Há livros que te encantam do início ao fim, não só pela sua história mas também por conta das suas ilustrações e seus vários pequenos detalhes, onde você se vê o pegando inúmeras vezes apenas para tentar descobrir algo novo ou reler um trecho rapidinho. Foi exatamente esta experiência que tive depois de ler Contos de Lugares Distantes do escritor e quadrinista australiano Shaun Tan, lançado aqui no Brasil pela Cosac Naify e traduzido por Érico Assis.
Ele é composto de quinze contos, que variam desde alguns bem curtinhos (de uma ou duas páginas), até outros mais longos. Apesar de todos terem no mínimo um pé dentro do mundo fantástico, não são o tipo de histórias que você diria serem impossíveis de acontecer, pois são contadas como se fossem algo totalmente corriqueiro e também por usar elementos ou objetos presentes no dia a dia da maioria das pessoas.
é engraçado que hoje em dia, em que toda casa tem seu míssil balístico intercontinental, você mal se lembre dele.
Logo no primeiro texto já é possível perceber que este não é exatamente um livro para crianças, pois possui um humor mais sofisticado e muitas vezes acaba sendo meio assustador também. O autor contou em uma entrevista que se inspirou no estilo da série Além da Imaginação (The Twilight Zone) que assistia quando criança para escrevê-los, que acaba explicando bem esse clima meio fantástico e horripilante. Os adultos que acompanharam a série e apreciam belos desenhos, com certeza vão se deleitar nesta obra.

O feriado sem nome acontece uma vez por ano, geralmente por volta do fim de agosto, às vezes em outubro. É esperado tanto por crianças como por adultos com um misto de emoções: não é propriamente festivo, mas ainda assim é uma espécie de comemoração, cuja origem há muito se esqueceu.
Falando em desenhos, a primeira coisa que mais chama atenção no livro são todas as ilustrações magníficas. Folheando ele com mais calma, é possível também perceber que muitas das imagens não são simplesmente para ilustrar a narrativa, mas também fazem parte dela. Alguns contos são totalmente visuais, como no caso de “Chuva ao Longe” ou “Faça Seu Próprio Animal de Estimação”, que são feitos totalmente de recortes. Ao lê-los você volta a ser criança, com aqueles olhos admirados tentando ver todos os detalhes e possíveis histórias escondidas por trás de cada desenho. Sem falar em todo o cuidado na impressão do mesmo, que aliás é um dos grandes méritos dos livros da editora Cosac Naify.
Secretamente, eu estava ansioso para receber um visitante estrangeiro — tinha tantas coisas para mostrar a ele. Pelo menos uma vez eu poderia ser um expert da região, uma fonte de informações e de comentários interessantes. Por sorte, Eric era muito curioso e estava sempre cheio de perguntas. Porém, não era o tipo de pergunta que eu estava esperando.

Um dos contos mais marcantes é “alertas mas sem alarme”, que é bem ao estilo de Crônicas Marcianas (Editora Globo) do Ray Bradbury, onde cidadãos comuns recebem um míssil balístico para colocar em seus jardins, sentindo assim participantes da segurança nacional. Só que o tempo foi se passando e aqueles objetos gigantes apenas ficavam parados em seus quintais e aos poucos as pessoas foram descobrindo maneiras bem criativas da dar utilidade a eles.
A história mais bizarra e horripilante é “Os gravetos”, que conta a história de um lugar onde gravetos andam pelas ruas e enquanto as crianças mais novas tentam se divertir com eles vestindo roupas velhas como se fossem espantalhos, os garotos mais velhos adoram sair batendo e destruindo eles. Os adultos sempre os reprimem por mexer com eles, mas nunca explicam o por quê. Também há a bem divertida “nossa expedição” onde dois garotos intrigados com o que poderia ter nos lugares onde o mapa termina, vão em busca para saber se realmente não há nada além daquele limite do papel e acabam fazendo uma descoberta no mínimo intrigante.
Bem, a sua avó e eu nos casamos lá do outro lado dele, muito antes de vocês existirem. Claro, os casamentos eram bem mais complicados naquele tempo, não eram essas coisas melosas de hoje em dia. Para começar, a noiva e o noivo eram enviados para bem longe antes da cerimônia, e só tinham permissão para levar uma foto ao partir, nada além disso, até voltarem, o que podia demorar bastante tempo.

Ao falar de contos fantásticos talvez alguns lembrem do Coisas Frágeis do Neil Gaiman, mas os dois possuem um estilo de narrativa totalmente diferente. Tan é mais minimalista e relaciona as histórias mais ao cotidiano, enquanto Gaiman explora um lado mais místico e lendário.

Shuan Tan é formado em artes plásticas e literatura inglesa na Universidade da Austrália Ocidental. Iniciou sua carreira como ilustrador em revistas de ficção científica e lançou seu primeiro livro O Observador (The Viewer) em 1997. A ideia para Contos de Lugares Distantes surgiu de alguns pequenos rascunhos que mantinha em um caderno de desenhos, que pode ser visto abaixo em um vídeo que mostra o estúdio do autor. O site oficial do autor também é muito legal, seguindo bastante também o estilo de recortes e desenhos, vale a pena dar uma visitada.
httpv://www.youtube.com/watch?v=c9NCUydoJFk