Crítica: Mary e Max

Crítica: Mary e Max

Crítica: Mary e Max

Diz-se que a solidão seja o mal do sécu­lo 21, e talvez seja. A informa­ti­za­ção e a glob­al­iza­ção facili­tam que nos sin­ta­mos menos soz­in­hos no mun­do, mas será mesmo?

Somente em abril desse ano Mary and Max (Mary and Max, Aus­trália, 2009) estre­ou no país, mas a ani­mação em stop-motion já está rodan­do pela inter­net há meses, afi­nal a sua estréia ¨ofi­cial¨ acon­te­ceu há mais de um ano. Infe­liz­mente filmes (e ani­mações) não pro­duzi­dos por grandes estú­dios sofrem esse ¨atra­so¨ para chegar nas telas brasileiras, quan­do não são lança­dos somente em DVD.

A ani­mação é cheia de pecu­liari­dades da vida adul­ta e é genial, diga-se de pas­sagem. O diretor/roteirista Adam Elliot deu vida a dois per­son­agens que ten­ho certeza que vão per­manecer na memória de qual­quer um que assista. Sep­a­ra­dos por uma dis­tân­cia de 2 con­ti­nentes, os per­son­agens pode­ri­am ser qual­quer um de nós. Mary é uma garot­in­ha de 8 anos, gordinha e solitária. Ela é tão soz­in­ha que tem um galo como ani­mal de esti­mação e mora no sub­úr­bio de Mel­bourne na Aus­trália. Já Max Horowitz é um obe­so judeu de 44 anos que sofre da Sin­drome de Asperg­er (um tipo de autismo), tem fobia de pes­soas e mora na caóti­ca Nova Iorque. Os dois tro­cam car­tas e desen­volvem uma amizade inco­mum que dura des­de a infân­cia de Mary e per­manece, mes­mo com altos e baixos, por 22 anos. A tro­ca de exper­iên­cias e de acon­tec­i­men­tos que aparente­mente são banais tor­nam-se chave para que um ajude muito o out­ro, mes­mo sem se dar con­ta disso.

O filme explo­ra a neces­si­dade de aceitação e amor, inde­pen­dente de quão difer­entes somos da maio­r­ia. Para Mary and Max o mun­do é estran­ho e difer­ente, e é jus­ta­mente esse sen­ti­men­to de desa­lo­ja­men­to e solidão que movi­men­ta as ima­gens mar­cantes do filme. Ambos não enten­dem porquê as pes­soas são com­pli­cadas e o porquê o mun­do parece tão ente­di­ante para aque­les que prestam atenção demais nos detalhes.

A ani­mação é impecáv­el e os detal­h­es são cria­tivos. Fique aten­to para a refer­ên­cia dada a clás­si­ca per­son­agem de Audrey Hep­burn, em Bonequin­ha de Luxo, para mostrar uma noite melancóli­ca na Nova Iorque de Max. Há dois mun­dos trata­dos ali, a Aus­trália de Mary escu­ra em tons de mar­rom e a Nova Iorque em tons de pre­to, bran­co e cin­za. Afi­nal, nada mel­hor que estas cores para retratar a solidão e a dis­tân­cia. Em muitos momen­tos há obje­tos e detal­h­es em ver­mel­ho para dar destaque e sim­bolo­gia às cenas, sem con­tar a ilu­mi­nação e os enquadra­men­tos que reforçam ao espec­ta­dor a dis­tân­cia exis­tente entre os dois per­son­agens. Destaque para o nar­rador, Bar­ry Humphries, que dá mais sig­nifi­ca­do a história.

A tra­ma é cheia de sin­gu­lar­i­dades que metaforizam situ­ações engraçadas e muitas vezes irôni­cas do cotid­i­ano. Inqui­etações como a de Mary sobre de onde vêm os bebês dá origem à tro­ca de car­tas e, ain­da, as expli­cações sobre a vida e amor que Max dá em suas car­tas nos fazem enten­der como tor­namos banais as peque­nas situ­ações diárias.

Aliás, o enre­do nos remete muito a filmes como O fab­u­loso des­ti­no de Amélie Poulain, de Jean Pierre Jeunet, com dis­cussões sobre a sim­pli­ci­dade necessária das relações. A atmos­fera lem­bra muito as ani­mações de Tim Bur­ton, prin­ci­pal­mente a história de Vin­cent Mal­loy. Mas Elliot vai mais a fun­do tratan­do de per­son­agens mais reais e sim­plórios à primeira vista, mas com uma bagagem extrema e tocante quan­do obser­va­dos de per­to. O próprio dire­tor rela­ta que escreveu o roteiro basea­do numa exper­iên­cia pes­soal com um ami­go que man­teve con­ta­to por mais de 20 anos.

Muito se comen­ta que os filmes em 3D tomarão con­ta do mer­ca­do, mas eu dis­cor­do, ain­da mais com lança­men­tos de pelícu­las tão boas em out­ros for­matos nos últi­mo anos. Nomes como Jan Svankma­jer, Tim Bur­ton e Michel Gondry vêm provan­do que o méto­do man­u­al encan­ta muito. Mes­mo sus­pei­ta a falar, sendo uma apaixon­a­da por stop-motion, devo diz­er que Mary and Max já é uma das grandes pro­duções feitas nos últi­mos tem­pos, tan­to tec­ni­ca­mente quan­to com o belís­si­mo e tocante roteiro.

¨As pes­soas, as vezes, me con­fun­dem. Mas ten­to não me pre­ocu­par com elas¨ (Max Horowitz)

Out­ra críti­cas interessantes:

Trail­er:

httpv://www.youtube.com/watch?v=KPULUwu0Wm8

Comments

2 responses to “Crítica: Mary e Max”

  1. Michelle Henriques Avatar

    Per­feito esse seu tex­to, ermã.
    Nem pre­ciso diz­er que ago­ra estou ain­da mais curiosa para ver esse filme.
    E con­cor­do com isso que você disse sobre o 3D. Mes­ma coisa com os livros e revis­tas impres­sas, sem­pre vai ter gente pro­duzin­do e gente interessada. 🙂

  2. Débora Avatar
    Débora

    Mary e Max foi uma das mel­hores ani­mações que já vi.
    Não tem como não se emo­cionar com a sim­pli­ci­dade pro­fun­da da história.
    Me fez pen­sar sobre amor próprio, amor aos out­ros, relações fal­i­das, del­i­cadeza, per­da de tem­po e de vida, aceitação, enfim…todo o cotid­i­ano que pas­sa bati­do muitas vezes e quan­do percebe­mos o tem­po que pas­sou, pouco ou nada pode se fazer.

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