­mal­mente as cópias para os filmes brasileiros vem em número menor, é muito difí­cil elas chegarem em out­ras cidades que não seja esse primeiro cir­cuito que você comen­tou. Essa é mais uma decisão de quem?
    Isso é uma decisão do exibidor e do dis­tribuidor. O dis­tribuidor tem a função de levar o filme ao maior número de espec­ta­dores pos­síveis, ele tem inter­esse nis­so. Existe uma lei do nat­ur­al do mer­ca­do, que ele próprio se reg­u­la, onde um exibidor tem inter­esse em um filme que vai dar bil­hete­ria, então, muitos filmes que pos­suem uma deman­da mel­hor do públi­co, não é um filme órfão de um grande públi­co, ele não encon­tra muito espaço den­tro do cir­cuito com­er­cial mais aber­to, então ele aca­ba depen­den­do do cir­cuito de arte. Mas isso é uma coisa que acho que acon­tece no mun­do inteiro, isso não é uma tragé­dia que só acon­tece aqui. O cin­e­ma extrema­mente com­er­cial, vem como um arrasa quar­teirão, ele tira todo mun­do do cir­cuito. Tem lança­men­tos que saem com 700, 800 cópias, mas o Brasil tem 2200 salas. Então um lança­men­to gigante estran­gu­la o cir­cuito, porque ele já o ocu­pa com 1/3 do total.

    Como dire­tor, você vê isso…
    O mer­ca­do é assim, eu não ten­ho muito o que… assim, por exem­p­lo, se o Lope saiu com 25 cópias, eu ten­to tra­bal­har nele, como dire­tor, da maneira mais poderosa pos­sív­el para ele ter uma vida lon­ga sem ser eje­ta­do do cir­cuito. Se eu lançar o Lope com 100 cópias ele vai ficar uma sem­ana em car­taz e adios. Então o exibidor, se o filme entrou na sex­ta, vai olhar a bil­hete­ria de segun­da e vai falar “sin­to muito, tem um filme que vai me dar bem mais bil­hete­ria e eu vou colo­car no lugar”. Então você depende muito do cir­cuito de arte sim, para deter­mi­na­dos filmes. Como dire­tor, eu gostaria que o públi­co tivesse mais inter­esse em filmes um pouco mais elab­o­ra­dos e menos, a pri­ori, com­er­ci­ais. Mas o mun­do não é assim, o públi­co tem o dire­ito de con­sumir o que ele quis­er, então infe­liz­mente, ou feliz­mente, é assim que o mer­ca­do funciona.

    Muitas pes­soas con­seguem aces­so a filmes menos com­er­ci­ais só pela inter­net, fazen­do o down­load deles.
    Ó, eu acho que assim, isso é uma coisa que é um erro. O erro está no sis­tema de dis­tribuição, que não enx­er­gou a inter­net como uma fer­ra­men­ta de dis­tribuição des­de o iní­cio. A Net­flix nos Esta­dos Unidos, você paga sete dólares por mês e tem aces­so ilim­i­ta­do ao catál­o­go inteiro, então não tem por que você não pagar, e o autor gan­ha com isso. Demor­ou muito para o mer­ca­do aceitar isso e fez com que fos­se nor­mal para toda uma ger­ação, meus fil­hos inclu­sive, acharem nor­mal down­lo­dar filmes ou músi­ca sem pagar. Mas eu acho o grande vilão, o grande cul­pa­do dis­so ter acon­te­ci­do, é o próprio sis­tema de dis­tribuição. Acho que ago­ra nat­u­ral­mente vai começar a ser impos­sív­el não ter a inter­net como meio de dis­tribuição e isso vai mudar.

    Mas esse públi­co que con­some os filmes des­ta maneira, você acha que isso é algo válido?
    Eu acho que o dire­ito autoral é algo que deve ser preser­va­do, ao mes­mo tem­po que tem um dese­jo que o maior número de pes­soas veja o filme. Então se você tem esse dese­jo como um dire­tor que fez o filme, a questão para mim é o ter um mod­e­lo de dis­tribuição den­tro da inter­net que seja acessív­el, e você cor­ta uma quan­ti­dade de inter­mediário e gan­ha nesse meio pra levar dire­to do pro­du­tor através do canal dis­tribuidor da inter­net para o públi­co. Isso é o que eu gostaria que acon­te­cesse, que fos­se uma coisa de praxe, que ocor­resse nat­u­ral­mente. Com isso ninguém perde, todo mun­do vai poder con­sumir por um preço bara­to. Com uma assi­natu­ra, por exem­p­lo, por doze reais e você poder con­sumir quan­tos filmes quis­er, não tem porque você não pagar, vai ter um down­load rápi­do, de qual­i­dade. Não só no Brasil que os dis­tribuidores tem essa difi­cul­dade, nos Esta­dos Unidos tam­bém hou­ve isso e na Europa tam­bém, hou­ve no mun­do inteiro um pre­con­ceito diante esse méto­do de distribuição.

    Como é que foi para um dire­tor brasileiro fil­mar fora do país?
    Acho que o cin­e­ma é uma lin­guagem uni­ver­sal, quan­do você começa a faz­er um filme você até esquece que está fora do teu país, porque todo mun­do que está ali é profis­sion­al do cin­e­ma, somente o que muda é a lin­gua, fora isso nada muda, todo mun­do é meio bicho de cin­e­ma, então você rapid­in­ho se acos­tu­ma, rapid­in­ho você acha que já é espanhol.

    Você comen­tou que usou duas pre­mis­sas bem atem­po­rais no filme, porque escol­her essa época para mostrar isso?
    Na ver­dade, acon­te­ceu que difer­ente dos meus filmes ante­ri­ores, este foi um filme que o pro­je­to chegou a mim. Era um uni­ver­so dis­tante, tin­ha um roteiro pron­to que eu ador­ei. Era um pro­je­to que na ver­dade me escol­heu, no sen­ti­do de que eu não tive um insight “oh vou faz­er a história do Lope”. Eu achei muito legal usar um per­son­agem do sécu­lo 16, para falar dessas duas questões que é um jovem resol­ven­do tro­car o cer­to pelo son­ho, largan­do o exérci­to para virar um poeta, dra­matur­go, e acred­i­tar no tal­en­to dele, e a ini­ci­ação amorosa de um jovem adul­to. Essas duas pre­mis­sas me fiz­er­am ficar muito insti­ga­do em con­tar essa história e aí quan­do fui con­hecen­do o Lope, per­son­agem, fui fican­do cada vez mais fasci­na­do por ele.

    Acom­pan­he o twit­ter do Andrucha Wadding­ton.

    Leia tam­bém o comen­tário sobre o filme Lope, que fize­mos após a sessão do filme no festival.

  • Príncipe da Pérsia – As areias do tempo: entrevista com Ben Kingsley

    Príncipe da Pérsia – As areias do tempo: entrevista com Ben Kingsley

    ben kingsley prince of persia

    Ben Kings­ley é um dos atores mais ilus­tres do mun­do, mais con­heci­do por filmes como “A Lista de Schindler”, “Casa de Areia e Névoa”, “Lances Inocentes”, e “Gand­hi”, com o qual gan­hou o Oscar na cat­e­go­ria de mel­hor ator. No entan­to, ape­sar de Ben Kins­g­ley estar em Hol­ly­wood há quase vinte e cin­co anos, em seu cur­rícu­lo ain­da fal­ta­va um block­buster que fos­se do tipo com aven­turas e efeitos espe­ci­ais de arregalar os olhos, como pre­vê às deman­das do gênero. Ele final­mente entra em cena em “Príncipe da Pér­sia: As areias do tem­po”, o mais recente filme de Jer­ry Bruck­heimer, o mega-pro­du­tor de “A len­da do tesouro per­di­do”, e os três “Piratas do Caribe”. “Areias do tem­po” é ambi­en­ta­do na fic­tí­cia Pér­sia do sécu­lo 6, estre­lando Jake Gyl­len­haal como Das­tan, um jovem príncipe que tem que deixar para trás sua breve vida despre­ocu­pa­da e evi­tar que diver­sos vilões roubem a Ada­ga do Tem­po, um anti­go artefa­to que tem o poder de voltar no tem­po e per­mite ao seu pos­suidor gov­ernar o mun­do. Ben Kings­ley inter­pre­ta o mis­te­rioso príncipe Nizam, tio ado­ti­vo de Das­tan, que pode ou não ter as mel­hores intenções em relação ao seu sobrin­ho. O filme tam­bém é estre­la­do por Gem­ma Arter­ton e Alfred Moli­na, e é dirigi­do por Mike Newell (“Har­ry Pot­ter e Cálice de Fogo” e “Don­nie Bras­co”). As fil­ma­gens duraram mais de cin­co meses em locais do Mar­ro­cos e nos estú­dios Pinewood, em Lon­dres, e foram grandiosas, mes­mo para os padrões gen­erosos de Jer­ry Bruck­heimer. Dois mil mem­bros na equipe; 400 fig­u­rantes; 7.000 tra­jes feitos à mão; e dezenas de palmeiras e toneladas de areia foram lev­adas a Lon­dres para se ter uma répli­ca do cenário no Mar­ro­cos: os números são real­mente ver­tig­i­nosos. Falam­os com Ben Kings­ley nos estú­dios Pinewood, enquan­to ele esta­va em uma pausa entre cenas fil­madas nas, real­mente con­vin­centes, dunas de areia.

    P: Como está indo seu primeiro blockbuster?
    R: [Risos] É um grande filme, não é? Mas ten­do dito isso, entre a ação e o corte, você está num pon­to em que o gênero, o orça­men­to ou o taman­ho dos cenários não fazem nen­hu­ma difer­ença. É o que está acon­te­cen­do com nós como atores que se impor­tam. E a história está reple­ta dess­es per­son­agens inter­es­santes que eu acho que o públi­co vai real­mente se preocupar.

    P: Você não teve nen­hu­ma restrição quan­to a andar pelo deser­to em um cav­a­lo e apren­der luta com espadas?
    R: Nem um pouco! Pare­ceu-me mar­avil­hoso. Acho que a idéia de que eu sou “um ator sério” é algo como um alba­troz em vol­ta do meu pescoço. Espero ser um artista ao invés de um ator sério. A min­ha escalação para o filme foi muito atraente, e assim foi com o gênero de aven­tu­ra e o grande elen­co. [O dire­tor] Mike Newell me ofer­e­ceu o papel de Nizam antes mes­mo de eu ler o roteiro, mas quan­do eu o li, eu pen­sei que seria muito bem pro­duzi­do. Nat­u­ral­mente, o roteiro foi con­duzi­do pelo enre­do, mas con­hecen­do Mike e seu tra­bal­ho, ficou claro que ele tam­bém iria bal­ancear a ação com o per­son­agem, anal­isan­do alguns motivos com­plex­os e psi­cológi­cos, e é assim que ficou. Por exem­p­lo, eu acho que é inter­es­sante que os pro­tag­o­nistas do filme não sejam sim­ples­mente divi­di­dos em mocin­hos e vilões. Eu fiz uma cena hoje, onde de repente, percebe­mos que este per­son­agem, que tem sido até ago­ra com­ple­ta­mente encan­ta­dor, edu­ca­do e benig­no tem capaci­dade para a vio­lên­cia com­ple­ta­mente casu­al. Em um min­u­to ele pode puxar sua espa­da, cor­tar a gar­gan­ta de alguém, colo­car sua espa­da de vol­ta e con­tin­uar a falar.

    P: Do que eu vi até ago­ra seu per­son­agem parece par­tic­u­lar­mente difí­cil de se compreender…
    R: Eu estou con­tente com isso! Eu diria que meu tra­bal­ho é ser tão incom­preen­sív­el quan­to pos­sív­el, até que as pes­soas começem a enten­der a essên­cia do que ele está fazen­do, que é um cam­in­ho bem lon­go no enre­do do filme. Nizam tem uma relação espe­cial com o per­son­agem de Jake, Das­tan — eu sou aque­le que o res­ga­tou das ruas, quan­do ele era um garo­to — e ele e seus irmãos não têm nen­hu­ma escol­ha a não ser con­fi­ar em mim.

    P: Você inter­pre­tou muitos per­son­agens da vida real na tela, em filmes como “Gand­hi” ou “A Lista de Schindler”, e o preparo para ess­es papéis deve ter envolvi­do uma série de pesquisas. Como você se prepara para ser um príncipe, total­mente imag­inário, da Pér­sia do sécu­lo 6?
    R: Você pen­sa sobre as emoções dele, sobre o que está acon­te­cen­do em sua alma. Nizam é gov­er­na­do por inve­ja e des­gos­to — Des­gos­to que foi o seu irmão que se tornou rei, e não ele. Ele está sem­pre pen­san­do: “Dev­e­ria ser eu!” e essas emoções são famil­iares para nós inde­pen­dente se estivésse­mos na anti­ga Pér­sia, na políti­ca con­tem­porânea, ou em uma peça de Shakespeare.

    P: Você faz isso soar muito Shakespeariano…
    R: [Risos] Qual­quer coisa eu faça aca­ba sendo de Shake­spear­i­ano! Eu acho que ten­to e acabo deixan­do as coisas dessa maneira.

    P: Quan­to ess­es cenários incríveis e fig­uri­nos o aju­dam a entrar no seu personagem?
    R: Ah, eles aju­dam muito. Os tra­jes são feitos destes teci­dos extra­ordinários e você se sente difer­ente quan­do você os veste. E para todos os can­tos do cenário que você olha você vê estas super­fí­cies incriv­el­mente detal­hadas que devem ter empre­ga­do mil­hares de artesãos. Em todos os lugares que se olha, a ener­gia salta aos olhos. Nada é aprox­i­ma­do. Tudo é muito fina­mente detal­ha­do. E todos os dias no set são sur­preen­dentes. Eu acabei de ver Jake [Gyl­len­haal] pas­san­do por mim mon­ta­do em um cav­a­lo, muito rápi­do e destemi­do, brandin­do sua espa­da, gri­tan­do fer­oz­mente. Há um esplen­dor no filme.

    P: Que difer­ença faz ter Jer­ry Bruck­heimer como pro­du­tor? Ten­do tra­bal­ha­do com ele pela primeira vez,você já obteu algum insight sobre suces­so dele?
    R: É o entu­si­as­mo dele. Você não pode fab­ricar o entu­si­as­mo e se você não o tem no coração, então você nun­ca terá a ener­gia para ver nada além. Eu observei Jer­ry andan­do pelo set em Mar­ro­cos com uma câmera fan­tás­ti­ca e ele esta­va fotografan­do coisas e havia tan­ta ale­gria em seu ros­to. Não era um “Isto é meu!”, mas “Isto é lindo!”

    P: Falan­do de Mar­ro­cos, você gravou por lá durante alguns meses e, aparente­mente, sobre­viveu inun­dações, tem­pes­tades de areia e tem­per­at­uras de até 51 ° C. Você acha que esta exper­iên­cia con­tribuiu, ou você algu­ma vez dese­jou ter feito tudo aqui­lo nos estú­dios da Pinewood?
    R: Graças a Deus que não fize­mos! Eu acho que para nós, como um grupo de atores, via­jar jun­tos é ines­timáv­el, e para nós como uma unidade com­pe­tir con­tra o deser­to é ines­timáv­el. Então empre­gar artesãos locais e ter essas pes­soas mar­avil­hosas como extras, real­mente con­tribui na tex­tu­ra do filme. Este é o meu sex­to filme lá e acon­tece que eu amo Mar­ro­cos. Não há nada esgotante sobre isto, e eu apren­do muito de um filme para o out­ro con­hecen­do mais pessoas.

    Este tex­to foi traduzi­do do orig­i­nal, em inglês, exclu­si­va­mente pelo interrogAção.

    Leia tam­bém a Críti­ca do Príncipe da Pér­sia, fei­ta pelo inter­ro­gAção. (mes­mo se você ain­da não viu, pode ler tran­quil­a­mente, não tem nen­hum spoil­er)