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  • Livro: Precisamos Falar sobre o Kevin — Lionel Shriver

    Livro: Precisamos Falar sobre o Kevin — Lionel Shriver

    Goza­do como a gente vai esca­v­an­do o bura­co com uma col­her­in­ha de chá – uma con­cessão mín­i­ma, um arredonda­men­to insignif­i­cante ou uma lev­ís­si­ma refor­mu­lação de deter­mi­na­da emoção para out­ra que seja um tiquin­ho mais sim­páti­ca ou lisonjeira.

    Capa Precisamos falar sobre o KevinKevin Khatch­adouri­an é autor de uma chaci­na esco­lar que lev­ou quase uma dezena de pes­soas à morte. Nat­u­ral­mente ao saber­mos dessa infor­mação, são inevitáveis as per­gun­tas que bus­cam elu­ci­dar a razão de tal ato. “O que leva jovens com uma vida aparente­mente boa a tomarem tal ati­tude, tiran­do a vida de pes­soas inocentes?” “Por quê?” é a per­gun­ta que sin­te­ti­za muitas vezes nos­sa per­plex­i­dade diante do fato.

    Porém, ao lon­go da leitu­ra de Pre­cisamos falar sobre o Kevin (2007, Intrínse­ca), de Lionel Shriv­er, esse ato bru­tal pas­sa muitas vezes esque­ci­do, nos parece menor, ou pior ain­da, soa ape­nas como o des­fe­cho de uma sucessão de pecu­liares even­tos que pon­tu­am a vida da família Khatch­adouri­an e de seu filho.

    A história de Kevin é con­ta­da por sua mãe, de sim­bóli­co nome Eva. Por meio de car­tas ao mari­do Franklin, Eva remon­ta sua tra­jetória como uma moça solteira com um desta­ca­do sen­so críti­co aos EUA e com ímpetos de explo­rar o mun­do. Sua vida muda ao con­hecer (e se casar com) aque­le que muitas vezes seria seu opos­to, Franklin, um típi­co norte-amer­i­cano enam­ora­do por seu próprio país.

    A opção de nar­rar as lem­branças de Eva por meio de epís­to­las já nos diz muito sobre a história da qual vamos com­par­til­har em Pre­cisamos falar sobre o Kevin, uma vez que essa escri­ta con­fes­sion­al parece a mais ade­qua­da para que a nar­rado­ra pontue sua cul­pa, seu remor­so e as con­cessões inde­v­i­das que Eva fez ao mari­do des­de que engravi­dara. Seu rela­to é pon­tu­a­do pelo silên­cio e pela resignação.

    Eva não que­ria, de fato, uma cri­ança, mas não pôde “negar” ao mari­do a von­tade de ter um reben­to em casa. Mes­mo durante a gravidez ela se sen­tia descon­fortáv­el, como se a cri­ança anu­lasse sua indi­vid­u­al­i­dade, sua fem­i­nil­i­dade, sua inde­pendên­cia e, pior, seu casamento.

    Capa Precisamos Falar sobre o Kevin
    Capa da primeira edição

    Des­de a ges­tação, Eva tra­va lutas silen­ciosas com seu fil­ho, em um cli­ma hos­til que per­du­ra por toda nar­ra­ti­va. O cli­ma de Pre­cisamos falar sobre o Kevin nun­ca é leve, e por vezes a leitu­ra dos acon­tec­i­men­tos choca, magoa, deman­da um respiro ao leitor.

    Isso porque as memórias de Eva são retomadas com sin­ceri­dade e bru­tal­i­dade extremas. É pos­sív­el acom­pan­har niti­da­mente cada pas­so erra­do e dado em fal­so pela família, e o oneroso peso que eles têm de pagar por isso. Kevin não é sociáv­el, não é uma cri­ança de desen­volvi­men­to nor­mal – os papéis muitas vezes se invertem e é ele quem força seus pais a crescerem, os provo­ca com sua apa­tia, ques­tiona-os enquan­to pais. A vio­lên­cia, a intran­sigên­cia e o vazio que partem de Kevin per­me­iam a história e é impos­sív­el ficar indifer­ente a ela.

    Nat­u­ral­mente é fácil obser­var os Khatch­adouri­an e tachá-los de cul­pa­dos ou de neg­li­gentes… Ago­ra, a história dessa família, até cer­to pon­to, não se afas­ta muito da nos­sa: quan­tas vezes, em nos­sas relações, não nos vemos força­dos a ced­er a con­tragos­to, a tomar par­tido, a optar por lados? Obvi­a­mente a história de Kevin é um rela­to extrema­do de uma atmos­fera doen­tia e prob­lemáti­ca, mas por isso mes­mo Pre­cisamos falar sobre o Kevin é um livro tão mar­cante – antes de se encer­rar sobre o tema dos assas­si­natos em si, ele se abre ao dialog­ar com nos­sas relações famil­iares, com nos­sos arran­jos soci­ais e com nos­sas crenças.

  • Crítica: Amor por Contrato

    Crítica: Amor por Contrato

    A mídia ofer­ta prati­ca­mente tudo e os pro­du­tos surgem o tem­po todo, as vezes de for­ma pas­si­va e em out­ros momen­tos de modo agres­si­vo e obri­gatório, há um imper­a­ti­vo nos out­doors e cam­pan­has de TV. Amor por Con­tra­to (The Jone­ses, USA, 2009), do dire­tor Der­rick Borte, foca esse assun­to em um meio pas­si­vo e inclu­sive em uma situ­ação pecu­liar, numa família.

    Os Jones aparentam ser uma família comum ao son­ho amer­i­cano, mudam-se para um sub­úr­bio nobre, são inve­ja­dos pelos viz­in­hos que os vêem como a feli­ci­dade per­fei­ta, rica e feliz. Tudo isso seria real se os Jones não fos­sem parte de uma cam­pan­ha pub­lic­itária, no esti­lo con­heci­do como self-mar­ket­ing, que foca em cam­pan­has mais indi­re­tas que por out­ro lado obtém um resul­ta­do muito supe­ri­or ao esti­lo comum de mar­ket­ing, val­orizan­do exata­mente o que o usuário espera e sente em relação ao produto.

    Kate Jones (Demi Moore) é a cabeça pen­sante do pequeno grupo e a mel­hor vende­do­ra, segui­da pelos jovens que rep­re­sen­tam seus fil­hos e em últi­mo lugar está o estre­ante Steve Jones (David Duchovny), pai dessa supos­ta família, um expe­ri­ente nego­ci­ador de car­ros, mas pés­si­mo nesse ramo de self-mar­ket­ing. Os qua­tro tem alguns meses para faz­er crescer a ven­da de pro­du­tos em seg­men­tos especí­fi­cos, que vão des­de car­ros até jóias e pequenos cos­méti­cos. Tudo pode­ria dar cer­to nesse meio tem­po se os Jones não fos­sem pes­soas comuns con­viven­do em situ­ações comuns, sendo lev­a­dos a ques­tionar até que pon­to vale­ria a pena sem­pre desem­pen­har um papel que gera uma reação em cadeia nas pes­soas em sua volta.

    O mar­ket­ing pesa­do e indi­vid­ual é o foco de Amor por Con­tra­to, o que lev­an­ta, em muitos momen­tos, sen­ti­men­tos assus­ta­dores sobre quem são real­mente as pes­soas que con­vive­mos, fazen­do ques­tionar se não somos parte de uma grande cam­pan­ha pub­lic­itária de for­ma pas­si­va, todos os dias. Claro que a comé­dia fun­ciona muito bem durante o filme, uma fór­mu­la que já fun­cio­nou, mes­mo que de for­ma difer­ente, no óti­mo Show de Tru­man (1998) de Peter Weir. Muitas situ­ações diárias, em que sabe­mos que deter­mi­na­da situ­ação surge exata­mente para causar impacto e dese­jo, são tão sutis no nos­so dia a dia que é impos­sív­el não cair na risa­da com taman­ha orig­i­nal­i­dade no filme. A tril­ha sono­ra e o desen­ro­lar dos acon­tec­i­men­tos são pon­tos chaves, tam­bém. Não optan­do por músi­cas pop­u­lares, como cos­tumeira­mente Hol­ly­wood faz, a tril­ha sabe bal­ancear de for­ma orig­i­nal cada cena, crian­do cli­mas que fun­cionam muito bem no decor­rer do filme

    Amor por Con­tra­to tin­ha tudo para ser mais um filme no grande vol­ume de lança­men­tos de fim de ano nos cin­e­mas. Mas a sur­pre­sa é boa, prin­ci­pal­mente por tratar de um assun­to pecu­liar para a época de lança­men­to, 24 de dezem­bro no Brasil, ques­tio­nan­do a família e as relações de con­sum­is­mo surgi­das com a neces­si­dade de se ter tudo que se vê nas mídias e nas pes­soas com quem se con­vive. Além de ser uma comé­dia inteligente, ele cumpre um papel inter­es­sante ao mostrar que as pes­soas são facil­mente manip­u­ladas, prin­ci­pal­mente se forem estim­u­ladas a faz­er parte de um padrão social.

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  • Crítica: A Suprema Felicidade

    Crítica: A Suprema Felicidade

    crítica a suprema felicidade

    A Supre­ma Feli­ci­dade (Brasil, 2010) é o novo lon­ga de Arnal­do Jabor, depois do dire­tor ter fica­do quase 25 anos sem ter pro­duzi­do nen­hu­ma obra cin­e­matográ­fi­ca. Sendo este um de seus tra­bal­hos mais biográ­fi­cos, somos con­duzi­dos a uma avalanche de memórias dos anos 50, 60 e 70.

    O enre­do foca-se prin­ci­pal­mente na tra­jetória de Paulo, des­de sua infân­cia (Caio Man­hente), pas­san­do pela pré-ado­lescên­cia (Michel Joel­sas), até o final dela (Jayme Mataraz­zo). Além dis­so é desta­ca­do o desen­volvi­men­to da relação de seus pais (Dan Stul­bach e Mar­i­ana Lima) durante todo esse tem­po, como tam­bém, com destaque espe­cial, ao seu avô Noel (Mar­co Nanini).

    Soou meio vaga, con­fusa e sem muito foco a descrição aci­ma? Pois são jus­ta­mente essas três palavras que mel­hor car­ac­ter­i­zam A Supre­ma Feli­ci­dade. Se pen­sa­do como um grande apan­hado de memórias con­tadas na ordem que elas vem surgin­do, fazen­do só muito sen­ti­do para quem con­ta, o lon­ga cumpre muito bem o seu papel. Só que para os olhos, e ouvi­dos, dos out­ros, a exper­iên­cia pode não ser tão agradáv­el e praze­rosa como para quem a está con­tan­do, o que lit­eral­mente acon­tece neste longa.

    A per­gun­ta que não quer calar o tem­po inteiro é: a supre­ma feli­ci­dade para quem? No lon­ga há o desen­volvi­men­to (super­fi­cial) da tra­jetória dos seus per­son­agens ao lon­go dos anos, cada um, é claro, pos­suin­do seu próprio con­ceito de feli­ci­dade. Mas este parece ser sem­pre o mes­mo e que podem ser divi­di­dos em prati­ca­mente (com uma peque­na exceção) duas cat­e­go­rias: a fem­i­ni­na, que quer achar o mari­do ide­al para casar e para isso abdi­ca de muitas coisas da sua vida, e mas­culi­no, que quer achar a mul­her ide­al para casar e cur­tir a vida fora de casa. A feli­ci­dade já vem acom­pan­ha­da de seus pesos e, de cer­ta for­ma, um des­ti­no já fixo para cada um dess­es per­son­agens, que vai pas­san­do de pai para fil­ho, como um kar­ma inevitáv­el. Cer­tos momen­tos em A Supre­ma Feli­ci­dade, temos a impressão de que os três per­son­agens mas­culi­nos prin­ci­pais, da mes­ma família, são a mes­ma pes­soa, só que nasci­dos em épocas difer­entes e com­par­til­han­do o mes­mo presente.

    A car­ac­ter­i­za­ção de época em A Supre­ma Feli­ci­dade foi muito bem tra­bal­ha­da e, ape­sar de ser uma visão bas­tante nos­tál­gi­ca da época, é o maior méri­to do filme. Ape­sar da super­fi­cial­i­dade ger­al dos per­son­agens, as atu­ações em ger­al ficaram bem con­vin­centes, tiran­do as sofríveis tomadas do Nani­ni “tocan­do” o trompete, desta­can­do-se o pequeno papel de pipo­queiro, vivi­do pelo ator João Miguel, com suas piadas de dup­lo sentido.

    É muito difí­cil con­seguir sin­te­ti­zar A Supre­ma Feli­ci­dade, prin­ci­pal­mente para alguém como eu que não acom­pan­hou a tra­jetória do dire­tor. Como um con­jun­to de memórias nos­tál­gi­cas, e com mui­ta lig­ação sen­ti­men­tal, trans­feri­dos para a tela dos cin­e­mas, pare­ceu uma exper­iên­cia vál­i­da. Já para quem não se sente atraí­do pelas obras do dire­tor, que geral­mente é um caso de amor ou ódio, provavel­mente não mudará de opinião des­ta vez também.

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    httpv://www.youtube.com/watch?v=jrJsoBRtCfo

  • Café com Leite

    Café com Leite

    Qual é a definição de família para você? Pai, Mãe e fil­hos? Hoje, o sig­nifi­ca­do desse ter­mo ultra­pas­sa as questões de gênero e quan­ti­dade, trazen­do o sim­ples sen­ti­do de pes­soas que con­vivem no mes­mo espaço, ten­tan­do um com­preen­der o out­ro. E em Café Com Leite (2007), de Daniel Ribeiro, muitas questões são lev­an­tadas no sen­ti­do de definir os papéis numa família improvisada.

    Dani­lo decide ir morar com o namora­do Mar­cos, mas como nem tudo sai como o esper­a­do, os pais dele acabam fale­cen­do num aci­dente e ele fica com a guar­da do irmão, Lucas. Ago­ra, Dani­lo pre­cisa lidar com uma vida a três: orga­ni­zar a sua relação com Mar­cos e cri­ar um novo con­ceito de família para o irmão caçula.

    Café Com Leite, tra­ta da sutileza de uma nova família, deixan­do em segun­do plano a questão da homos­sex­u­al­i­dade dos novos pais, focan­do na adap­tação de um novo modo de viv­er. O cur­ta-metragem pas­sou por inúmeros fes­ti­vais pelo mun­do trazen­do um tema polêmi­co com lev­eza e bom-humor.

    

  • Crítica: Corações em Conflito

    Crítica: Corações em Conflito

    corações em conflito

    Tra­bal­har muito para con­seguir gan­har din­heiro sufi­ciente e dessa for­ma man­ter um padrão de vida dese­jáv­el é a real­i­dade de muitos. Em Corações em Con­fli­to (Mam­moth, Suécia/Dinamarca, 2009), de Lukas Moodys­son, é refleti­do jus­ta­mente o dis­tan­ci­a­men­to que este tipo de com­por­ta­men­to pode causar den­tro de uma família.

    Leo (Gael Gar­cia Bernal), cri­ador de um site sobre jogos eletrôni­cos de suces­so, e Ellen (Michelle Williams), cirurgiã total­mente ded­i­ca­da à sal­var vidas, são um casal de suces­so profis­sion­al. Eles tem uma fil­ha de oito anos mas, por tra­bal­harem demais, ela pas­sa a maior parte do tem­po com sua babá Fil­ip­ina, de for­ma que a relação entre pais e fil­ha é muito escas­sa. Quan­do Leo pre­cisa via­jar a Tailân­dia, para assi­nar um con­tra­to impor­tante, uma série de reações em cadeia começam a acon­te­cer, trazen­do con­se­quên­cias dramáti­cas para todos.

    Corações em Con­fli­to tem como prin­ci­pal car­ac­terís­ti­ca per­son­agens que mes­mo estando em lugares e situ­ações total­mente difer­entes, pos­suem algum tipo de lig­ação, na maio­r­ia dramáti­cas. O que lem­bra muito filmes como Babel, de Ale­jan­dro González Iñár­ritu, e Crash — No lim­ite, de Paul Hag­gis. Ape­sar dis­so, o lon­ga não chega a ser tão envol­vente e cati­vante quan­tos estes dois.

    O enre­do pos­sui algu­mas ideias bem inter­es­santes, prin­ci­pal­mente em mostrar difer­entes real­i­dades con­viven­do uma ao lado da out­ra sem terem con­sciên­cia dis­so. Corações em Con­fli­to ques­tiona tam­bém a fal­ta de atenção dada á própria família, prin­ci­pal­mente aos fil­hos, e a difi­cul­dade de lidar com eles por causa deste afas­ta­men­to cada vez maior. Algu­mas cenas do filme são bas­tante impac­tantes, mostran­do como o ciúme e a difi­cul­dade para con­seguir comu­nicar uma men­sagem, podem resul­tar em des­do­bra­men­tos muito sérios.

    Um dos grandes prob­le­mas de Corações em Con­fli­to está na sua tril­ha sono­ra, mais pare­cen­do um apan­hado das dez músi­cas favoritas de alguém da equipe de pro­dução, que sim­ples­mente jogou em cima do lon­ga em cenas que achou legal. As músi­cas sim­ples­mente não tem nen­hu­ma lig­ação com o que está acon­te­cen­do, algu­mas se repe­ti­ram incan­sáveis vezes, além de “que­brarem o cli­ma” dramáti­co alme­ja­do pelo lon­ga. Como as tril­has sono­ras são um aspec­to muito impor­tante para mim, fiquei muito inco­moda­do e pos­so afir­mar: difi­cil­mente vi uma pro­dução sono­ra tão ruim. Infe­liz­mente os atores tam­bém não aju­daram muito a man­ter o cli­ma do filme, seus papéis são bem vazios e cer­tas atu­ações são total­mente forçadas e sem emoção.

    Corações em Con­fli­to lida com prob­le­mas fre­quentes e impor­tantes das relações humanas, mas que muitas vezes são igno­ra­dos por causa da com­plex­i­dade que trazem con­si­go. Ape­sar de não con­seguir ser muito envol­vente, causa um descon­for­to dev­i­do aos fortes temas abor­da­dos, que podem ser usa­dos para uma boa dis­cussão após o filme.

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  • Crítica: Cabeça a Prêmio

    Crítica: Cabeça a Prêmio

    Cabeça a Prêmio (Brasil, 2010), estréia do dire­tor Mar­co Ric­ca, basea­do em livro homôn­i­mo de Marçal Aquino, é um filme nacional que ape­sar de ter um enre­do mis­tu­ran­do dra­ma e poli­cial, com ele­men­tos já bem con­heci­dos, con­segue ousar e apre­sen­tar um resul­ta­do muito pouco convencional.

    Miro (Ful­vio Ste­fani­ni) é um poderoso cri­ador de gado, que tam­bém faz para­le­la­mente out­ros “negó­cios” jun­to com seu irmão Abílio (Otávio Müller). Para isso eles usam o pilo­to de aluguel Denis (Daniel Hendler), que tem um caso com a fil­ha de Miro, Elaine (Alice Bra­ga), e faz o trans­porte de mer­cado­rias pela fron­teira do país. Tam­bém há mais dois capan­gas, Albano (Cás­sio Gabus Mendes) e Brito (Eduar­do Mosco­vis), respon­sáveis por man­ter a ordem e servirem de guardas costas. Resu­min­do: uma peque­na família de mafiosos nacional.

    Cabeça a Prêmio prati­ca­mente não faz uso de tril­ha sono­ra, só em pou­cas tomadas de pais­agem e de con­tem­plação de algum per­son­agem tam­bém com a pais­agem, sendo bas­tante “cru” na exibição dos acon­tec­i­men­tos, geran­do uma con­tem­plação maior aos even­tos ocor­ri­dos. Acred­i­to até que ele pode­ria ter dis­pen­sa­do toda tril­ha sono­ra, pois quan­do ela se faz pre­sente aca­ba destoan­do com com cli­ma do filme em ger­al. As pais­agens gan­ham um destaque espe­cial no lon­ga, não só pela beleza com que foram fil­madas, mas pelo sig­nifi­ca­do que gan­ham com o silên­cio e vazio que o filme propõe.

    Sem flash­backs ou qual­quer tipo de recur­so para ten­tar explicar as moti­vações de cada per­son­agem, somos lit­eral­mente joga­do em situ­ações para, cada um, ten­tar encaixar por si mes­mo as peças do que­bra cabeça ao qual somos apre­sen­ta­dos. Infe­liz­mente o uso exces­si­vo des­ta téc­ni­ca em Cabeça a Prêmio acabou geran­do uma fal­ta de conexão com o enre­do em ger­al, resul­tan­do em um sen­ti­men­to de que muito está acon­te­cen­do, mas ao mes­mo tem­po nada real­mente se desenvolve.

    A riqueza e a ganân­cia, são mostradas lit­eral­mente com todo seu peso, amar­gu­ra e indifer­ença em relação a vida. Tudo é ape­nas um negó­cio, que na ver­dade nun­ca sabe­mos qual real­mente é, e as pes­soas são sim­ples­mente empre­ga­dos, ten­tan­do pis­ar em cima do out­ro a qual­quer opor­tu­nidade. Todos ess­es ele­men­tos são extrema­mente claros em Cabeça a Prêmio não por serem desta­ca­dos ao exces­so na tela, mas por pos­suírem uma sutileza muito marcante.

    Mes­mo Cabeça a Prêmio sendo uma pro­dução muito boa, com ele­men­tos não muito con­ven­cionais, o filme em ger­al parece que lit­eral­mente não acon­tece, no sen­ti­do de não agradar e cati­var, e tem pou­cas chances de con­seguí-lo em relação ao públi­co. Isso inclui tan­to os que bus­cam o mais con­ven­cional quan­to aos que querem coisas mais diferentes.

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  • Crítica: Um Sonho Possível

    Crítica: Um Sonho Possível

    um sonho possível

    Michael Oher (Quin­ton Aaron) era um ado­les­cente negro, nasci­do em um bair­ro pobre, que provavel­mente pode­ria estar pre­so ou mor­to se não fos­se por Leigh Anne Touhy (San­dra Bul­lock[bb]), que o acol­heu para den­tro de sua família, em Um Son­ho Pos­sív­el (The Blind Side, EUA, 2009), o novo filme de John Lee Han­cock[bb], basea­do em fatos reais.

    Leigh é uma mul­her bas­tante deter­mi­na­da e tra­bal­hado­ra, tem como profis­são dec­o­rado­ra, mãe de dois fil­hos e casa­da com um ex-atle­ta, Sean Tuo­hy (Tim McGraw). Eles são uma família bem suce­di­da finan­ceira­mente, pos­suem uma rede de restau­rantes, e vivem uma vida ‘nor­mal’ até o dia que se deparam com Michael, de camise­ta e bermu­da andan­do pela rua em pleno inver­no, enquan­to estavam indo para casa. Leigh, subita­mente, toma a decisão de levá-lo jun­to e, o que ini­cial­mente seria ape­nas um gesto de bon­dade na noite antes do feri­ado de Ação de Graças, tornou-se uma exper­iên­cia que mudou a vida de todos.

    Basea­do no livro The Blind Side: Evo­lu­tion of a Game, de Michael Lewis, Um Son­ho Pos­sív­el foi lança­do, apro­pri­ada­mente, nos Esta­dos Unidos na época do feri­ado de Ação de Graças, uma data para reunir as famílias e, depen­den­do da crença, agrade­cer a Deus. Só que neste caso, a religião é apre­sen­ta­da de maneira bem explíci­ta. O cris­tian­is­mo está estam­pa­do em todo lugar, às vezes mais implici­ta­mente, out­ras não. Curioso perce­ber que ape­sar de alguns per­son­agens se uti­lizarem de intenções cristãs para jus­ti­ficar seus atos, surge a dúvi­da da sua veraci­dade (out­ras são con­fir­madas fal­sas) mas, ape­sar de tudo ter­mi­nam com a imagem de bom samar­i­tano. A estru­tu­ra famil­iar tam­bém é bas­tante reforça­da, só que des­ta vez, com a mul­her no coman­do e o mari­do fazen­do, às vezes, o  papel de mãe.

    Tec­ni­ca­mente o filme ape­nas repete a fór­mu­la amer­i­can way of life and hol­ly­wood style (jeito amer­i­cano de viv­er e esti­lo hol­ly­wood­i­ano), rec­hea­do com tril­ha sono­ra para reforçar as emoções e, com uma lin­eari­dade quase impecáv­el, sem grandes sur­pre­sas, para agradar o públi­co de todas as idades (“dos 8 aos 80 anos”, como diria um pro­du­tor amer­i­cano). Mes­mo poden­do ter abor­da­do cer­tos assun­tos (pre­con­ceito, pobreza, edu­cação, dro­gas e o próprio altruís­mo), eles são rap­i­da­mente “fecha­dos” assim que apare­cem, de for­ma a não ger­ar qual­quer incô­mo­do ou inqui­etação. Afi­nal, você está lá para se entreter e ser feliz.

    Um Son­ho Pos­sív­el é politi­ca­mente cor­re­to e inspi­rador para a pro­dução de atos altruís­tas, de prefer­ên­cia por aque­les finan­ceira­mente favorecidas.

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  • Crítica: Preciosa – Uma História de Esperança

    Crítica: Preciosa – Uma História de Esperança

    Preciosa

    A edu­cação, tan­to em casa quan­to na esco­la, é um tema que nem sem­pre é abor­da­do de maneira realís­ti­ca e ger­ado­ra de dis­cussões pro­fun­das, em filmes mais com­er­ci­ais. Difer­ente de Pre­ciosa – Uma História de Esper­ança (Pre­cious: Based on the Book “Push” by Sap­phire, EUA, 2009), de Lee Daniels, que, de for­ma crua e indi­ges­ta, não só a enfa­ti­za, como fala tam­bém de out­ros assun­tos del­i­ca­dos como: amor, abu­so e homossexualismo.

    Claireece Pre­cious Jones (Gabourey Sidibe) é uma ado­les­cente de 16 anos, obe­sa e negra. Ela vive com a sua mãe, Mary (Mo’Nique), que pas­sa o dia inteiro em casa assistin­do TV e a tratan­do como uma serviçal. A relação entre as duas é bas­tante con­fusa e vio­len­ta. A mãe a agride físi­ca e psi­cológi­ca­mente, afir­man­do que Claireece é bur­ra e que nun­ca será mel­hor do que ela em nada. Um com­por­ta­men­to que aca­ba sendo incor­po­ra­do pela garota.

    Toda vez que Claireece encon­tra-se em um momen­to difí­cil, foge para um mun­do imag­inário onde é famosa e dese­ja­da por todos. Um lugar onde a sua pre­sença real­mente impor­ta. Tudo isso acom­pan­hado de uma tril­ha sono­ra “glam­ourosa”, reme­tendo á fama e ao suces­so, que tam­bém está pre­sente nas tomadas que mostram o que real­mente está acon­te­cen­do nes­sas situ­ações, enfa­ti­zan­do a con­fusão, de cer­ta for­ma esquizofrêni­ca, da sua per­cepção da real­i­dade. Acon­tec­i­men­tos que graças a óti­ma direção, con­seguem mes­mo mostran­do pouco, diz­er tudo.

    A importân­cia de uma edu­cação mais humana e menos genéri­ca, para a for­mação e evolução pes­soal, é retrata­da pela esco­la “Cada Um Ensi­na Um”, a qual Claireece é trans­feri­da após ser expul­sa da ante­ri­or, por estar grávi­da de seu segun­do fil­ho. Lá, pela primeira vez em sua vida, sente-se como uma pes­soa, graças à ded­i­cação e atenção da pro­fes­so­ra Mrs. Rain (Paula Pat­ton). Um dos méto­dos uti­liza­do, durante e fora das aulas, é que os alunos escrevam em um cader­no os seus pen­sa­men­tos, que é muito pare­ci­do com a téc­ni­ca usa­da pela per­son­agem de Hillary Swank em Escritores da Liber­dade, de Richard LaGrave­nese, para não só estim­ulá-los á escr­ev­er, mas tam­bém para refle­tirem sobre suas próprias vidas.

    O tipo de abor­dagem uti­liza­da para retratar ess­es temas, lem­bra bas­tante out­ros sur­preen­dentes filmes como: A pro­fes­so­ra de piano, de Michael Haneke, que retra­ta tam­bém uma relação muito doen­tia, e depen­dente, entre mãe e fil­ha e, Bad Boy Bub­by, de Rolf de Heer, a história de um homem que ficou prati­ca­mente metade da sua vida tran­ca­do em um quar­to, moran­do só com a mãe, descon­hecen­do tudo que exis­tia no mun­do. O enre­do, de Pre­ciosa, foi basea­do no livro Push, de Sap­phire, lança­do no Brasil como “Pre­ciosa”, pela edi­to­ra Record.

    Pre­ciosa, ape­sar de ser um filme sobre super­ação, não cai na mesmice de apre­sen­tar os fatos sem­pre de maneira açu­cara­da, pas­san­do a impressão de que ultra­pas­sar cer­tas bar­reiras é fácil, rápi­do e que geral­mente ter­mi­nam bem. Além dis­so, deixa claro que, não faz­er nada é escol­her um dos lados.

    Out­ra críti­cas interessantes:

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=bmp0Dlz0HwY

    Leonar­do Campos