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  • Django Livre | Crítica

    Django Livre | Crítica

    Qual o taman­ho da difi­cul­dade de escr­ev­er sobre um filme de Quentin Taran­ti­no? Talvez uma das tare­fas mais inter­es­santes nos filmes do dire­tor é encon­trar todas as refer­ên­cias cin­e­matográ­fi­cas, de quadrin­hos, lit­er­atu­ra e a imen­sid­ão de influên­cias que ele con­segue mon­tar nos seus filmes e Djan­go Livre (Djan­go Unchained, E.U.A., 2012) não é nen­hu­ma exceção. Três anos depois de matar Hitler no cin­e­ma em Bas­tar­dos Inglórios (2009), o dire­tor man­tém o esti­lo do que eu chamaria de “vin­gança cole­ti­va” no seu novo lon­ga onde Djan­go, um escra­vo lib­er­to por um alemão, parte ao rumo de uma jor­na­da para sal­var sua ama­da Brunhilde.

    Taran­ti­no talvez seja o pai e o maior real­izador do que se con­hece como remix no cin­e­ma — a bela arte de usar algo pre­ex­is­tente dan­do um novo con­tex­to para aqui­lo — e faz isso com maes­tria. As refer­ên­cias são muitas e depende é claro do seu repertório, onde cada plano de câmera pode faz­er um sen­ti­do e gan­har mais sig­nifi­ca­do de acor­do com a lig­ação imag­i­na­da. Mas não se sin­ta desan­i­ma­do se você não é nen­hum mestre em cin­e­ma west­ern e seus deriva­dos, ou das out­ras áreas citadas, porque mes­mo assim você vai apre­ciar cada lance de Djan­go Livre. O que Taran­ti­no con­segue faz­er com a arte do remix é recri­ação de alto nív­el, colan­do todas as suas obsessões e dan­do vida a algo total­mente próprio, tor­nan­do o seu cin­e­ma adje­ti­vo dele mesmo.

    Djan­go Livre segue a mes­ma lin­ha de poder reden­tor dado ao espec­ta­dor. Por quase três horas você pode sen­tir cada gos­to da vin­gança de fatos que his­tori­ca­mente foram injus­tos, mas que na ficção fun­cionam de for­ma per­fei­ta e cal­mante. Jamie Foxx é Djan­go Free­man — mais um óti­mo tro­cadil­ho — um escra­vo lib­er­to que faz uma bela parce­ria com King Schultz (Christo­pher Waltz), um den­tista que tro­cou a bro­ca por alguns gatil­hos velozes e notas de rec­om­pen­sa. A Guer­ra Civ­il amer­i­cana está prestes a estourar e o sul dos E.U.A. man­tém firme sua econo­mia escrav­ocra­ta. Djan­go é um negro lutan­do por sua liber­dade, per­son­ifi­ca­da na sua esposa que tem nome de len­da alemã, e para chegar até ela não se pre­ocu­pa onde ten­ha que pis­ar e atirar.

    Nem sem­pre o espec­ta­dor nota todos os detal­h­es — e no caso dos filmes do Taran­ti­no é até perigoso diz­er que algo “ficou com a pon­ta sol­ta” — pois prati­ca­mente tudo em cena, cada resp­in­go de sangue, vem de algum can­to da memória ciné­fi­la do cara. Você provavel­mente notará a pre­sença de inúmeros west­erns clás­si­cos com câmeras focadas em ros­tos expres­sivos, due­los de armas, um anti-herói que age mais do que fala e claro, a vin­gança que nun­ca é tar­dia e sem­pre rec­om­pen­sado­ra. Claro que ess­es são os pon­tos de hom­e­nagem do dire­tor, ago­ra junte tudo isso a muito sangue, nen­hum perdão e um pouco de filosofia samu­rai e você terá um Taran­ti­no feliz.

    A refer­ên­cia mais clara para Djan­go Livre — que pode ser con­sid­er­a­do mais como uma bela hom­e­nagem — é o per­son­agem clás­si­co de Ser­gio Cor­buc­ci, no filme de 1966 estre­la­do por Fran­co Nero, que inclu­sive faz uma pon­tin­ha em Djan­go Livre. Neste o anti-herói tam­bém está em bus­ca de uma boa vin­gança e não deixa de faz­er isso sem uma tril­ha sono­ra agi­ta­da e bas­tante incon­stante, como tam­bém faz Taran­ti­no, man­ten­do a classe de optar por uma sonori­dade diver­sa e oscilante, hom­e­nage­an­do várias fig­uras e que vão des­de tril­has de west­erns clás­si­cos, pas­san­do por John­ny Cash e indo até um óti­mo mashup de James Brown com “The Pay­back” com a “Untouch­ables” do rap­per 2Pac.

    O encon­tro de “Djan­gos”

    Um dos trun­fos mais geni­ais nas nar­ra­ti­vas cri­adas por Taran­ti­no são os para­dox­os de humor negro que ele cria com seus per­son­agens, acom­pan­hado dos diál­o­gos ver­bor­rági­cos — no caso de Djan­go, um pouco exager­a­dos em alguns momen­tos — entre eles. Imag­ine você um negro escra­vo, de um sul extrema­mente racista e per­ver­so, sal­vo por um alemão que leva a vida como caçador de rec­om­pen­sas. Afi­nal, nada é tão pior quan­to os Amer­i­canos e nada mel­hor que um deles para falar dis­so. Observe a cena que sinal­iza uma primeira for­mação de uma pos­siv­el Ku Klux Klan, hilário no mín­i­mo. Um west­ern com o col­o­niza­do, no caso escrav­iza­do, metendo bala atrás da sua liber­dade. Sim, é isso que gosta­mos de ver.

    Quan­to ao elen­co de Djan­go Livre, o alemão Christo­pher Waltz é um dos caras da vez do Taran­ti­no. Des­de a sua aparição em Bas­tar­dos Inglórios ele vem sendo usa­do por vários out­ros como um “grande alemão mal­va­do”, mas em Djan­go Livre ele vol­ta com o mes­mo sen­so de humor negro do seu per­son­agem nazista, mas dessa vez corre com os lobos, ou mel­hor, corre com Djan­go. Aliás, ele e Jamie Foxx for­mam uma dupla e tan­to assim como sem­pre nos filmes do dire­tor, mocin­hos e ban­di­dos con­seguem ter uma mes­ma qual­i­fi­cação e não há como não men­cionar Leonar­do Di Caprio como Calvie Can­die, um ver­dadeiro sen­hor do Mis­sis­sípi e Samuel L. Jack­son como um negro com uma espé­cie de sín­drome de estocolmo.

    Esse tex­to que você leu não é uma críti­ca e espero que, se você tin­ha algu­ma dúvi­da, defin­i­ti­va­mente ten­ha se moti­va­do a ver Djan­go Livre. Provavel­mente terei que ver muitas vezes, além de retomar aos gos­tos taran­ti­nescos, para con­seguir arran­car boa parte das refer­ên­cias que cor­rem pela tela. Abaixo deixo a tril­ha sono­ra com­ple­ta do filme no Sound­cloud. Dê o play e vá prepara­do para expur­gar seus próprios demônios afi­nal, sem­pre sabe­mos que Taran­ti­no é um belo place­bo para boa parte dos nos­sos males.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=tivv135aGbc

  • Crítica: 400 Contra 1

    Crítica: 400 Contra 1

    400 contra 1

    O cin­e­ma vio­lên­cia-favela acabou viran­do uma refer­ên­cia fora do país para o cin­e­ma brasileiro. 400 con­tra 1 — A história do Coman­do Ver­mel­ho (Brasil, 2010), de Caco Souza, é mais um filme para entrar nes­ta lista, só que provavel­mente para o final dela.

    Basea­do na auto­bi­ografia de William da Sil­va Lima, um dos artic­u­ladores do Coman­do Ver­mel­ho, que é con­sid­er­a­do a maior facção crim­i­nosa do país, 400 con­tra 1 ten­ta relatar os acon­tec­i­men­tos que levaram a cri­ação do grupo. A locação prin­ci­pal é a prisão de Ilha Grande, onde William (Daniel de Oliveira) é lev­a­do pre­so pela segun­da vez. Ao chegar lá percebe que mui­ta coisa esta­va difer­ente, a prin­ci­pal mudança era que pre­sos nor­mais estavam sep­a­ra­dos dos pre­sos políti­cos. O Coman­do Ver­mel­ho era ini­cial­mente uma ten­ta­ti­va de mel­ho­rar as condições entre os pre­sidiários, con­stru­in­do prin­ci­pal­mente uma união entre eles.

    A história é con­ta­da de for­ma total­mente não lin­ear, na maio­r­ia das vezes com tro­cas ráp­i­das entre tomadas muito cur­tas rep­re­sen­tan­do anos difer­entes, que geral­mente tem a data anun­ci­a­da (mel­hor seria se não tivesse, pois aca­ba fican­do uma con­fusão para rela­cioná-las). 400 con­tra 1 tam­bém pos­sui uma nar­ração em off bem fra­ca, que se limi­ta a repe­tir o que está sendo exibido nas telas, tor­nan­do ela muito monó­tona e desnecessária. Aliás, este é o sen­ti­men­to que impera durante o filme inteiro, dev­i­do prin­ci­pal­mente a fal­ta de rit­mo dele. Out­ro ele­men­to que con­tribuiu para esse sen­ti­men­to foram os dial­o­gos pobres e dis­tantes do que seria dito em uma con­ver­sa colo­quial entre ess­es personagens.

    Em algu­mas tomadas de 400 con­tra 1, foi uti­liza­do vários ele­men­tos, como roupas e tril­has sono­ras mais “desco­ladas”, para se cri­ar um cli­ma cult, esti­lo Quentin Taran­ti­no, mas o resul­ta­do acabou fican­do uma imi­tação bara­ta e total­mente deslo­ca­da da maneira como o resto do filme foi pro­duzi­do. Isso sem falar que as cenas de assalto, perseguição e até as de vio­lên­cia den­tro da cadeia são tão vazias (mecâni­cas) que é difí­cil pro­duzirem algu­ma emoção mais forte.

    400 con­tra 1 aca­ba sendo muito cansati­vo e com difí­cil envolvi­men­to. É uma pena que, de tão con­fu­so, nem como apoio de um momen­to históri­co ele pode­ria servir.

    Para quem se inter­es­sa em filmes do gênero, recomen­do O Grupo Baad­er Mein­hof, de Uli Edel, que con­ta a história (basea­da em fatos reais) do grupo “ter­ror­ista” RAF, que bal­ançou toda a estru­tu­ra da Ale­man­ha. Inclu­sive eles tam­bém uti­lizaram o livro do Car­los Marighel­la, Man­u­al do Guer­ril­heiro Urbano, mostra­do em 400 con­tra 1, como um ele­men­to impor­tante para a orga­ni­za­ção do grupo.

    Out­ra críti­cas interessantes:

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=QBiURRHZcTY&feature=related

  • Crítica: Morgue Story — Sangue, Baiacu & Quadrinhos

    Crítica: Morgue Story — Sangue, Baiacu & Quadrinhos

    Morgue Story

    Ter­ror não é um gênero muito explo­rado pelo cin­e­ma brasileiro, e quan­do é geral­mente con­segue pouquís­si­ma divul­gação e suporte/fomento para a sua pro­dução, cain­do sem­pre no rótu­lo de cin­e­ma B. Morgue Sto­ry (Brasil, 2009), de Paulo Bis­ca­ia Fil­ho, com­pro­va que se é pos­sív­el pro­duzir um óti­mo filme, com ele­men­tos de ter­ror trash de qual­i­dade, sem pre­cis­ar de inves­ti­men­tos grandiosos (exatos cen­to e vinte e seis mil e qua­tro­cen­tos reais) e em pouquís­si­mo tem­po (onze dias).

    Ana Argen­to (Mar­i­ana Zanette), uma car­tunista (cujo nome é uma hom­e­nagem ao cineas­ta Dario Argen­to) de rel­a­ti­vo suces­so com suas HQs que tem como per­son­agem um zumbi caol­ho, Tom (Ander­son Faganel­lo), um catalép­ti­co que vende seguros, e Doutor Daniel Tor­res (Lean­dro Daniel Colom­bo), um médi­co legista com méto­dos e gos­tos bas­tante pecu­liares, são os per­son­agens prin­ci­pais que, pelo aca­so do des­ti­no (ou não), se encon­tram em um necrotério. Com um enre­do muito bem con­struí­da e mon­ta­da, com várias revi­ra­voltas e flash­backs, é pos­sív­el acom­pan­har cer­tos even­tos pela óti­ca de cada per­son­agem, que aca­ba tornando‑a ain­da mais diver­ti­da. Isso sem falar em algu­mas cenas de quadrin­hos ani­madas, que dão um toque espe­cial ao longa.

    Morgue Sto­ry foi basea­do em uma peça de teatro homôn­i­ma muito bem suces­si­da, pela Vig­or Mor­tis, que faz pesquisa em cima do teatro de hor­ror. Ape­sar da atu­ação dos per­son­agens beirar muitas vezes ain­da o teatral, ao exagero dos dial­o­gos, uma car­ac­terís­ti­ca típi­ca de filmes exploita­tion, a fil­magem con­seguiu romper a bar­reira dos pal­cos e o resul­ta­do ficou bem cin­e­matográ­fi­co. A qual­i­dade da imagem é óti­ma, o que não cos­tu­ma ser muito fre­quente em gravações dig­i­tais, mas por con­ta do abu­so de efeitos espe­ci­ais, para dar uma impressão de filme anti­go com câmera amado­ra, o resul­ta­do final foi um pouco prej­u­di­ca­do de tão over que ficou.

    Morgue Sto­ry é engraça­do não só pelas situações/personagens que beiram ao absur­do e efeitos pra lá de trash, mas prin­ci­pal­mente dev­i­do aos diál­o­gos, com um humor áci­do e sar­cás­ti­co, que lem­bram os filmes do Taran­ti­no. Resu­min­do: uma óti­ma exper­iên­cia, tan­to para quem pro­duz­iu quan­to para quem assiste, do cin­e­ma brasileiro.

    Con­fes­so que quan­do assisti ao trail­er de Morgue Sto­ry pen­sei que só con­seguiria vê-lo amar­ra­do com uma parafer­nália esti­lo a do Laran­ja Mecâni­ca, onde é impos­sív­el fugir e fechar os olhos. Mas eu esta­va com­ple­ta­mente engana­do. E se você teve a mes­ma sen­sação após o trail­er, não desista, vale a pena!

    Como o filme está com uma divul­gação lim­i­ta­da, a exibição do mes­mo em algu­mas cidades está sendo feito prin­ci­pal­mente pela con­ver­sa entre os exibidores e o públi­co, e o espec­ta­dor pode ser fun­da­men­tal nesse proces­so de divul­gação. Se con­hecer algu­ma exibido­ra local que pode­ria estar inter­es­sa­da no filme, entre em con­ta­to com a respon­sáv­el pela dis­tribuição do mes­mo, Diana Moro da Vig­or Mor­tis, para ver a pos­si­bil­i­dade de exibição.

    Out­ra críti­cas interessantes:

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=E4MrFkjc7Gs