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  • Estrevista com Lau Siqueira, Vássia Silveira e Marilia Kubota

    Estrevista com Lau Siqueira, Vássia Silveira e Marilia Kubota

    Os poet­as Lau Siqueira, Vás­sia Sil­veira e Marília Kub­o­ta encon­traram-se no últi­mo dia 24 de out­ubro em Curiti­ba e repetem a dose no próx­i­mo dia 05 de dezem­bro em Flo­ri­anópo­lis e no dia 06 em Joinville, para realizar o lança­men­to de seus livros de poe­sia “Livro Arbítrio” (Casa Verde, 2015), “microp­o­lis” (Lumme Edi­tor, 2014) e “Febre-Terçã” (Off Flip, 2013), os três pub­li­ca­dos por peque­nas edi­toras. Reuni­mos os autores nes­ta entre­vista para um pingue-pongue de ideias sobre poe­sia e a aven­tu­ra das edições inde­pen­dentes e uma reflexão sobre a função social da poesia:

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    Vás­sia Sil­veira, Lau Siqueira e Marília Kubota

    Por que mes­mo não sendo autor ini­ciante, você edi­tou seu livro por uma peque­na editora?

    Vás­sia Sil­veira: Porque não me atrai essa lóg­i­ca do mer­ca­do das grandes edi­toras. Não ten­ho inter­esse em aper­tar, de for­ma automáti­ca, como crit­i­ca­va Chap­lin em “Tem­pos Mod­er­nos”, os para­fu­sos des­ta máquina. E muito menos ser um deles. O prob­le­ma é que essa lóg­i­ca é tão per­ver­sa que mes­mo algu­mas edi­toras peque­nas acabam sucumbindo a estraté­gias que mostram cer­to despre­zo, desre­speito pelo autor — quan­do, do pon­to de vista da peque­na edi­to­ra, ele não é um nome “vendáv­el”, não faz parte de pan­elas, não tem cacife para con­cor­rer a edi­tais do gov­er­no nem está incluí­do no mun­do das feiras literárias. O que me faz pen­sar que o cam­in­ho está no arte­sanal e na força da cole­tivi­dade, em ini­cia­ti­vas onde o autor é tam­bém um faze­dor de livros. Acho fan­tás­ti­co, por exem­p­lo, o movi­men­to car­tonero na Améri­ca Lati­na! Ele rompe com toda essa lóg­i­ca de mer­ca­do, é cul­tur­al, políti­co, social, filosó­fi­co, poéti­co e de resistência.

    Lau Siqueira: As peque­nas edi­toras são, atual­mente, o prin­ci­pal cam­po de batal­ha da lit­er­atu­ra con­tem­porânea. O mer­ca­do edi­to­r­i­al está por demais con­cen­tra­do e as grandes edi­toras estão transna­cional­izadas. Não se inter­es­sam por lit­er­atu­ra brasileira. Menos ain­da pela lit­er­atu­ra con­tem­porânea. Se limi­tam, no máx­i­mo, à repub­li­cação dos canôni­cos. O que se vê pre­dom­i­nar nas grandes livrarias é uma lit­er­atu­ra estrangeira de baixa qual­i­dade ou mes­mo livros de auto-aju­da. As peque­nas edi­toras vêm cumprindo um papel impor­tan­tís­si­mo na con­dução da lit­er­atu­ra e espe­cial­mente da poe­sia con­tem­porânea. Com rarís­si­mas exceções, a lit­er­atu­ra brasileira con­tem­porânea tem pas­sa­do “muito bem, obri­ga­do” por fora das grandes edi­toras e até mes­mo por fora do mer­ca­do for­mal do livro. Não acho isso ruim. Pois o mer­ca­do do livro é algo extrema­mente per­ver­so, mafioso. Nós não exis­ti­mos para eles e eles não exis­tem para nós. E a vida continua.

    Marília Kub­o­ta: “microp­o­lis” é meu ter­ceiro livro de poe­mas. Escre­vo des­de os 15 anos, mas demor­ei para pub­licar o primeiro de livro poe­mas, “Sel­va de sen­ti­dos”, pro­duzi­do pela artista Jus­sara Salazar, em selo de sua auto­ria, o Água-forte Edições, em 2008; o segun­do foi “Esperan­do as bár­baras”, pub­li­ca­do pela Blanche, de Curiti­ba, em 2012. A Lumme é con­heci­da pela pub­li­cação de boa poe­sia, brasileira e estrangeira. Optei por esta edi­to­ra por causa de seu catál­o­go e qual­i­dade no tra­bal­ho de edição de Fran­cis­co San­tos. Se pudesse, gostaria de ser pub­li­ca­da pela Cosac Naify ou Record, mas sei que atual­mente só pagan­do um agente literário ou fazen­do lob­by se con­segue entrar numa grande editora.

    Você acha que poe­sia não vende, como reza a lenda?

    Vás­sia Sil­veira: Acho que quem lê poe­sia, com­pra poe­sia. Ago­ra é claro, vive­mos em uma sociedade onde o con­sumo está cada vez mais vin­cu­la­do ao mar­ket­ing. E no caso do livro parece que as estraté­gias têm que par­tir tam­bém do autor: o cara (ou a cara) tem que ser bom (ou boa) em mar­ket­ing pes­soal. Isso pra mim é um prob­le­ma, sabe? Porque sou meio bicho do mato e não ten­ho dis­posição para cri­ar um per­son­agem fora da literatura.

    Lau Siqueira: Não vende? Como assim? Baude­laire con­tin­ua venden­do. Fer­nan­do Pes­soa con­tin­ua venden­do. Drum­mond con­tin­ua venden­do. Sem­anal­mente são lançadas dezenas de livros de poe­sia no país inteiro. Alguns com óti­mos índices de ven­da. A pesquisa Retratos da Leitu­ra no Brasil, nos mostra que em algu­mas regiões, como a região do Pajeú (PE), a poe­sia é mais pop­u­lar que livro reli­gioso. Essa história de “poe­sia não vende” é que é uma len­da. É cer­to que ninguém está enrique­cen­do com ven­da de livro, mas diz­er que poe­sia não vende é uma blas­fêmia. Vende sim! O que não há é um úni­co autor venden­do demais. Há um cer­to equi­líbrio. Ain­da não está sendo pos­sív­el excur­sion­ar pela Europa com nos­sos livros, mas já é pos­sív­el via­jar para Curiti­ba e Flo­ri­anópo­lis, por exemplo.

    Marília Kub­o­ta: Lemins­ki uma vez escreveu num ensaio que os poet­as devi­am reju­bi­lar-se porque poe­sia não vende. Não vende porque é um inuten­sílio, não serve a ninguém nem a nada, a não ser para dar praz­er a quem cria e a quem apre­cia. Tem o mes­mo val­or de um bei­jo, o ato sex­u­al, con­tem­plar saguis no Par­que Bar­reir­in­ha ou matar o tra­bal­ho para ir ao cin­e­ma. Hoje, quan­do tudo, até a nos­sa opinião e gos­tos se trans­for­maram em mer­cado­ria para as empre­sas pon­to­com, a poe­sia segue como peça de resistên­cia. O mer­can­til­is­mo ten­ta a todo cus­to com­prar o poeta, espe­cial­mente o ini­ciante, que se deslum­bra com prêmios, para­tex­tos literários e a mídia. Mas a poe­sia resiste, diverte-se à margem do sis­tema, encar­na­da em pal­haços como o per­former Hélio Leite, que poucos críti­cos doutores con­sid­er­ari­am poeta, mas até se tornou per­son­agem de Adélia Pra­do. Glau­co Mat­toso, Ricar­do Cha­cal, Alice Ruiz, Leila Mic­co­l­is, Nicholas Behr, Dou­glas Diegues, Jose Koz­er, Rey­nal­do Jimenez são a evo­cação da graça, seguin­do a máx­i­ma de Oswald de Andrade: a ale­gria é a pro­va dos 9. Se não existe diver­são não é poe­sia. Vender ou não vender não faz parte dos ócios do poeta.

    poeta Marília Kubota
    Marília Kub­o­ta

    Que estraté­gias os poet­as devem usar para dis­tribuir seu livro?

    Vás­sia Sil­veira: Olha, min­ha exper­iên­cia não aju­da a respon­der esta questão. A úni­ca coisa que enten­do de dis­tribuição é o que fiz com o “Febre Terçã”: saí dis­tribuin­do, lit­eral­mente, entre ami­gos e leitores de poesia.

    Lau Siqueira: Acho que a prin­ci­pal estraté­gia é a ven­da dire­ta. Faz­er tardes, noites,manhãs de autó­grafo. Olhar no olho do leitor. Usar as redes soci­ais para dis­tribuí-lo nacional e inter­na­cional­mente. Os esque­mas de dis­tribuição nas redes de livraria são char­mosos, mas extrema­mente des­fa­voráveis aos poet­as em todos os sen­ti­dos. Bus­car os lugares alter­na­tivos é a prin­ci­pal estraté­gia. Mon­teiro Loba­to já fazia isso nos anos 30. Escreveu uma car­ta para com­er­ciantes do país inteiro com a seguinte per­gun­ta: “você quer vender, tam­bém, uma coisa chama­da livro?” Com isso abriu mais de 2.000 pos­tos de ven­da para os seus livros, em armazéns, far­má­cias, esta­b­elec­i­men­tos diver­sos espal­ha­dos no Brasil. A cul­tura alter­na­ti­va, aliás, pos­sui um mer­ca­do bem gen­eroso e razoavel­mente democráti­co espal­ha­do pelo Brasil.

    Marília Kub­o­ta: O bacana da poe­sia é encon­trar out­ros poet­as. As estraté­gias vão acon­te­cen­do com os encon­tros. Dois poet­as jun­tos são pólos que atraem ener­gias pos­i­ti­vas e poten­cial­izam a cri­ação do com­bustív­el mais poderoso do plan­e­ta, a ale­gria. O encon­tro entre dois cri­adores gera feli­ci­dade; estraté­gias para dis­tribuir livros surgem das faís­cas de feli­ci­dade: os poet­as podem doar seus livros uns aos out­ros — como fazem com fre­quên­cia — ou con­tratar uma dis­tribuido­ra — o que é pouco prováv­el — ou par­tic­i­par de even­tos para vender seus par­cos exem­plares. O fato é que os livros de poe­sia são mila­grosa­mente dis­tribuí­dos. Uma pesquisa fei­ta na últi­ma FLIP rev­el­ou que os livros mais ven­di­dos foram de poe­sia. Mas a poe­sia sem­pre sobre­viveu fora dos megaeven­tos de mer­ca­do, porque em cada can­to do plan­e­ta há poet­as juve­nis, poet­as madames, poet­as empreende­dores, poet­as eru­di­tos, que se gal­va­nizam à voz dos men­estréis, ou seja, ain­da há neces­si­dade de cul­ti­var algo que não tem util­i­dade para o mercado.

    Qual a sua visão sobre a poe­sia contemporânea?

    Vás­sia Sil­veira: Ten­ho curiosi­dade e descon­fi­ança ao mes­mo tem­po. Curiosi­dade em desco­brir o que de bom está sendo pro­duzi­do e descon­fi­ança com o que o mer­ca­do (e as redes soci­ais) me diz que é bom. Movi­da por ess­es dois sen­ti­men­tos, acabo me refu­gian­do muitas vezes na poe­sia de autores que me acom­pan­ham des­de sem­pre, o que não deixa de ser uma grande ironia…

    Lau Siqueira: Está acon­te­cen­do, ape­sar de tudo. Há uma diver­si­dade imen­sa. Numa quan­ti­dade assus­ta­do­ra. Um bom garim­po nos per­mite encon­trar poet­as impor­tantes como Sér­gio de Cas­tro Pin­to, Antônio Brasileiro, Líria Por­to, Glau­co Mat­toso e muitos out­ros. Existe um panora­ma nacional se con­sol­i­dan­do cada vez mais, entre dilu­idores e sui­ci­das. As pes­soas estão, de for­ma muito saudáv­el, se afa­s­tan­do dos chama­dos “cabeças de rede”. Mas, acho que ain­da é cedo para um olhar mais definidor. Alguém já disse que o cenário atu­al se parece com um liq­uid­i­fi­cador lig­a­do. Ain­da não dá pra medir a qual­i­dade do suco.

    Marília Kub­o­ta: não é difer­ente a poe­sia con­tem­porânea da poe­sia do pas­sa­do. Alguém já disse que as redes soci­ais democ­ra­ti­zaram a imbe­ciliza­ção. Não sabíamos que havia tan­tos poet­as por aí, ago­ra esbar­ramos com eles em todos os lugares. Creio que na ver­dade há poucos poet­as, isto é, poucos de fato se dedicam à pesquisa de lin­guagem, a cri­ar algo novo. No Brasil, depois dos anos 90, temos Paulo Hen­riques Brit­to, Arman­do Fre­itas Fil­ho, a poe­sia demoli­do­ra de Sebastião Nunes, Lucila Nogueira, Deb­o­ra Bren­nand. Entre os mais novos, Car­l­i­to Azeve­do, Clau­dio Daniel, Miche­liny Verun­schk, Jus­sara Salazar e Rodri­go Gar­cia Lopes. Da safra da nova ger­ação (00), a sin­gu­lar­i­dade e insu­lar­i­dade de Nydia Bonet­ti, emb­o­ra ela ten­ha 50 anos. Uma novi­dade é a poe­sia étni­ca, isto é, poet­as negros com con­sciên­cia de sua iden­ti­dade étni­ca, como Edim­il­son de Almei­da Pereira e Nina Rizzi, trazen­do à baila não ape­nas a reivin­di­cação da negri­tude, mas vozes estra­nhas ao dis­cur­so canônico.

    poeta Vássia Silveira
    Vás­sia Silveira

    Como vê a ansiedade dos novos autores em relação a prêmios literários ou indi­cações, a neces­si­dade de ser legit­i­ma­do a qual­quer cus­to, seja nego­cian­do pre­fá­cios com críti­cos ou matérias em jornais?

    Vás­sia Sil­veira: Acho engraça­do e des­o­lador ao mes­mo tem­po. Engraça­do porque parece que isso real­mente tem fun­ciona­do (e daí a descon­fi­ança sobre a qual falei ante­ri­or­mente). E des­o­lador porque essa práti­ca mostra que a lit­er­atu­ra, em alguns casos, está deixan­do de ser um proces­so de reflexão e amadurec­i­men­to do autor com o tex­to. E veja, estou dizen­do isso e me colo­can­do, tam­bém, como uma auto­ra nova. Porque min­ha relação com o tex­to está sem­pre inacaba­da, é um per­cur­so que me sin­to obri­ga­da a faz­er. E que não depende da legit­i­mação do out­ro. Pra ser bem hon­es­ta, toda vez que leio ou ouço alguém se referir a mim como “poeta”, sin­to um calafrio na espin­ha. Porque ten­ho medo do peso e da respon­s­abil­i­dade des­ta palavra. Pre­firo pen­sar que estou no entre-lugar da poesia.

    Lau Siqueira: Per­da de tem­po. Esse tipo de coisa a psi­canálise resolve. Cada poeta é abso­lu­ta­mente respon­sáv­el pela sua poe­sia. A pre­ocu­pação cen­tral do poeta (novo ou vel­ho) deve ser com a met­alur­gia da palavra. Escr­ev­er um poe­ma é uma ativi­dade muito difí­cil. Dividir essa pre­ocu­pação com a neces­si­dade de alpin­is­mo é a negação da própria poe­sia. Os prêmios não rep­re­sen­tam nada. Abso­lu­ta­mente nada. Os pre­fá­cios robus­tos aju­dam na ter­apia, mas não resolvem a cura. Matéria em jor­nal não rep­re­sen­ta nada, porque os jor­nal­is­tas não leem nem o próprio jor­nal que edi­tam, imag­ine livros de poe­sia. A “fama postiça” resolve ape­nas a neces­si­dade de afir­mação social de cer­tos poet­as, jovens de qual­quer idade.

    Marília Kub­o­ta: Vejo com pre­ocu­pação a ansiedade do poeta jovem em ser con­sagra­do ime­di­ata­mente. “Poeta bom é poeta mor­to” é um adá­gio que con­sidero váli­do para man­ter a autocríti­ca em alta. Flo­ra Sussekind escreveu, no ano de 2005, o arti­go “Hagiografias”, em que anal­isa­va a poe­sia de três autores da Poe­sia Mar­gin­al: Caca­so, Ana Cristi­na César e Paulo Lemins­ki, mor­tos e em vias de serem can­on­iza­dos. Dois seri­am sui­ci­das, ape­nas Caca­so mor­re­ria por fatores nat­u­rais, mas emped­ernido críti­co da ditadu­ra mil­i­tar. O que impor­ta hoje para o poeta – ou escritor – é o recon­hec­i­men­to críti­co antes que o autor encon­tre a voz poéti­ca. Para isto, vale tudo, des­de ser empreende­dor mambe­m­be até baju­lar novos edi­tores, críti­cos e out­ros poet­as. Há novos autores que declar­am não ter capaci­dade para comen­tar o tra­bal­ho de seus pares e se colo­cam à frente de sites que emu­lam revis­tas literárias. Para ser poeta é pre­ciso ter lido muito, e de for­ma vari­a­da, ou seja, lou­ca­mente. A leitu­ra fornece o sen­so críti­co para sep­a­rar o joio do tri­go. Ao recon­hecer que não têm sen­so críti­co, tais autores fazem auto­pro­pa­gan­da neg­a­ti­va: não têm leitu­ra sufi­ciente para se auto-avaliar, como poderão ser avali­a­dos por out­ros leitores ? Numa dis­cussão sobre os aten­ta­dos em Paris, lem­brei o final de “A mon­tan­ha mág­i­ca”, de Thomas Mann: “Será que tam­bém da fes­ta uni­ver­sal da morte, da per­ni­ciosa febre que ao nos­so redor infla­ma o céu des­ta noite chu­vosa, sur­girá um dia de amor?” Um autor que escre­va um tex­to como este não pre­cisa ser dis­tin­gui­do com um prêmio. O prêmio é sua lin­guagem ter atingi­do o mais alto nív­el de com­preen­são e beleza sobre a com­plex­i­dade da natureza humana.

    Quais são seus livros de cabe­ceira ? Há um autor que pode ser con­sid­er­a­do uma influên­cia literária?

    Vás­sia Sil­veira: Con­tin­uo me encon­tran­do e me des­en­con­tran­do no “Grande Sertão: Veredas”, no “Livro do Desas­sossego” e em “Água Viva”. E fun­da­men­tal­mente em um livrin­ho pequeno que gan­hei aos 15 anos de meu pai e que inclu­sive dei de pre­sente tam­bém para min­ha fil­ha mais vel­ha: o “Car­tas a um jovem poeta”, do Rilke. Então acho que pos­so diz­er que estes são meus livros de cabe­ceira. Sobre a influên­cia literária, é com­pli­ca­do… Não sei se pos­so apon­tar o nome de um autor ou auto­ra somente. Porque tudo o que me afe­ta pas­sa, de algu­ma maneira, a faz­er parte de min­has angús­tias em relação à escri­ta. O que pos­so diz­er é que min­ha aven­tu­ra como leito­ra foi mar­ca­da a fer­ro e fogo, e ain­da na ado­lescên­cia, por Dos­toievs­ki e pela poe­sia de Manuel Ban­deira, Muri­lo Mendes, Drum­mond… Eu não acharia nada ruim se pudesse escr­ev­er como eles ou como a Clarice, a Ana Cristi­na César, a Hilst.

    Lau Siqueira: Não sei se ten­ho livros de cabe­ceira. Mas, autores de cabe­ceira. Sem­pre leio Antônio Cân­di­do, Ezra Pound, João Alexan­dre Bar­bosa, Joan Brossa, Maiakovs­ki, Fer­nan­do Pes­soa, João Cabral, Augus­to de Cam­pos, Drum­mond e alguns poucos autores. Mis­turo poet­as e teóri­cos, mas ando lendo poucos romances. No entan­to, sou aber­to às influên­cias não ape­nas de poet­as, mas de músi­cos como Jards Macalé, Ita­mar Assunção, Chico Cesar, Zeca Baleiro e out­ros tantos.

    Marília Kub­o­ta: Con­sidero Manuel Ban­deira e Jorge de Lima os poet­as maiores do Brasil. Ten­ho lido tam­bém e apre­ci­a­do a obra de Muri­lo Mendes. Mas Paulo Hen­riques Brit­to e Arman­do Fre­itas Fil­ho são hoje nos­sos poet­as maiores. Me admi­ra quan­tos leitores ain­da se deix­am cati­var por Emi­ly Dick­in­son, auto­ra que cultuei na juven­tude, e Clarice Lispec­tor. Por com­pro­mis­sos profis­sion­ais leio mui­ta lit­er­atu­ra japone­sa, entre estes Banana Yoshi­mo­to e o best sell­er Haru­ki Muraka­mi, mas sei que a lit­er­atu­ra deles é bobagem. Gos­to dos tankas de Takuboku Ishikawa e Akiko Yosano, além dos qua­tro grandes mestres haicais­tas, Bashô, Buson, Issa e Shi­ki e de haicais­tas do Brasil, Nen­puku Sato, Masu­da Goga e Teruko Oda. E adoro a poe­sia pop­u­lar brasileira, a MPB: ouço de Chico Buar­que a Edval­do San­tana, Estrela e Téo Ruiz e os incríveis PoETs, a ban­da dos poet­as Alexan­dre Brito, Ricar­do Sil­vestrim e Ronald Augusto.

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    Lau Siqueira

    O que faz­er com o cânone literário ? O cânone é uma refer­ên­cia para a obra de vocês ou estão na tur­ma do deixa isto pra lá?

    Vás­sia Sil­veira: A ideia de cânone me inco­mo­da quan­do pen­so que há, por trás dela, uma relação históri­ca de poder que pas­sa não só pela acad­e­mia e por aqui­lo que ela legit­i­ma como “alta lit­er­atu­ra”, mas tam­bém pelo olhar do oci­dente em relação ao ori­ente; ou da Europa em relação à África, Ásia e Améri­ca Lati­na. Por isso pre­firo pen­sar no que não faz­er com o cânone: ter uma pos­tu­ra ingênua frente a ele. Isso não sig­nifi­ca, de for­ma algu­ma, ignorá-lo (ou ignorá-los, já que o cânone é diver­so e mutáv­el). Porque seria mui­ta estu­pid­ez min­ha “deixar para lá” autores como Dos­toievs­ki, Tol­stói, Shake­speare, Goethe, Kaf­ka, Virgí­nia Woolf, Home­ro, Cer­vantes, Borges, Pound e Mal­lar­mé para falar de alguns estrangeiros que li e sin­to a neces­si­dade de rel­er; ou de Macha­do de Assis, Guimarães Rosa, Clarice Lispec­tor, Gra­cil­iano Ramos, Oswald de Andrade, Harol­do de Cam­pos, João Cabral de Melo Neto, Mário de Andrade, Muri­lo Mendes, Manuel Ban­deira. Enfim… Acho que é impor­tante lê-los com fome sufi­ciente para saber que há out­ras leituras inqui­etantes e não can­on­izadas. É pre­ciso desco­bri-las também.

    Lau Siqueira: Geral­mente isso tem mais a ver com políti­ca literária que com poe­sia. Eu vejo isso de for­ma muito lib­ertária. Não é assun­to que deva pre­ocu­par um poeta. Que os gen­erais da cena que deci­dam quem deve viv­er ou mor­rer. Não me inter­es­sa. Não per­co meu tem­po escol­hen­do fita métri­ca para saber quem é maior ou menor. Quan­do gos­to de um autor, não inter­es­sas se é con­sid­er­a­do canôni­co ou não.

    Marília Kub­o­ta: Ulti­ma­mente leio poucos autores canôni­cos. Gostaria de ler mais Shake­speare e lit­er­atu­ra de lín­gua ingle­sa e france­sa. Mas ten­ho descober­to os autores de lín­gua por­tugue­sa, de Por­tu­gal e ex-colô­nias: Sara­m­a­go, Gonça­lo Tavares, Sophia de Mel­lo Breyn­er Andresen, Hel­ber­to Helder, Adília Lopes. Por isto me vêm a ideia de ler mais Camões, ape­sar de que quase todo bom autor em lín­gua por­tugue­sa difi­cil­mente deixará de sofr­er a influên­cia do autor de Os Lusíadas. Emb­o­ra não seja con­sid­er­a­do no cânone oci­den­tal, um pro­je­to meu é ler o Heike mono­gatari, clás­si­co que mar­ca a ascen­são do shogu­na­to no Japão.

    Como fica a questão da solidão cria­ti­va hoje, quan­do vive­mos numa sociedade hiperconectada?

    Vás­sia Sil­veira: A min­ha vai muito bem, obri­ga­da. Primeiro porque gos­to e pre­ciso da solidão. E segun­do porque sou lou­ca o bas­tante para me man­ter conec­ta­da com a min­ha própria vida, o que já rende matéria sufi­ciente para me tirar o sono, a fome e muitas vezes o riso. E quan­do falo da min­ha própria vida não estou me referindo às mis­érias cotid­i­anas da Vás­sia enquan­to mãe, mul­her, fil­ha. Mas das angús­tias da Vás­sia enquan­to ser, estar e ver o mun­do. Isso sig­nifi­ca, por exem­p­lo, que você não vai me encon­trar, na rua ou no ônibus, com os olhos pre­ga­dos a uma tela, porque ten­ho o pés­si­mo hábito de obser­var as pais­agens, as pes­soas, aque­la “vida besta” que fala­va Drum­mond. Então, para mim, a hiper­conec­tivi­dade é uma grande farsa, uma distração.

    Lau Siqueira: A solidão, hoje, é cole­ti­va. Exerci­ta­mos nos­sa solidão nas redes soci­ais sem nen­hum pudor. Meu últi­mo livro, o Livro arbítrio, foi inte­gral­mente escrito no Face­book. É fru­to de uma solidão com­par­til­ha­da, cur­ti­da e comen­ta­da. Esta­mos viven­do no sécu­lo XXI e não no sécu­lo XIX. Na solidão do sécu­lo XIX não tin­ha Wi-fi.

    Marília Kub­o­ta: Ten­ho neces­si­dade de solidão para cri­ar. Quan­do estou em casa, em Curiti­ba, pas­so quase a maior parte do tem­po a sós, lendo ou escreven­do. Através da inter­net con­si­go con­ver­sar com par­ceiros para pro­duzir pro­je­tos ou even­tos literários. Por força de com­pro­mis­sos profis­sion­ais e famil­iares, ten­ho menos momen­tos de solidão do que gostaria. Muitos falam que o autor deve se iso­lar para escr­ev­er – ir para a pra­ia, fora de tem­po­ra­da, ou a algum lugar dis­tante. Gostaria de poder faz­er isto, mas é quase impos­sív­el. Se eu fos­se para um paraí­so ecológi­co ou uma aldeia, duvi­do que ficas­se desconectada.

    Vocês moram em cidades peque­nas. Acham que não é necessário morar no eixo Rio-São Paulo para pro­je­tar suas obras?

    Vás­sia Sil­veira: Bem, acho que temos exem­p­los recentes provan­do que não…

    Lau Siqueira: No eixo-Rio/Sam­pa pre­dom­i­nam as per­ife­rias, onde a sobre­vivên­cia se assemel­ha às peque­nas cidades onde moramos. O país foi con­stru­in­do novas refer­ên­cias, sem que se faça necessário bus­car um “cen­tro de pro­jeção”. No mais, pra que pro­jeção? Vamos viven­do o que nos cabe.

    Marília Kub­o­ta: Com a sociedade con­ste­la­da cri­a­da pela conexão por satélite, não parece mais necessário morar em metrópoles, como Rio e São Paulo. Mas o eixo cul­tur­al con­tin­ua sendo as duas cidades, no Brasil. Se você é artista, não pode deixar de mostrar seu tra­bal­ho no Rio e em São Paulo para se pro­je­tar nacional­mente. Mas não é pre­ciso mais morar e tra­bal­har nes­tas cidades.

    A questão social em poe­sia é ultra­pas­sa­da ? Poe­sia enga­ja­da é sem­pre pan­fletária? Como vê a apoli­ti­za­ção de parte dos poet­as con­tem­porâ­neos, que optam por um ativis­mo sele­ti­vo — em relação a questões étni­cas ou de gênero, ou à ecolo­gia, por exem­p­lo, deixan­do de se posi­cionar sobre grandes questões da humanidade, como as guer­ras e a políti­ca nacional e internacional?

    Vás­sia Sil­veira: Não acho que seja ultra­pas­sa­da e tam­bém não gos­to de rotu­lar como “pan­fletária” a poe­sia enga­ja­da. Sin­to inve­ja dos autores que con­seguiram ou con­seguem levar para a poe­sia, e de for­ma clara, as grandes questões de seu tem­po. Ten­ho con­sciên­cia de que não con­si­go faz­er isso, pelo menos não ain­da. Sou lenta, demoro a proces­sar aqui­lo que me impacta, o que faz com que eu facil­mente seja encaix­a­da nesse per­fil que você traçou e criti­cou na últi­ma per­gun­ta. Acho mais fácil, por exem­p­lo, me posi­cionar de for­ma inci­si­va em relação a questões étni­cas e/ou de gênero porque tive mais tem­po para digerir a vio­lên­cia embu­ti­da nelas. E não por ser apolíti­ca, muito menos por não me inter­es­sarem as guer­ras civis, o dra­ma dos refu­gia­dos, o fun­da­men­tal­is­mo, o ódio ao PT, as manobras da políti­ca inter­na­cional e seus des­do­bra­men­tos na Améri­ca Lati­na, na África ou na Ásia. Essas são questões que me afligem e sobre as quais procuro refle­tir e me posi­cionar em out­ras instân­cias. Ago­ra veja, estou falan­do de min­ha exper­iên­cia. Não pos­so respon­der pelo silên­cio dos outros.

    Lau Siqueira: A poe­sia tran­si­ta livre­mente pelo tem­po. Em qual­quer tem­po. As temáti­cas escol­hi­das não alter­am o pro­du­to final do poe­ma. Nen­hu­ma questão social ou políti­ca é ultra­pas­sa­da. Na ver­dade são questões desafi­ado­ras para a usi­na cria­ti­va de cada um. Cada qual sabe por onde cam­in­ha, mas existe até mes­mo um cer­to pre­con­ceito quan­to às escol­has temáti­cas desse tipo, o que eu acho uma bobagem. A matéria da poe­sia é a palavra. O resto é cenário.

    Marília Kub­o­ta: A sociedade con­ste­la­da facil­i­tou a seg­men­tação e for­t­ale­ceu a iden­ti­dade cole­ti­va. Stu­art Hall fala sobre as iden­ti­dades móveis, em que o indi­ví­duo aban­dona a iden­ti­dade com a nação e o ter­ritório, bus­can­do out­ro tipo de sub­je­tivi­dade, nômade. Durante muito tem­po me iden­ti­fiquei como nipo-brasileira até perce­ber que a hif­eniza­ção não faz sen­ti­do: sou brasileira. Mas a aceitação de um biótipo difer­ente do europeu ain­da está em proces­so na sociedade brasileira. A luta das mino­rias soci­ais, dos imi­grantes, das fem­i­nistas, dos negros, dos homos­sex­u­ais, emb­o­ra pareça assim­i­la­da, ain­da está em processo.

    Acho impor­tante dis­cu­tir estas questões, porque em tem­pos de recrude­sci­men­to políti­co, tais mino­rias são as primeiras a serem social­mente rechaçadas. Creio que o poeta jamais abstém-se de ter uma posição políti­ca. Eu me recu­sei a faz­er parte de duas antolo­gias patroci­nadas pelo gov­er­no do Esta­do do Paraná. Uma de con­tos, orga­ni­za­da pelo escritor Luiz Ruf­fat­to, e out­ra de poe­sia, orga­ni­za­da por Ademir Demarchi. Foi numa época em que o gov­er­no fechou vários espaços cul­tur­ais em Curiti­ba, can­celou ver­bas para pro­je­tos cul­tur­ais no esta­do e apro­pri­ou-se dos dire­itos autorais dos colab­o­radores do JORNAL NICOLAU, para faz­er uma edição fac-sim­i­lar, que até hoje está à ven­da. O NICOLAU, cri­a­do por uma equipe coman­da­da pelo artista grá­fi­co Luis Antônio Guin­s­ki e pelo poeta Wil­son Bueno fez história na cul­tura do Paraná e do Brasil. A recusa foi um protesto con­tra os des­man­dos deste gov­er­no, que cul­mi­nou no episó­dio de 29 de abril, o Mas­sacre do Cen­tro Cívi­co. Na época em que come­cei a denun­ciar os abu­sos do gov­er­no do Paraná nas redes soci­ais, muitos me adver­ti­ram para ficar cal­a­da. Nun­ca con­segui ficar cal­a­da, por isto jamais rece­bi indi­cações para par­tic­i­par de even­tos literários, mas os cole­gas mais dóceis rece­ber­am. Declinei de par­tic­i­par da antolo­gia “O ver­so da vio­lên­cia”, pub­li­ca­do pela Edi­to­ra Patuá. Emb­o­ra tra­ga reg­istros impor­tantes, feitos pelos fotó­grafos Lina Faria e Bruno Cov­el­lo, me pare­ceu que a pub­li­cação da antolo­gia não faria difer­ença na oposição a este gov­er­no arbi­trário, no qual muitos se aproveitam para pro­mover inter­ess­es pes­soais através da máquina pública.

  • Timidez pra que te quero | Crônica

    Timidez pra que te quero | Crônica

    Campo de Trigo com Corvos (1890), de Vincent van Gogh
    Cam­po de Tri­go com Cor­vos (1890), de Vin­cent van Gogh

    Eu sou assim
    Quem quis­er gostar de mim eu sou assim
    Eu sou assim
    Quem quis­er gostar de mim eu sou assim
    Meu mun­do é hoje
    Não existe aman­hã pra mim
    E sou assim
    Assim mor­rerei um dia
    Não levarei arrependimentos
    Nem o peso da hipocrisia
    Ten­ho pena daqueles
    Que se agacham até o chão
    Enganan­do a si mesmos
    Com din­heiro, posição
    Nun­ca tomei parte
    Desse enorme batalhão
    Pois sei que além de flores
    Nada mais vai no caixão
    Meu mun­do é hoje.
    (Wil­son Batista)

    Des­de cri­ança fui tími­da. A primeira vez que escutei min­ha voz em públi­co lev­ei um sus­to. Pen­sei: Que voz de pato! Feia, gras­na­va. Fala­va baixo para ninguém ouvir. Isso fez com que me ouvis­sem cada vez menos. Sofria de “fal­ta de ini­cia­ti­va”, como acusavam os boletins esco­lares. Tira­va dez em tudo, menos nesse item.

    timidez-pra-que-te-quero-cronica-fazer-amigosEm um mun­do que não pára de falar, o tími­do é doente. Pen­sei assim por 20 anos de vida. Desisti da esco­la, aos 15 anos, porque não con­seguia faz­er palestras. Fiz ter­apia para tratar a “fobia social”. Não me curei. Voltei a estu­dar aos 18, fiz cur­so de Comu­ni­cação Social. E con­tin­uei tímida.

    Me apoiei na escri­ta para suprir o déficit. Primeiro veio a leitu­ra, refú­gio con­tra a hor­da de falantes. Como não sabia abrir a boca, abria um livro para “con­ver­sar”. Assim apren­di a dialog­ar com vozes dis­tantes no tem­po e no espaço, e com meus botões. Pen­sei que me tornar­ia uma escrito­ra, pub­li­ca­da e con­heci­da. A timidez impediu de divul­gar meus escritos, criva­dos pela autocrítica.

    Quan­do come­cei a tra­bal­har, estran­han­do a “fal­ta de ini­cia­ti­va”, cole­gas e ami­gos recomen­davam que fizesse teatro. Nun­ca me entu­si­as­mei, nem para desinibir. Hoje há atores nipo-brasileiros que ofer­e­cem óti­mos cur­sos, basea­d­os em téc­ni­cas teatrais, para aju­dar os tími­dos a se soltarem.

    Para faz­er a defe­sa de meu mestra­do, tomei aulas de impostação de voz com um ami­go. Mas o que me aju­dou a falar em públi­co foi ir a even­tos onde pre­cisa­va falar sobre o anda­men­to da pesquisa. Essas comu­ni­cações cien­tí­fi­cas, como se diz no jargão, duravam dez min­u­tos. Depois de falar meia dúzia de vezes para estu­dantes e pro­fes­sores que talvez não enten­dessem patavina do que eu fala­va, come­cei a ficar menos ansiosa.

    Carl Gustav Jung na Suiça (Foto: absolut Medien)
    Carl Gus­tav Jung na Suiça (Foto: abso­lut Medien)

    Há cer­ca de dois anos, ain­da pen­san­do o quan­to me cus­ta­va abrir a boca em públi­co, fiz o tal cur­so de teatro. Foi um desas­tre. O prob­le­ma não era só falar. Eu não tin­ha inteligên­cia cor­po­ral como os estu­dantes de artes cêni­cas. O meu azar é que era um cur­so volta­do para atores e não para lei­gos. Mas, para não diz­er que não falei de flo­res, nesse ano, no Dia da Mul­her, atuei no pal­co, pela primeira vez na vida, para falar meus poe­mas e de out­ras autoras. Perce­bi que ser tími­do pode não ser um prob­le­ma, mas um esti­lo de personalidade.

    Por causa daqui­lo que acha­va ser um obstácu­lo ao desen­volvi­men­to social em min­ha vida, come­cei a estu­dar sobre a timidez. Desco­bri que o psicól­o­go Carl Gus­tav Jung clas­si­fi­ca os tipos de per­son­al­i­dade em extro­ver­tidos e intro­ver­tidos. Se timidez é con­sid­er­a­da doença, pelo menos de fal­ta de socia­bil­i­dade, a intro­ver­são pode ser um modo como se com­por­ta metade da humanidade.

    timidez-pra-que-te-quero-cronica-poder-quietosÉ o que diz Susan Cain, auto­ra do best-sell­er “O poder dos qui­etos”. Li um e‑book em que ela abom­i­na tipos vende­dores como Dalie Carnegie, autor do best-sell­er “Como faz­er ami­gos e influ­en­ciar pes­soas”. Susan crit­i­ca o rea­cionar­is­mo de Carnegie, que nos anos 60, ensi­na­va que para ter suces­so era pre­ciso sor­rir, falar e ter pen­sa­men­tos pos­i­tivos o tem­po todo. E fin­gir que igno­ra­va os hor­rores da guer­ra do Viet­nã, sor­rindo. Quan­do cru­zo com pes­soas que pare­cem ter lido esse livro, ou incor­po­ra­do suas ideias, ten­ho von­tade de fugir. Em ger­al, acabo ten­do exper­iên­cias desagradáveis com quem não para de falar bobagens ten­tan­do ser simpático.

    Depois de tan­to tem­po, aceito a timidez. Gos­to de ficar soz­in­ha, lendo e escreven­do. Os tími­dos, ou intro­ver­tidos, são mais inde­pen­dentes e têm mel­hor desem­pen­ho tra­bal­han­do soz­in­hos. Desco­bri, lendo o livro de Susan, que depois de pas­sar algum tem­po com out­ras pes­soas, tra­bal­han­do ou em even­tos soci­ais, os tími­dos pre­cisam “recar­regar as bate­rias”. Ou seja, ficar um tem­po a sós.

    Não pre­ciso mais expor num diário públi­co tudo que acon­tece comi­go por me sen­tir só. Ten­ho um com­pan­heiro, uma família, bons ami­gos e uma rede de tra­bal­ho e con­tatos. Fiz as pazes com a garot­in­ha enver­gonha­da que baix­a­va a cabeça diante do piano da sala de pro­fes­sores para posar numa foto esco­lar. Ain­da bem. Não aguen­ta­va mais deixá-la de lado. Com o tem­po, vi que é até bom cul­ti­var a ver­gonha numa cul­tura em que os mais sem-ver­gonha acabam pas­san­do por cima de tudo e de todos.

  • Entrevista Lau Siqueira: Poesia a vida inteira

    Entrevista Lau Siqueira: Poesia a vida inteira

    O poeta Lau Siqueira nasceu em Jaguarão (RS), em 21 de março de 1957. Começou a pub­licar poe­mas no Jor­nal Cor­reio do Povo, de Por­to Ale­gre, nos anos 70. Seu primeiro livro foi O Comí­cio das Veias, pub­li­ca­do em 1993. Seguem O Guardador de Sor­risos (1998), Sem Meias Palavras (2000). Par­ticipou das antolo­gias Mário Quin­tana – 1985, Na Vira­da do Sécu­lo — Poe­sia de Invenção no Brasil (Landy, 2002) e Agen­das da Tri­bo. Há 20 anos mora em João Pes­soa (PB), e há out­ro par de anos man­tém o blogue Poe­sia Sim

    Lau Siqueira tam­bém esteve em Curiti­ba lançan­do o livro Poe­sia Sem Pele.

    Teu nome é Lau­re­ci Siqueira . De onde vem o “ Lau”?

    O que é o nos­so nome? É o que está na cédu­la de iden­ti­dade ou é o nome no qual as pes­soas nos recon­hecem? Nem sem­pre essas coisas coin­ci­dem. Acho que este é o meu caso. Na min­ha iden­ti­dade está escrito Lau­recí Siqueira dos San­tos. Foi assim que meu pai me bati­zou. No entan­to, nem ele me chama­va pelo nome de batismo. Meu apeli­do de infân­cia era Dido. Até hoje alguns ami­gos de infân­cia lá de Jaguarão, me chamam assim. O “codi­nome” Lau foi se empoderan­do nat­u­ral­mente da min­ha existên­cia e da min­ha inex­istên­cia. Tudo porque quan­do apre­sen­ta­do às pes­soas a con­fusão apare­cia logo: Laude­cir, Lau­re­mi, Laude­ci?… As pes­soas sim­pli­fi­cavam nat­u­ral­mente, rap­i­da­mente, reduzin­do para Lau. Isso acon­te­ceu muito com cole­gas de tra­bal­ho e na esco­la, prin­ci­pal­mente, mas em out­ros espaços tam­bém . Depois veio o primeiro livro e eu pen­sei que era mais coer­ente assi­nar o nome pelo qual eu já esta­va con­heci­do entre os ami­gos. Enfim, se tudo tem uma história, esta min­ha história é assim. O nome tam­bém expli­ca uma poe­sia que bus­ca se despir das sonori­dades desnecessárias. Assim, o meu nome literário é tam­bém mín­i­mo e ao mes­mo tem­po de den­sa sonoridade.

    Você nasceu em Jaguarão , pas­sou a infân­cia, lá, depois morou em Por­to Ale­gre ? Con­ta um pouco sobre a tua juventude.

    É ver­dade, nasci em Jaguarão, cidade históri­ca e muito boni­ta, às mar­gens de um rio (Rio Jaguarão) que cor­ta a fron­teira com o Rio Uruguay. A cidade tem uma vida cul­tur­al inten­sa, pro­duzin­do uma Feira Bina­cional do Livro onde farei uma sessão de autó­grafos no mês de novem­bro. Mor­ei lá até os 15 anos e fui para Por­to Ale­gre, de onde voltei no final do serviço mil­i­tar para aju­dar a cuidar do meu pai que esta­va muito doente. Assim, fiquei nova­mente em Jaguarão no ano de 1977, até que meu pai mor­reu no dia 3 de dezem­bro e em janeiro de 78 voltei para Por­to Ale­gre onde mor­ei nova­mente até me mudar para a Paraí­ba, “de mala e cuia”, em 1985. Este é o resumo da ópera.

    Por que mudou do Rio Grande para a Paraíba?

    Por motivos muito par­tic­u­lares. Eu casei na Paraí­ba, vivi casa­do 13 anos e depois divor­ciei. Mas aí já tin­ha duas fil­has para dar con­ta dos meus afe­tos e das min­has respon­s­abil­i­dades de pai apaixon­a­do e fui fican­do. Hoje ten­ho uma neta, tam­bém por aqui. Além dis­so, o povo paraibano é muito espe­cial, muito acol­he­dor e sem­pre me sen­ti queri­do por aqui. Hoje me sin­to um ser­tane­jo do pam­pa ou um pam­peano do sertão que mora num dos litorais mais belos do País. Não é difí­cil largar tudo e vir pra cá. Os encan­tos são muitos. A cap­i­tal da Paraí­ba é a ter­ceira mais anti­ga do país. É uma das cidades mais verdes do país e ain­da não está assim tão caóti­ca. Aqui se con­vive com pas­sa­do e futuro numa mes­ma avenida. 

    Em Por­to Ale­gre você con­heceu Mário Quin­tana ? Que lem­brança tem dele ? Que out­ros poet­as foram impor­tantes para sua for­mação e informação ?

    Mário era uma per­son­al­i­dade das ruas de Por­to Ale­gre. Quem andou pelo cen­tro da cap­i­tal gaúcha até os anos 80, pelo menos algu­ma deve ter vis­to o poeta cam­in­han­do pela Rua da Pra­ia, pelas ruas do cen­tro. Ele tin­ha hábitos reg­u­lares. Mora­va no Hotel Majes­tic, onde hoje é a Casa de Cul­tura Mário Quin­tana. Toma­va café sem­pre no anti­go Ryan, gosta­va de uma sal­a­da de fru­tas no Mer­ca­do Cen­tral. Eu vi Mário muitas vezes, na Feira do Livro, na anti­ga Livraria do Globo, na Bib­liote­ca Públi­ca onde até assisti um recital com ele, nos anos 80. Tam­bém tive o priv­ilé­gio de entre­vistá-lo, jun­ta­mente com a jor­nal­ista Joana Belarmi­no, em janeiro de 1987. Enfim, além dis­so, podia encon­trá-lo nos livros que escreveu e traduz­iu. A primeira tradução de Proust que li, foi sua. Ele tra­bal­ha­va no jor­nal Cor­reio do Povo e quan­do o jor­nal fechou, pude vê-lo em uma passea­ta de jor­nal­is­tas pelas ruas de Por­to Ale­gre. Acho que foi sim um poeta impor­tante para a min­ha for­mação, mas eu admiro muitos poet­as. Inclu­sive me sin­to a von­tade para diz­er que não gos­to de tudo que leio nos poet­as que admiro. Sin­to da mes­ma for­ma quan­to aos meus con­tem­porâ­neos. Sou um escritor abso­lu­ta­mente aber­to às influên­cias e não me pre­ocupo em ser engoli­do por algum esti­lo. Acho que quan­to maiores e mais diver­si­fi­cadas as leituras, mais pos­si­bil­i­dades temos de con­stru­ir uma lin­guagem sin­gu­lar, que não seja a mais pura e bela diluição, a imi­tação de algum poeta ama­do. Enfim, os poet­as que mais me fasci­nam são os que cam­in­ham no fio da naval­ha, os que bus­cam o extremo, a margem do erro… o risco permanente.

    E a poe­sia, quan­do se tornou impor­tante? Ao con­trário de tan­tos, você não começou escreven­do poesia…

    A poe­sia foi se tor­nan­do grada­ti­va­mente impor­tante pra mim. Na ado­lescên­cia eu detes­ta­va poe­sia. Apren­di a gostar com os român­ti­cos Cas­tro Alves e Fagun­des Varela por motivos abso­lu­ta­mente extra-literários. Um pelo dis­cur­so agu­do con­tra o sitema de escrav­is­mo da monar­quia brasileira, out­ro pela dor de ter per­di­do um fil­ho. Dig­amos que não come­cei a escr­ev­er poe­sia, mas tam­bém não come­cei escreven­do gênero algum. Escr­ev­er era ape­nas uma for­ma de res­pi­rar mel­hor num mun­do em que o silên­cio ger­a­va o medo e tudo era de uma vio­lên­cia assus­ta­do­ra. Cresci numa área de segu­rança nacional, em ple­na ditadu­ra. Acho que isso tudo me ensi­nou uma for­ma de ver as coisas. Escr­ev­er é um ato úni­co e con­tín­uo. Sin­to que des­de sem­pre estive escreven­do o mes­mo livro, mes­mo já ten­do pub­li­ca­do cin­co inédi­tos e um pela Coleção Dul­cinéia Cata­do­ra que con­sidero, talvez, o mais impor­tante de todos. Procuro sem­pre fugir dos rótu­los e, pra diz­er a ver­dade, algu­mas vezes ques­tiono até mes­mo o fato de ser chama­do de poeta. O que é ser poeta? Eu acho que ser poeta é exata­mente não ser.

    Par­ticipou do movi­men­to Arte Postal ? O que era este movimento ?

    Como se diz aqui no Nordeste, fui me metendo meio que de “enx­eri­do” e acabei tro­can­do toques com nomes impor­tantes do movi­men­to arte-postal e com artis­tas da van­guar­da visu­al, como Paulo Brusky, Sama­r­al, Hugo Pontes, Moa­cy Cirne e Con­stança Lucas. Pes­soas que depois acabei con­hecen­do pes­soal­mente (menos Sama­r­al que fale­ceu pre­mat­u­ra­mente) e hoje são meus ami­gos. Con­heci mui­ta gente bacana, mui­ta cri­ação na área da Poe­sia Visu­al que cir­cula­va como se estivesse ante­ci­pan­do o que hoje temos na inter­net. Eu envi­a­va fanzines que pro­duzia para divul­gar min­ha pro­dução poéti­ca, min­has exper­iên­cias, mes­mo antes de sequer pen­sar em pub­licar livros. Fazia um orig­i­nal numa fol­ha de ofí­cio e imprim­ia em aero­gra­mas, encam­in­han­do não ape­nas para out­ros mil­i­tantes da arte postal, mas sele­cio­nan­do aleato­ri­a­mente endereços nas vel­has lis­tas tele­fôni­cas e encam­in­han­do cor­re­spondên­cias poéti­cas, geral­mente anôn­i­mas. Enfim, no meu caso foi da for­ma como hoje se envia spam pela internet.

    Você tra­bal­hou na sec­re­taria de cul­tura de João Pes­soa ? Que car­go exerceu ? Quais os feitos mem­o­ráveis de sua pas­sagem por lá ?

    Na ver­dade, fui o dire­tor exec­u­ti­vo da Fun­dação Cul­tur­al de João Pes­soa – FUNJOPE, entre 2007 e 2008. É a Fun­dação que dirige as políti­cas de cul­tura na cidade. Não temos Sec­re­taria Munic­i­pal de Cul­tura aqui. De 2005 a 2006, eu era o dire­tor adjun­to na gestão do ator Luiz Car­los Vas­con­ce­los que fez o médi­co em Carandiru, Baile Per­fuma­do e out­ros filmes. Ele se afas­tou para fil­mar Pedra do Reino, na Rede Globo e eu assu­mi. Depois veio o Chico Cesar e ago­ra a Fun­dação é dirigi­da por Mil­ton Dor­nel­las, um ami­go músi­co dos bons que foi meu adjun­to. Por­tan­to, tive­mos teatro, lit­er­atu­ra e músi­ca na direção da Fun­dação nos últi­mos anos. Olha, para falar dos feitos mem­o­ráveis, não sei se ten­ho jeito. Até porque ess­es feitos não são meus. Vou falar de algu­mas coisas que con­sidero rel­e­vantes, como ter cri­a­do o depar­ta­men­to de Lit­er­atu­ra na Fun­dação, coisa que antes não exis­tia; tam­bém assinei jun­ta­mente com o secretário da Edu­cação da época, Wal­ter Galvão, a cri­ação da primeira bib­liote­ca públi­ca do municí­pio de João Pes­soa. Na ver­dade, lev­a­mos arte e cul­tura para prati­ca­mente todos os bair­ros da cidade e desta­co aí o pro­je­to Cir­cuito Cul­tur­al das Praças que até hoje visa aproveitar os anfiteatros que foram cri­a­dos pela Prefeitu­ra nas praças públi­cas para apre­sen­tação sem­anal de gru­pos da cidade, em todas as áreas, em todas as estéti­cas. Tra­bal­hamos muito pela preser­vação da diver­si­dade cul­tur­al, pela preser­vação das tradições da cul­tura pop­u­lar, dos bens ima­te­ri­ais, trazen­do para a cena expressões que se encon­travam mar­gin­al­izadas, como as Cam­bindas, o Cav­a­lo Mar­in­ho, o Boi de Reis, o Coco de Roda, o Babau, o Coco de Embo­la­da, o tradi­cional for­ró pé-de-ser­ra que hoje Chico Cesar bus­ca preser­var no Esta­do, enquan­to Secretário de Cul­tura da Paraí­ba. Até mes­mo o Cordel anda­va deix­a­do de lado porque a gestão ante­ri­or bus­ca­va preser­var as ações de pão e cir­co, deixan­do a cul­tura na mín­gua. Nós afir­mamos as políti­cas de cul­tura den­tro da gestão. Pau­ta­mos politi­ca­mente a cul­tura na cidade. Dialog­amos com a cena con­tem­porânea, apoian­do a cri­ação de even­tos under­grounds ou pop­u­lares, aju­damos a con­sol­i­dar aqui o Fes­ti­val de Cin­e­ma de Lín­gua Por­tugue­sa, o CINEPORT, imple­men­ta­mos ofic­i­nas de arte pela cidade inteira, bus­camos a qual­i­dade musi­cal para os nos­sos even­tos de verão que hoje ref­er­en­ci­am João Pes­soa nacional­mente. A cidade tem hoje um dos mais impor­tantes fes­ti­vais de verão do país, o Estação Nordeste. Na ver­dade tudo isso foi fru­to de um debate cole­ti­vo que vin­ha se for­man­do através dos anos, nos instru­men­tos da luta dos artis­tas, como o Musi­clube da Paraí­ba, nas idéias do gru­pos como Jaguaribe Carne, com Pedro Osmar, Chico Cesar e Paulo Ró, de pen­sadores e gestores da cul­tura paraibana como Car­los Aran­ha e Fer­nan­do Abath… Enfim, bus­camos preser­var a iden­ti­dade cul­tur­al nordes­ti­na e dialog­ar com a con­tem­po­ranei­dade. São essas as idéias que ain­da prevale­cem por lá. Não são coisas min­has, relevân­cias min­has, mas questões cole­ti­vas, debati­das e imple­men­tadas cole­ti­va­mente. Por­tan­to, estive den­tro de um proces­so e não fiz nada soz­in­ho. E esse é o que foi o difer­en­cial e que ain­da está sendo. Foi uma gestão de com­pan­heiros e con­tin­ua sendo uma gestão de com­pan­heiros e com­pan­heiras. Como diz Chico Cesar, no meu tem­po, eu fui “ape­nas o orde­nador de despe­sas”. (risos)

    Para que ou para quem serve a poesia ?

    A poe­sia não serve para abso­lu­ta­mente nada, ain­da bem. Não existe nada mais inútil que a dana­da da poe­sia. Para quem serve? Sei lá… acho que serve de pano de fun­do aos que curtem jog­ar amare­lin­ha com psiquia­tras que inves­tigam as pro­fun­dezas do espíri­to humano.

    Um poeta pre­cisa ter grupo, site, blogue, livro , ser dinâmi­co, ati­vo, empreende­dor ? Pre­cisa gan­har prêmios, rece­ber bol­sas de cri­ação literária e coisas tais ?

    Um poeta pre­cisa ter con­sciên­cia do seu ofí­cio que é: tra­bal­har, tra­bal­har, tra­bal­har… Tra­bal­har para sus­ten­tar o cadáver desajeita­do que é e tra­bal­har exaus­ti­va­mente a palavra, escreven­do ou não. Então ele pode ter grupo, pode ter blog, ser dinâmi­co, ati­vo, pas­si­vo, malu­co, empreende­dor, bundão… Ele só não pode achar que já está pron­to, que já é uma cele­bri­dade por ser razoavel­mente con­heci­do ou elo­gia­do pelos ami­gos. Um poeta nun­ca é uma cele­bri­dade. Pelo menos, não deve pen­sar que é. Porque aí ele terá mor­ri­do e será ape­nas uma camisa e uma calça flu­tuan­do pelas ruas em bus­ca de algum tipo de imor­tal­i­dade. O poeta não pode ter medo de arriscar-se. Ser poeta é não ter medo do abis­mo, ser poeta é cor­rer riscos per­ma­nen­te­mente. É não ter medo do ridícu­lo. Ele pode até rece­ber prêmios, bol­sas de cri­ação literária, mas acho com­pli­ca­do alguém achar que pode escr­ev­er um grande livro ape­nas porque rece­beu uma bol­sa de cri­ação literária. Poe­sia é como diz meu queri­do poeta Ronald Augus­to, “coisa nen­hu­ma” e por­tan­do o poeta tem que estar pre­ocu­pa­do é com coisa nen­hu­ma mes­mo. O poeta pre­cisa viv­er inten­sa­mente a vida (como qual­quer pes­soa), viv­er pro­fun­da­mente a palavra e bus­car exper­i­men­tar esse mis­tério que é a pul­sação dos seus movi­men­tos, dos seus sig­nifi­ca­dos den­tro da invenção poéti­ca, den­tro das pos­si­bil­i­dades de trans­gressão dos próprios processos.

    Você lançou teu livro Poe­sia sem Pele na Sem­ana Anti­man­i­co­mi­al, na Paraí­ba. Como a lou­cu­ra pode ser arte na cidade ?

    Sim, acho que a poe­sia não pode ser enga­ja­da — emb­o­ra pos­sa ser temáti­ca. No entan­to, o poeta pode escol­her entre ser um cidadão enga­ja­do ou não. Eu estou enga­ja­do na Luta Anti­man­i­co­mi­al, con­tra o anti­go e crim­i­noso mod­e­lo dos choques, das lobot­o­mias… ações que viti­maram pes­soas do meu mais pro­fun­do afe­to. Des­de muito novo estou enga­ja­do nas questões humanas. Na ver­dade eu sabia e sei que cuidar do out­ro é cuidar de si mes­mo. E acho que a arte é uma das curas da humanidade. Por isso, a lou­cu­ra pode ser arte na cidade.

    quar­ta capa

    o poeta

    é o que bus­ca na palavra

    a dimen­são do átomo

    o silên­cio extremo

    por detrás de cada fato

    o poeta é o etéreo e o ácido

    na pele dos val­ores estáticos

    estéti­cos são seus baralhos

    o poeta é o vapor bara­to e o

    lance de dados

    o aca­so e o atalho

    macalé e mallarmé

    no mes­mo saco

    o poeta é um guapo

    (de: POESIA SEM PELE , Casa Verde, 2011. Pedi­dos pelo email: poesiasempele@gmail.com)

  • Lançamento do Jornal MEMAI e livro ¨Poesia sem pele¨ de Lau Siqueira, em Curitiba

    Lançamento do Jornal MEMAI e livro ¨Poesia sem pele¨ de Lau Siqueira, em Curitiba

    Para os fãs, entu­si­as­tas e inter­es­sa­dos em Cul­tura e Lit­er­atu­ra Japone­sa, nes­sa terça-feira, dia 10 de maio, no Brook­lyn Café em Curiti­ba, acon­tece o lança­men­to da 6 edição do Jor­nal MEMAI — Letras e Artes Japone­sas. Jun­ta­mente com o even­to acon­tece o lança­men­to do livro Poe­sia sem Pele do poeta Lau Siqueira . Tudo isso a par­tir das 19:00 horas.

    O Jor­nal MEMAI é uma pub­li­cação trimes­tral, dis­tribuí­da gra­tuita­mente em enti­dades cul­tur­ais em Curiti­ba, Lon­d­ri­na e São Paulo. É uma ini­cia­ti­va de um grupo de artis­tas inter­es­sa­dos em divul­gar a cul­tura japone­sa e nipo-brasileira, entre eles a escrito­ra e jor­nal­ista Marília Kub­o­ta, a artista plás­ti­ca San­dra Hiro­mo­to, a edu­cado­ra Lina Sahe­li e a atriz Patri­cia Kamis.

    Poe­sia Sem Pele é o títu­lo do quin­to livro do poeta gaú­cho Lau Siqueira, que vive na Paraí­ba. Edi­ta­do pela Casa Verde (RS), depois de lançá-lo na Fes­tiPoa Literária, em Por­to Ale­gre. Emb­o­ra este não seja um livro de haicais, a for­ma poéti­ca japone­sa é sua “ver­tigem” (tradução de “Memai” para a lín­gua por­tugue­sa), por isto é o con­vi­da­do espe­cial da fes­ta de lança­men­to do dessa edição do Jor­nal MEMAI.

    Lança­men­to
    10/05 — 19 horas
    JORNAL MEMAI 06 e Poe­sia sem Pele , de Lau Siqueira
    Brook­lyn Café
    Rua Tra­jano Reis, 389 — São Fran­cis­co — Curiti­ba — PR