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  • O Duplo (2012), de Juliana Rojas | Curta

    O Duplo (2012), de Juliana Rojas | Curta

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    A cineas­ta paulista Juliana Rojas tem con­quis­ta­do destaque no cenário cin­e­matográ­fi­co brasileiro com o cur­ta-metragem “O Dup­lo” (2012), tra­bal­ho pre­mi­a­do em Cannes e em diver­sos fes­ti­vais nacionais e estrangeiros. Na tra­ma, a pro­fes­so­ra Sil­via (Sab­ri­na Greve) é con­fronta­da com a imagem de seu dup­lo, uma espé­cie de clone soturno e neg­a­ti­vo, e entra em colap­so. A história toma por base o mito europeu con­heci­do como Dop­pel­gänger, que é con­sid­er­a­do um sinal nada aus­pi­cioso. Segun­do a len­da, quem vê seu dup­lo enfrenta o risco de maus pressá­gios e morte iminente.

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    A história do cur­ta foi basea­da em um depoi­men­to real sobre a aparição do Dop­pel­gänger, fato reg­istra­do no começo do filme e que dá o pon­tapé ini­cial para abrir as com­por­tas do uni­ver­so fan­tás­ti­co e das fábu­las de hor­ror, assi­natu­ra de Juliana. Assim como em “Lençol Bran­co” (2004) e “Um Ramo” (2007), tra­bal­hos pro­duzi­dos em parce­ria com o dire­tor Mar­co Dutra, a cineas­ta con­cil­ia com pre­cisão a triv­i­al­i­dade da vida de mul­heres que, abrup­ta­mente deses­ta­bi­lizadas, pre­cisam lidar de for­ma pavorosa com ele­men­tos sur­reais lig­a­dos ao macabro e à trans­for­mação físi­ca ou mental.

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    As ima­gens envel­he­ci­das e com tonal­i­dade mar­rom de “O Dup­lo” for­t­ale­cem a aura silen­ciosa e sin­is­tra que cer­ca a esco­la, espaço prin­ci­pal dos acon­tec­i­men­tos. Ao encar­ar o seu clone malig­no, os olhos da pro­fes­so­ra Sil­via gan­ham um bril­ho novo, algo que se move com a fero­ci­dade e carnific­i­na de um tubarão-bran­co. Há ele­men­tos de hor­ror e ten­são espal­ha­dos do começo ao fim dos vinte e cin­co min­u­tos do cur­ta, com destaque para a apoc­alíp­ti­ca cena em que a per­son­agem da atriz Gil­da Nomac­ce, pre­sença mar­cante nas pro­duções de Rojas, esti­ca e puxa o elás­ti­co de uma pas­ta de for­ma frenéti­ca e per­tur­bado­ra. Nestes poucos segun­dos que pare­cem durar uma eternidade, há a certeza abso­lu­ta do des­fe­cho trági­co. Sim­ples­mente fenomenal!

    O Dup­lo” faz emer­gir a qual­i­dade de um tra­bal­ho que explo­ra o ter­ror e o fan­tás­ti­co de for­ma con­sis­tente, dan­do força a um gênero ain­da pouco difun­di­do entre as pro­duções nacionais.

    Assista abaixo ao curta:

  • Livro: Coisas Frágeis — Neil Gaiman

    Livro: Coisas Frágeis — Neil Gaiman

    Nor­mal­mente a primeira coisa que vem em mente quan­do falam­os em Neil Gaiman é Sand­man, ou algu­ma de suas out­ras Graph­ic Nov­el, mas asso­ciar o nome aos seus tra­bal­hos literários ain­da não é algo muito comum. Acred­i­to que como muitos, ini­cial­mente nem sequer sabia que ele pos­suía tra­bal­hos além dos quadrin­hos e deci­di então ini­ciar min­ha leitu­ra nes­ta nova fac­eta — para mim — do autor pelo livro Coisas Frágeis (2010, Con­rad Edi­to­ra), com tradução de Michele de Aguiar Vartuli.

    É inter­es­sante já avis­ar que se você é daque­les que não gos­ta de saber cer­tas infor­mações antes de ler/assistir algo, aí vai uma dica impor­tante: leia a intro­dução só depois que você tiv­er lido Coisas Frágeis inteiro. Porque nela Neil Gaiman con­ta a história do moti­vo e situ­ação em que escreveu cada um dos con­tos, além de muitas vezes citar no esti­lo de quem se influ­en­ciou. Par­tic­u­lar­mente pre­firo deixar esse tipo de leitu­ra para depois, assim como não gos­to de ler críti­cas antes de ver um filme — as vezes evi­to até trail­ers — para assim poder depois com­parar as min­has impressões com aque­la do autor. Mas se você gostar de saber algu­mas par­tic­u­lar­i­dades antes, é garan­ti­do que são infor­mações que aju­dam e muito em uma com­preen­são mel­hor de cada um dos contos.

    Acho que pos­so afir­mar sem­pre ter sus­peita­do que o mun­do fos­se uma farsa bara­ta e tosca, um pés­si­mo dis­farce para algo mais pro­fun­do, mais esquisi­to e infini­ta­mente mais estran­ho, e de algu­ma for­ma sem­pre ter sabido a ver­dade. (p. 105)

    Coisas Frágeis é com­pos­to de nove con­tos e como não tin­ha ideia do que esper­ar e não haven­do ordem para seguir, deci­di escol­her aque­le que tin­ha o títu­lo mais inter­es­sante e par­ti para a leitu­ra. Emper­rei. Não era algo do tipo que eu que­ria ler naque­le momen­to. Próx­i­mo con­to. Depois de mais duas tro­cas, deci­di final­mente parar e ler um até o final. Desco­bri que o iní­cio de alguns deles é meio arras­ta­do mes­mo, pois a apre­sen­tação dos per­son­agens e situ­ações cos­tu­mam ser feitas de maneira bem pon­tu­a­da em um mar de out­ras infor­mações. Mas logo que você avança mais um pouco na leitu­ra e se ambi­en­ta neste mun­do, muitas vezes nada con­ven­cional, o con­to vai gan­han­do um óti­mo rit­mo, as vezes até bem frenéti­co, onde a últi­ma coisa que você quer faz­er é largar o livro de tão ansioso que fica para saber o seu desfecho.

    O inter­es­sante em todos os con­tos do Coisas Frágeis é que por mais cotid­i­anas e nor­mais que algu­mas situ­ações aparentam ser, sem­pre aparece algum ele­men­to fan­tás­ti­co no meio, mas que não que­bra total­mente esta sen­sação de que aqui­lo pode­ria acon­te­cer com qual­quer um a qual­quer momen­to. E por que não acon­te­cer com você tam­bém? Com certeza seria uma aven­tu­ra incrív­el acom­pan­har o mis­te­rioso dete­tive de Um estu­do em esmer­al­da ou assi­s­tir o curioso rit­u­al do O monar­ca do Vale.

    E então seu son­ho se encheu de deuses: deuses vel­hos e esque­ci­dos, mal-ama­dos e aban­don­a­dos, e novos deuses, coisas assus­tadas e tran­sitórias, ilu­di­das e con­fusas. (p. 175)

    Mas um dos con­tos em par­tic­u­lar, enti­t­u­la­do de O Pás­saro-do-Sol, me cativou de maneira sur­preen­dente! Não só pela excên­tri­ca ideia de um grupo cuja mis­são é exper­i­men­tar tudo que é comestív­el no mun­do, mas tam­bém pelos ele­men­tos mais mís­ti­cos e sim­bóli­cos, car­ac­terís­ti­ca que acred­i­to ser a mais inter­es­sante em Neil Gaiman e que é, de cer­ta for­ma, onipresente em seu tra­bal­ho. Se eu fos­se recomen­dar um con­to para alguém começar a ler Coisas Frágeis, com certeza seria este! Mas vou deixar a curiosi­dade pairan­do mes­mo sobre ele, pois ten­ho receio de estra­gar qual­quer agradáv­el sur­pre­sa que pos­sa vir a quem lê-lo.

    As reuniões men­sais dos epi­cu­ri­anos vêm acon­te­cen­do há mais de 150 anos, des­de a época do meu pai, do meu avô e do meu bisavô, e ago­ra temo que seja necessário parar, porque não res­ta mais nada que nós, ou nos­sos ante­ces­sores no clube, já não ten­hamos comi­do. (p. 135)

    O esti­lo dos con­tos de Coisas Frágeis muda dras­ti­ca­mente, poden­do assim causar uma cer­ta sen­sação de estran­heza se forem lidos muito segui­dos. Por isso recomen­do que sejam lidos com um cer­to inter­va­lo de tem­po, até para poder digerir todas as infor­mações de cada um. Por isso tam­bém, pode ser que alguns não sejam do gos­to de todos, mas que em ger­al o livro pos­sa ser do inter­esse de vários tipos difer­entes de pessoas.

    Acred­i­to que a dica mais impor­tante é: este­ja total­mente aber­to para o ines­per­a­do no iní­cio de cada con­to de Coisas Frágeis. Pois no mín­i­mo será uma aven­tu­ra por lugares, pes­soas e criat­uras fasci­nantes que você nun­ca esper­a­va, mas talvez gostaria, encon­trar. Se ao final de todos eles você ain­da sen­tir um gostin­ho de quero mais, como acon­te­ceu comi­go, foi tam­bém lança­do pela Con­rad a con­tin­u­ação Coisas Frágeis 2. Nos vemos no próx­i­mo livro?