Nas últimas semanas vem se espalhado uma inquietação em torno da Literatura contemporânea no Brasil. Os críticos e professores Alcir Pécora e Beatriz Rezende tiveram uma discussão pertinente em torno do assunto, na proposta de programa Desentedimento do blog do Instituto Moreira Salles. Alguns dos pontos mais questionadores foi a que Literatura produzida atualmente é estranhamente contaminada por outras artes se tornando sem identidade, sem muitas novidades, como afirma com algumas palavras o professor da Unicamp.
Tornando a discussão uma falácia, paralelamente ao caos via web que a discussão causava, aconteceu na mesma semana, em Curitiba, o evento Zoona Literária, justamente trazendo muitas das vozes contemporâneas contaminadas, segundo a academia. O evento aconteceu nos dias 15,16 e 17 de abril, com a curadoria do poeta e professor Claudio Daniel e da artista e escritora Joana Corona. O evento — como me disse por alto o multi-artista Ricardo Corona — tinha a intenção de fazer uma real zona, no sentido coloquial de bagunça e diversão, tirando do eixo a atual cena literária de Curitiba.
Homenageando os escritores Valêncio Xavier e Wilson Bueno, o Zoona Literária contou com escritores e artistas que têm suas obras também pontuadas por um delicioso experimentalismo e uma relação intima — e necessária — de Literatura, Artes Plásticas, Teatro, Cinema e uma boa lista de outras possibilidades. Um dos aspectos mais interessantes das mesas-redondas foi justamente os assunto que circulou em cada uma delas, mesmo que o tema variasse: a forma leviana como a academia conservadora do país e, inclusive, a mídia tratam as novas experimentações e toda produção literária que venha acompanhada da palavra contemporâneo.
Além do lançamento do suplemento literário do evento, o jornal Vagau, o Zoona contou com muitos escritores — de vários cantos do país — lançando seus trabalhos, por editoras independentes — ou menos desconhecidas — do circuito costumeiro. Aí outro ponto interessante do Zoona Literária, um momento para nomes do circuito mais underground — mesmo sendo fora de moda usar esse termo em pleno ano 2011 com o auge das mídias sociais — terem voz, mostrarem, lerem e discutirem suas produções. Ainda, teve leituras de novela, poesia e textos em geral com performances, videoartes, documentários e todo tipo de material que traz à tona o hibridismo e polifonia geniais em que a produção atual opera.
Mas os pontos mais altos do Zoona Literária foram as mesas redondas pautadas sobre alguma polêmica que movimentava a plateia e os debatedores. Assuntos como a contaminação da Literatura com Artes Visuais e os experimentalismos que a poesia vive desde o Concretismo (e até antes) que configuram muito o status atual, permearam as primeiras discussões. Depois os debates ficaram mais intensos e além de todo o time de escritores ótimos que ainda vivem ainda no anonimato, o Zoona contou com a participação dos conhecidos Luiz Ruffato e Joca Reiners Terron.
Nesse momento a discussão ficou mais no entorno dos meios e formas que a Literatura atual vem se configurando através da internet e o advento de novas tecnologias para leitura. Ainda, se discutiu a questão de gêneros dentro da prosa chamada de mínima e o assunto se tornou ainda mais interessante quando surgiu o questionamento sobre as escolhas de um autor na hora de escrever. E para finalizar o dia, a última mesa redonda do sábado manteve um olhar sobre os trabalhos de Valêncio Xavier e Wilson Bueno, dando um ânimo a mais para os entusiastas dessa Literatura tão rica e híbrida. Quase impossível ressaltar todas as falas importantes que aconteceram nesses dias de intensa movimentação Literária.
Um evento como o Zoona Literária é uma atitude louvável e ousada, permitiu que uma parcela dos leitores e autores da literatura do presente pudessem dialogar e encontrar formas de tornar essas relações mais concretas. Se confirma a ideia de que a partir do momento que a literatura dialoga com outras artes, ela deixa de ser puramente literatura, passa a ser uma criação e aí que reside a dificuldade da academia aceitar trabalhos mais ousados. Mas, convenhamos, a linguagem não tem limites e como diz o filósofo italiano Giorgio Agambem: Contemporâneo é aquele que recebe em pleno rosto o facho de trevas que provém de seu tempo. E bem, com trevas os escritores e pesquisadores da Literatura Contemporânea lidam todos os dias.