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  • A persistência da infância | Crônica

    A persistência da infância | Crônica

    No livrin­ho “Infân­cia”, o escritor J. Coet­zee con­ta que ele e seus irmãos se escon­di­am quan­do os par­entes do lado mater­no chegavam para vis­itá-los. Ele descreve a hipocrisia das gen­tilezas soci­ais e a ten­ta­ti­va da mãe em ensi­nar “bons mod­os” aos fil­hos. Fora do ambi­ente domés­ti­co, denun­cia o apartheid da África do Sul, dan­do como exem­p­lo sua exper­iên­cia esco­lar. Cri­anças não europeias, ou seus fil­hos, eram espan­cadas pelas europeias. Coet­zee con­tou numa palestra em Curiti­ba que seus livros pas­saram pelo cri­vo da cen­sura ofi­cial, mas foram lib­er­a­dos sob a ale­gação de que a lin­guagem eru­di­ta só seria enten­di­da pela elite letrada.

    O escritor moçam­bi­cano Mia Couto diz que a mãe pas­sa­va apuros com o pai, poeta, que não con­seguia aju­dar em nen­hum tra­bal­ho da vida domés­ti­ca. E ela reza­va para que não sur­gisse na família mais poet­as. Uma vez, man­dou o fil­ho à padaria, a algu­mas quadras de casa. No cam­in­ho, Mia se dis­traiu seguin­do uma bor­bo­le­ta e esque­ceu o que ia faz­er. Sen­ta­do na calça­da, pas­sou horas ven­do formi­gas. Em sua casa, uma con­fusão: o pai havia pas­sa­do mal. O meni­no ficou na rua até que, tarde da noite, quan­do lem­braram dele o foram bus­car. Encon­traram-no ain­da a obser­var o formigueiro.

    ( Desenho por: Gervasio Troche )
    ( Desen­ho por: Ger­va­sio Troche )

    Essas duas histórias me vier­am à cabeça, quan­do volta­va da con­sul­ta à min­ha médi­ca home­opa­ta. De repente, o ônibus parou. Lá atrás uma pas­sageira gri­tou: “o que acon­te­ceu?” Um bar­bu­do com camisa do Atléti­co respon­deu: “Quer saber o que acon­te­ceu? Quer mes­mo saber ? Veja aqui, já te mostro.” Remexeu na mochi­la e por alguns segun­dos, os pas­sageiros ficaram apreen­sivos. Como o sujeito demor­ou remex­en­do na mochi­la, um out­ro pas­sageiro, a seu lado, gri­tou “Vai demor­ar pra dar o tiro?” O ner­vos­in­ho acabou sacan­do da mochi­la uma bar­ra de banana-pas­sa. “Olha aqui a banana de dina­mite”, brin­cou, cain­do na gargalhada.

    Uma pas­sageira mudou de lugar, per­gun­tan­do por que o ônibus havia para­do. “Não sei”, respon­di. Ouvi o motorista ao celu­lar: uma car­reta blo­quea­va o trân­si­to. As cobrado­ras desce­r­am do ônibus e con­vi­daram o torce­dor do Atléti­co a aju­dar. “Sair daqui só na con­tramão”, disse o motorista. As cobrado­ras e o pas­sageiro blo­quear­am os car­ros, como se fos­sem guardas. Os três pare­ci­am cri­anças trav­es­sas brin­can­do de guardas de trân­si­to. Apoiamos o trio para poder con­tin­uar seguin­do viagem.

    As moças, coradas, e o torce­dor do Atléti­co retornaram. Alguém gri­tou que mais um pas­sageiro havia desci­do. Tin­ha que parar o ônibus pra ele reem­bar­car. Quan­do o ônibus voltou a nave­g­ar, me sen­ti estran­ha. Da janelin­ha do cole­ti­vo avis­tei uma mãe e uma fil­ha rindo uma com a out­ra, numa luta de saco­las de supermercado.

    Nos últi­mos tem­pos pen­so se é necessário preser­var a infân­cia em nós. Se, adul­tos, não cor­re­mos o risco de nos infan­tilizar. Para mim, ler ou escr­ev­er poe­sia é uma for­ma de cul­ti­var o lado cri­ança. Quan­to mais envel­he­ce­mos, a cri­ança se tor­na solitária. Algu­mas se sufo­cam comen­do choco­lates, indo à Dis­neylân­dia, ou pro­ferindo dis­cur­sos sobre caixotes de madeira. Out­ras, desen­ham histórias em quadrin­hos, recitam versin­hos, can­tam e tocam vio­lão. As que nun­ca mor­rem são as bufonas, como o torce­dor do Atléti­co. Que sabem que tudo na vida é pas­sageiro, menos quem con­duz a graça.

  • Crítica: Toy Story 3

    Crítica: Toy Story 3

    toy story 3

    Ape­sar de ser grande fã da Pixar, não sabia muito o que esper­ar do Toy Sto­ry 3 (Toy Sto­ry 3, USA, 2010), de Lee Unkrich. Mes­mo ela ser uma excessão à regra, a con­tin­u­ação cos­tu­ma ser sem­pre um desas­tre e acred­itei que não havia mais muito o que acres­cen­tar na história. Mas eu esta­va, ain­da bem, total­mente enganado.

    Des­ta vez Andy cresceu e já não brin­ca mais com seu brin­que­dos de infân­cia. Eles ficaram esse tem­po todo guarda­dos em um baú, até que com sua futu­ra mudança para fac­ul­dade, é pre­ciso decidir se vão ser joga­dos fora, doa­d­os ou guarda­dos no porão. Por fim acabam sendo lev­a­dos para Sun­ny­side, uma creche já con­heci­da da família.

    Sem­pre cheio de refer­ên­cia á out­ros filmes, Toy Sto­ry 3 con­segue diver­tir com um humor bas­tante inteligente e muitas vezes inusi­ta­do. Lem­bra da moda do met­ro­sex­u­al­is­mo, bas­tante divul­ga­da na mídia há pouco tem­po? Pois um per­son­agem novo, que aca­ba gan­han­do bas­tante atençao, é o que poderíamos chamar de met­ro­sex­u­al-mor: Ken, o namora­do da Bár­bie. Com tomadas de faz­er qual­quer um rolar no chão de tan­to rir, como: o encon­tro entre os dois onde dizem que são feitos um para o out­ro e ele mostra à ela a Casa dos Son­hos do Ken (com seu gin­gatesco guar­da-roupa) ou quan­do Buzz é lig­a­do no modo espanhol.

    Ao rep­re­sen­tar o mun­do imag­inário de uma cri­ança ao brin­car com seus brin­que­dos, você é total­mente trans­porta­do para quan­do você era cri­ança e um sen­ti­men­to de nos­tal­gia aparece, mas ao mes­mo tem­po fica claro que não há idade para que isto acon­teça. Bas­ta deixar sua imag­i­nação fluir e voltar a faz­er parte do seu dia a dia. Emb­o­ra isso já ten­ha sido feito nos filmes ante­ri­ores, des­ta vez há uma inten­si­dade bem maior.

    A qual­i­dade da ani­mação está se superan­do cada vez mais. O prob­le­ma das tex­turas está cada vez mais bem resolvi­do, pro­moven­do uma sen­sação de real­is­mo fan­tás­ti­ca. Depois do real­is­mo dos pêlos/cabelos con­segui­dos pela Dream­works em Como Treinar o Seu Dragão, o méri­to aqui ficou para a ambi­en­tação em 3D. Mes­mo ten­do assis­ti­do ele em uma sala 3D nor­mal (UCI Estação, em Curiti­ba) a sen­sação foi a mes­ma que tive no IMAX ven­do Avatar, de James Cameron. A escol­ha de man­ter a lim­i­tação dos movi­men­tos dos brin­que­dos reais em Toy Sto­ry 3, tornou seus movi­men­tos muito mais engraça­dos (como a Bar­bie e o Ken andan­do durinhos).

    As ani­mações da Pixar são para todas as idades. Cada faixa etária cap­ta mais ou menos cer­tas coisas, mas algo é cer­to: todas elas se divertem. Toy Sto­ry 3 é mais uma pro­va disso.

    Se alguém quis­er saber um pouco mais sobre a Pixar, recomen­do o doc­u­men­tário chama­do The Pixar Sto­ry, de Leslie Iwerks, onde você vê o que acon­tece por trás dos mon­i­tores de quem cria as ani­mações assim como a história e o dia a dia da empresa.

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    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=CHA3Kss72Ro