Em um tempo onde cada vez mais as coisas estão sendo digitalizadas, uma discussão sobre esse novo formato e as suas possibilidades para a literatura, não poderia faltar na Bienal do Livro Rio 2011. Com o título Apresentando o Livro Digital, o assunto do Café Literário foi discutido pelos participantes Carlo Carrenho, Daniel Pinsky e Giselle Beiguelman mediados por Cristiane Costa.
Para desfazer já qualquer falsa expectativa, o título do bate-papo acabou sendo bastante infeliz pois para uma apresentação do livro digital, não houve nada de introdutório. O que acabou sendo ótimo na verdade, pois teria sido um desperdício se prender a essa parte de apresentação considerando a experiência dos participantes. Mas por conta dele, acabou atraindo também outro tipo de público que deve ter esperado algo totalmente diferente. Um exemplo disso foi uma das perguntas enviadas para a mediadora por um (ou mais) participantes sobre quantos livros era possível armazenar em um leitor de ebooks. Para quem já tem contato com esse mundo isso pode parecer tão dispensável quanto perguntar quantas músicas cabe em um MP3 player, pois é muito relativo dependendo da capacidade de armazenamento, mas para os ainda não iniciados isso acaba ainda sendo algo muito distante.
Mas vamos realmente ao que interessa, o conteúdo da conversa! Ainda é difícil sair do apocalíptico questionamento se o livro impresso vai morrer ou não quando se fala sobre o livro digital e aqui não foi muito diferente, mas o interessante foi que a opinião dos participantes era bem diversa a respeito do assunto.
Daniel Pinsky, sócio diretor da Editora Contexto, era dos três o mais marketeiro — intusiasta seria muito pouco — a respeito dos livros digitais, logo mostrando seu aparelho Kindle e citando várias de suas vantagens. Uma delas era o fato de que caso o mesmo quebrasse e ele tivesse que comprar um outro, teria somente o gasto do equipamento, pois os livros ainda estariam disponíveis nos servidores da Amazon, que é a empresa criadora e vendedora exclusiva dos títulos para o aparelho, e o acesso aos livros não seriam perdidos. Tudo muito legal e bonito, mas infelizmente ele não levou em consideração que a compra do aparelho aqui no Brasil não é nada acessível, pois só pode ser feita pelo site oficial da empresa que está em inglês e as compras são feitas em dólares, precisando então de um cartão de crédito internacional. Ou seja, a compra do aparelho já está limitada apenas para um grupo muito pequeno de pessoas.
Essa questão da dificuldade de acesso aos aparelhos acabou surgindo mais tarde, mas os três participantes concordavam na ideia de que daqui a alguns anos os tablets seriam tão populares quantos os celulares hoje em dia, que no início também não se achava que iria ser acessível ao grande público. Daniel também lembrou que com a aprovação recente de isenção fiscal para os tablets, o preço dos leitores de e‑books deverá diminuir. Ele acredita que os editores aqui no Brasil ainda estão muito apegados ao modelo tradicional de negócio, muitos deles nem conseguiam enxergar outros tipos de modelos, e que eles deveriam repensar isso, pois a maior parte do futuro será digital.
Em relação a essa mudança no mercado editorial, Carlo Carrenho, sócio-fundador da PublishNews, comentou que muitas vezes o que acontece hoje em dia no Brasil, justamente por esse problema de visão, é que quem acaba pagando o prejuízo do livro físico é o livro digital, por isso do seu preço ainda ser tão elevado, sendo as vezes até igual ao impresso, o que não faz nenhum sentido.
Entrando mais no assunto do livro digital e da Cultura Digital em si, Giselle Beiguelman, professora universitária e editora-chefe da revista Select, comentou que já houve inúmeras mortes e ressureições do livro eletrônico devido a sua precariedade e que agora com a chegada de aparelhos como Kindle e IPad isto está começando a mudar, apesar de ainda não serem ideais. Ainda afirma que a ideia do “fim do livro impresso” é uma visão meio apocalíptica, pois, como exemplo, o cinema não acabou com o teatro, a televisão não acabou com o cinema, … e por aí vai.
Carlo também concordou que o livro físico não vai acabar e comentou que todos os problemas que o livro digital resolvia para a editora, a impressão sob demanda (somente um livro de cada vez, não 5, 10 ou mais) resolvia grande parte deles. Esta maneira de impressão está cada vez ficando mais barata e nos Estados Unidos recentemente se tornou economicamente viável para o mercado.
Um tema que sempre vem junto com a discussão do livro digital é a questão da pirataria. Daniel se mostrou bastante preocupado com o assunto e defendeu que um dos papeis da editora seria proteger os livros digitais contra a cópia ilegal, usando DRMs e outros meios de segurança, para poder obter o seu lucro. Já Carlo e Giselle não achavam esta questão tão importante, sendo que ele inclusive acreditava que daqui a alguns anos não vai ter mais DRMs e afins.
A maior surpresa da conversa com certeza foi a Giselle, que tinha ótimas opiniões sobre o livro digital e também dele como um todo. Segundo ela, o livro impresso seria o objeto mais estável criado no campo da indústria cultural desde os seus primórdios. Ele possui o design mais perfeito da história, pois é o único que tem mais de mil anos e nunca precisou mudar.Também lembrou que pensar no livro digital seria pensar em todo o âmbito do digital e que tem coisas que fazem mais sentido estar numa versão do IPad, outras em um site e outras no meio impresso, mas que nenhum é melhor do que a outro. Além disso ainda comentou que o impasse agora seria pensar o livro além da página.
O interrogAção gravou em áudio todo esse bate-papo e se você quiser pode escutar aqui pelo site, logo abaixo, ou baixar para o seu computador e ouvir onde preferir.
Ouça a palestra completa: (clique no link abaixo para ouvir ou faça o download)
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