Levei anos para assistir The Toolbox Murders (EUA, 1978). Sempre me passou a impressão de ser só mais um slasher, como tantos que pipocaram depois do sucesso de Halloween. Não que isso seja ruim, muito pelo contrário. Apenas não me parecia ter algo a mais. Juntando isso à falta de legendas disponíveis, o filme ficou encostado aqui por anos esperando a sua hora. Que chegou quando me toquei que The Toolbox Murders foi lançado meses ANTES de Halloween, no mesmo ano de 1978. E que gratíssima surpresa ao começar a rodar o filme!
O caso é que The Toolbox Murders se aproxima muito mais do ciclo de exploitations ultra-violentos dos anos 70, tipo os clássicos The Last House on The Left, I Spit on Your Grave e, principalmente, O Massacre da Serra Elétrica. Com este último, inclusive, divide o fato de ser ‘baseado em uma história real’, inclusive com toda a irrealidade da história real apresentada. Aliás, confesso que não tenho nenhuma pista sobre qual é a tal história, caso ela realmente exista. Mas o que importa é o filme, então voltemos a ele.
A ideia de um monstro que nada tem de sobrenatural, que não volta dos mortos. Pessoas comuns envolvidas em uma situação extraordinária, algo que sempre me fascinou, com o adicional que só o baixo orçamento e a criatividade setentistas conseguiam proporcionar.
O início de The Toolbox Murders é brutal. Uma série de mortes de mulheres dentro de um condomínio de apartamentos nas quais o assassino utiliza as ditas ferramentas da caixa do título. É tudo cru, com nítida falta de recursos, mas surpreendentemente eficiente. Martelo, pistola de pregos, furadeira (aliás, o clima do filme por algum motivo me lembrou muito, o tempo todo, de Driller Killer, obra-prima do Abel Ferrara) etc., tudo em uma espécie de precursor dos métodos que seriam utilizados em Sexta-Feira 13 dois anos depois. Curioso que uma das vítimas é interpretada por Kelly Nichols, muda e workaholic do cinema pornô dos anos 70 e 80 e que continuava na ativa no final dos anos 2000, do alto de seus quase 60 anos… Ao que me consta, este é seu único trabalho fora do ramo pornográfico. E sua personagem aparece única e exclusivamente nua. Boa sacada.
Um ponto que chama bastante a atenção durante esta primeira parte do filme é a escolha da trilha sonora dos assassinatos. Todos ocorrem com uma ‘música ambiente’, sempre algo pendendo para o country brega americano, sem nenhuma ligação com o que está acontecendo na tela.
Somente depois de terminada a série de assassinatos que começamos a conhecer os personagens. Mais especificamente, conhecemos a família de Laurie Ballard (Pamelyn Ferdin, cuja carreira foi quase que totalmente construída com participações na TV). E as apresentações param por aí, porque logo Laurie é seqüestrada pelo assassino e começa a mudança brutal de direcionamento de The Toolbox Murders.
O climão exploitation hardcore subitamente dá lugar a um thriller denso, arrastado. Os assassinatos param, os personagens são aprofundados e o arremedo de história apresentado até então começa a se desenhar com surpreendente fluidez. Passamos a acompanhar a tentativa do irmão de Laurie, Joey (Nicolas Beauvy, que também foi mais atuante na TV, mas participou do genial The Cowboys, de 1972, e foi a versão criança do Richard Harris como Rei Arthur no interminável e enfadonho Camelot), de descobrir o que aconteceu com ela.
Um pouco mais à frente no filme, vemos Laurie amarrada a uma cama enquanto o assassino, agora revelado, mas óbvio desde as primeiras cenas, lhe serve um café-da-manhã, cita a Bíblia e explica que está purificando o mundo com seus atos. OK. Ah, ele também explica que seqüestrou Laurie por ela lhe lembrar sua falecida filha.
Os últimos 40 minutos de The Toolbox Murders podem repelir o expectador casual de horror ou fanático por gore, pois são realmente arrastados. O foco principal muda da investigação para a psicose do assassino para a busca de Joey, mas sem se prender muito a qualquer um deles. Particularmente, achei fascinante a forma como as coisas foram conduzidas pelo diretor Dennis Donnely, neste que é seu único longa (dirigiu inúmeros seriados até meados dos anos 90, inclusive vários episódios de As Panteras e Esquadrão Classe A). Mesmo quando as coisas começaram a se arrastar, em momento algum The Toolbox Murders se tornou entediante, para mim.
No geral, um thriller extremamente válido, que merecia um reconhecimento maior do que o obtido. Não decepciona em nenhuma de suas vertentes, seja no exploitation ou no thriller, e tem um final incômodo e surpreendente. A última cena, que continua rodando enquanto sobem os créditos, me foi bem inquietante.
Boa direção, boas atuações (tem também o Cameron Mitchell, que esteve à margem de fazer sucesso nos anos 50 mas acabou virando figurinha fácil dos filmes B anos depois, geralmente em papeis perturbados), boa história. Ou seja, The Toolbox Murders é altamente recomendado.
Trailer:
httpv://www.youtube.com/watch?v=WGZJjfjUqN0