Tag: Biblioteca Pública do Paraná

  • Olhar por trás de estantes

    Olhar por trás de estantes

    Biblioteca de Leminski, fotografada sem produção prévia. Foto : Carlos Roberto Zanello de Aguiar (Macaxeira).
    Bib­liote­ca de Lemins­ki, fotografa­da sem pro­dução prévia.
    Foto : Car­los Rober­to Zanel­lo de Aguiar (Macax­eira).

    Des­de ado­les­cente fre­quen­to bib­liote­cas públi­cas. Quan­do cri­ança, não. Nas esco­las em que estudei, em Paranaguá, não havia bib­liote­cas. Uma vez, uma pro­fes­so­ra inven­tou uma bib­liote­ca ambu­lante. Cada aluno dev­e­ria levar um livro. Não fun­cio­nou. Ninguém lev­ou livros. Quan­do mudei para Curiti­ba, pas­sa­va um tem­pão passe­an­do pelos corre­dores da Bib­liote­ca Públi­ca do Paraná. Min­has estantes preferi­das eram as de lit­er­atu­ra brasileira e poe­sia. Tam­bém pas­sei quase cem anos de solidão e areia diante da lit­er­atu­ra em lín­gua espan­ho­la, quan­do desco­bri Gabriel Gar­cia Márquez e Jorge Luis Borges.

    Uma bib­liote­ca que sem­pre me fas­ci­nou foi a da Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Paraná, quan­do ain­da não era alu­na. A diver­si­dade de títu­los, e em lín­guas difer­entes impres­sion­a­va. Lem­bro do encan­to por um livro de Luís da Câmara Cas­cu­do sobre lendas brasileiras. Quan­do me tornei alu­na, pude emprestar um livro de poe­mas de Manuel Ban­deira traduzi­dos para o francês. Mais tarde, na pós-grad­u­ação, li livros sobre lit­er­atu­ra japonesa.

    Out­ra bib­liote­ca que gostei de con­hecer foi a do Insti­tu­to Goethe. Fre­quentei pouco, mas quan­do a con­heci, era uma novi­dade emprestar, além de livros, CDs e filmes. Depois, em São Paulo, vis­itei bib­liote­cas que tam­bém tin­ham seções mul­ti­mí­dia. E nas quais pas­sa­va horas lendo revis­tas sobre todo o tipo de assunto.

    Nesse ano con­heci a bib­liote­ca do Insti­tu­to de Estad­ual de Edu­cação Eras­mo Pilot­to, esco­la na qual Hele­na Kolody foi pro­fes­so­ra. Uma ami­ga, a poeta Jane Sprenger Bod­nar, tra­bal­ha lá. O acer­vo, emb­o­ra seja uma bib­liote­ca esco­lar, é diver­si­fi­ca­do. Além de lit­er­atu­ra e edu­cação, há livros sobre cul­tura pop­u­lar. Pena que pre­cise de refor­mas e não rece­ba atenção do gov­er­no do estado.

    Biblioteca Pública do Paraná (Foto: Yasmin Taketani)
    Bib­liote­ca Públi­ca do Paraná (Foto: Yas­min Taketani)

    Ape­sar de ter sido reestru­tu­ra­da, espe­cial­mente na área de comu­ni­cação visu­al, hoje ten­ho medo de voltar à Bib­liote­ca Públi­ca do Paraná. Já li quase todos os livros da seção de Lit­er­atu­ra que me inter­es­savam. Há poucos títu­los novos. Con­fes­so que ler os autores da lit­er­atu­ra con­tem­porânea, cel­e­bra­dos em even­tos pro­movi­dos pela própria BPP me atemoriza.

    Não con­si­go mais exercer o rit­u­al juve­nil, de aven­tu­rar entre as estantes para desco­brir um livro estran­ho. Falan­do em estran­heza, tem­pos atrás havia leitores bizarros entre os fre­quen­ta­dores da BPP. Escritores, artis­tas, design­ers, jor­nal­is­tas? Não: sem-teto ou desem­pre­ga­dos, enfur­na­dos nas salas de leitu­ra. A neolib­er­al­iza­ção do lugar expul­sou os bizarros, que devem ter volta­do para o seu lugar: as ruas.

    Cer­ta vez, num pro­gra­ma de tevê, vi a bib­liote­ca da pro­fes­so­ra de lit­er­atu­ra Luzilá Gonçalves, que mora no Recife. Os livros estavam em des­or­dem e as estantes roí­das por cupins. Des­or­dem igual às das bib­liote­cas do poeta Paulo Lemins­ki e do ilustrador Clau­dio Seto. Nem tudo está con­forme a nova ordem e os cupins roem as prateleiras. Mais que cupins, o que impor­ta é ali­men­tar os ratos de bib­liote­ca. Em tem­po de bien­ais e grandes even­tos de lit­er­atu­ra, bib­liote­cas cheias de poeira são um refú­gio con­tra os que cobrem a história com verniz.

  • “Escrever é ficar sozinha” — A escritora Marina Colasanti em Curitiba

    Escrever é ficar sozinha” — A escritora Marina Colasanti em Curitiba

    nada na mangaNo dia 17 de março, a escrito­ra Mari­na Colas­an­ti encon­trou com mais de cem cri­anças, de 5 a 10 anos, na Bib­liote­ca Públi­ca do Paraná em Curiti­ba. Foi boni­to ver a platéia de cri­anças, falan­do, rindo, brin­can­do e aten­ta. Mari­na, aos 73 anos, con­segue falar a lín­gua delas. Não à toa, é auto­ra de mais de 50 livros, muitas histórias de fadas. Out­ras, crôni­cas, reporta­gens, poe­sia para cri­anças. Todos pare­cem ter em comum a ideia de ser histórias para cri­anças de todas as idades.

    Durante o bate-papo, Mari­na Colas­an­ti ves­tia um tern­in­ho com saia e ficou em pé, mãos cruzadas à frente, para falar com as cri­anças. Uma pos­tu­ra boni­ta, despo­ja­da, de desarme e encan­to. Falou um pouco sobre ela, incluin­do a frase do títu­lo. E que escritor é profis­são de gente soz­in­ha, mas que nun­ca está só.

    Lem­bro o primeiro livro que li de Mari­na Colas­an­ti, Nada na Man­ga. Desco­bri na Bib­liote­ca Públi­ca, orgul­hosa. Descon­heci­da pra mim, ela já escrevia crôni­cas para o Jor­nal do Brasil e tra­bal­ha­va na Revista Nova. Ain­da não sabia que era casa­da com o poeta Affon­so Romano de Sant´anna. Pelas crôni­cas, con­heci as fil­has, Alessan­dra e Fabiana.

    Fique feliz em ler as crôni­cas de Mari­na. Que falavam sobre a solidão. Eu, aos 15 anos, me iden­ti­fi­ca­va com aque­la mul­her soz­in­ha, casa­da e com 2 fil­has. E me ini­ci­a­va na arte de ser sozinha.

    Até hoje lem­bro as primeiras leituras. E tam­bém fiquei sat­is­fei­ta em encon­trar Mari­na Colas­an­ti, ao vivo, sem falar uma palavra com ela. Por que ela gos­ta de escr­ev­er e ensi­na que ser soz­in­ha pode ser diver­tido. Ler é uma aven­tu­ra, um encon­tro com a alma.

    Durante anos busquei quem lesse os mes­mos livros que eu. Algu­mas vezes ain­da me ilu­do quan­do encon­tro um leitor. Me emo­ciono, quero pro­lon­gar a relação. Mas sei que não con­seguirei deixar de ser soz­in­ha. Cada um segue seu cam­in­ho. Se tiv­er tal­en­to e per­sistên­cia, pub­li­cará um livro para com­par­til­har suas leituras em público.

    O Dalai Lama diz que exis­tem seis mil­hões de religiões no plan­e­ta para seis mil­hões de almas. Pou­cas seguirão soz­in­has, escritoras ou leitoras. Mari­na Colas­an­ti sabe o que é a lit­er­atu­ra. A feli­ci­dade que provo­ca, e não é pre­ciso sair de seu silên­cio. Tam­bém sabe que é bom com­par­til­har a alma. Por isto, talvez, a pos­tu­ra de meni­na leviana e com­por­ta­da, diante dum auditório reple­to de bor­bo­le­tas coloridas.

    Tex­to pub­li­ca­do tam­bém no blog microp­o­lis, da própria auto­ra Mar­il­ia Kub­o­ta.