Author: Otávio Colino

  • Ilsa — a Guardiã Perversa da SS (1975), de Don Edmonds

    Ilsa — a Guardiã Perversa da SS (1975), de Don Edmonds

     A  belíssima loira e peitudissima atriz Dianne Thorne estrela a produção.
    A belís­si­ma loira e pei­tud­is­si­ma atriz Dianne Thorne estrela a produção.

    Foi em um lam­pe­jo de sabedo­ria artís­ti­ca, digna somente dos maiores tram­biqueiros de Hol­ly­wood, que alguns pro­du­tores da déca­da 50 ( alguns dizem déca­da de 40) tiver­am a belís­si­ma ideia de explo­rar todo o absur­do e vio­lên­cia da ocu­pação nazista alemã durante a segun­da guer­ra mundial.Tudo isso em pro­duções baratas que se diziam realista.

    A intenção era lit­eral­mente explo­rar esse tema, gan­har din­heiro em cima de algo que até hoje fasci­na e repu­dia qual­quer pes­soa que já ten­ha ouvi­do falar como os pri­sioneiros eram trata­dos nos cam­pos de con­cen­tração. Nasceu assim o Nazi-xplota­tion, um sub­gênero bem famoso do cin­e­ma X‑plotation.

    Quan­do a déca­da de 60 chegou, os jovens que­ri­am mais era saber de sexo e vio­lên­cia, então não demor­ou para que os mes­mos pro­du­tores tram­biqueiros começassem a pen­sar numa maneira mais per­sua­si­va de faz­er essa jovem plateia, com hor­mônios a flor da pele, irem ao cin­e­ma. Nes­sa época tam­bém sur­gi­ram mais sub­gêneros den­tro do X‑plotation e quase toda pro­dução bara­ta tin­ha que ter peit­in­ho e sangue a cada minuto.

    Love Camp 7, por Lee Frost
    Love Camp 7, por Lee Frost

    Com o suces­so do filme Love Camp 7 de Lee Frost em 1969, o pro­du­tor David F. Fried­man’s decid­iu inve­stir na mes­ma ideia de vio­lên­cia, putaria e… nazis­tas, mais uma vez. Assim surgiu Ilsa — a Guardiã Per­ver­sa da SS (Ilsa — She Wolf of the SS), que seria dirigi­do por Don Edmonds (1937–2009), em 1975. Edmonds era um ator de pequenos papéis e dire­tor de filmes eróti­cos de baixo orça­men­to. Da noite pro dia se tornou um dire­tor cul­tua­do por esse filme que é o maior rep­re­sen­tante do Nazi-xplota­tion de todos os tempos.

    Até entrar para a his­to­ria do cin­e­ma como Ilsa, Dianne já fazia suces­so em revis­tas mas­culi­nas como mod­e­lo pin-up e tam­bém como strip­per em Las Vegas. Começou no cin­e­ma em 1964, fazen­do pro­duções eróti­cas baratas e chegou a ter uma peque­na par­tic­i­pação em um episó­dio na clás­si­ca série Star Trek.

    Ilsa, Harem Keeper of the Oil Sheiks, por Don Edmonds
    Ilsa, Harem Keep­er of the Oil Sheiks, por Don Edmonds

    Em 1975 ela encon­tra seu papel mais mar­cante inter­pre­tan­do a coman­dante Ilsa. Ela reprisa o papel mais três vezes em Ilsa, Harem Keep­er of the Oil Sheiks (1976), Ilsa, the Tigress of Siberia (1977) e tam­bém em uma pro­dução dirigi­da pelo dire­tor espan­hol recém fale­ci­do, Jess Fran­co mestre do cin­e­ma sexplotation.

    Existe uma peque­na con­fusão em relação a este filme: alguns sites colo­cam o nome da per­son­agem inter­pre­ta­da por Dianne como Ilsa, out­ros como Gre­ta e mais out­ros como Wan­da. O nome orig­i­nal do filme é Gre­ta — Haus ohne Män­ner (1979) então imag­i­no que deva­mos ficar com Gre­ta mes­mo. Basi­ca­mente só o primeiro filme des­ta tetralo­gia entra no gênero Nazi, os out­ros usam a mes­ma ideia, mas vão mais pro lado de out­ra ram­i­fi­cação do gênero x‑plotation que é o gênero W.I.P (Wom­ans In Prison), onde mul­heres são tor­tu­radas e abu­sadas em prisões, para o praz­er de um dire­tor sádico.

    Ilsa the Tigress of Siberia, por Jean LaFleur
    Ilsa the Tigress of Siberia, por Jean LaFleur

    Dianne, tem ao todo 28 papéis em sua car­reiras, mas somente os filme em que ela inter­pre­tou Ilsa são dig­nos de nota. Ela fez seu ulti­mo papel 1989, inter­pre­tan­do o tran­sex Sr. Piran­del­lo, pai do per­son­agem inter­pre­ta­do por James Beluchi no filme Real Men. Des­de então começou a cuidar de uma capela de casa­men­tos em las Vegas com seu mari­do. Mas, no site do IMDB apare­cem duas pro­duções com o nome da atriz cota­do no elen­co com estreia mar­ca­da para 2013. Res­ta esper­ar para saber se é oficial.

    Vamos ao filme… Ilsa é uma coman­dante de um cam­po de con­cen­tração nazista, que usa seus pri­sioneiros em “exper­i­men­tos médi­cos” pes­soais. Ela ten­ta provar para o alto escalão da SS, que mul­heres são mais resistentes a dor do que os home­ns. Como ela faz isso? Sim­ples, ela tor­tu­ra home­ns e mul­heres das maneiras mais cruéis e absur­das pos­síveis e vê qual morre primeiro! Legal né?

    Comandante Ilsa demonstrando que manja das putarias.
    Coman­dante Ilsa demon­stran­do que man­ja das putarias.

    Fora esse seu inter­esse acadêmi­co pela med­i­c­i­na, Ilsa tam­bém é dona de um apetite sex­u­al voraz e, sem­pre que pode, man­da um pri­sioneiro sor­tu­do para sua cama para sat­is­fazê-la. Infe­liz­mente a ale­gria do escol­hi­do dura muito pouco, pois ela fica muito, mas muito irri­ta­da quan­do o mané do pri­sioneiro goza antes dela. E como ela resolve essa situ­ação? Sim­ples, como qual­quer coman­dante da SS nazista de um filme x‑plotation do meio da déca­da de 70 que se preze faria! Cas­tran­do o infeliz!

    Ilsa escolhendo um dos prisioneiros “azarados” para lhe fazer companhia.
    Ilsa escol­hen­do um dos pri­sioneiros “azara­dos” para lhe faz­er companhia.

    Tudo está as mil mar­avil­has com a coman­dante até que um cer­to pri­sioneiro, com uma espé­cie de “super­poder” dig­amos assim, é chama­do para a cama da coman­dante. Não é que final­mente ela encon­tra alguém dig­no de sua atenção sex­u­al? O cara con­segue con­tro­lar a ereção pela noite inteira se quis­er, e assim con­segue a sim­pa­tia da loba SS e o jogo se inverte, pois ago­ra é um pri­sioneiro que tem o coman­dante sob seu comando!

    Dá pra notar que o filme é só isso mes­mo, sexo, vio­lên­cia, tor­tu­ra, mais sexo e depois mais tor­tu­ra! Não é atoa que ele foi proibido na Ale­man­ha na época de seu lança­men­to e tam­bém em out­ros diver­sos países.

    Por mais absur­do a obra pareça, é inegáv­el diz­er que ela influ­en­ciou diver­sos gêneros do cin­e­ma além do x‑plotation. Fora dos telões do cin­e­ma, Ilsa inspirou tam­bém alguns per­son­agens de videogame como a The Butcher­ess do game Blood­rayne, e tam­bém influ­en­ciou no design de um grupo de elite fem­i­ni­na que aparece no game Return To Cas­tle Wolfen­stein.

    De um lado a The Butcheress do game Bloodrayne e do outro a comandante Ilsa demonstrando toda sua volúpia.
    De um lado a The Butcher­ess do game Blood­rayne e do out­ro a coman­dante Ilsa demon­stran­do toda sua volúpia.
    Grindhouse - Planeta Terror e À Prova de Morte
    Grind­house

    A mais óbvia das influên­cias de Ilsa no cin­e­ma, foi quan­do Quentin Taran­ti­no e Robert Rodriguez dividi­ram a direção no pro­je­to Grind­house com os filmes Plan­e­ta Ter­ror (2007) e À Pro­va de Morte (2007), ten­do como intenção hom­e­nagear essas pro­duções x‑plotation da déca­da de seten­ta. Entre um filme e out­ro, a platéia que assis­tia teve a chance de ver alguns trail­ers fal­sos de out­ras supostas pro­duções. Entre ess­es fal­sos filmes, um deles foi bati­za­do de: Were­wolf Women of SS, onde podemos ver Sheri Moon, a esposa do dire­tor e músi­co Rob Zom­bie, como uma ofi­cial nazista que coman­da um pro­je­to cien­tí­fi­co com a intenção de trans­for­mar mul­heres em lobi­somens para lutar na guer­ra! Veja o video abaixo.

    httpv://www.youtube.com/watch?v=pv_aefnKf‑E

    machete
    Machete, por Robert Rodriguez

    Ess­es trail­ers fal­sos der­am origem a três filmes, um deles foi o fraquís­si­mo Machete dirigi­do por Robert Rodriguez em 2010, out­ro foi Hobo With A Shot­gun (em alguns sites este filme é traduzi­do com o belo tit­u­lo de “Mendi­go com Escope­ta!”) dirigi­do por Jason Eisen­er em 2011. Então podemos diz­er que existe a pos­si­bil­i­dade de ver­mos um dia Were­wolf women of SS em ver­são lon­ga metragem.

    Emb­o­ra Ilsa — a Guardiã Per­ver­sa da SS seja um filme situ­a­do em uma época bem clara e basea­do em acon­tec­i­men­tos reais, o caráter real­ista da obra sobra mes­mo para aqui­lo que parece mais absur­do. Os úni­cos acon­tec­i­men­tos que real­mente exi­s­ti­ram durante a ocu­pação nazista são os exper­i­men­tos mostra­dos no filme, todos ver­dadeiros. Diver­sos pri­sioneiros judeus foram real­mente usa­dos como coba­ias pelas tropas nazis­tas em cam­pos de concentração.

    Hobo With A Shotgun,  por Jason Eisener
    Hobo With A Shot­gun, por Jason Eisener

    No lon­ga são mostradas as já citadas cas­trações e os testes de resistên­cia a dor, numa cena vemos até uma pri­sioneira sendo fer­vi­da viva! Algu­mas mul­heres são proposi­tal­mente infec­tadas com doenças como tifu, sífil­is, lep­ra, etc.

    Exis­tem diver­sos filmes e muitos tex­tos na inter­net que tratam sobre ciên­cia nazista de uma maneira muito mais abrangente do que aqui. É tudo muito inter­es­sante e ao mes­mo tem­po revoltante. Recomen­do que pesquisem!

    A per­son­agem de Ilsa obvi­a­mente nun­ca exis­tiu, nem nun­ca exis­tiu nen­hu­ma mul­her que chegou ao alto coman­do do exérci­to alemão a pon­to de diri­gir um cam­po de con­cen­tração. Mas a coman­dante sado­ma­so foi basea­da em alguém que exis­tiu de ver­dade, não uma ofi­cial, mas a esposa de um. Estou falan­do de Ilse Koch, esposa de Karl-Otto Koch, um alto coman­dante do exérci­to nazista que entre os anos 1937 a 1943, coman­dou dois cam­pos de con­cen­tração em ter­ritório alemão, os cam­po de Bunchen­wald e Majdanek.

    A sádica da vida real ou a ninfomaníaca da ficção. Com qual você prefere passar a noite?
    A sádi­ca da vida real ou a nin­fo­manía­ca da ficção. Com qual você pref­ere pas­sar a noite?

    A sen­ho­ra Koch (mais con­heci­da como “A bruxa de Bunchewald”) ficou famosa pelos estran­hos sou­venirs que gosta­va de guardar, entre eles, pedaços de couro tat­u­a­do dos pri­sioneiros e aba­jures feitos de pele humana, eram o mais bási­cos da coleção. Ele foi pre­sa e jul­ga­da diver­sas vezes, aos sessen­ta anos come­teu suicí­dio enquan­to cumpria um sen­tença de prisão perpetua.

    De vol­ta ao filme… O cam­po de con­cen­tração onde toda a ação acon­tece não lem­bra muito os temíveis cam­pos que vemos em doc­u­men­tários ou em filmes com a mes­ma temáti­ca que se lev­am mais a sério. Ele mais parece uma prisão de segu­rança mín­i­ma, e os pri­sioneiros até cer­to pon­to são bem gordinhos, com­para­do aos que vemos em fotos reais da época, e tam­bém pos­suem uma cer­ta liber­dade, que provavel­mente não exis­tia, pra falar com os ofi­ci­ais nazistas.

    Prisioneiras do campo de concentração do filme
    Pri­sioneiras do cam­po de con­cen­tração do filme

    Eu gos­to de Ilsa — a Guardiã Per­ver­sa da SS por ser um puta fil­maço que me mar­cou bas­tante, foi o primeiro do gênero nazi-xplota­tion que vi. Não imag­i­na­va que alguém pode­ria faz­er uma comé­dia falan­do de temas tão ten­sos… ou mel­hor: Não imag­i­na­va que algum estú­dio DEIXARIA um dire­tor faz­er um filme sobre temas tão delicados.

    Viven­do em tem­pos politi­ca­mente cor­re­tos até demais, onde a maio­r­ia das pes­soas está dis­pos­ta a se ofend­er tão calorosa­mente e lutar por causas banais, é quase impos­sív­el acred­i­tar que um filme assim seria lança­do nos dias de hoje sem sofr­er grandes críti­cas e resistên­cia dos sofa­tivis­tas de plan­tão. Afi­nal, todo mun­do está dis­pos­to a lutar por algo des­de que isso não obrigue ninguém a sair da frente do Face­book ou tirar a bun­da do sofá…

    Ilsa em mais um de seus experimentos
    Ilsa em mais um de seus experimentos

    Na min­ha pré-adul­tecên­cia me inter­es­sei muito por filmes gore, trash, slash­ers e mon­do. Todos ess­es podem ser con­sid­er­a­dos sub-gêneros do cin­e­ma x‑plotation. A déca­da de seten­ta foram os anos em que ess­es filmes pipocavam nos cin­e­mas norte amer­i­canos aos montes, era nat­ur­al que em meio a tan­tos lança­men­tos baratos, uns fos­sem mel­hores que out­ros, em meio a mui­ta (mui­ta mes­mo!) por­caria que assisti durante ess­es anos de “auto estu­do cine­fil­iti­co”, Ilsa — a Guardiã Per­ver­sa da SS se tornou um dos meus filmes preferi­dos, é mais um daque­les lon­gas que faço questão de assi­s­tir uma vez a cada dois ou três anos, pra ter certeza que ain­da é foda!

    Fora tudo isso, há um caráter psi­cológi­co que me faz pen­sar um pouco… por que dia­bos a vio­lên­cia é tão fascinante?

    Não uma sim­ples vio­lên­cia fic­cional, mas uma vio­lên­cia basea­da em fatos. Antes mes­mo dos crédi­tos ini­ci­ais, vemos um tex­to atribuí­do ao pro­du­tor Her­man Traeger (pseudôn­i­mo de David F. Fried­man, o ver­dadeiro pro­du­tor) avisan­do que os exper­i­men­tos pre­sentes na tra­ma do filme são reais e que foram clas­si­fi­cadas como “exper­iên­cias médi­cas”. Por últi­mo diz que o filme fora real­iza­do com a esper­ança de que essas mes­mas exper­iên­cias médi­cas não se repi­tam nova­mente. Ou seja, mes­mo avisa­do dis­so, a maio­r­ia das pes­soas pref­ere ver o filme até final, ou até mes­mo esse pré avi­so ins­tigue o espec­ta­dor a assistir.

    Vocês foram avisados do que viria a seguir...
    Vocês foram avisados…

    O que mais me fasci­na nis­so tudo é o teor sex­u­al da bagaça toda, como algo tão desumano con­segue se asso­ciar tão facil­mente com sexo? Por que existe tan­ta audiên­cia do públi­co (incluin­do eu!) em cima de um tema tão especí­fi­co, a pon­to de se cri­ar um nome exclu­si­vo para esse tipo de filme?

    Enfim, a intenção aqui não é desmere­cer a obra, mas sim discutí-la.

    Pra ter­mi­nar deixo o vídeo da músi­ca Ilsa que a ban­da brasileira Zumbis do Espaço gravou para hom­e­nagear a loba alemã. Ago­ra, clique no play e leia tudo de novo can­tan­do essa lin­da e sin­gela poe­sia do hor­ror punk nacional.

    httpv://www.youtube.com/watch?v=i‑I1Rl2Eml4

    Trail­er:

    httpv://www.youtube.com/watch?v=cWaChi_OOvQ

  • O Grande Dragão Branco (1988), de Newt Arnold

    O Grande Dragão Branco (1988), de Newt Arnold

    O Grande Dragão Branco DVDEm 1987 o bel­ga espe­cial­ista em artes mar­ci­ais Jean Claude Van Damme saiu do anon­i­ma­to para estre­lar sua primeira grande pro­dução cin­e­matográ­fi­ca, O Grande Dragão Bran­co (Blood­sport, EUA, 1988), dirigi­do por Newt Arnold, e nos anos seguintes entrou no hall dos maiores bru­cu­tus do cin­e­ma, for­man­do no imag­inário pop­u­lar dos anos 80 e 90 uma espé­cie de “trio dos marombeiros” jun­to com Sil­vester Stal­lone e Arnold Schwarzeneg­ger, estando na ter­ceira posição deste top, é claro.

    Este seu primeiro grande suces­so foi aque­le que seria seu filme mais lem­bra­do e mais reprisa­do na TV brasileira, uma pro­dução dos estú­dios Can­non, dirigi­do pelo expe­ri­ente profis­sion­al do cin­e­ma Newt Arnold, que serviu como dire­tor de segun­da unidade e assis­tente de dire­tor em grandes pro­duções como O Poderoso Chefão II, Blade Run­ner, Os Goonies, entre out­ros grandes e menores suces­sos ao lon­go dos seus quase 40 anos de serviços à Hol­ly­wood. Curiosa­mente ele só dirigiu ape­nas três títu­los, sendo O Grande Dragão Bran­co o últi­mo, mel­hor e mais famoso deles.

    O filme teve o orça­men­to esti­ma­do em US$1.100.000, val­or bem medi­ano para uma pro­dução da Can­non films. Nas bil­hete­rias o filme super­ou seu val­or em 10 vezes e teve duas con­tin­u­ações hor­ríveis, que pouco ou nada tem a ver com o orig­i­nal, usan­do ape­nas seu tit­u­lo para chamar a atenção dos fãs desin­for­ma­dos na maior picare­tagem. O orig­i­nal fora lança­do em 1988, pas­san­do por alguns prob­le­mas de pro­dução e quase não chegan­do aos cin­e­mas. Reza a len­da que o próprio Van Damme teve que edi­tar algu­mas cenas por fal­ta de edi­tor, coisa que não é con­fir­ma­da nos crédi­tos do filme.

    Acho muito difí­cil escr­ev­er sobre O Grande Dragão Bran­co sem apelar para um lado muito pes­soal da coisa. Afi­nal, o filme foi e é até hoje reprisa­do aos baldes na sessão da tarde e nas madru­gadas da Rede Globo, um clás­si­co dos anos 90 da TV aber­ta e um dos meus filmes favoritos de todos os tempos.

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    Às vezes, só para irri­tar os ciné­fi­los mais tara­dos, cos­tu­mo exal­tar as qual­i­dades de O Grande Dragão Bran­co como se fos­se um mar­co do cin­e­ma mod­er­no, com­para­n­do com grandes filmes do sécu­lo como; Cidadão Kane, O Poderoso Chefão, Psi­cose, Os Sete Samu­rais, filmes do Truf­faut ou do Kubrick, etc. sem­pre dizen­do que nun­ca, jamais, nen­hum filme feito até hoje ou qual­quer filme que será feito futu­ra­mente, con­seguira ser mel­hor ou no mín­i­mo chegar aos pés de O Grande Dragão Bran­co! É claro que hoje digo isso como brin­cadeira, mas quan­do eu assis­tia lá pelos meus 8 ou 9 anos, pra mim era a mais pura verdade!

    O filme con­ta a história de Frank Dux (Van Damme), um mil­i­tar norte-amer­i­cano treina­do pelo mestre Sen­zo Tana­ka (Roy Chiao, ator chinês com quase 100 filmes no cur­rícu­lo), que aban­dona os serviços mil­itares nos states e parte para Hong Kong para se encon­trar com seu sen­sei. Des­de cri­ança Frank pas­sou por um doloroso treina­men­to que exi­gia muito de seu físi­co e de sua con­cen­tração. Numa das cenas mais clás­si­cas do filme vemos ele amar­ra­do pelos braços e per­nas sus­pen­so no ar entre dois tron­cos, enquan­to seu mestre puxa as cor­das tor­nan­do a cena mui­ta ten­sa e dolorosa, ain­da mais saben­do que não são efeitos visuais ou trucagem cinematográfica.

    O Grande Dragão Branco

    Já em Hong Kong, Frank con­segue uma vaga no “Kumite”, um torneio super-secre­to e ile­gal que reúne os mel­hores prat­i­cantes de artes mar­ci­ais de todo o mun­do. Não há regras e os luta­dores chegam real­mente ao lim­ite, pos­sivel­mente até a morte de um dos adversários.

    Logo que chega faz amizade com Ray Jack­son (Don­ald Gibb), que tam­bém irá lutar no torneio. Ray é um gigante de bom coração que ado­ra uma luta livre e os dois se con­hecem numa cena hilária onde Frank con­segue vencer Ray num game de flipera­ma (Karate Champ, jogo japonês de 1984, clás­si­co) e logo viram amigos.

    No momen­to em que Frank vai faz­er a inscrição para o torneio, os juízes não acred­i­tam que ele foi treina­do por Sen­zo Tana­ka e pra provar isso eles pedem que faça o golpe Dim Mak, um golpe secre­to que no reino dos filmes de artes mar­ci­ais seria mor­tal quan­do apli­ca­do, pois suposta­mente causaria danos inter­nos ao adver­sário, numa cena antológ­i­ca Frank Dux mostra pra todos os pre­sentes sua força e con­cen­tração ao que­brar um úni­co tijo­lo especí­fi­co numa pil­ha com cinco!

    O Grande Dragão Branco

    Dim Mak na ver­dade é ape­nas ficção, sendo um golpe que só existe nos filmes e nas histórias de kung-fu e Karatê, ele aparece em cen­te­nas de out­ros filmes con­heci­do quase sem­pre como “ o toque na morte”, poden­do ser vis­to em grandes pro­duções como O Tigre e o Dragão (Crouch­ing Tiger, Hid­den Drag­on, 2000) dirigi­do por Ang Lee e no filme Kill Bill (2003) de Quentin Taran­ti­no, a Noi­va aprende uma espé­cie de Dim Mak que se tor­na mui­ta útil caso um dia você seja enter­ra­do vivo.

    Mas não são ape­nas os luta­dores que têm inter­esse no torneio: uma deter­mi­na­da repórter faz de tudo para se infil­trar nos basti­dores da com­petição, assim como uma dupla de poli­ci­ais (um deles inter­pre­ta­do por um jovem For­est Whitak­er!) que está atrás de Frank Dux por aban­donar o serviço mil­i­tar e que tam­bém pre­ten­dem acabar com o even­to de uma vez por todas.

    O Grande Dragão Branco

    Mas os grandes desafios chegam ao nos­so herói quan­do ele encon­tra seu nême­sis, o luta­dor cru­el Chong Li, inter­pre­ta­do por Bolo Yeung, ator chinês com cur­rícu­lo gigan­tesco em filmes de artes mar­ci­ais e que depois des­ta pro­dução se tornou ami­go de Van Damme fora das câmeras. Uma curiosi­dade a mais sobre o per­son­agem Chong-li: as pou­cas falas que ele tem no filme são na maio­r­ia tiradas do filme Oper­ação Dragão de 73, filme estre­la­do por Bruce Lee onde Bolo Yeung tam­bém par­ticipou! Yeung, anos depois vol­ta para inter­pre­tar mais um vilão con­tra Van Damme no filme Dup­lo impacto (Dou­ble Impact, 1992 dir. Shel­don Leit­tich) e chegou apare­cer no Real­i­ty Show britâni­co “Jean Claude Van Damme: Behind Closed Doors” de 2011, onde podemos ver o astro na sua vida real fazen­do coisas nor­mais que pouco lem­bram suas façan­has cin­e­matográ­fi­cas. Mas no reino da ficção os dois sem­pre foram inimi­gos mortais!

    No filme durante uma luta, Chong Li desce a por­ra­da em Ray Jack­son, deixando‑o a beira da morte. O ami­go, Frank Dux, jura vin­gança e der­ro­ta todos os adver­sários até chegar na luta final con­tra Chong Li que, num exem­p­lo de vila­nia fil­hada­putís­ti­ca, joga sujo e tra­paceia, jogan­do poeira nos olhos de Frank deixando‑o cego!

    Na ver­dade a tra­ma do filme é somente uma des­cul­pa bara­ta para ver­mos Frank Dux descen­do o sar­rafo em todo mun­do no torneio. As cenas de luta foram muito bem core­ografadas pelo próprio Frank Dux da vida real e as atu­ações são dig­nas de um filmes de ação dos anos oiten­ta, con­tan­do até com o já cita­do For­est Whitak­er, fazen­do um pequeno papel per­di­do ali no meio. Todos os clichês do cin­e­ma de kung-fu/karatê estão ali, o mestre insen­sív­el, o golpe secre­to, a vin­gança do herói, o vilão arro­gante e ine­scrupu­loso, e a luta final con­tra o arqui-inimi­go Chong-Li com o clí­max em slow-motion, com a clás­si­ca cena de Van Damme fazen­do essa care­ta hor­ro­rosa aqui:

    O Grande Dragão Branco

    Uma das coisas mais estra­nhas sobre a pro­dução do filme é o fato dela se diz­er basea­da em em uma história real, coisa que nun­ca foi con­fir­ma­da. A úni­ca fonte de infor­mação sobre o torneio Kumite e sobre os per­son­agens que apare­cem no filme é o próprio Frank Dux da vida real, que por si só é um figu­ra, alem de ter cri­a­do seu próprio esti­lo de luta chama­do Dux Nin­jut­su Ryu, ele diz ter ven­ci­do o torneio secre­to umas 53 vezes seguidas(!), detém o recorde de nocaute mais rápi­do, 12 seg(!!) e ele tam­bém diz ter rece­bido a medal­ha de hon­ra e bravu­ra do próprio pres­i­dente dos EUA (!!!). Porém, nun­ca nen­hum out­ro luta­dor do mun­do ouviu falar ou par­ticipou do tal torneio e nun­ca ninguém viu a tal medal­ha. Ou seja, ou esse cara é um bai­ta men­tiroso do caram­ba ou o torneio existe e é extrema­mente secre­to mes­mo. ( e a medal­ha é invisív­el, claro)

    Frank Dux verdadeiro e o ator Donald Gibb, intérprete de Ray Jackson
    Frank Dux ver­dadeiro e o ator Don­ald Gibb, intér­prete de Ray Jackson

    A ideia do filme, “torneio de artes mar­ci­ais com luta­dores do mun­do todo, cada um lutan­do com seu esti­lo” ante­ci­pa até os pop­u­lares games de luta como Street Fight­er e Mor­tal Kom­bat que fazi­am lotar os flipera­mas entre os anos de 90 a 96, quan­do ess­es esta­b­elec­i­men­tos eram bem mais pop­u­lares e muitas vezes as úni­cas opções para quem quisesse jog­ar um vídeo gamezinho.

     

    Sem con­tar que, para quem já jogou Mor­tal Kom­bat, talvez não ten­ha nota­do mas no game orig­i­nal de 1992, o per­son­agem John­ny Cage usa o MESMO calção que o per­son­agem de Van Damme usa no filme!

    Mudando apenas a cor da faixa. Será coincidência, homenagem ou plágio mesmo?
    Mudan­do ape­nas a cor da faixa. Será coin­cidên­cia, hom­e­nagem ou plá­gio mesmo?

     

    O jogo Street Fight­er é ante­ri­or ao filme em poucos meses de difer­ença, sendo um pouco difí­cil um ter se basea­do no out­ro. Mas coin­cidên­cias à parte, de fato, acho que se quisessem faz­er um filme decente adap­tan­do o game Street Fight­er dev­e­ri­am usar O Grande Dragão Bran­co como base para o roteiro. Emb­o­ra o plot do filme seja o fes­ti­val de clichês já cita­dos, nen­hu­ma cena é gra­tui­ta, tudo que aparece em tela é rel­e­vante para a tra­ma sim­ples e dire­ta, sem grandes aspi­rações cin­e­matográ­fi­cas, o filme é e se propõe a ser ape­nas um diver­são casu­al e logra êxi­to na ten­ta­ti­va. Mel­hor do que muitas pro­duções mega­lo­manía­cas e bil­ionárias que querem te mostrar o sen­ti­do da vida em três horas de duração com efeitos visuais absur­da­mente caros (e em 3D).

    Como eu já disse, assi­s­tir O Grande Dragão Bran­co é uma exper­iên­cia muito pes­soal pra mim, me faz lem­brar da infân­cia e de tem­pos onde tra­bal­ho, din­heiro e estu­dos não fica­va a frente da diver­são sim­ples de se sen­tar a frente da TV e assi­s­tir um bom filme, quan­do assis­to não estou reven­do um filme anti­go, mas sim reven­do um momen­to bom da min­ha vida.

    Então fica a recomen­dação, caso queira se aven­tu­rar a assi­s­tir uma pro­dução bara­ta e diver­ti­da com boas cenas de ação, O Grande Dragão Bran­co é uma óti­ma sugestão.