O que é qualidade na produção artística para crianças e jovens? Este foi o tema explorado pela ilustradora paranaense de livros infantis Márcia Széliga e pelo cineasta curitibano Paulo Munhoz em debate, na Bienal do Livro Paraná 2010, mediado por Ieda de Oliveira. A discussão foi conduzida por questões referentes à educação e ao desenvolvimento criativo e intelectual do público infanto-juvenil através da linguagem pictórica em livros, bem como a linguagem audiovisual direcionada a este grupo.
O repertório cultural dos convidados é muito relacionado com o tema do debate. Márcia Széliga estudou na Escola de Belas Artes do Paraná, depois estudou Desenho Animado na Polônia, realizou diversas exposições artísticas e desde 1992 se dedica para a ilustração de livros infantis. Paulo Munhoz estudou Engenharia Mecânica, obteve sua pós-graduação em Computação Gráfica e é mestre em Tecnologia e Interação, pela atual UTFPR. Dirigiu o premiado curta-metragem PAX e o longa-metragem BRICHOS, que foi indicado ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Ele trabalha com linguagens em diferentes mídias e sua obra destaca-se pela produção voltada ao público infantil.
Na discussão, Márcia Széliga apontou que a criatividade dos alunos de ensino fundamental e médio é muitas vezes prejudicada por práticas opressoras de ensino que tolhem as possibilidades de exploração imagética pelos alunos. O discurso dela também foi permeado pela questão de como as editoras de livros didáticos muitas vezes restringem os tipos de ilustrações que o artista pode criar e limitam elementos visuais entre os que são moralmente permitidos e os que não moralmente inadequados, sem nenhum critério sério para embasar tais decisões por parte das editoras. Ela descreveu o contraponto: as editoras que dão liberdade ao artista de criar ilustrações para livros infanto-juvenis, inclusive expressando influências vanguardistas, tais como surrealismo, muito presente na obra de Széliga. Este tipo de postura mais liberal é o que no mundo contemporâneo dialoga melhor com o público-alvo e desperta maior interesse pelo livro didático.
Paulo Munhoz acrescentou a este tópico o fato de que imagens exploradas em sala de aula e em materiais didáticos estimulam as crianças cognitivamente e que o contato com diversos materiais com elementos pictóricos, bem como diferentes mídias, estimulam o raciocínio e a sensibilidade criativa.
Os palestrantes também apontaram como a visão “engessada” de um adulto pode se expandir com o contato com crianças de forma a criar desenhos que façam com que as crianças despertem mais interesse por se identificarem mais com a obra final. “Engessada” no sentido de relutar em aceitar a criação e composição de imagens oníricas, e do uso expressivo de cores diversas. No entanto, estes são justamente os elementos que mais instigam as crianças, tanto em livros quanto em animações. As crianças têm um grande interesse por fantasia, e os adultos precisam desenvolver idéias criativas sem medo de imaginar um mundo completamente novo quando estão criando uma obra direcionada ao público infantil, pois é a melhor maneira de atingir de fato este público. Ambos ilustraram esta idéia comentando momentos em suas carreiras profissionais que tiveram algum tipo de influência na criação e na recepção do público devido ao contato que eles têm diariamente com seus filhos.
Outro tema que permeou as ideias discutidas neste debate foi a polêmica de até que ponto as produções artísticas são mal utilizadas nas escolas por professores com uma visão impositiva e que desestimula os alunos a pensarem de forma crítica. Muitas obras são feitas para dialogar com seu público, e muitos professores com uma visão ultrapassada evitam que este diálogo seja expandido pelos alunos, especialmente em sala de aula, alegando que o bom aprendizado é aquele em que o aluno segue o que seu mestre diz, não procura novos desafios, e não se dispersa com imagens, como desculpas para não serem questionados por alunos que aprendam a pensar de forma analítica.
O debate, que inicialmente era sobre a qualidade na produção artística para o público infanto-juvenil acabou abrangendo questões ainda mais amplas. Tratou não apenas da produção destas obras como também a recepção destas obras pelo público e dos entornos sociais que influenciam cada obra, das mais diversas maneiras. Foi um debate muito produtivo e que estimulou a reflexão sobre este tema .