Author: Átila Joly

  • Crítica: [REC]³ Gênesis

    Crítica: [REC]³ Gênesis

    Em 2007, o primeiro [REC] (Espan­ha, 2007) meio que abalou qual­quer um lig­a­do ao cin­e­ma de hor­ror. Durante cer­to perío­do, foi assun­to de qual­quer con­ver­sa que desvi­asse para o tema, e com muito méri­to. Não era ino­vador, não era rev­olu­cionário, mas era uma abor­dagem difer­ente de temas bati­dos (found footage, zumbis etc.). A acla­ma­da recepção ger­ou o óbvio remake amer­i­cano, Quar­ente­na (Quar­an­tine, EUA, 2008), que é desnecessário, porém muito bem exe­cu­ta­do, e a ain­da mais óbvia sequên­cia, [REC] Pos­suí­dos ([REC]², Espan­ha, 2009), que divid­iu opiniões, até tem seus defen­sores, mas, para mim, é um fra­cas­so retumbante. 

    Com­preen­sív­el que os parâmet­ros definidos por [REC] eram muito altos, o que difi­cul­taria a vida de qual­quer con­tin­u­ação, mas a coisa é MUITO ruim. Várias séries, espe­cial­mente den­tro do hor­ror, viver­am fenô­meno semel­hante nos anos 70/80, com um bai­ta primeiro filme e sequên­cias ruins/irregulares, mas que ain­da guar­davam cer­to charme – muitas vezes pela total inap­tidão envolvi­da, mas OK

    E aí cheg­amos a [REC]³ Gêne­sis (Espan­ha, 2012)… Enquan­to os dois primeiros foram ambos dirigi­dos pela dupla Paco Plaze e Jaume Bal­a­gueró, o ter­ceiro fica inteira­mente a car­go do primeiro (Bal­a­gueró diri­girá soz­in­ho o já temi­do quar­to – e, queiram os deuses, últi­mo – episó­dio da série). E sim, con­fir­man­do o que eu já temia, a coisa con­segue ficar pior. 

    Só para deixar explíc­i­to, o tex­to a seguir con­tém spoil­ers. O que não faz mui­ta difer­ença num filme que pri­ma pela obviedade durante todos os seus menos de 80 min­u­tos (só uns 70 efe­ti­va­mente de filme e mais uns 8 de inter­mináveis créditos…).

    A história de [REC]³ Gêne­sis se pas­sa durante o casa­men­to do casal de pro­tag­o­nistas menos caris­máti­co que eu vi em muito tem­po, Clara (Leti­cia Dol­era, que, pelo menos, é boni­ta) e Kol­do (Diego Mar­tin). Logo no iní­cio do filme somos apre­sen­ta­dos ao tio que está com a mão enfaix­a­da porque foi mor­di­do por um cão no vet­er­inário que pare­cia estar mor­to. E a lig­ação deste [REC]³ Gêne­sis com os out­ros dois filmes da série ter­mi­na aí. 

    Por mais alguns min­u­tos, somos apre­sen­ta­dos a uma série de per­son­agens desin­ter­es­santes, até que, durante a fes­ta, o tal do tio resolve desen­volver os sin­tomas da con­heci­da infecção e começar a atacar. E aí surgem tam­bém uns out­ros zumbis ( zumbis, infec­ta­dos, dá igual) do nada, sabe-se lá como, aparente­mente vesti­dos como se fizessem parte da fes­ta, mas já infectados. 

    Se as coisas seguis­sem por esse cam­in­ho dos primeiros 20 min­u­tos, seria mais uma sequên­cia ruim, ape­nas. Mas não, as novi­dades pul­u­lam a par­tir daí. A história pas­sa a girar em torno casal, que parece ter um tipo de lig­ação cós­mi­ca tão forte que faz com que um sin­ta o out­ro quase que telepati­ca­mente. E, óbvio, durante a con­fusão ini­cial, eles se separam. 

    E o glo­rioso Kol­do vai parar numa igre­ja, onde já se refu­gia­ram alguns sobre­viventes, já que os infec­ta­dos não podem pis­ar em solo sagra­do e são feri­dos com água ben­ta. E, den­tro da igre­ja, ao ver uma está­tua de São Jorge, o herói tem a bril­hante ideia de se vestir como uma espé­cie de cav­aleiro tem­plário (???) para ir atrás de sua ama­da Clara, que ele desco­bre estar na sala de con­t­role do lugar após ela infor­má-lo, via aut­o­falante, que está grávi­da. Sur­preen­den­te­mente, ele con­segue con­vencer um out­ro sujeito a se fan­tasiar e ir com ele, aparente­mente para ensi­nar o cam­in­ho. Sujeito este que, como um bom camisa ver­mel­ha (Star Trek, lem­bram?), vai mor­rer na primeira oportunidade. 

    Mas a Clara não está soz­in­ha na tal sala de con­t­role, está com o padre que cel­e­bra­va o casa­men­to. E ele mata a chara­da na hora: os infec­ta­dos são, na ver­dade, uma espé­cie de anjos caí­dos. Assim sendo, bas­ta uma oração para que eles con­gelem e parem de atacar. Ou seja, os zumbis mais con­ve­nientes do mun­do! E tam­bém desco­b­ri­mos que, na ver­dade, todos são um só. E que, refleti­dos no espel­ho, todos eles são como a meni­na Medeiros do primeiro filme…

    E a Clara, óbvio, escapa de tudo que lhe acon­tece, com a aju­da de um sujeito fan­tasi­a­do de Bob Espon­ja (ou John Espon­ja, por causa dos dire­itos autorais), até que ela resolve virar badass zom­bie hunter, arru­ma uma moto­sser­ra, arran­ca um pedaço do vesti­do e começa a arregaçar com os zumbis. Tipo uma Alice do Res­i­dent Evil on drugs, mas com um visu­al híbri­do de Jill Valen­tine e Ash do Evil Dead. \o/

    Então, cheg­amos a cena do reen­con­tro, quan­do ela está fug­in­do por um túnel, depois de det­onar uns zumbis, que não só pas­sa bem abaixo da coz­in­ha do lugar, onde Kol­do aca­ba de enfrentar o tio do iní­cio da história com uma bat­edeira, mas que tam­bém tem uma lig­ação dire­ta com esta coz­in­ha, com esca­da e tudo! Os infec­ta­dos a seguem pela esca­da e, assim como começou, o ímpeto de matar some dela, e bate o deses­pero para que o casal con­si­ga abrir logo a grade que os sep­a­ra. E eles con­seguem, claro. E a grade fica lá aber­ta, e eles se esque­cem que os bichos eram sim capazes de subir tam­bém. Mas os infec­ta­dos aparente­mente des­en­canam e vão emb­o­ra, porque o casal tem tem­po de se bei­jar, faz­er juras de amor blá blá blá, até que a coz­in­ha seja infes­ta­da de zumbis (que vier­am de todo lugar, MENOS do túnel onde já estavam). 

    Daí pra frente, nos últi­mos min­u­tos, a coisa con­tin­ua indo ladeira abaixo, mas aí já é spoil­er demais. Não que acon­teça algo que real­mente val­ha a pena ser vis­to, mas…

    Resu­min­do, [REC]³ Gêne­sis não só é ruim, é pior do que eu sequer con­seguia con­ce­ber. E é claro que ele, assim como o segun­do, tam­bém terá seus defen­sores. Se eu já não os enten­do em relação ao [REC] Pos­suí­dos, nem sei o que pen­sar quan­do a este aqui. A ten­ta­ti­va de comé­dia é patéti­ca, o hor­ror não causa um úni­co sus­to, menos ain­da a sen­sação de descon­for­to per­ma­nente do primeiro, e o gore não acres­cen­ta nada. 

    Den­tre os prin­ci­pais prob­le­mas de [REC] Pos­suí­dos, talvez o mais incô­mo­do para mim ten­ha sido a frustra­da ten­ta­ti­va de se colo­car as questões reli­giosas, “bem con­tra o mal”, coisas do gênero. Sim, o primeiro filme já dava a dica de que a coisa seria mais ou menos assim, mas nada fica explíc­i­to, o que muito con­tribuía para a história. O segun­do escan­car­ou e jogou no ven­ti­lador. E o ter­ceiro ele­va isso a uma potên­cia constrangedora. 

    Há muito, MUITO tem­po eu não via um filme tão ruim. E olha que eu sou bem cha­to e gos­to de bas­tante porcaria… 

    Trail­er:

  • Three The Hard Way (1974), de Gordon Parks Jr.

    Three The Hard Way (1974), de Gordon Parks Jr.

    Não tin­ha como dar erra­do. Three The Hard Way (EUA, 1974) jun­ta três dos maiores nomes da história do blax­ploita­tionJim Brown, de Slaugh­ter (EUA, 1972), mas provavel­mente mais con­heci­do pela (óti­ma) par­tic­i­pação em Marte Ata­ca! (EUA, 1996); Fred Williamson, ou O Chefão de Nova York (EUA, 1973), mas lem­bra­do por Um Drink no Infer­no (EUA, 1996); e Jim Kel­ly, o Williams de Oper­ação Dragão (Hong Kong/EUA, 1973) – dirigi­dos pelo respon­sáv­el por um dos mais clás­si­cos filmes do gênero – Gor­don Parks Jr. dire­tor do inques­tionáv­el Super­fly (EUA, 1972). Infe­liz­mente, os nomes podem diz­er pouco para a grande maio­r­ia dos fãs de cin­e­ma hoje em dia. O que impor­ta é que o lega­do dos caras está por aí para quem se inter­es­sar. Williamson ain­da tra­bal­ha fre­neti­ca­mente no under­ground do cin­e­ma, Brown aparece pouco, mas não se aposen­tou, e Kel­ly parece ter se dis­tan­ci­a­do um pouco das telas. Parks, que, aliás, era fil­ho do lendário Gor­don Parks, que dirigiu Shaft (EUA, 1971), mor­reu cedo, em 1979. 

    Mas volte­mos ao que inter­es­sa, que é Three The Hard Way.

    Sem­pre achei o blax­ploita­tion um dos par­entes mais próx­i­mos do cin­e­ma de ação dos anos 80, ao lado dos filmes da Shaw Broth­ers. Talvez o blax­ploita­tion seja aque­le o tio bacana que usa ter­nos col­ori­dos, sei lá. Sei que Three The Hard Way deixa essa influên­cia mais clara que qual­quer out­ro exem­plar do gênero. Tem muito mais ação e vio­lên­cia do que era comum no gênero, com perseguições, tiroteios e o Jim Kel­ly dis­tribuin­do per­nadas toda hora. 

    A tra­ma é típi­ca daque­las que NUNCA se tornar­i­am real­i­dade no mun­do cin­e­matográ­fi­co hipócri­ta e meti­do a politi­ca­mente cor­re­to de hoje: supremacista bran­co pre­tende exter­mi­nar toda a raça negra con­t­a­m­i­nan­do a água com um vírus que não afe­ta os de ascendên­cia cau­casiana. E ele tem um exérci­to, um cien­tista e uma ban­deira que lem­bra um SS, e é inter­pre­ta­do pelo canas­trão Jay Robin­son, que foi o Calígu­la em Man­to Sagra­do (EUA, 1953), mas deve ser mais lem­bra­do por ter par­tic­i­pa­do de A Rain­ha Tirana (EUA, 1955). E neste Three The Hard Way atende pelo incrív­el nome de Mon­roe Feather…

    O grande plano de Mon­roe começa com a con­t­a­m­i­nação da água em Detroit, Los Ange­les e Wash­ing­ton – claro, as três cidades onde vivem os três heróis. Jim Brown é Jim­my Lait, que tem seu ami­go mor­to e namora­da seqüestra­da pelos vilões; Fred Williamson é Jag­ger Daniels, o per­son­agem menos apro­fun­da­do, e Jim Kel­ly é Mis­ter Keyes, mestre de caratê com roupas bril­hantes e col­ori­das. A primeira meia-hora de filme serve basi­ca­mente para con­hecer­mos os per­son­agens, com algu­mas cenas antológ­i­cas no meio (uma perseguição com tiroteio em um par­que de diver­sões e o espal­hafatoso carate­ca der­ruban­do poli­ci­ais no meio da rua – e tudo sendo com­ple­ta­mente igno­ra­do pelos transe­untes), mas depois que os três se jun­tam, Three The Hard Way se tor­na definidor de parâmet­ros den­tro do blaxploitation. 

    Difer­ente de out­ros filmes da época, o teor racial (ape­sar da história absur­da) é mín­i­mo. Three The Hard Way é mais cal­ca­do no espetácu­lo, nas cenas de ação, que na políti­ca e, por isso, talvez seja mais acessív­el para os menos ínti­mos do estilo. 

    E como todo exploita­tion que se preze, Three The Hard Way tem sua cena do peit­in­ho, quan­do três moto­queiras vestin­do roupas de couro col­ori­das são chamadas para tor­tu­rar um pri­sioneiro dos três heróis. A úni­ca razão de ser da tal cena é mostrar as três atrizes peladas – entre as quais está Irene Tsu, cujo nome pode não sig­nificar nada, mas provavel­mente já foi vista par­tic­i­pan­do em uma das inúmeras séries que fez ao lon­go da car­reira ou mes­mo de alguns filmes mais con­heci­dos, como Um Mil­ionário na Alta Roda (EUA, 1986).

    Enfim, demor­ei anos para ver Three The Hard Way e acabou se tor­nan­do um dos meus blax­ploita­tions favoritos. Como é comum nesse tipo de pro­dução, as imper­feições adi­cionam muito mais do que atra­pal­ham. As atu­ações pouco con­vin­centes, os car­ros que explo­dem sem moti­vo aparente, o fer­i­men­to à bala que é esque­ci­do depois de poucos min­u­tos etc., tudo fun­ciona tão bem que até parece estar lá de propósi­to! Um exce­lente filme para os ini­ci­a­dos e uma óti­ma por­ta de entra­da para os interessados. 

    Cena do filme:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=cYFgoh4YTE8

  • The Toolbox Murders (1978), de Dennis Donnely

    The Toolbox Murders (1978), de Dennis Donnely

    The Toolbox Murders, 1978, de Dennis DonnelyLev­ei anos para assi­s­tir The Tool­box Mur­ders (EUA, 1978). Sem­pre me pas­sou a impressão de ser só mais um slash­er, como tan­tos que pipocaram depois do suces­so de Hal­loween. Não que isso seja ruim, muito pelo con­trário. Ape­nas não me pare­cia ter algo a mais. Jun­tan­do isso à fal­ta de leg­en­das disponíveis, o filme ficou encosta­do aqui por anos esperan­do a sua hora. Que chegou quan­do me toquei que The Tool­box Mur­ders foi lança­do meses ANTES de Hal­loween, no mes­mo ano de 1978. E que gratís­si­ma sur­pre­sa ao começar a rodar o filme!

    O caso é que The Tool­box Mur­ders se aprox­i­ma muito mais do ciclo de exploita­tions ultra-vio­len­tos dos anos 70, tipo os clás­si­cos The Last House on The Left, I Spit on Your Grave e, prin­ci­pal­mente, O Mas­sacre da Ser­ra Elétri­ca. Com este últi­mo, inclu­sive, divide o fato de ser ‘basea­do em uma história real’, inclu­sive com toda a irre­al­i­dade da história real apre­sen­ta­da. Aliás, con­fes­so que não ten­ho nen­hu­ma pista sobre qual é a tal história, caso ela real­mente exista. Mas o que impor­ta é o filme, então volte­mos a ele. 

    A ideia de um mon­stro que nada tem de sobre­nat­ur­al, que não vol­ta dos mor­tos. Pes­soas comuns envolvi­das em uma situ­ação extra­ordinária, algo que sem­pre me fas­ci­nou, com o adi­cional que só o baixo orça­men­to e a cria­tivi­dade seten­tis­tas con­seguiam proporcionar. 

    O iní­cio de The Tool­box Mur­ders é bru­tal. Uma série de mortes de mul­heres den­tro de um con­domínio de aparta­men­tos nas quais o assas­si­no uti­liza as ditas fer­ra­men­tas da caixa do títu­lo. É tudo cru, com níti­da fal­ta de recur­sos, mas sur­preen­den­te­mente efi­ciente. Marte­lo, pis­to­la de pre­gos, furadeira (aliás, o cli­ma do filme por algum moti­vo me lem­brou muito, o tem­po todo, de Driller Killer, obra-pri­ma do Abel Fer­rara) etc., tudo em uma espé­cie de pre­cur­sor dos méto­dos que seri­am uti­liza­dos em Sex­ta-Feira 13 dois anos depois. Curioso que uma das víti­mas é inter­pre­ta­da por Kel­ly Nichols, muda e worka­holic do cin­e­ma pornô dos anos 70 e 80 e que con­tin­u­a­va na ati­va no final dos anos 2000, do alto de seus quase 60 anos… Ao que me con­s­ta, este é seu úni­co tra­bal­ho fora do ramo pornográ­fi­co. E sua per­son­agem aparece úni­ca e exclu­si­va­mente nua. Boa sacada. 

    Um pon­to que chama bas­tante a atenção durante esta primeira parte do filme é a escol­ha da tril­ha sono­ra dos assas­si­natos. Todos ocor­rem com uma ‘músi­ca ambi­ente’, sem­pre algo pen­den­do para o coun­try bre­ga amer­i­cano, sem nen­hu­ma lig­ação com o que está acon­te­cen­do na tela. 

    Somente depois de ter­mi­na­da a série de assas­si­natos que começamos a con­hecer os per­son­agens. Mais especi­fi­ca­mente, con­hece­mos a família de Lau­rie Bal­lard (Pame­lyn Fer­din, cuja car­reira foi quase que total­mente con­struí­da com par­tic­i­pações na TV). E as apre­sen­tações param por aí, porque logo Lau­rie é seqüestra­da pelo assas­si­no e começa a mudança bru­tal de dire­ciona­men­to de The Tool­box Mur­ders.

    The Toolbox Murders, 1978, de Dennis Donnely

    O climão exploita­tion hard­core subita­mente dá lugar a um thriller den­so, arras­ta­do. Os assas­si­natos param, os per­son­agens são apro­fun­da­dos e o arreme­do de história apre­sen­ta­do até então começa a se desen­har com sur­preen­dente flu­idez. Pas­samos a acom­pan­har a ten­ta­ti­va do irmão de Lau­rie, Joey (Nico­las Beau­vy, que tam­bém foi mais atu­ante na TV, mas par­ticipou do genial The Cow­boys, de 1972, e foi a ver­são cri­ança do Richard Har­ris como Rei Arthur no inter­mináv­el e enfadon­ho Camelot), de desco­brir o que acon­te­ceu com ela. 

    Um pouco mais à frente no filme, vemos Lau­rie amar­ra­da a uma cama enquan­to o assas­si­no, ago­ra rev­e­la­do, mas óbvio des­de as primeiras cenas, lhe serve um café-da-man­hã, cita a Bíblia e expli­ca que está purif­i­can­do o mun­do com seus atos. OK. Ah, ele tam­bém expli­ca que seqüe­strou Lau­rie por ela lhe lem­brar sua fale­ci­da filha. 

    Os últi­mos 40 min­u­tos de The Tool­box Mur­ders podem repelir o expec­ta­dor casu­al de hor­ror ou fanáti­co por gore, pois são real­mente arras­ta­dos. O foco prin­ci­pal muda da inves­ti­gação para a psi­cose do assas­si­no para a bus­ca de Joey, mas sem se pren­der muito a qual­quer um deles. Par­tic­u­lar­mente, achei fasci­nante a for­ma como as coisas foram con­duzi­das pelo dire­tor Den­nis Don­nely, neste que é seu úni­co lon­ga (dirigiu inúmeros seri­ados até mea­d­os dos anos 90, inclu­sive vários episó­dios de As Pan­teras e Esquadrão Classe A). Mes­mo quan­do as coisas começaram a se arras­tar, em momen­to algum The Tool­box Mur­ders se tornou ente­di­ante, para mim. 

    The Toolbox Murders, 1978, de Dennis Donnely

    No ger­al, um thriller extrema­mente váli­do, que mere­cia um recon­hec­i­men­to maior do que o obti­do. Não decep­ciona em nen­hu­ma de suas ver­tentes, seja no exploita­tion ou no thriller, e tem um final incô­mo­do e sur­preen­dente. A últi­ma cena, que con­tin­ua rodan­do enquan­to sobem os crédi­tos, me foi bem inquietante.

    Boa direção, boas atu­ações (tem tam­bém o Cameron Mitchell, que esteve à margem de faz­er suces­so nos anos 50 mas acabou viran­do fig­ur­in­ha fácil dos filmes B anos depois, geral­mente em papeis per­tur­ba­dos), boa história. Ou seja, The Tool­box Mur­ders é alta­mente recomendado. 

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=WGZJjfjUqN0

  • Crítica: Hobo With a Shotgun (O Vingador)

    Crítica: Hobo With a Shotgun (O Vingador)

    Crítica Hobo with a ShotgunPrimeira­mente, é inegáv­el que Hobo With a Shot­gun (EUA/CAN, 2011), de Jason Eisen­er, entre­ga com sobras aqui­lo que prom­ete. Aliás, prom­ete antes mes­mo de ser um filme de fato, des­de que ain­da era ape­nas mais um dos trail­ers fal­sos de Grind­house (EUA, 2007). Em tem­pos em que prati­ca­mente não podemos mais con­sid­er­ar qual­quer lon­ga como “o mais vio­len­to que já vimos”, porque tal car­go é suplan­ta­do por uma série de novos filmes a cada ano, Hobo With a Shot­gun cer­ta­mente colo­ca seu nome entre eles.

    E longe de mim con­sid­er­ar essa “com­petição” pela vio­lên­cia como uma coisa ruim. Con­sidero a vio­lên­cia estiliza­da como uma das coisas mais diver­tidas que o cin­e­ma pode nos pro­por­cionar e me posi­ciono rad­i­cal­mente con­tra as man­i­fes­tações con­tra os chama­dos “filmes vio­len­tos”. Claro que há casos e casos, há a vio­lên­cia fan­tás­ti­ca de um Machete (EUA, 2010) ou de um Kill Bill (EUA, 2003), enquan­to há aqui­lo que é gra­tu­ito e injus­ti­fi­ca­do de filmes que nada tem a diz­er, como O Alber­gue (EUA, 2005).

    Hobo With a Shot­gun se enquadra na primeira cat­e­go­ria. A vio­lên­cia pode, sim, ser gra­tui­ta, mas ela está ali muito mais para diver­tir que para chocar. E sim, fun­ciona, inegavel­mente. Mas infe­liz­mente, e talvez aí a cul­pa seja min­ha por ter deposi­ta­do esper­anças demais no filme des­de que ele começou a ser divul­ga­do, as coisas acabam não sendo tão boas como poderiam…

    O títu­lo é a mel­hor sinopse pos­sív­el para o que acon­tece nos pouco mais de 80 min­u­tos de Hobo With a Shot­gun: um mendi­go com uma esp­in­gar­da que resolve colo­car uma cidade cor­romp­i­da de vol­ta ao eixo. Rut­ger Hauer inter­pre­ta o per­son­agem prin­ci­pal, um mendi­go recém-chega­do à cita­da cidade que, logo em seus primeiros instantes, pres­en­cia uma exe­cução a céu aber­to per­pe­tra­da pelo “dono” da cidade, o traf­i­cante Drake (Bri­an Downey), que cul­mi­na com uma dança sen­su­al ban­ha­da pelo sangue que lit­eral­mente esguicha do cor­po decap­i­ta­do. É basi­ca­mente assim que somos intro­duzi­dos ao filme.

    Ao sal­var a vida de Abby (Mol­ly Dun­w­stowth), o Mendi­go é cas­ti­go pelos fil­hos de Drake e pela polí­cia cor­rup­ta da cidade. Depois dis­so, durante um assalto numa loja na qual esta­va, decide faz­er justiça na cidade e começa a ir atrás de cafetões, pedó­fi­los e todo e qual­quer tipo de desajus­ta­do, até chegar ao próprio Drake.

    Tudo o que acon­tece em Hobo With a Shot­gun é muito grá­fi­co e exager­a­do, e vai des­de muti­lação da mão com um cor­ta­dor de gra­ma a tiro no saco. Porém, tudo é TÃO exager­a­do que não chega a ser chocante, ain­da mais para os padrões cin­e­matográ­fi­cos atuais.

    Mas nem tudo são flo­res. O filme é diver­tido, é vio­len­to, o per­son­agem prin­ci­pal é caris­máti­co. OK. Mas fal­ta “algo”. Li comen­tários que cer­tos ele­men­tos ruins do cin­e­ma dos anos 70 são usa­dos proposi­tal­mente, mas não acho que ten­ha sido a mel­hor escol­ha. O expec­ta­dor não é real­mente apre­sen­ta­do a nen­hum dos per­son­agens e nem às relações entre eles. Não que o pano de fun­do seja extrema­mente necessário para o que o lon­ga se propõe (como eu disse ante­ri­or­mente, isso Hobo With a Shot­gun cumpre com sobras), mas no fim fica um cer­to vazio, o que, para mim, aca­ba sendo um pon­to neg­a­ti­vo que pesa bas­tante. Já os diál­o­gos ruins (aí sim, niti­da­mente proposi­tais) divertem por um tem­po, mas acabam cansan­do no desen­ro­lar da história.

    Rut­ger Hauer é con­vin­cente como o Mendi­go, mas o resto do elen­co, quase que total­mente for­ma­do por descon­heci­dos, não segu­ra a pete­ca em momen­tos impor­tantes da história. Talvez isso ten­ha a ver, tam­bém, com a direção do inex­pe­ri­ente Jason Eisen­er (este é prati­ca­mente seu primeiro lon­ga), que con­tribuiu para que falte o punch necessário ao filme. Se isso tam­bém foi proposi­tal, aí sim a escol­ha foi defin­i­ti­va­mente errada.

    No lado pos­i­ti­vo, a tril­ha sono­ra e o Tech­ni­col­or garan­tem a parte boa do climão exploita­tion, mas não fazem de Hobo With a Shot­gun uma exper­iên­cia tão boa quan­to pode­ria ser para os fãs deste tipo de cinema.

    Assisti Hobo With a Shot­gun queren­do adorá-lo, mas não con­segui. Me pren­deu, sim, da primeira à últi­ma cena e em momen­to algum me pare­ceu uma per­da de tem­po, mas eu que­ria muito que fos­se algo mais, como foi Machete (o out­ro – e bril­hante – spin-off de Grind­house). É o típi­co filme cujas opiniões a respeito diver­girão muito. Só por isso, acho que vale a pena assi­s­tir e tirar sua própria conclusão.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=6qLinsS4rjk

  • Os cinco melhores filmes de Zumbis

    Os cinco melhores filmes de Zumbis

    Zumbis. Uma pesquisa sobre lendas a respeito de tais criat­uras nos leva ao Haiti. Mais pre­cisa­mente, ao vodou, ou o vodu haitiano, como ficou con­heci­do no resto do mun­do, que é difer­ente do vodu da Louisiana e do de New Orleans, ape­sar de pos­suírem o mes­mo nome. Mas o vodu em si não está em dis­cussão aqui, então, ape­nas prossigamos.

    Segun­do o fol­clore que envolve este vodu haitiano, um bokor, que seria uma espé­cie de feiti­ceiro reli­gioso ou um pas­tor, pos­sui o poder de reviv­er os mor­tos, que, por sua vez, por não terem von­tade própria, estari­am sob o coman­do deste bokor. A estes mor­tos, dava-se o nome de zombis.

    O fol­clore que envolve estas histórias é riquís­si­mo, mas uma ráp­i­da pesquisa sobre pode nos levar a pági­nas que o expli­cam com muito mais pro­priedade do que eu pode­ria faz­er. Além dis­so, explicar cul­turas ter­ceiras não é o propósi­to deste tex­to. Dig­amos que isso foi ape­nas um back­ground dos pará­grafos seguintes.

    No iní­cio dos anos 30, o cin­e­ma de hor­ror pas­sa­va, talvez, por aque­la que foi sua tem­po­ra­da mais rica. A Uni­ver­sal lança­va suces­so atrás de suces­so, em sua maio­r­ia basea­d­os em obras clás­si­cas da lit­er­atu­ra. E em 1932, Zumbi Bran­co chega aos cin­e­mas. E começa­va um dos nichos mais explo­rados em todo o cin­e­ma de horror.

    A seguir, uma peque­na (e super­fi­cial) intro­dução ao glo­rioso mun­do dos zumbis, des­de os ser­vos sem alma até os adoráveis come­dores de cére­bros. Os filmes estão divi­di­dos em ordem cres­cente de importân­cia, ten­do como base úni­ca e exclu­si­va a opinião de um afi­ciona­do pelo gênero e a importân­cia destes filmes sobre sua vida, e não uma mega­lo­manía­ca pre­sunção de diz­er quais são ou não são aque­les que podem ser con­sid­er­a­dos como impor­tantes his­tori­ca­mente para todo o mundo.

    5 – Zumbi Bran­co (White Zom­bie, EUA, 1932). Como já cita­do, esta pro­dução amer­i­cana foi lança­da em 1932. Fil­ma­do total­mente nos estú­dios da Uni­ver­sal, mas lança­do pela Unit­ed Artists, Zumbi Bran­co, dirigi­do por Vic­tor Halperin e com o mito hún­garo Bela Lugosi no papel prin­ci­pal, con­ta a história do casal Neil Park­er e Madeleine Short, inter­pre­ta­dos por John Har­ron e Madge Bel­lamy (que ficaria mais famosa pela acusação de assas­si­nar seu amante do que por sua car­reira pro­pri­a­mente dita), em visi­ta a Charles, um ami­go que reside no Haiti. Charles encan­ta-se por Madeleine e resolve con­tratar os serviços de Mur­der Legendre (!!!), o per­son­agem de Bela, con­hece­dor do vodu e que pos­sui uma plan­tação total­mente oper­a­da por zumbis sob seu con­t­role, para que a jovem aceite se casar com ele. Segun­do Mur­der, a úni­ca for­ma de aju­dar Charles é trans­for­man­do Madeleine em zumbi, e isto é feito.

    A par­tir daí, a tra­ma, ape­sar de sim­ples, gan­ha fôlego. O filme tem um cli­ma incrív­el, ape­sar das fra­cas atu­ações de grande parte do elen­co. Mas temos um Bela Lugosi no auge de sua car­reira, naque­le que talvez seja seu mais icôni­co papel depois do imor­tal Conde Drácu­la. O filme foi lucra­ti­vo em seu lança­men­to e obteve boa respos­ta do públi­co, mas a críti­ca não se sat­is­fez (espe­cial­mente pelas atuações).

    Quase 80 anos pas­sa­dos des­de seu lança­men­to, hoje, ao menos sua importân­cia históri­ca é recon­heci­da por todos. Pode não ser um grande filme, tec­ni­ca­mente falan­do, mas merece ser con­heci­do por todos que tem algum envolvi­men­to com o cin­e­ma de hor­ror. E, lamen­tavel­mente, con­tin­ua inédi­to em DVD no Brasil.

    httpv://www.youtube.com/watch?v=tQV7wOg3hYQ

    4 – Zom­bie 2 (Zom­bi 2, Itália, 1972) A tradição do cin­e­ma ital­iano de copi­ar grandes suces­sos amer­i­canos começou com os épi­cos dos anos 50 e se esten­deu pelo spaghet­ti west­ern. Então, não foi nen­hu­ma sur­pre­sa quan­do Zom­bie 2, de Lucio Ful­ci, chegou aos cin­e­mas, pegan­do carona no suces­so do clás­si­co de George A. Romero Des­per­tar dos Mor­tos (EUA, 1978). O filme de Romero foi chama­do de ‘Zom­bi’ na Itália, daí a intenção de se lançar o filme de Ful­ci bati­za­do como se fos­se uma sequência.

    A ideia dos pro­du­tores, na ver­dade, era de faz­er uma cópia ital­iana do suces­so amer­i­cano (há até alguns diál­o­gos idên­ti­cos nos dois filmes), mas Ful­ci foi por out­ro cam­in­ho, ten­do se inspi­ra­do mais em out­ro clás­si­co, I Walked With a Zom­bie (EUA, 1943). A história se pas­sa em uma ilha cariben­ha, onde os nativos começam a voltar do mun­do dos mor­tos por meio de vodu e a ater­rorizar um médi­co rad­i­ca­do no local e um grupo de amer­i­canos. Super genéri­co, mas diver­tidís­si­mo e eficiente.

    Uma par­tic­u­lar­i­dade dos cineas­tas europeus, e espe­cial­mente ital­ianos, da época era a de uti­lizar atores de diver­sas nacional­i­dades, cada um falan­do na lín­gua que se sen­tisse mais con­fortáv­el, e depois dublar o filme em inglês e ital­iano para lança­men­to em ambos os mer­ca­dos. Em ger­al, tais dubla­gens acabavam hor­ren­das, e em Zom­bie 2 isso não é difer­ente. Há até um sen­ti­men­to de dis­tan­ci­a­men­to, taman­ha é a arti­fi­cial­i­dade trans­mi­ti­da pelos per­son­agens, que impede que nos importe­mos mais ou menos com alguns deles. O que real­mente prende (e MUITO) a atenção do expec­ta­dor de Zom­bie 2 é imag­i­nar como será a morte de cada um dess­es per­son­agens, e Ful­ci, con­heci­do como ‘O Poderoso Chefão do Gore’, não decep­ciona no quesito.

    A mel­hor palavra para definir Zom­bie 2 talvez seja ‘obri­gatório’. Tem difi­cul­dades téc­ni­cas, a cita­da dublagem, atores pouco con­vin­centes etc. Mas tem a clás­si­ca cena da per­furação do olho (mar­ca reg­istra­da de Ful­ci, aliás) e tem um zumbi lutan­do com um tubarão. Um zumbi. Lutan­do com um tubarão. Oras, do que mais você precisa?

    httpv://www.youtube.com/watch?v=BVD7v2L_roY&feature=related

    3 – Fome Ani­mal (Brain­dead, Nova Zelân­dia, 1992) Peter Jack­son nem sem­pre foi um pé no saco mega­lo­manía­co que faz filmes chatís­si­mos e inter­mináveis sobre anões de pés pelu­dos procu­ran­do uma por­caria de um anel. Um dia, ele foi um cineas­ta neoze­landês descon­heci­do e extrema­mente cria­ti­vo, que fez Trash – Náusea Total (NZL, 1987) e Fome Ani­mal . O segun­do, que está em dis­cussão aqui, se tornou prati­ca­mente um hors con­cours entre os fãs de horror/gore. E, par­tic­u­lar­mente, no meu caso foi a por­ta de entra­da do cin­e­ma extremo.

    Em Fome Ani­mal, Lionel (Tim­o­thy Balme) é um rapaz que mora com sua mãe super pro­te­to­ra, Vera (Eliz­a­beth Moody), que proíbe, entre out­ras coisas, que ele saia com garo­tas. Quan­do Lionel con­hece Paqui­ta (Diana Peñalver), sua mãe ten­ta impor mais ain­da seu con­t­role sobre ele. Mas as coisas começam a dar erra­do em uma visi­ta ao zoológi­co, quan­do Vera é mor­di­da por um ‘rato-maca­co da Suma­tra’. Ela adoece, sua orel­ha cai em um pra­to de sopa durante um jan­tar, ela morre e rap­i­da­mente vol­ta como um zumbi assassino.

    Então, o fes­ti­val do gore começa, e divide espaços com momen­tos hilários de humor negro. De um padre que luta kung-fu con­tra os zumbis (com o mem­o­ráv­el “I kick ass for the Lord”) a sexo entre zumbis, cul­mi­nan­do com o nasci­men­to do bebê dos mes­mos (que Lionel leva para um inesquecív­el pas­seio no par­que). Ah, Lionel tam­bém guar­da sua coleção de zumbis no porão de sua casa…

    O clí­max de Fome Ani­mal é um dos maiores ban­hos de sangue da história do cin­e­ma, onde o ataque se dá não só na for­ma de zumbis, mas tam­bém de um intesti­no e da mutação da mãe de Lionel.

    Um fato inter­es­sante sobre Fome Ani­mal é que o filme foi pro­duzi­do com aju­da do New Zealand Film Com­mis­sion, um órgão gov­er­na­men­tal. Se isso não faz com que seja uma super pro­dução, ao menos serve para difer­en­ciá-lo de tan­tos filmes de baixo cus­to pro­duzi­dos pelo mun­do. E é curioso saber que o gov­er­no de um país tomou parte na pro­dução do filme de zumbis mais alu­ci­na­do já produzido.

    httpv://www.youtube.com/watch?v=CwYb8BXofgE

    2 – A Noite dos Mor­tos-Vivos (Night of the Liv­ing Dead, USA, 1968). Indisc­u­tivel­mente, o mais impor­tante filmes de zumbis de todos os tem­pos, e um dos mais impor­tantes de todo o cin­e­ma de hor­ror. Só não é o primeiro da lista porque, como eu disse no iní­cio, a lista é exclu­si­va­mente min­ha, e o próx­i­mo filme teve um impacto maior que este em min­ha vida. O que não sig­nifi­ca que eu ten­ha qual­quer dúvi­da sobre a importân­cia e sobre o lega­do deA Noite dos Mor­tos-Vivos.

    Pode-se diz­er, sem deixar qual­quer tipo de som­bra para dúvi­das, que George A. Romero redefiniu a for­ma como o cin­e­ma tra­ta os filmes de zumbis. Em A Noite dos Mor­tos-Vivos, eles não são mais víti­mas do vodu servin­do a um propósi­to. Até há uma expli­cação para o fato de os mor­tos (ape­nas os mor­tos recentes) voltarem à vida, mas ela pas­sa longe de ser o foco do filme. Ago­ra, eles agem ape­nas por um instin­to: fome.

    O cenário é des­o­lador. Um grupo de sobre­viventes, sendo que seus inte­grantes pos­suem per­son­al­i­dades com­ple­ta­mente dis­so­nantes, se vêem iso­la­dos em uma casa, cer­ca­da por zumbis (que em momen­to algum são chama­dos de ‘zumbis’ ao lon­go do filme), em uma zona rur­al, sem nen­hum tipo de aju­da aparente, e lutam para sobre­viv­er durante a noite.

    Na ver­dade, durante boa parte de A Noite dos Mor­tos-Vivos, os mor­tos-vivos servem mais como back­ground do que como per­son­agens atu­antes. As ten­sões den­tro da casa crescem à medi­da que os desen­tendi­men­tos entre os sobre­viventes aflo­ram, fazen­do com que os vivos sejam inimi­gos piores que os mortos.

    Os mor­tos são, de fato, assus­ta­dores, em parte pelo fato de o filme ser todo em pre­to e bran­co, e a vio­lên­cia ser é extrema­mente grá­fi­ca para a época, com intesti­nos sendo devo­ra­dos e com a clás­si­ca cri­ança zumbi ata­can­do seus pais.

    É impres­sio­n­ante como Romero supera as lim­i­tações téc­ni­cas da pro­dução. O cli­ma claus­trofóbi­co é ampli­a­do por uma câmera que pouco se move durante o filme e por uma ilu­mi­nação som­bria, que colab­o­ra para o cli­ma de des­o­lação. Em momen­to algum há esper­ança. Não há um alen­to de que haja uma aju­da vin­da, há ape­nas as pes­soas tran­cadas den­tro de uma casa, sem condições de lutar ou mes­mo de escapar.

    Na época do lança­men­to de A Noite dos Mor­tos-Vivos, foram traça­dos parâmet­ros entre a for­ma como o gov­er­no se com­por­ta no filme e o com­por­ta­men­to do gov­er­no amer­i­cano durante a guer­ra do Viet­nã, na fal­ha em pro­te­ger suas pes­soas e na fal­ta de infor­mações. Romero nun­ca admi­tiu ter real­mente a intenção do teor políti­co da pro­dução, mas o mes­mo se repetiu em seus filmes seguintes, espe­cial­mente nas sequên­cias envol­ven­do seus mortos-vivos.

    A Noite dos Mor­tos-Vivos, repi­to, é o mais impor­tante de todos os filmes de zumbis, e um dos mais impor­tantes da história do hor­ror. Mas o car­in­ho espe­cial que ten­ho pelo próx­i­mo filme faz com que eu não pos­sa colocá-lo em posição nen­hu­ma da lista que não a primeira sem estar sendo injus­to comi­go mesmo.

    httpv://www.youtube.com/watch?v=spa7HH4DvuY


    1 – A Vol­ta dos Mor­tos-Vivos (The Return of the Liv­ing Dead, USA, 1985). No fim dos anos 80/início dos 90, não ten­ho condições de saber com certeza, A Vol­ta dos Mor­tos-Vivos foi exibido pela primeira vez na TV brasileira. Meu pai gravou, depois de uma árd­ua batal­ha com o vídeo-cas­sete, e alguns dias depois eu, cri­ança, colo­quei a fita no vídeo e assisti. E ali nascia uma paixão por zumbis que nun­ca mais arrefeceu.

    A raiz de A Vol­ta dos Mor­tos-Vivos é o livro de mes­mo nome, escrito por John Rus­so em 1977, que seria a sequên­cia dire­ta para os even­tos de A Noite dos Mor­tos-Vivos. Rus­so é co-escritor do roteiro orig­i­nal de A Noite dos Mor­tos Vivos, jun­to com George A. Romero. Quan­do os dois se sep­a­raram, Rus­so con­seguiu os dire­itos de qual­quer títu­lo envol­ven­do o nome ‘mor­tos-vivos’, o que forçou Romero a dar sequên­cia à sua saga colo­ca­do ape­nas ‘mor­tos’ no tit­u­lo (como em Des­per­tar dos Mor­tos (EUA, 1978) e Dia dos Mor­tos (EUA, 1985).

    A direção de A Vol­ta dos Mor­tos-Vivos ficaria por con­ta de Tobe Hop­per e Dan O’Bannon seria respon­sáv­el pela ver­são final do enre­do, mas Hop­per saiu para diri­gir Força Sin­is­tra (EUA, 1985) e O’Bannon ficou encar­rega­do tam­bém, pela primeira vez em sua car­reira, da direção. E não decepcionou.

    Com uma veia cômi­ca acen­tu­a­da, difer­ente da visão de Romero para seus mor­tos-vivos, A Vol­ta dos Mor­tos-Vivos tam­bém se foca em um grupo de sobre­viventes iso­la­do em uma casa, mas de maneira muito mais abrangente. Os zumbis aqui não se ali­men­tam de carne, mas sim de cére­bros (o que na antológ­i­ca dublagem brasileira rende os inesquecíveis gri­tos de “mioooo­los”).

    Em A Vol­ta dos Mor­tos-Vivos, o apoc­alipse zumbi se dá quan­do um tam­bor con­tendo um pro­du­to quími­co do exérci­to com a pro­priedade de reviv­er os mor­tos vaza em um depósi­to de mate­ri­ais hos­pi­ta­lares. Um dos respon­sáveis pelo vaza­men­to é Fred­dy (Thom Math­ews), cujo grupo de ami­gos, enquan­to espera que ele saia do tra­bal­ho, resolve pas­sar um tem­po no cemitério ao lado do depósi­to, onde se vêem frente a frente com os mor­tos-vivos depois que a coisa irrompe.

    Mas aqui, os zumbis são difer­entes. Eles aparentam ser inde­strutíveis, mes­mo depois de atingi­dos no cére­bro, e são capazes até de se comu­nicar. E tam­bém pos­suem uma maquiagem que os desta­ca dos demais filmes de zumbis pro­duzi­dos até então. O visu­al do filme, aliás, difer­ente de grande parte dos filmes do gênero, é cheio de cores e bril­hante, o que con­tribui para o tom mais leve da história em alguns momentos.

    Aliás, ape­sar deste tom menos sério de A Vol­ta dos Mor­tos-Vivos em com­para­ção aos filmes de Romero, há uma latente veia críti­ca aqui, em espe­cial dire­ciona­da ao com­por­ta­men­to do exérci­to amer­i­cano, o real respon­sáv­el pelo vaza­men­to da sub­stân­cia “cri­ado­ra” dos zumbis.

    A tril­ha sono­ra merece MUITO destaque, tam­bém. The Cramps, The Damned, 45 Grave e um som MATADOR de Roky Erick­son, den­tre out­ros. E as músi­cas se encaix­am muito bem no decor­rer do filme, inclu­sive dan­do um tom mais cômi­co e alu­ci­na­do em algu­mas cenas mais ten­sas, crian­do um exce­lente paradoxo.

    Os per­son­agens tam­bém são muito difer­entes dos vis­tos nos filmes de Romero, sendo mais cati­vantes e envol­ven­do mais o expec­ta­dor na história. Mas é impos­sív­el não sen­tir afeição pelos zumbis da história, muito mais par­tic­i­pa­tivos e úni­cos do que em qual­quer out­ro filme do gênero. Em uma cena antológ­i­ca, uma zumbi (ou metade dela) é “inter­ro­ga­da” a respeito do moti­vo pela qual eles se ali­men­tam de cérebros…

    Já se vão quase 20 anos des­de que vi este filme pela primeira vez, e o vi incon­táveis vezes, e (para mim) não perdeu nem um pouco de sua força. Out­ro que até hoje não rece­beu a dev­i­da atenção das dis­tribuido­ras nacionais.

    httpv://www.youtube.com/watch?v=A3ehWyT5LEk

    Claro que fal­tam filmes nes­sa lista. Muitos. Mas creio que estes cin­co sejam um bom começo para quem se inter­es­sa pelo estilo.

  • Crítica: Os Mercenários

    Crítica: Os Mercenários

    Os Mer­cenários (The Expend­ables, EUA, 2010) é o filme que teve cenas gravadas no Brasil e ren­deu tan­ta polêmi­ca entre os politi­ca­mente cor­re­tos daqui, quan­do Stal­lone fez piadas, de for­ma bem estúp­i­da e de gos­to extrema­mente duvi­doso, sobre o Brasil. Não defen­do o que ele fez, pelo con­trário, mas tam­bém não dá pra defend­er a onda de moral­is­mo que seguiu o ocorrido.

    Pre­ciso tomar algu­mas lin­has para expres­sar min­ha opinião sobre o assun­to. O brasileiro acha que é intocáv­el. Nós podemos criticar e apon­tar o dedo para tudo e todos, e tudo bem. Mas quan­do acon­tece o con­trário, somos bom­bardea­d­os com todos os meios de comu­ni­cação pos­síveis noti­cian­do e con­de­nan­do, além da facil­i­dade encon­tra­da para se ‘protes­tar’ pela inter­net. Quem se lem­bra do episó­dio de Os Simp­sons que ‘ridic­u­lar­iza­va’ o Brasil? Por todo lado apare­ce­r­am cam­pan­has de boicote etc., mas tudo bem rir dos episó­dios que ‘ridic­u­lar­izavam’ a Aus­trália, o Japão, a Irlan­da, todos os esta­dos americanos…

    Aliás, aqui den­tro mes­mo, vemos pro­duções que ape­nas ele­vam os clichês region­al­is­tas car­ac­terís­ti­cos do país, e rara­mente vemos qual­quer movi­men­tação a respeito, espe­cial­mente mas­si­va como ness­es casos internacionais.

    Encer­ran­do, Stal­lone foi muito infe­liz, mas isso gan­hou uma dimen­são muito maior do que dev­e­ria. E Stal­lone se retra­tou pub­li­ca­mente, e a dimen­são dada à retratação foi muito menor que aque­la dada ao comen­tário orig­i­nal. E o com­plexo de infe­ri­or­i­dade do povo brasileiro fica ain­da mais evi­dente. Não somos piores que eles, mas não somos mel­hores. Se podemos apon­tar, eles tam­bém podem. Apren­dam a con­viv­er com isso.

    Quan­to ao filme, como já disse no tex­to a respeito de Machete (2010, EUA), Os Mer­cenários é um filme de ação de macho. É um revival de tudo aqui­lo que víamos nas pro­duções dos anos 80, mas repag­i­na­do com as tec­nolo­gias mod­er­nas que tor­nam a ação muito mais frenéti­ca do que era pos­sív­el na época.

    O elen­co de Os Mer­cenários é este­lar para um filme do gênero, mes­mo sendo decep­cio­nante em relação ao que foi ini­cial­mente divulgado/especulado: Van Damme, Steven Sea­gal e Wes­ley Snipes foram con­vi­da­dos para papeis ou par­tic­i­pações no filme, mas ficaram de fora por vari­a­dos motivos (Van Damme e Steven Segal dec­li­naram do con­vite, e Wes­ley Snipes pos­sui uma ordem judi­cial que o impede de deixar os EUA sem aprovação de um côrte). Se tais par­tic­i­pações adi­cionaram qual­i­dade ao filme, é ques­tionáv­el, mas sem dúvi­da seri­am um atra­ti­vo! Sem os atores, o maior foco ficou, em Jason Stathan e, claro, em Sylvester Stal­lone, além de um sur­preen­dente papel impor­tante na mex­i­cana rad­i­ca­da no Brasil (e lim­i­ta­da) Gise­le Itié.

    Itié é San­dra, uma mer­cenária de uma peque­na ilha sulamer­i­cana con­tro­la­da por um dita­dor. Após uma incursão à ilha em uma mis­são, os mer­cenários do títu­lo fogem para sal­var suas vidas, aju­da­dos por ela, mas Bar­ney Ross (Stal­lone) resolve voltar para res­gatá-la, em uma espé­cie de redenção. Os Mer­cenários pos­sui um enre­do raso, mas que não atra­pal­ha um filme cuja real intenção é pren­der o expec­ta­dor pela ação.

    Além dos já cita­dos, o elen­co tam­bém tem Jet Li, Dolph Lund­gren (o tam­bém cita­do gigante soviéti­co de Rocky IVEUA 1985), o campeão mundi­al de UFC Randy Cou­ture, o wrestler Steve Austin e o ex-jogador de fute­bol amer­i­cano Ter­ry Crews. Há tam­bém uma par­tic­i­pação de Mick­ey Rourke, inter­pre­tan­do um ex-mer­cenário e tat­u­ador – par­tic­i­pação que pode­ria ser maior, porque Rourke sem­pre é sensacional.

    Mas o grande momen­to para os fãs de ação dos anos 80 é, sem dúvi­da algu­ma, o encon­tro (pela primeira vez em um filme) de Stal­lone, Arnold Schwarzeneg­ger e Bruce Willis, sem dúvi­da os três maiores expoentes do gênero. Willis é Mr. Church, o homem que con­tra­ta os mer­cenários para a mis­são na ilha, e o Gov­er­na­tor é o mer­cenário a quem o serviço é ofer­e­ci­do, jun­to com Stal­lone. A cena é cur­ta, mas o sufi­ciente para faz­er bril­har os olhos dos fãs de Ram­bo, do Exter­mi­nador do Futuro e de Duro de Matar, além de ter uma exce­lente pia­da de ocasião.

    Sylvester Stal­lone é sem dúvi­da um dos maiores heróis que eu já tive. O cara aju­dou os rebeldes no Afe­gan­istão, res­ga­tou os sol­da­dos no Viet­nã e venceu o gigante soviéti­co em ple­na Moscou. OK, não foi exata­mente ‘ele’, mas con­tin­ua sendo legal pra caramba.

    Então, Os Mer­cenários é um bom filme de ação. Claro que podia ser mel­hor, mas cumpre o prometi­do. Não perde o pique, tem explosões, tiros, brigas e algu­mas cenas engraçadas. E o cin­e­ma pre­cisa dis­so, também.

    Out­ras críti­cas interessantes:

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=ZhrThK3q6BA

  • Crítica: Machete

    Crítica: Machete

    Primeira coisa: Machete (EUA, 2010), de Robert Rodriguez, não é um filme para se levar a sério. Nasci­do como um trail­er fal­so de Grind­house (2007), é, sim, uma fan­tás­ti­ca hom­e­nagem ao exploita­tion dos anos 70. Tudo está lá, com exagero em todos os sen­ti­dos: na ação, nos one-lin­ers (com “Machete don’t text” sendo a fala mais espetac­u­lar de todo o filme), na vio­lên­cia e, espe­cial­mente, nos clichês. Mas, ao con­trário de Plan­e­ta Ter­ror (2007), tam­bém do mes­mo dire­tor, que mostrou a um públi­co novo o cin­e­ma B de hor­ror, Machete não serve como intro­dução ao exploita­tion, por se tratar de um filme de fato cal­ca­do no gênero.

    Dan­ny Tre­jo é o per­son­agem que dá nome ao filme (pro­tag­o­nista pela primeira vez na car­reira, aos 66 anos), um ex-Agente Fed­er­al que tem a vida destruí­da pelo chefe do trá­fi­co local, Tor­rez, um Steven Sea­gal sur­preen­den­te­mente bem escol­hi­do para o papel, e pela primeira vez inter­pre­tan­do um vilão. Anos depois, Machete é con­trata­do por um asso­ci­a­do de Tor­rez para assas­si­nar o senador McLaugh­lin, inter­pre­ta­do por um Robert de Niro per­feita­mente encaix­a­do no espíri­to do filme. Após desco­brir que o tra­bal­ho era na ver­dade uma armadil­ha, Machete pas­sa a bus­car vin­gança con­tra todos os envolvi­dos. Um enre­do sim­ples, óbvio, na exce­lente tradição do gênero nos anos 70!

    Com­ple­tam o esquadrão prin­ci­pal do elen­co de Machete: Cheech Marin (talvez o mel­hor per­son­agem do filme), Michelle Rodriguez (com­pe­tente), Jes­si­ca Alba (passáv­el) e Lind­say Lohan (insos­sa grande parte do tem­po, mas com pelo menos uma cena mem­o­ráv­el). Robert Rodriguez tem se espe­cial­iza­do em tra­bal­har com elen­cos este­lares e tem demon­stra­do cada vez mais com­petên­cia, sendo que mes­mo atores de qual­i­dade ques­tionáv­el não com­pro­m­e­tem o resul­ta­do final. O elen­co fem­i­ni­no, mes­mo for­ma­do por nomes de cer­to peso, é de qual­i­dade alta­mente ques­tionáv­el e em um primeiro momen­to parece escol­hi­do exclu­si­va­mente pela beleza – as atrizes pas­sam grande parte do filme em ‘tra­jes insin­u­antes’ – oi, 70’s exploitation.

    Um pon­to no elen­co de Machete que será nota­do pelos fãs do cin­e­ma de hor­ror, é a pre­sença de Tom Savi­ni como o assas­si­no de aluguel con­trata­do por Tor­rez. Savi­ni é o homem por trás do visu­al dos zumbis de George A. Romero, além de alguns filmes de Dario Argen­to, do primeiro Sex­ta-Feira 13 (1980), Creepshow (1982) e den­tre out­ros, além de ter feito pon­tas como ator em diver­sos filmes con­heci­dos no mun­do do hor­ror. Ele tam­bém dirigu o remake de A Noite dos Mor­tos-Vivos (1990).

    No final, Machete fun­ciona extrema­mente bem no que se com­pro­m­ete a faz­er: diver­tir. Não cabe ten­tar anal­is­ar o filme como sendo um “retra­to da luta do imi­grante lati­no”, mas sim como o exce­lente exploita­tion que é. A influên­cia grad­ual de Quentin Taran­ti­no, na obra de Robert Rodriguez, tam­bém está mais forte do que nun­ca, enraiza­da inclu­sive no con­ceito do filme. Dan­ny Tre­jo é sen­sa­cional como o anti-herói, na con­tramão dos mocin­hos boni­tos e bem arru­ma­dos que ten­tam nos enfi­ar goela abaixo nos filmes de ação atuais.

    Aliás, 2010 vem sendo de cer­ta for­ma um alen­to para aque­les que, como eu, cresce­r­am assistin­do os filmes de ação “de macho” dos anos 80. Mes­mo Machete sendo cal­ca­do no esti­lo dos 70 ele trouxe, jun­to com Os Mer­cenários (2010 – e sem “mim­i­mi Stal­lone xin­gou o Brasil”. Evolua, povo!), o ado­ra­do exagero de vol­ta ao grande públi­co. Tiros, bom­bas, facas, explosões… Apos­to que não fui o úni­co a sen­tir fal­ta dis­so tudo…

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  • Crítica: Deixa Ela Entrar

    Crítica: Deixa Ela Entrar

    As vezes eu real­mente não enten­do por que deter­mi­nadas obras não gan­ham a dev­i­da atenção da mídia brasileira. Deixa Ela Entrar (Låt Den Rätte Kom­ma In, Sué­cia, 2008), de Tomas Alfred­son, foi acla­ma­do pela críti­ca, venceu vários fes­ti­vais de cin­e­ma fan­tás­ti­co, foi indi­ca­do a tan­tos out­ros e, mes­mo assim, quase pas­sou bati­do pelos cin­e­mas brasileiros – além de ain­da não ter rece­bido a atenção de nen­hu­ma dis­tribuido­ra para o mer­ca­do doméstico.

    O per­son­agem prin­ci­pal da história é Oskar (Kåre Hede­brant), um garo­to de 12 anos, cole­cionador de mate­ri­ais sobre ser­i­al killers, que é o alvo preferi­do das provo­cações em sua esco­la. Ele vive com sua mãe na per­ife­ria de Esto­col­mo e con­cen­tra boa parte de seus dias em plane­jar uma vin­gança con­tra aque­les que o provo­cam na esco­la, mes­mo saben­do que nun­ca teria cor­agem para efe­ti­va­mente faz­er tal movimento.

    A vida de Oskar muda quan­do ele con­hece sua nova viz­in­ha, Eli (Lina Lean­der­s­son, em uma estreia fab­u­losa). Mes­mo que o espec­ta­dor sai­ba des­de o princí­pio que Eli é uma vam­pi­ra, a sutileza com que ela ten­ta mostrar sua situ­ação para Oskar chega a ser tocante, e é um dos pon­tos que fazem com que o cli­ma de Deixa Ela Entrar mes­mo que “arras­ta­do”, não deixe que per­camos o inter­esse no filme em momen­to algum, cul­mi­nan­do com a fan­tás­ti­ca cena em que Oskar final­mente entende – em parte – o que ela que­ria lhe dizer.

    A própria per­son­agem de Eli, aliás, é a força motriz de Deixa Ela Entrar. Ter­mi­namos com muito mais dúvi­das que respostas sobre quem ela de fato é, prin­ci­pal­mente sobre seu pas­sa­do e seu mis­te­rioso rela­ciona­men­to com Håkan (Per Rag­nar), o homem com quem se muda para o con­domínio de Oskar. E talvez este seja um dos meus maiores medos (den­tre tan­tos) em relação ao remake amer­i­cano: a ânsia de Hol­ly­wood por respostas que “com­pletem” seus roteiros.

    Tais respostas, aliás, são encon­tradas no livro de mes­mo nome de John Ajvide Lindqvist, de 2004 – sem tradução para o por­tuguês, ain­da. Para mim, se tra­ta de um dos mais fortes casos de com­ple­men­tari­dade entre cin­e­ma e lit­er­atu­ra. TODAS as respostas para as questões lev­an­tadas no filme estão em algum lugar do livro, mas, de algu­ma for­ma, elas real­mente não pre­cisavam estar no lon­ga. São estas respostas que, implici­ta­mente, fazem de Deixa Ela Entrar um dos filmes mais pesa­dos que tive a opor­tu­nidade de ver recen­te­mente. Poucos são os que tratam de questões tão per­tur­bado­ras, espe­cial­mente com cri­anças nos papéis principais.

    Tec­ni­ca­mente, Deixa Ela Entrar é impecáv­el. A fotografia é absur­da­mente lin­da, como é comum no cin­e­ma sue­co, e a direção de Tomas Alfred­son é exce­lente, fazen­do com que o filme não se torne cansati­vo em momen­to algum. A sen­sação que fica é de que nada do que é mostra­do na tela é desnecessário, algo cada vez mais raro no cin­e­ma, espe­cial­mente no fan­tás­ti­co. A con­sistên­cia das atu­ações dos dois atores prin­ci­pais (Hede­brant e Lean­der­s­son) tam­bém impres­siona, espe­cial­mente por se tratar do primeiro tra­bal­ho de ambos.

    O triste, nova­mente, é notar como ambas as obras (filme e livro) não gan­ham o destaque que mere­ci­am. Eu me sur­preen­do cada vez que entro em uma livraria com a quan­ti­dade de lança­men­tos sobre vam­piros que pegou carona na Saga Crepús­cu­lo, muitos dos quais eu nun­ca ouvi falar e – pos­so queimar a lín­gua um dia, mas acho difí­cil – pos­suem qual­i­dade alta­mente ques­tionáv­el, enquan­to um Deixa Ela Entrar, acla­ma­do nos mais diver­sos locais onde foi lança­do, é ignorado.

    Res­ta torcer para que o temi­do remake amer­i­cano, Let Me In, pre­vis­to para 1º de out­ubro de 2010, ao menos faça com que haja boa von­tade das dis­tribuido­ras nacionais em relação ao filme orig­i­nal, Deixa Ela Entrar.

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  • Crítica: Help Me Eros

    Crítica: Help Me Eros

    help me eros

    Lee Kang-shen é discípulo/protegido do cineas­ta Tsai Ming Liang (mais con­heci­do aqui por ter dirigi­do O Sabor da Melan­cia – um de seus tra­bal­hos mais fra­cos, aliás), ten­do apare­ci­do em todos os filmes do mes­mo. Dev­i­do a isto, não é de se estran­har semel­hanças e influên­cias de Tsai nes­ta segun­da incursão de Lee à direção, Help Me Eros (Bang bang wo ai shen, Tai­wan, 2007), como as tomadas lon­gas e estáti­cas e, mais evi­dente, a exper­i­men­tação com a sex­u­al­i­dade dos personagens.

    Como é comum nesse tipo de cin­e­ma avant garde asiáti­co, em momen­to algum somos intro­duzi­dos com clareza aos per­son­agens e somos força­dos a “deduzir” o papel de cada um den­tro da história. Jie (inter­pre­ta­do pelo próprio Lee) é um recém-demi­ti­do nego­ciante da bol­sa de val­ores fali­do, que cui­da de sua plan­tação caseira de cannabis, vende os obje­tos da casa para se sus­ten­tar e liga para uma espé­cie de Cen­tro de Val­oriza­ção da Vida tai­wanês, onde é comu­mente aten­di­do por Chyi. Jie anseia por mais con­ta­to com Chyi, ide­al­izan­do a mul­her de seus son­hos, enquan­to Chyi, com­plex­a­da por causa de seu peso, ape­sar de demon­strar cer­tos sen­ti­men­tos por Jie, ten­ta evi­tar o con­ta­to real.

    E Shin, a out­ra per­son­agem cen­tral da história, é uma vende­do­ra de nozes e cig­a­r­ros que tra­bal­ha semi­nua em um quiosque em frente ao aparta­men­to de Jie (aparente­mente, é uma profis­são tradi­cional em Tai­wan e as moças são chamadas de betel nut beau­ties). Shin e Jie se envolvem e sua primeira noite jun­tos cul­mi­na em uma absur­da cena de sexo (que acabou se tor­nan­do a imagem mais con­heci­da do Help Me Eros), bem à esco­la de Tsai Ming Liang.

    Mais cenas absur­das se suce­dem, até ser­mos mel­hor apre­sen­ta­dos à Chyi, aos prob­le­mas que ela enfrenta em seu casa­men­to e às razões que a levaram a engor­dar. Cer­ta cena dela em uma ban­heira, sobre os seus prob­le­mas con­si­go mes­ma, acabou se tor­nan­do icôni­ca, de tão inter­es­sante que ficou.

    Help Me Eros ter­mi­na da for­ma como se mostrou o tem­po todo: incon­clu­si­vo. Defin­i­ti­va­mente, um filme de difí­cil digestão. O tra­bal­ho de Lee na direção é inegavel­mente com­pe­tente, o que fica evi­dente na lin­da cena que fecha o filme. Ape­sar do dire­tor ain­da neces­si­tar bus­car uma iden­ti­dade própria, seus per­son­agens são con­vin­centes em suas aparentes super­fi­cial­i­dades, con­for­ma­dos com suas vidas miseráveis.

    Mas, mes­mo para os acos­tu­ma­dos aos exer­cí­cios do bizarro comuns ao cin­e­ma asiáti­co, a sen­sação que fica após Help Me Eros é, como o filme, incon­clu­si­va. Não há indi­cações conc­re­tas de quais serão os des­ti­nos dos prin­ci­pais per­son­agens, sequer há indi­cações conc­re­tas do que real­mente acon­te­ceu com os mes­mos. E não sabe­mos o que mais podemos extrair.

    É real­mente difí­cil deter­mi­nar se assi­s­tir a Help Me Eros é uma exper­iên­cia boa ou ruim, mas, sem dúvi­da, é válida.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=Zg0ib1ryCl4

  • Crítica: Sede de Sangue

    Crítica: Sede de Sangue

    sede de sangue

    Para começar, devo diz­er que os comen­tários a seguir dizem respeito ao tra­bal­ho de um diretor/escritor que admiro muito. Por­tan­to, são total­mente ten­den­ciosos e par­ci­ais. Aler­ta feito, continuemos.

    Sede de Sangue (Bakjwi, Cor­eia do Sul, 2009) é o mais recente filme de um dos mais bril­hantes cineas­tas da atu­al­i­dade. Chan-Wook Park já havia demon­stra­do evolução e amadurec­i­men­to mar­cantes ao lon­go de sua obra: recon­heci­do inter­na­cional­mente após o rel­a­ti­vo suces­so do fab­u­loso Joint Secu­ri­ty Area e a explosão com a (já clás­si­ca) Trilo­gia da Vin­gança (Mr. Vin­gança, Old­boy e Lady Vin­gança), ele já havia cau­sa­do sur­pre­sa com o lança­men­to de I’m a Cyborg, But That’s OK, que foge con­sid­er­av­el­mente de car­ac­terís­ti­cas de seus tra­bal­hos ante­ri­ores – e com isso mostra uma bem-vin­da ver­sa­til­i­dade em sua obra.

    Ago­ra, com Sede de Sangue, fica claro que a evolução é, sim, con­stante. Des­de a abor­dagem de assun­tos del­i­ca­dos aos aspec­tos téc­ni­cos, tudo no filme se mostra supe­ri­or às suas obras anteriores.

    Com o suces­so da chama­da Saga Crepús­cu­lo, tudo que envolve vam­piros aca­ba sendo vis­to com descrédi­to por grande parte dos apre­ci­adores de cin­e­ma com um gos­to min­i­ma­mente apu­ra­do, o que é total­mente com­preen­sív­el. Mas isso tam­bém pode faz­er com que se per­ca pelícu­las pre­ciosas, como no caso de Deixa Ela Entrar e Sede de Sangue – que não guardam semel­hança algu­ma entre si, exce­to o fato do vampirismo.

    No filme em questão, Sang-Hyeon é um padre vol­un­tário em um hos­pi­tal que se sub­mete a um exper­i­men­to bus­can­do encon­trar a cura para uma doença rara, mas durante a exper­iên­cia as coisas dão erra­do e o padre aca­ba se tor­nan­do um vam­piro após rece­ber uma trans­fusão de sangue (par­tic­u­lar­mente achei bril­hante este detal­he, que que­bra com o ordinário dos filmes sobre o assunto).

    A par­tir dis­so começa o prin­ci­pal con­fron­to de Sede de Sangue: o de Hyeon com sua própria crença. Ele desco­bre que ao se ali­men­tar com sangue, a doença con­traí­da na exper­iên­cia some, mas tem­po­rari­a­mente, o que faz com que ten­ha que lutar não ape­nas con­tra a fome, mas tam­bém con­tra o vírus. Como podem con­viv­er den­tro da mes­ma pes­soa o padre e o vam­piro? Em sua negação rel­a­ti­va a matar out­ro ser humano, mes­mo que para sua própria sal­vação, bus­ca for­mas alter­na­ti­vas e começa a se ali­men­tar do sangue de um paciente em coma do hos­pi­tal no qual tra­bal­ha­va, e mais para frente a aju­dar pes­soas que bus­cam o suicídio.

    No meio das descober­tas rela­cionadas à sua nova vida, ele se reen­con­tra com uma ami­ga de infân­cia, Tae-Ju, que vive infe­liz em uma casa onde é prati­ca­mente escrav­iza­da pelo mari­do e a sogra (que tam­bém fazem parte da infân­cia de Hyeon). E ao se ver apaixon­a­do pela ami­ga, novos con­fli­tos com a religião surgem para ele.

    E tudo isso se dá na primeira metade de Sede de Sangue. Na metade final somos apre­sen­ta­dos a assas­si­natos e alu­ci­nações que dão out­ro tom a história, que, por sinal, é cheia de revi­ra­voltas, mas sem nun­ca perder sua lin­ha cen­tral, extrema­mente coesa e forte.

    Há algum gore em Sede de Sangue, mas nada que vá sur­preen­der aque­les que já estão habit­u­a­dos ao cin­e­ma extremo ori­en­tal. O que sur­preende são as lin­das ima­gens que apare­cem a todo momen­to no filme, com cenas que ficam entre o sur­re­al e o absur­do, e que per­manecem na lem­brança por um bom tem­po após o seu tér­mi­no. Ele pos­sui uma exce­lente fotografia, que é ao mes­mo tem­po crua e delicada.

    E na ver­dade, é pos­sív­el encon­trar out­ra semel­hança com o genial Deixa Ela Entrar: toda a ação no desen­ro­lar do filme é, na ver­dade, um pano de fun­do para uma história de amor mais pro­fun­da do que podemos encon­trar em qual­quer dra­ma ou romance. Sede de Sangue é uma lin­da história ban­ha­da em sangue.

    Out­ra críti­cas interessantes:

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=2Cc16OX4zvg