Boas energias, luz, calor humano e esperança integram o composto do álbum Above the Buried Cry, da banda de alternative/atmospheric rock Aeon Spoke. Falando assim até pode parecer clichê, mas o trabalho capitaneado pelo talentosíssimo guitarrista, compositor e vocalista Paul Masvidal, ao lado do seu fiel companheiro, o baterista Sean Reinert, não poderia ser diferente.
Os dois músicos em questão foram membros da banda Death durante a execução e turnê do álbum Human (1991), considerado um divisor de águas na carreira de uma das maiores bandas de Heavy Metal que já existiram em todos os tempos. Conta-se que Chuck Schuldiner, líder do Death, tentou dissuadir Paul Masvidal a não deixar o grupo, pois considerava‑o um guitarrista excepcional. Mas o fato aconteceu, levando Masvidal e Reinert a retomarem suas atividades com o Cynic, trabalho perene dos músicos.
Paralelo ao Cynic, o ano de 2000 fez emergir a primeira demo do Aeon Spoke, composta por seis faixas, culminando depois em um EP lançado em 2002 e radio sessions em 2003. No ano seguinte, o primeiro álbum da banda vem à tona com sete faixas (o material foi regravado em 2007). Above the Buried Cry introduz mensagens positivas e reflexões acerca do comportamento humano, o que vem a calhar com as crenças do porto-riqueno Paul Masvidal.
Sean Reinert e Paul Masvidal
Nascido Pablo Alberto Masvidal, o músico cresceu em Miami, Flórida, e estudou música clássica e jazz desde os primeiros anos. Paul é envolvido com a filosofia Oriental e com tudo o que diz respeito à espiritualidade. Ele também é iniciado na prática do Kriya Yoga, expondo suas ideias/experiências nas letras de suas composições, que abarcam Cynic, Aeon Spoke, Portal e outros projetos paralelos.
Sean Reinert tem acompanhado Masvidal desde a década de 1980 e é considerado um proeminente baterista, escrevendo e apresentando performances em programas de televisão e filmes. Reinert parece ter a mesma filosofia de vida do seu amigo Paul, o que resultou em faixas como:
“No Answers”
A felicidade não está em respostas e deve ser procurada com otimismo.
https://www.youtube.com/watch?v=6E_8oVxrUKw
“Grace”
Um pedido de fé bem ao estilo da doutrina oriental, onde paz e amor devem ser perseguidos constantemente.
“Silence”
Crença, desejo, amor, esperança e alusão, uma vez mais, ao sol como fonte de renovação/renascimento.
“Emmanuel”
Belíssima intro, é uma das faixas mais introspectivas do álbum. A música lança o ouvinte para uma irremediável conexão com uma natureza onírica, que se perde em cada nova nota. Minha faixa preferida!
Above the Buried Cry também traz “Pablo at the Park”, “Suicide Boy”, “Face the Wind”, “For Good”, “Nothing” e “Yellowman”, tudo dentro da linha “descubra-se e entregue-se”. De fato, pensamento pra lá de alternativo para um mundo cada vez mais egóico, manipulador e obcecado pela sede de poder. Mas a arte existe para isso: abrir, cativar e estimular consciências.
Muitos de nós, que lemos e relemos livros, assim como sites, blogs e tudo que concerne ao universo literário, costumamos manter o hábito de escrever cartas, artigos, e‑mails, matérias, trabalhos acadêmicos, recados rápidos em redes sociais, um tomo de 1.000 páginas do romance de estreia ou, simplesmente, um informativo para o mural da empresa – algo do tipo “Área reservada ao tempo-livre. Chefes de setores, favor respeitar” (ok, não custa imaginar). Enfim, as opções são extensas. Muitas vezes, nos perguntamos como nos tornar escritores melhores, mais rápidos, concisos, versáteis, criativos e interessantes.
Marshall McLuhan
Pois bem, dentre os cultuadores do totem Novas Tecnologias — tudo começou com o profeta Marshall McLuhan, não se culpem — existem aqueles que estão buscando novas formas de melhorar cada vez mais sua capacidade de escrever e produzir conteúdo. Jennifer Blanchard, uma copywriter profissional que até meados de 2013 mantinha o blog Procrastinating Writers, é uma dessas entusiastas e decidiu usar o twitter como prova de que 140 caracteres podem sim fazer de você um escritor melhor. No artigo How Twitter Makes You a Better Writer (Como o Twitter faz de você um escritor melhor), Blanchard dá algumas dicas e testemunhos de como uma rede social, louvada e/ou criticada — mas sempre analisada — nas faculdades de Comunicação ao redor do mundo pode dar um upgrade significativo nas suas habilidades de escrita.
Jennifer defende que o Twitter não é apenas um ótimo espaço para negócios e expansão de marcas, mas também o lugar ideal para organizar as habilidades para escrever. Segundo ela, o “Twitter força você a ser conciso”, ou seja, você precisa ser rápido, hábil e criativo com as palavras. O recurso te oferece apenas 140 caracteres para dizer tudo o que você precisa. “Isso não é um monte de espaço. Letras, números, símbolos, pontuação e espaços, todos contam como caracteres no Twitter”, reforça Jennifer. Você precisa dizer o que tem que dizer utilizando o menor número de palavras possível, o que te obriga a tomar decisões entre a imensidão de vocábulos a usar, reduzindo suas ideias ao essencial. A copywriter dá a entender que para os escritores verborrágicos, que costumam escrever laudas e laudas sem sair do preâmbulo, esboçar sentenças em 140 caracteres é um verdadeiro desafio. Dessa forma, o Twitter — quem diria? — te força a exercitar e ampliar o vocabulário que possui, impulsionando à procura de palavras e expressões novas “para dizer de modo melhor, claro e conciso” toda a mensagem que se quer passar.
A copywriter Jennifer Blanchard
O último argumento da autora versa sobre a possibilidade de melhorar as habilidades de edição através do Twitter. Para Jennifer Blanchard, todo autor deve ser capaz de editar seu próprio texto, e a ferramenta de 140 caracteres serve para deixar a capacidade de edição simplesmente excelente (top-notch). “É quase como jogar um jogo; tentar escrever uma mensagem de 140 caracteres e ainda obter seu ponto de vista de tal forma que inspire seus seguidores a tomar medidas como clicar no seu link ou retwittar seus posts”, afirma Blanchard.
A autora fala ainda sobre como o uso dessa rede social a força a pensar cada vez mais profundo dentro do seu vocabulário até encontrar um modo curto de dizer suas mensagens. Ela, que diz ser usuária do Twitter há algum tempo, revela que a ferramenta não só a tem ajudado a melhorar suas habilidades de escrita como também a realizar cópias (reproduções) de forma mais produtiva.
E você? Também acha que o uso do Twitter é útil para desenvolver habilidades e, ao contrário do que uma parte de pensadores contemporâneos argumenta, pode ajudar a melhorar nossa capacidade no que diz respeito à leitura, escrita, pensamento?
Swans, de M. C. Escher (Gravura em Madeira) — 1956
Louis Aragon (1897 – 1982), poeta, editor e romancista francês, expressou como “os homens vivem” no poema que carrega a força desses versos:
(…)
Eram tempos insanos,
Tínhamos posto os mortos à mesa
Fazíamos castelos de areia
Confundíamos lobos com cães
Apropriando-se do poema, nossas falecidas memórias voltam do passado como uma visão fantasmagórica, triunfante e ameaçadora, que olha ao redor para se certificar de sua onipresença. A insegurança e a vontade incontrolável de lembrar, salvar e regular tudo nos torna construtores e plateia de uma História documentada, cujo efeito de real seja imanente. Durante séculos, esse raciocínio foi seguido pela necessidade de diferenciar rigidamente “fato e ficção”, “mito e história”, “real e imaginário”. A narrativa historiográfica passou por longas fases de restrição, limitada ao positivismo, às exigências de vestígios e documentos. Separar história e literatura como dois entes de planetas opostos foi o primeiro passo para determinar caminhos, impor sentidos, fixar padrões. Ao analisar o pensamento de Gilles Deleuze (1925–1995) sobre a linguagem literária e o de-fora, o autor brasileiro Roberto Machado traz à tona a ideia que o francês possuía sobre a escrita como “uma tentativa de libertar a vida daquilo que a aprisiona, é procurar uma saída, encontrar novas possibilidades, novas potências de vida”. Se continuamos a todo instante pondo nossos mortos à mesa, por que ignorar a estreita relação entre linguagem histórica e ficcional?
Zdzisław Beksiński
O escritor colombiano Gabriel García Márquez, que faleceu em abril deste ano em consequência de complicações geradas pelo câncer, criou um novo sentido para o envelhecer por meio do protagonista de “Memória de minhas putas tristes”, livro lançado em 2005 e divulgado no Brasil pela editora Record em 2008, com tradução de Eric Nepomuceno. Trata-se da emblemática história de um senhor no auge dos seus noventa anos que, completamente perdido em uma vida comum, sem amores, sem expectativas, sem ânsias e desejos, se vê às voltas com a desordem que só sentimentos como o amor podem acarretar. O sábio decide comemorar sua entrada em uma nova década na companhia de uma moça, ninfeta e virgem. Para isso, entra em contato com uma antiga conhecida, a cafetina Rosa Cabarcas, e encomenda a menina.
Em todo o texto, a mistura de realidade e ficção é um dos pontos altos, levando o leitor a questionar: É possível sentir saudades do que você nunca viveu? Como resistir a um tempo de começo, meio e fim, atribuindo-lhe sentidos que, muitas vezes, o próprio tempo desconhece? O historiador Hayden White entende as narrativas históricas como ficções verbais. Para ele, o historiador “não pode mais ignorar a estreita relação entre história e mito. A história não é uma ciência porque não é realista, o discurso histórico não apreende um mundo exterior, porque o real é produzido pelo discurso”. White afirma que o historiador produz “construções poéticas”, sendo a linguagem o elemento que constitui sentido. Para ele, é inegável a influência do estilo literário do autor na escrita historiográfica, bem como dos recursos estilísticos empregados para destacar posicionamentos e seleções. Como retoma o teórico, os acontecimentos são neutros, isto é, não trazem em si nenhuma carga valorativa. No entanto, são convertidos em trágicos, emocionantes, cômicos, românticos ou irônicos pelo próprio enredo atribuído.
Para o nonagenário criado por García Márquez, atravessar décadas de fatos históricos e registrados não significa absorvê-los de uma única forma; em toda a trama, o velho homem é refamiliarizado com os acontecimentos vividos por meio de suas lembranças. A forma como o mundo se descortinou diante dos seus olhos quase centenários é vista de modo interpretativo, e não metódico e projetado. Essa mesma atmosfera pode ser sentida nos contos do italiano Antonio Tabucchi (1943–2012), reunidos no sugestivo livro “O tempo envelhece depressa” (2009), e no romance “Enquanto Agonizo” (1930), do norte-americano William Faulkner (1897–1962). Apesar de investirem em linguagens narrativas diferentes, as duas obras tocam a mesma questão no que diz respeito à memória e a construção de diferentes pontos de vista. É essa disputa entre relato e subjetividade que traça o contorno da narrativa histórica. A união entre história e literatura permite “delírios significativos”, epifanias que abrem espaço para o pensamento escapar do sistema dominante. O imaginário traz uma carga devastadora que parece sondar o vazio, enxergar nas trevas e escutar através dos portões fechados.
A “imanência”, termo usado por Deleuze, está em descobrir-se além das cortinas; é não ter medo, por exemplo, de se perder nos labirintos de ilusão de óptica criados por M. C. Escher (1898–1972) ou na beleza mórbida das pinturas do polonês Zdzislaw Beksinski (1929–2005) e seus humanos-esqueletos, árvores retorcidas e ambientes cercados pela névoa. É saber reconhecer traços da história na expressão subjetiva.
Relativity, de M. C. Escher (litografia) — 1953
A união da literatura e da história abre caminho para ver através das palavras, transformar pensamento em sensação e ser capaz de traçar linhas de fuga. Os sentidos da história não são neutros, objetivos e rigorosamente científicos. Eles são fluidos, optam por pontes e descobrem novas rotas. É preciso ter coragem para reconhecer que as “coisas têm dimensões que são intrínsecas ao valor que damos”, e que mascarar esse fato — como se tal atitude fosse crucial para manter a zona de conforto – só abre mais espaços, mais abismos, mais fossos. Como lembraria o jornalista e escritor brasileiro Daniel Piza (1970–2011): “Quanto mais escravizado pelo costume, mais o homem sonha com o clarão salvador”. Portanto, coragem! Vamos colocar nossos mortos à mesa e oferecer o banquete.