
Tudo que já funcionou muito no passado sofre de um certo medo e decepção quando adaptado no presente, considerado incapaz de reproduzir a aura dos clássicos. Talvez seja no cinema o campo que sofre maior julgamento nesse aspecto e não é diferente com o remake da série inicialmente radiofônica e estrelada nos anos 60 com o mestre das artes marciais Bruce Lee. O Besouro Verde (The Green Hornet, USA, 2010), de Michel Gondry, tenta aproximar o enrendo ainda da década de 30 para os dias atuais prometendo ação e comédia aliados a criatividade do diretor francês.
O boa-vida Britt Reid (Seth Rogen) é o único herdeiro do império jornalístico de James Reid (Tom Wilkinson), seu pai, e ele nunca teve maiores responsabilidades até a morte dele. Após o acontecimento Britt percebe que mal entende dos negócios herdados e muito menos conhece as pessoas que trabalhavam para o pai e acaba por travar amizade com um dos mais improváveis funcionários, o mecânico fiel do seu pai, Kato (Jay Chou). Aproveitando a genialidade do amigo oriental, Britt propõe que eles façam algo de grandioso: combatam o crime, mascarados, na violenta Los Angeles e tentarão fazer isso com a ajuda da especialista em criminologia, e secretária de Britt, Lenore Case (Cameron Diaz). Mas, não contam que o crime na cidade é bem organizado e que um dos chefões, Chudnofsky (Christoph Waltz), não vai deixar que dois mascarados atrapalhem seu caminho.
O roteiro de O Besouro Verde foi adaptado pelo próprio Seth Rogen, junto com o roteirista Evan Goldberg, e o ator vem recebendo indicações de ser a nova promessa da comédia atual, apesar de ter no currículo uma meia dúzia de comédias românticas bem caricatas. Mesmo não sendo o mais original dos atores, ele não deixa a adaptação sem clima, pelo contrário, sempre há uma piadinha vinda de Britt contrastando com a comum seriedade do companheiro Kato, que sempre salva a dupla de heróis, interpretado pelo o astro taiwanês Jay Chou, pouco conhecido por esses lados. Já Cameron Diaz não desempenha bem nem o papel de secretária sexy, muito menos a de mulher independente, sendo ela fundamental no enredo, mas se sai como uma simples peça ornamental. O grande trunfo nos personagens do longa é Christoph Waltz, o traficante com um humor extremamente negro, Chudnofsky, lembrando muito os trejeitos de seu personagem em Bastardos Inglórios.
Nem todo o potencial de Michel Gondry é aproveitado em O Besouro Verde, mas foi uma ótima escolha, pois o diretor francês tem uma extensa carreira com trabalhos extremamente criativos e a improvisação de materiais, na maioria dos casos, é um dos seus melhores trunfos. O próprio Gondry, conhecido por produções envolvendo a fantasia relacionada a psique humana, admite que filme é uma produção para vender, mas que a sua assinatura permanece ali, e realmente isso acontece. A criatividade do francês é uma marca incrível e justamente em poder ousar, contando com muito mais dinheiro, que algumas sequências ficaram próprias do estilo dele aliadas à tecnologia 3D. Aliás, ao contrário do que se afirma, as cenas em bullet-time não são exageros em referência à trilogia Matrix, ou somente artimanhas para funcionar nas telas tridimensionais. Michel já fazia uso da técnica em 1998 — antes dos Irmãos Wachowski — em um comercial da Smirnoff. Mas de fato, o 3D é bastante desnecessário, pois apenas algumas cenas os efeitos realmente funcionam.
Não vi todo essa alarde em torno da suposta falta de piadinhas e engajamento das situações no longa. O Besouro Verde não vem cheio de pretensões, é mais um filme de super heróis por escolha e os dois atores desempenham isso de uma forma bem natural. Creio que isso seja uma das negatividades da internet, a influência de ler tudo ao mesmo tempo e ir com uma opinião prévia para o cinema pode trazer um menor aproveitamento do longa. Recomendo que quem não conhece a fundo o trabalho do Michel Gondry que busque ver a infinidade de videoclipes, comerciais para TV e longas metragens que ele produziu. É um diretor que merece atenção.
Claro que O Besouro Verde é um filme para vender, impossível não gastar uma quantia grande de dinheiro envolvendo muita ação, 3D e outros efeitos especiais e não se esperar grandes bilheterias, mas convenhamos que a safra de longas envolvendo super-heróis ¨por acaso¨ tem sido muito decadentes. O Besouro Verde é despretensioso, vale o ingresso pela diversão, pela iniciativa de adaptação de Seth Rogen e pela criatividade de Michel Gondry.
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Trailer:
httpv://www.youtube.com/watch?v=Kx4MZMwqph0