Daniel Galera em seu quarto romance, Barba Ensopada de Sangue (Companhia das Letras, 2012), é protagonizado por um “homem forte e silencioso” como diria Tony Soprano. Assim como em Mãos de Cavalo e Até o Dia que o Cão Morreu, temos uma narrativa onde a violência surge no cotidiano confortável da classe média.
Após o suicídio do pai, o protagonista decide viver um ano em Garopaba para se dedicar como instrutor em uma academia da região e se isolar de sua cidade natal, Porto Alegre. Ao seu lado, temos a cachorra Beta, que pertencia ao seu pai e que ele se recusou a sacrificar.
Diagnosticado com uma doença neurológica rara que o impossibilita de guardar na memória o próprio rosto e o das pessoas com quem vem a se relacionar, o protagonista leva consigo um álbum de retratos para lembrar-se do rosto dos amigos, da família e inclusive da sua própria face.
Eis um dos mistérios do romance: Na conversa que teve com seu pai quando esse o informa que ira tirar a própria vida, fica sabendo que seu avô, Gaudério, acabou se isolando na cidade de Garopaba nos anos 1960 e devido ao seu comportamento violento foi assassinado a facadas por vários nativos e seu corpo nunca foi encontrado. Descobrir o que realmente aconteceu com ele é uma de suas metas, mesmo que isso possa colocar sua vida em risco.

“Ninguém escolhe nada e mesmo assim a responsabilidade é nossa” diz o personagem principal em uma discussão com a ex-namorada. O centro do romance trata a questão de livre-arbítrio e determinismo, tópico estudado por David Foster Wallace, uma grande influência do escritor brasileiro e do qual traduziu recentemente a coletânea Ficando Longe do Fato de Já Estar Longe de Tudo.
“Desde o princípio do trabalho, eu queria que o romance explorasse de maneira implícita a questão filosófica da responsabilidade humana em uma visão de mundo determinista, segundo a qual tudo que acontece é apenas resultado inevitável do que aconteceu logo antes. É um assunto que me interessa.” Diz o autor em uma entrevista para o site do Jornal do Comércio
O único ponto negativo está no trabalho gráfico do livro. De longe, uma das piores capas jamais feitas. Fora isso, a trama de mais de 400 páginas não é em nenhum momento cansativa e uma das críticas feitas ao livro, da qual ele poderia ser menor e menos verborrágico, é infundado.
Barba Ensopada de Sangue é um ótimo romance, mas ainda é cedo para dizer qual é sua importância para a literatura brasileira. Ao mesmo tempo vemos uma produção literária nacional dar passos cada vez maiores (antologias, feiras literárias, críticos atento ao que acontece no cenário nacional, etc.), ainda não sabemos no que isso vai dar, pro bem ou pro mal. Ficamos no aguardo.