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  • Crítica: Natimorto

    Crítica: Natimorto

    Lourenço Mutarel­li é um dos escritores mais inter­es­santes e híbri­dos da lit­er­atu­ra atu­al e Nati­mor­to (Brasil, 2011), dirigi­do por Paulo Mach­line, é a adap­tação do segun­do livro deste escritor con­heci­do pela den­si­dade e iro­nia de suas obras.

    Um homem e uma mul­her numa pro­pos­ta de tentarem viv­er suas vidas, lit­eral­mente, num quar­to de hotel. Os per­son­agens se resumem no homem (Lourenço Mutarel­li), uma espé­cie de pro­du­tor musi­cal e a mul­her (Simone Spo­ladore), uma can­to­ra de ópera. Enquan­to o cotid­i­ano da relação vai se con­stru­in­do, eles pas­sam a dis­cu­tir, entre cig­a­r­ros e cafés, seus futur­os através da asso­ci­ação de embal­a­gens de cig­a­r­ro e car­tas do Tarô.

    O enre­do de Nati­mor­to se foca neste con­vívio claus­trofóbi­co, exem­pli­f­i­can­do de for­ma muito inter­es­sante o sufo­ca­men­to das relações. Os dois per­son­agens podem sair o momen­to que quis­erem da situ­ação pro­pos­ta, mas não há a ini­cia­ti­va. Ele por não acred­i­tar na vida fora do quar­to e sen­tir que sua vida se resume em lamen­to, café e cig­a­r­ros e ela por ter a neces­si­dade de alguém que ali­mente a sua per­spec­ti­va de existên­cia, ou seja, uma relação extrema­mente simbiótica.

    Antes de ser con­heci­do pela sur­preen­dente obra e bem suce­di­da adap­tação de O cheiro do Ralo, Lourenço Mutarel­li era famoso pelos seus quadrin­hos obscuros e reple­tos de um humor negro incon­fundív­el. Além dis­so, o paulista tam­bém é con­heci­do na lit­er­atu­ra con­tem­porânea pelas idioss­in­cra­cias e por con­stru­ir diál­o­gos inteligentes pau­ta­dos por movi­men­tos de câmeras-nar­ra­ti­vas que vem e vão durante as cenas literárias.

    O fato de Mutarel­li usar recur­sos de roteiro para escr­ev­er seus romances não sig­nifi­ca que as adap­tações de seus tra­bal­hos, para o cin­e­ma, devam sem­pre ser trans­postas de for­ma lit­er­al. Há detal­h­es na nar­ra­ti­va literária que surtem efeito aos olhos do leitor mas, quan­do pas­sadas para uma nar­ra­ti­va de imagem, elas aparentam serem mais lon­gas ou fazem pouco sen­ti­do num deter­mi­na­do plano. Na adap­tação de Nati­mor­to, ocor­reu isso algu­mas vezes, como, por exem­p­lo, nos lon­gos diál­o­gos reple­tos de reflexões, numa espé­cie de bate e vol­ta con­si­go mes­mo, do per­son­agem sociofóbi­co inter­pre­ta­do pelo próprio Mutarel­li. Os lon­gos diál­o­gos no lon­ga se tor­nam, em algum momen­tos, um pouco cansativos por ocu­parem difer­entes tem­pos do que ocorre na nar­ra­ti­va literária. No livro, os dis­cur­sos se desen­volvem em muitas pági­nas, enquan­to no filme eles são suprim­i­dos a uma cena do roteiro.

    Por out­ro lado, out­ras situ­ações se encaixaram per­feita­mente, como em muitos momen­tos onde os planos seguem à risca as descrições do livro em que o nar­rador apon­ta a câmera para a boca de deter­mi­na­do per­son­agem, como se o leitor — ago­ra espec­ta­dor — final­mente pudesse enten­der deter­mi­na­da situ­ação descri­ta no livro.

    Em Nati­mor­to há pou­cas cenas exter­nas, o que aca­ba fazen­do a atenção se voltar para as inter­pre­tações, como a do próprio escritor que se mostra inse­guro no íni­cio do filme mas que, com o pas­sar do tem­po, se tor­na uma pre­mis­sa psi­cológ­i­ca do per­son­agem. A aparên­cia miú­da e ner­vosa de Mutarel­li con­funde, de for­ma muito inter­es­sante, o cri­ador e a criatu­ra. Já Spo­ladore faz um papel que acred­i­to com­bi­nar com ela, pos­suin­do uma voz forte e um olhar irôni­co cabív­el à personagem.

    Nati­mor­to é uma exper­iên­cia inter­es­sante para o cin­e­ma nacional que vem apo­s­tan­do em tra­bal­ho menos hiper­re­al­is­tas e con­fig­u­ran­do asso­ci­ações com a lit­er­atu­ra fei­ta no pre­sente. Mes­mo para os desacos­tu­ma­dos a um cin­e­ma com mais diál­o­gos e exper­i­men­tal, o filme vale o ingresso.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=PfoHx-kHUhQ

  • Crítica: Não se pode viver sem Amor

    Crítica: Não se pode viver sem Amor

    Histórias e vidas que se entre­cruzam não são novi­dade no cin­e­ma e em Não se pode viv­er sem Amor (Brasil, 2011), o dire­tor Jorge Durán já joga as car­tas dizen­do que não pre­tende rein­ven­tar o esti­lo nar­ra­ti­vo e sim ver de out­ros ângu­los o entre­laça­men­to das relações humanas. O lon­ga, que parte de um esti­lo mais exper­i­men­tal, surge trazen­do tendên­cias bem difer­entes do cos­tumeiro cin­e­ma hiper­re­al­ista do país.

    Gabriel é um garo­to de 10 anos que vive com Roseli no inte­ri­or do Rio de Janeiro. Os dois, deci­di­dos a encon­trar o pai do meni­no, partem na véspera do Natal para a cap­i­tal numa saga de encon­tros e des­en­con­tros em bus­ca dele. A tra­jetória da dupla vai ser par­til­ha­da com out­ros per­son­agens em um Rio de Janeiro urbano e caóti­co onde todos estão em bus­ca de algo.

    Jorge Durán é con­heci­do pelos roteiros com con­teú­dos bem enga­ja­dos social­mente e con­sid­er­a­dos clás­si­cos do cin­e­ma nacional dos anos 80 como Pixote — a lei do mais fra­co e Lúcio Flávio, Pas­sageiro da Ago­nia. Mais tarde tra­bal­hou como dire­tor em lon­gas como o pre­mi­a­do Proibido Proibir onde já se con­tor­na­va um esti­lo de entre­laça­men­to de per­son­agens soci­ais. Em Não se pode viv­er sem Amor o dire­tor chile-brasileiro con­tin­ua no esti­lo do últi­mo lon­ga, mas dan­do um con­torno que beira mais para um real­is­mo-fan­tás­ti­co onde situ­ações cor­riqueiras e fan­ta­siosas fun­cionam como ele­men­tos fun­da­men­tais para que a real­i­dade se torne mais suportáv­el de se encarar.

    A fotografia, assim como as atu­ações e pro­dução em ger­al de Não se pode viv­er sem Amor, são muito inter­es­santes. O filme tem uma pega­da bem ao esti­lo lati­noamer­i­cano, não focan­do situ­ações soci­ais que nor­mal­mente caem no sen­sa­cional­is­mo como, por exem­p­lo, um assalto na per­ife­ria do Rio de Janeiro se tornar uma ação exis­ten­cial­ista e não mera­mente uma con­se­quên­cia crua e social.

    Aparente­mente, há uma fal­ta de lóg­i­ca na nar­ra­ti­va que não se pre­ocu­pa em nen­hum momen­to em cumprir lin­has de raciocínio. Segun­do o próprio dire­tor Jorge Durán, Não se pode viv­er sem Amor é um filme que tra­ta da sobra nos rela­ciona­men­tos e, prin­ci­pal­mente, da fal­ta do sen­ti­men­to que segue o títu­lo, o amor. Por­tan­to, partin­do desse pon­to de vista de que a pre­ocu­pação está nas fal­tas, o filme cumpre o papel fug­in­do da nar­ra­ti­va clás­si­ca e beiran­do para um cin­e­ma mais de sen­sação e experimentos.

    O elen­co de Não se pode viv­er sem Amor chama atenção por con­tar com nomes que vêm apare­cen­do con­stan­te­mente nas pro­duções como Simone Spo­ladore e Fabi­u­la Nasci­men­to. Mas, ao mes­mo tem­po, parece que nen­hum dos atores se desta­ca muito, não sendo isso um prob­le­ma mas ape­nas uma lacu­na na pro­pos­ta do lon­ga. O que inco­mo­da nas atu­ações é o meni­no inter­pre­ta­do por Vic­tor Nave­ga Mot­ta, em muitos momen­tos se apre­sen­ta num papel um pouco força­do e até típi­co de atu­ações de primeira viagem mas aca­ba não com­pro­m­e­tendo o longa.

    Não se pode viv­er sem Amor pode causar sen­sações adver­sas na plateia, mas vale o ingres­so para aque­les que pref­er­em exper­i­men­tar rumos difer­entes de dra­matur­gia fílmi­ca, se pro­pon­do a novos ques­tion­a­men­tos no entorno da ficção.

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=-Xr8TuzuK1A

  • Crítica: Elvis e Madona

    Crítica: Elvis e Madona

    crítica elvis e madonaSão poucos os filmes de comé­dia român­ti­ca que con­seguem sair um pouco do padrão do gênero. Elvis e Madona (Brasil, 2010), dirigi­do por Marce­lo Laf­fitte, faz da inver­são de opções sex­u­ais dos per­son­agens prin­ci­pais, o grande chama­riz para o seu lon­ga sair do lugar comum.

    Elvis (Simone Spo­ladore) é uma moto­ci­clista que son­ha em ser fotó­grafo e em uma de suas entre­gas como “moto­girl” de uma piz­zaria, con­hece Madona (Igor Cotrim), uma cabel­ereira que son­ha em pro­duzir um show de teatro. Deste encon­tro inusi­ta­do, entre uma lés­bi­ca e um trav­es­ti, nasce uma história de amor nada convencional.

    Em Elvis e Madona temos todos os clichês das comé­dias român­ti­cas, mas por traz­er essa roupagem difer­en­ci­a­da, con­segue des­per­tar o lado cômi­co deles. Ape­sar dis­so, não traz nada mais inusi­ta­do, ou inteligente, sobre o assun­to. Graças a uma tril­ha sono­ra bem pre­sente e agi­ta­da, muitas situ­ações do lon­ga se tor­nam menos cansativas do que real­mente seri­am se não hou­vesse esse recur­so. Inclu­sive, uma de suas músi­cas é “Reflexo” da ban­da Beep-Polares, que é lid­er­a­da pelo próprio Igor Cotrim.

    O foco do filme é mes­mo a con­strução e o desen­volvi­men­to do amor entre esse dois per­son­agens, sem faz­er qual­quer ques­tion­a­men­to ou apro­fun­da­men­to em relação a opção sex­u­al de cada um deles. Ape­sar de em pou­cas cenas de Elvis e Madona haver um pre­con­ceito de out­ros per­son­agens, des­de incom­preen­são á repul­sa ficar mais aparente, essas situ­ações são rap­i­da­mente igno­radas ou concluídas.

    Elvis e Madona é um filme mais para diver­são, bem cin­e­ma pipoca, que ques­tiona com o con­ceito de casal mais usu­al, além é claro de tam­bém mex­er na feri­da do pre­con­ceito de muitos. Se você esta­va esperan­do algo mais ques­tion­ador e pro­fun­do sobre a questão de gêneros, este não é o lon­ga que você esta­va procurando.

    Após a exibição do filme no 7º Fes­ti­val de Verão do RS de Cin­e­ma Inter­na­cional, hou­ve uma con­ver­sa com o ator Igor Cotrim, que falou um pouco sobre como foi sua preparação para o papel e tam­bém como hou­ve a pre­ocu­pação de não faz­er algo que ficas­se car­i­ca­to ou este­ri­oti­pa­do, além de out­ros detal­h­es sobre a pro­dução do longa.

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    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=SUqDKzzxzgM