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  • Livro: Sem Família — Hector Malot

    Livro: Sem Família — Hector Malot

    A lit­er­atu­ra france­sa de fim de sécu­lo XIX é mar­ca­da pela moral con­struí­da por seus per­son­agens sem­pre pre­sentes em dois gru­pos: os bons e batal­hadores e os de má índole, que chegam às últi­mas con­se­quên­cias para se ter algo. Sem Família (Sans Famille, Edi­to­ra e Livraria do Chain, 2010), escrito por Hec­tor Mal­ot, é con­sid­er­a­do um clás­si­co desse esti­lo, prin­ci­pal­mente por retratar a odis­séia de um garo­to que em ple­na infân­cia tem que lidar com questões como adoção, aban­dono, tra­bal­ho escra­vo, pere­gri­nações pelo mun­do e isso tudo sem perder a esper­ança, con­seguin­do tirar o máx­i­mo de proveito de cada situação.

    O meni­no Rena­to vivia muito feliz com sua mãe Maria Bar­bari­no no inte­ri­or da França. Seu pai, um homem rude, mora­va na cidade por con­ta de seu tra­bal­ho. É quan­do esse homem vol­ta para casa, dev­i­do a um aci­dente de tra­bal­ho, que Rena­to vê sua vida cal­ma, ruir. Ao desco­brir que foi encon­tra­do aban­don­a­do, ain­da bebê, por aque­les que con­sid­era seus pais, o meni­no é ven­di­do, pelo Sr. Bar­bari­no, a um músi­co errante que pas­sa­va pela peque­na aldeia. O garo­to, a par­tir desse momen­to, pas­sa por momen­tos mais extremos entre a tris­teza e a feli­ci­dade, tudo em nome da sobre­vivên­cia e pela bus­ca da sua família.

    Em tem­pos de uma França difí­cil, asso­la­da pelas desigual­dades soci­ais extremas, mes­mo meio sécu­lo após der­ro­ta de Napoleão, o país con­ta­va com o tra­bal­ho explo­ratório de cri­anças e até mes­mo para adul­tos resta­va ape­nas serviços em situ­ações precárias. No con­tex­to de Sem Família isso tudo fica bem claro, mes­mo que de for­ma bem sim­plória. As cri­anças eram explo­radas e não exis­ti­am medi­das de pro­teção e nem obri­ga­to­riedade na Edu­cação. Mal­ot traz uma grande dis­cussão sobre os dire­itos e deveres infan­to-juve­nis, um assun­to ain­da em pau­ta hoje.

    O enre­do de Sem Família é reple­to de aven­turas do garo­to que man­tém firme os seus ideais de bon­dade e bus­ca pelo que con­sid­era o ápice da feli­ci­dade: encon­trar a ver­dadeira família. Em nen­hum momen­to o meni­no se deixa abalar e isso às vezes soa exager­a­do ao leitor atu­al, pois o dis­cur­so con­ta com grandes dos­es de boa moral. Claro que esse tipo de lit­er­atu­ra do fim do sécu­lo XIX, como pode se perce­ber tam­bém em Os mis­eráveis de Vic­tor Hugo, con­ta­va ain­da com bases fortes no Human­is­mo e esti­los de escri­ta ain­da basea­d­os em com­pên­dios de retóri­ca e poéti­ca, não con­tan­do com nen­hu­ma grande vari­ação estéti­ca na escrita.

    Como Rena­to é o próprio nar­rador da sua saga, isso deixa o leitor muito mais inti­mo durante a leitu­ra, como se fos­se um espec­ta­dor ávi­do do meni­no durante as suas aven­turas. Sem Família, mes­mo que sem esse propósi­to ini­cial, é um óti­mo livro infan­to-juve­nil. Mes­mo que rel­a­ti­va­mente lon­go, o livro é de leitu­ra fácil e com enre­do agradável.

    A edição que li do livro é a últi­ma lança­da no país pela Edi­to­ra e Livraria do Chain, de Curiti­ba. Este vol­ume con­ta com a úni­ca tradução fei­ta para o por­tuguês do Brasil por Vir­ginia Lafèvre e com ilus­trações do famoso desen­hista, mural­ista, entre out­ras habil­i­dades artís­ti­cas, o curitibano Poty Lazarot­to. As ilus­trações, mes­mo que notada­mente típi­cas do sul do Brasil, mais pre­cisa­mente a região dos pin­hais, dialogam per­feita­mente com as aven­turas relatadas no inte­ri­or da França, com pais­agens bucóli­cas e de traço próprio.